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Educação e Filosofia

versão impressa ISSN 0102-6801versão On-line ISSN 1982-596X

Educação e Filosofia vol.33 no.68 Uberlândia maio/ago 2019  Epub 30-Ago-2021

https://doi.org/10.14393/revedfil.v33n68a2019-46925 

Artigos

Recatolizar a Nação: Intelectuais Católicos na Comissão Nacional do Livro Didático (1938-1969)

Recatolizing the Nation: Intellectual Catholics in the National Commission of the Didactic Book (1938-1969)

Recatolizar la Nación: Intelectuales Católicos en la Comisión Nacional del libro Didáctico (1938-1969)

Aldemir Barbosa da Silva* 

Celso João Carminati** 
http://orcid.org/0000-0002-3638-5489

*Doutorando em Educação na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Mestre em Educação pela UDESC. E-mail: maquiavel.sc@hotmail.com

**Doutor em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Professor no Departamento de Pedagogia do Centro de Ciências Humanas e da Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). E-mail: cjcarminati@gmail.com


Resumo

Este artigo analisa a presença de intelectuais católicos entre os membros da Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) como indício da relação de poder entre a Igreja Católica e o governo. Tal posição estratégica permite examinar, estimular, indicar e promover os livros didáticos na formação da nação, como aproximar a cultura católica dos princípios nacionalistas. Na primeira parte, apresentam-se sinais do movimento Reação Católica em torno do projeto de recatolizar a nação; na segunda, mostra-se a importância da CNLD entre os aparatos estatais em consonância com o projeto da construção institucional do governo; e, por fim, na terceira parte, indica-se a posição estratégica de intelectuais católicos na CNLD.

Palavras-chave: História da educação; Intelectuais católicos; Livro didático; Reação católica

Abstract

This article analyzes the presence of Catholic intellectuals among the members of the National Textbook Commission (CNLD) as an indication of the power relationship between the Catholic Church and the government. Such a strategic position allows us to examine, stimulate, indicate and promote didactic books in the formation of the nation, how to bring Catholic culture closer to nationalist principles. In the first part, there are signs of the Catholic Reaction movement around the project to re-nation the nation; the second shows the importance of the CNLD among state apparatus in line with the government's institutional construction project; and, finally, in the third part, the strategic position of Catholic intellectuals in the CNLD is indicated.

Keywords: History of education; Catholic intellectuals; Textbook; Catholic reaction

Resumen

Este artículo analiza la presencia de intelectuales católicos entre los miembros de la Comisión Nacional del Libro Didáctico (CNLD) como indicio de la relación de poder entre la Iglesia Católica y el gobierno. Tal posición estratégica permite examinar, estimular, indicar y promover los libros didácticos en la formación de la nación, como aproximar la cultura católica de los principios nacionalistas. En la primera parte, se presentan señales del movimiento Reacción Católica en torno al proyecto de recatolizar la nación; en la segunda, se muestra la importancia de la CNLD entre los aparatos estatales en consonancia con el proyecto de la construcción institucional del gobierno; y, finalmente, en la tercera parte, se indica la posición estratégica de intelectuales católicos en la CNLD.

Palabras clave: Historia de la educación; Intelectuales católicos; Libro didáctico; Reacción católica

A Comissão Nacional do Livro Didático (CNLD) foi um aparato estatal1 instituído na política educacional do então Ministro da Educação e Saúde Gustavo Capanema (1934-1945), com função de estabelecer as condições de produção, importação e utilização do livro didático entre as escolas pré-primárias, primárias, normais, profissionais e secundárias em toda a República.

Na década de 1930, os aparatos estatais constituem instrumento do projeto de construção institucional, instituídos em torno de uma rede de autarquias, conselhos, departamentos e comissões especiais, e permitem ao governo operacionalizar, para Miceli (2001, p. 199), “o processo de centralização autoritária”. Nesse viés, as articulações no campo político educacional apontam alianças entre a Igreja Católica e o governo que fortalecem as instituições na defesa dos princípios nacionalistas.

Os tempos de reforma ocorriam simultaneamente aos da ação, mas consistiam, basicamente, na elaboração de um grande painel de normas, regulamentos e projetos para a reformulação total do sistema educacional do país. Era aqui, mais do que em qualquer outra área, que o pacto do Ministério da Educação com a Igreja se revelava com toda a sua força (SCHWARTZMAN et al. 2000, p. 189).

Tal pacto entre líderes do poder estatal e católico, para Schwartzman et al. (2000, p. 61), “parece ter tido permanência e repercussões muito mais profundas [...]. A Igreja Católica deveria oferecer ao novo regime uma ideologia que lhe desse substância e conteúdo moral”. A Igreja Católica, como instrumento de mobilização política, torna-se uma aliada fundamental do governo e permite apoio ao seu projeto nacionalista, em consonância com as alianças em prol de recatolizar a nação.

Sobre a posição da Igreja Católica no projeto de ampliar sua representação política, assim Miceli (2001, p. 127), percebe que “ao mesmo tempo que procuravam reformar as obras tradicionais de caridade, as associações leigas, as ligas destinadas ao culto e à oração, os círculos e as congregações voltadas ao recrutamento”, tem intensificado a estruturação institucional em torno de expandir a representação católica no campo sócio-político-cultural.

A presença de intelectuais católicos (eclesiásticos e leigos) entre os aparatos estatais ocorre da seguinte forma: CNLD, Conselho Nacional de Educação (CNE), Comissão Nacional de Censura Cinematográfica (CNCC), Instituto Histórico Geográfico Brasileiro (IHGB), Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto Brasileiro de Educação, Ciência (IBEC), entre outras autarquias em favor da cultura católica e do nacionalismo. Tal estratégia aponta sinais dos avanços do movimento Reação Católica2 no projeto de recatolizar a nação pelo engajamento de intelectuais.

Tal representação entre os aparatos estatais, como na comissão do Plano Nacional de Educação, possibilita fortalecer as alianças entre os ciclos de sociabilidade do governo. Para Chartier (2011, p. 17), essa “representação nos permite ver o ‘objeto ausente’ (coisa, conceito ou pessoa), substituindo-o por uma ‘imagem’ capaz de representá-lo adequadamente”. A noção de representação constitui um instrumento de análise importante, pois possibilita identificar traços dos objetos ausentes (intencionalidades), como a representação de intelectuais, ao posicionar sobre os preceitos que constituem a política educacional do país em prol da cultura católica.

Entre os avanços do projeto recatolizar a nação consta a presença da Liga Eleitoral Católica (LEC) na Constituição Federal de 1934. Para Schwartzman et al. (2000, p. 65), “a parte visível desse acordo foi a aprovação, pela Assembleia Constituinte de 1934, das chamadas emendas religiosas”, que permitem a visibilidade no cenário nacional de projetos arquitetados pela Reação Católica.

Nesse contexto, o engajamento de inúmeros intelectuais em prol da cultura católica possibilita a fundação do movimento Ação Católica Brasileira (ACB), em 1935, seguindo os princípios da Ação Católica Italiana, que integra uma rede de sociabilidade ao hierarquizar e organizar as lideranças em torno dos órgãos católicos. Para Nery (1933, p. 17), “é a união disciplinada de todos os católicos, religiosamente formados, para a recristianização da sociedade”.

As intervenções católicas no país ocorrem no campo sócio-político-cultural entre as principais lideranças católicas, Dom Sebastião Leme, Pe. Leonel Franca S. J., e o líder laicato Jackson de Figueiredo, sucedido por Alceu Amoroso Lima, que utilizam a influência intrínseca da Igreja Católica no projeto de recatolizar a nação. A representação do Centro Dom Vital (CDV), em torno das novas alianças com o governo, permite um posicionamento em defesa dos princípios católicos e nacionalistas em detrimento aos avanços comunistas no período.

Diante dessas informações preliminares, este artigo é estruturado na seguinte forma: na primeira parte, aborda os indícios da Reação Católica em torno do projeto de recatolizar a nação, como o engajamento de intelectuais entre os órgãos católicos (ligas, associações e movimentos), e sua ação no campo político educacional; na segunda parte, trata de aspectos que configuram a instituição da CNLD, com suas funções de examinar, estimular, indicar e promover os livros didáticos oficiais para a formação da nação; e, por fim, na terceira parte, apresenta a posição estratégica dos intelectuais católicos Pe. Leonel Franca S.J., Jonathas Serrano e Maria Junqueira Schmidt como membros do CNLD.

Reação Católica na Política Educacional

A fundação da Associação Brasileira de Educação (ABE), em 1924, tem por objetivo possibilitar aos intelectuais intervenções em torno das “causas educacionais”, com significativa representação nas Conferências Nacionais de Educação. No entanto, na década de 1930, a posição dos membros da ABE no campo político educacional pela “bandeira da educação” alcança um status político no governo do então presidente Getúlio Vargas, em defesa da universalização do projeto político educacional nacional.

Mas o posicionamento de um grupo de intelectuais da ABE em defesa do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (sistema único de ensino, público, laico e gratuito), na assembleia da IV Conferência Nacional de Educação, em 1932, provoca o “êxodo dos católicos” da ABE. Nesse contexto, para Carvalho (2003, p. 228), trata-se de um “conflito entre duas mentalidades, inaugurando um período crítico, profundamente conturbado, mas renovador e fecundo, [...] um longo período orgânico de dominação da tradição e das ideias estabelecidas”. Após a ruptura dos intelectuais da ABE, intensificam-se as disputas pela organização técnica e doutrinária nas instituições de ensino

A essa altura, já se encontrava inteiramente demarcada a arena de luta entre a Associação Brasileira de Educação e a Igreja Católica. A associação congregava os educadores profissionais que defendiam o ensino leigo, uma crescente intervenção do Estado para centralizar a gestão do sistema de ensino, e que divulgavam novos modelos pedagógicos e instrumentos sofisticados para avaliação de desempenho. A reação da Igreja católica fazia-se sentir por meio do Centro Dom Vital e de outras organizações que buscavam incentivar a militância em favor da obrigatoriedade do ensino religioso (MICELI, 2001, p. 301).

Nesse cenário, a estratégia de reposicionar intelectuais católicos dá-se entre articulações em torno da Reação Católica. Para Certeau, (2008, p. 102), as estratégias, são “ações que, graças ao postulado de um lugar de poder (a propriedade de um próprio), elaboram lugares teóricos (sistemas e discursos totalizantes), capazes de articular um conjunto de lugares físicos onde as forças se distribuem”.

Tal estratégia permite o engajamento de intelectuais em torno dos órgãos católicos, e posiciona-los entre discussões nas áreas educacional, política e social, e fortalecer a representação da cultura católica na formação da nação. Em relação a ruptura intelectual na ABE, ocorre a fundação da Confederação Católica Brasileira da Educação (CBE), em 1933, e a realização do I Congresso Nacional Católico de Educação (CNCE), em 1934, com apoio das Associações de Professores Católicos (APCs), instituição no período composta por quarenta “sedes” espalhadas pelo território nacional.

O CDV é o reduto intelectual católico sob orientação de seus fundadores, o Cardeal Dom Sebastião Leme e Jackson Figueiredo3 (sucedido por Alceu Amoroso Lima, em 1928). Além de constituir um centro unificador, divulgador, recrutador e reorientador das forças católicas, possibilita engajar inúmeros intelectuais em prol da cultura católica, intensificando, por exemplo, a apropriação de aportes teóricos da filosofia católica em detrimento aos avanços das concepções, que, para Velloso, (1978, p. 134), são “laicismo, agnosticismo, subjetivismo, esteticismos e individualismo”. Nesse viés, entre os periódicos da imprensa católica, a revista A Ordem se destaca como o principal instrumento de produção e circulação dos intelectuais do CDV, pois posiciona seu perfil ideológico, no debate cultural, religioso, sociológico, filosófico e não partidário.

A função do Centro era disponibilizar um ambiente de debates da Igreja Católica, liderados por eclesiásticos e homens das letras das principais cidades do país. Suas atividades se dividiam entre palestras, formação de religiosos, organização de um espaço onde fosse possível encontrar publicações religiosas para a sociabilidade entre intelectuais católicos e realização de retiros para orientação espiritual, dentre outras atividades desenvolvidas em diversas cidades do Brasil (MOURA, 2012, p. 35).

Os periódicos da imprensa católica permitem aos intelectuais, para Moura (2012, p. 31-32), “apresentar suas ideias sobre o momento sócio-político, destacando os meios que poderiam ser utilizados pelos letrados, religiosos, governantes e fiéis que defendiam a recatolização da sociedade”, como a relação entre o conhecimento científico, debates religiosos e apropriação do pensamento filosófico cristão europeu. Nesse caso, as publicações da imprensa católica (revistas, jornais, livros, livros didáticos e documentos eclesiásticos) são estratégicos na formação da militância católica.

Tal representação da romanização4 proposta pela Reação Católica repercute sobre as bases teóricas católicas que circulam expressivamente na revista A Ordem entre os pensadores europeus Edmund Burke, Louis-Ambroise De Bonald, Joseph De Maistre, João Donoso Cortés, Henri-Louis Bergson, Carl Schmitt e Jacques Maritain5. Além disso, os aportes teóricos constituem as diretrizes que fundamentam os órgãos católicos em consonância com a formação da elite católica, sendo articulados entre professores católicos nas instituições tradicionais católicas, leigas e militares (secundárias e superiores).

A Igreja Católica posicionou-se de maneira mais ofensiva para impor sua ideologia no campo das disputas educacionais do período. Além da criação do Centro Dom Vital, em 1922, que se comporia numa associação civil de estudos e discussões de questões relativas aos interesses dos católicos no Brasil, e a veiculação da revista A Ordem, que, em 1928, passou a ser dirigida por Alceu Amoroso Lima, representou o principal meio de divulgação dos ideais da Igreja, os católicos organizaram-se em diferentes grupos políticos para exercerem pressão sobre as decisões do Estado nas discussões de elaboração das Constituições (FERREIRA, 2008, p. 28).

Sob a direção do líder católico Alceu Amoroso Lima (após 1928), o CDV é projetado para expansão no território nacional, com novas filiais nas seguintes cidades, segundo Arduini (2012, p. 53), “Rio de Janeiro, Recife, São Paulo, Aracaju, S. João d’el-Rey, Belo Horizonte, Salvador, Juiz de Fora, Porto Alegre, Fortaleza e Itajubá”. Assim, a imprensa católica fica responsável pela produção e circulação dos impressos católicos no país, sendo estratégico na ampliação dos seus membros entre as linhas editoriais (pensadores, literatos, historiadores, professores, entre outros) com produções teóricas6 direcionadas aos temas teologia e filosofia, história e jornalismo, letras e ciências.

A estratégica da imprensa católica depois da década de 1920, permite posicionar os periódicos no cenário nacional, com objetivo de “recrutar” o corpo eclesiástico, os intelectuais, os professores entre outros membros da militância católica em defesa do projeto recatolizar a nação. Nesse viés, a revista A Ordem, junto aos principais periódicos universitários católicos (Kriterion e Verbum) e os Boletins (APCs), aponta os debates no campo teórico, ancorados nos documentos eclesiásticos em prol da Reação Católica.

Tais periódicos católicos têm extensão significativa entre órgãos católicos, pois apontam os pilares ideológicos na formação da militância católica e sua expressiva representação entre inúmeros periódicos católicos nacionais, regionais e locais, que fortalecem a presença dos princípios católicos na cultura nacional.

A posição estratégica das APCs, além de organizar movimentos em prol da pedagogia católica, possibilita intensificar o engajamento de professores católicos em detrimento aos avanços do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Tais periódicos são instrumentos da Reação Católica, com extensão significativa na juventude católica, pois permitem engajá-la entre os setores em que circula (agrário, estudantil, independente, operário e universitário), articulando sua relação de poder nas ações sociais católicas, com repercussão entre eventos católicos nacionais e internacionais.

A organização institucional da Igreja Católica possibilita hierarquizar e organizar as novas estruturas da militância católica, como a representação dos órgãos católicos no cenário nacional. Nesse sentido, a posição de intelectuais entre as lideranças católicas aponta a manutenção do poder da Igreja Católica, que, para Miceli (2001, p. 127), visa “preservar e expandir a presença da Igreja em áreas estratégicas como de ensino, a produção cultural, o enquadramento institucional de intelectuais etc.”.

A presença de intelectuais nas reformas educacionais7 sinaliza o reposicionar no campo político educacional, entre os projetos políticos educacionais que iriam constituir o país. Conforme Carvalho (2003, p. 89), “inaugura espaços de poder de importância estratégica na configuração e no controle técnico e doutrinário do aparelho escolar”.

Nesse viés, as intencionalidades da aliança entre lideranças católicas e governo apontam a defesa dos princípios nacionalistas8, sendo articuladas pelo líder católico Alceu Amoroso Lima, interlocutor da Igreja Católica com o Ministério da Educação e Saúde (primeiro com o Ministro Francisco Campos, e após com o Ministro Gustavo Capanema), em consonância aos princípios que regem a “bandeira pela educação”, sob a égide da Família, Igreja e Estado9, conforme orientações expressas na Encíclica Divini Illius Magistri, do Papa Pio XI, em 1929, sobre a educação cristã da juventude.

A presença do líder católico Alceu Amoroso Lima, para Fávero e Brito (1999, p. 41), “como político conservador, católico e simpatizante de um regime hierárquico-autoritário opôs-se tenazmente à laicidade do ensino público”. Tal posição permite a ele ampliar as redes de sociabilidade ao redor do campo político educacional, tendo entre os órgãos católicos aglutinados na ACB, em torno do projeto recatolizar a nação. Nesse caso, o poder de mobilização política do líder católico com o Ministério da Educação e Saúde sinaliza os avanços da Reação Católica, como novas alianças que permitem ampliar a rede de instituições educacionais católicas.

A curta passagem de Campos no Ministério (apenas três anos), em comparação à longevidade de Capanema (quase onze anos). [...] O grau de autonomia do ministro frente Vargas, suficientemente grande para que este pudesse implementar uma política de longo prazo. Além disso, foi essencial o apoio intensivo que Capanema receberia ao longo de toda a década de 1930 por parte da Igreja. Para essa finalidade, Alceu Amoroso Lima e o Centro Dom Vital atuavam como uma espécie de porta-vozes dos interesses das ordens, congregações e dioceses com interesse na manutenção ou na ampliação de sua rede de escola e universidades. Para que tais interesses fossem satisfeitos, era essencial a atuação favorável do Ministério nos trâmites burocráticos (ARDUINI, 2012, p. 62).

No projeto de recatolizar a nação ocorre a fundação da LEC (1932), uma associação civil no território nacional que se posiciona contra a formação de um partido católico (interferência nas lutas partidárias), e mobiliza os católicos para engajamento no campo político. Quer dizer, a LEC tem por objetivo defender os interesses da Igreja Católica no país e, para isso, posiciona os votos católicos aos candidatos que apoiam os seguintes princípios da cultura católica: indissolubilidade do casamento, ensino religioso nas escolas públicas, assistência eclesiástica as forças armadas, entre outros.

Após as lideranças católicas constatarem a importância do engajamento da juventude na Ação Católica Italiana, ocorre a estruturação de uma juventude em torno da fundação da ACB, em 1935, sendo espaço legítimo e especializado dessa classe brasileira, organizada entre Juventude Agrária Católica (JAC), Juventude Estudantil Católica (JEC), Juventude Independente Católica (JIC), Juventude Operária Católica (JOC), Juventude Universitária Católica (JUC), e sua extensão entre os Homens da Ação Católica (HAC), e a Liga Feminina da Ação Católica (LFAC).

Nos campos pedagógico e cultural, a fundação da Associação dos Universitários Católicos (AUC), do Instituto Católico de Estudos Superiores (IES), das Faculdades Católicas e da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RIO), constitui importantes articulações na área político educacional, pois tais instituições católicas possibilitam a formação da elite católica, entre os aportes teóricos de filosofia católica, com o objetivo de posicioná-la entre os líderes dos órgãos católicos ou membros dos aparatos estatais.

A necessidade, para a Igreja Católica, de contar com instituições universitárias próprias, além de corresponder a uma tendência internacional, cujo modelo estava dado pela Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, impunha-se, no caso do Brasil, também por razões conjunturais ligadas à política governamental [...]. Era preciso pois criar as próprias instituições. E, de fato, a liderança católica em articulação com a cúpula eclesiástica trabalhou com afinco para viabilizar a fundação da Universidade Católica, levando a proposta até a Cúria Romana (SAVIANI, 2011, p. 260).

A fundação de novas instituições católicas são indícios das alianças com o governo, que possibilitam ampliar a formação da elite aos traços da cultura católica, sendo conduzidos pelos professores católicos que atuam entre as instituições tradicionais do ensino superior e secundário. Nesse caso, a posição estratégica dessas instituições e o engajamento de intelectuais e da juventude em torno da cultura católica apontam avanços da Reação Católica no campo sociopolítico.

Nesse cenário, os sinais de avanço do projeto de recatolizar a nação apontam outra envergadura, na primeira metade do século XX, após engajamento de intelectuais, entre o CDV, que, para Arduini (2012, p. 50), está “diretamente ligada à formação da cultura católica superior”; às APCs, na defesa da pedagogia católica; à LEC, na aprovação das emendas católicas; e aos órgãos católicos em torno da ACB. Dá-se, assim, a formação de uma legião católica que intensifica as redes de sociabilidades, formando alianças que repercutem em prol da cultura católica.

A CNLD nos Tempos de Capanema

A CNLD é instituída pelo Decreto-lei no 1.006, de 30 de dezembro de 1938, que estabelece as condições de produção, importação e utilização do livro didático, sendo de competência do governo estruturar e regulamentar o aparato estatal, o que, para Certeau (2008, p. 99), “postula um lugar suscetível de ser circunscrito como algo próprio” que expõe intencionalidades do governo, ao implementar uma legislação específica no processo de autorização dos livros didáticos que irão constituir a formação da nação.

Entre os projetos de construção institucional do governo, a posição estratégica da CNLD, como primeira estrutura oficial da avaliação nacional dos livros didáticos, permite orientar aos autores e editoras, as causas que impedem a autorização do livro didático, entre as instituições de ensino pré-primário, primário, normal, profissional e secundário.

Art. 20. Não poderá ser utilizado os livros didáticos: a) que atente, de qualquer forma, contra a unidade, a independência ou a honra nacional; b) que contenha, de modo explícito ou implícito, pregação ideológica ou indicação da violência contra o regime político adotado pela Nação; [...]; k) que inspire o desamor à virtude, induza o sentimento da inutilidade ou desnecessidade do esforço individual, ou combata as legítimas prerrogativas da personalidade humana. Art. 21. Será inda negado autorização do uso aos livros didáticos: a) que esteja escrito em linguagem defeituosa, quer pela incorreção gramatical quer pelo inconveniente ou abusivo emprego do termo ou expressões, regionais ou da gíria, quer pela obscuridade do estilo; b) que apresente o assunto com erro de natureza científica ou técnica; [...]; e) que não contenha a declaração do preço da venda, o qual não poderá ser excessivo em face do seu custo (BRASIL, Decreto-Lei no 1.006/38).

Nesse viés, a transparência dos itens a ser examinados possibilita a livre concorrência entre os interessados, sendo que compete à CNLD examinar, estimular, indicar e promover os livros didáticos, com atenção aos temas de cunho político-ideológico, que sinalizam vestígios de tendências políticas ideológicas contrárias ao governo, como manter o rigor técnico-científico dos saberes entre as áreas do conhecimento em consonância com a ortografia oficial. Ao instituir os padrões de análise dos pareceres, torna legítima a forma de fiscalização dos livros didáticos.

Os pareceres permitiam identificar que um dos principais objetivos do Ministério da Educação e da CNLD com a avaliação era conformar uma ortografia oficial, visando criar uma língua nacional e valorizar uma identidade brasileira. Um segundo objetivo foi padronizar e uniformizar os livros de acordo com os programas de ensino para as disciplinas do secundário [...], procurava efetivar-se a nacionalização do ensino na atualização dos métodos de ensino e aprendizagem, expurgando os conhecimentos considerados ultrapassados e os erros de natureza científica (FILGUEIRAS, 2013, p. 66-67).

A CNLD demonstrar os pontos de análise dos livros didáticos, tornando-o um roteiro padrão de avaliação às fichas de julgamento. As normas constituem a legitimidade de tal processo, pois universalizam as notas que passam a ser emitidas aos itens indicados pelos pareceristas. Tal projeção do aparato estatal permite, após os tramites legais, declarar os livros didáticos com status de oficiais na formação da nação.

Nesse cenário, os livros didáticos são reconhecidos como “instrumentos poderosos da constituição identitária” e ocupam espaço privilegiado na formação da nação, pois são “depositários de um conteúdo educativo”, que desempenha função estratégica ao transmitir saberes e habilidades das áreas do conhecimento às novas gerações. Constituem um instrumento pedagógico, uma vez que representam um conjunto de instruções oficiais (métodos e técnicas de aprendizagem) com objetivos e princípios orientadores que participam do universo cultural, “da mesma forma que bandeira ou moeda, na esfera do simbólico” (CHOPPIN, 2002).

Na política educacional do ministro Gustavo Capanema, os livros didáticos constituem instrumentos de análise entre as questões educacionais, sendo direcionados a jurisdição de um aparato estatal, não mais pelos órgãos estaduais. Após consolidar tal legislação, o então Ministro segue os trâmites legais que constituem as atribuições dos membros (os pareceres), que configuram o processo de análise dos livros didáticos.

Na década de 1930, as alternâncias na legislação educacional possibilitam a expansão do campo editorial, em especial na produção dos livros didáticos, pedagógicos e literários. Mas, os autores e editores estão voltados para livros didáticos (constituem um amplo mercado editorial), em torno da autorização dos seus referidos títulos pela CNLD, como sua e publicação no Diário Oficial da União (DOU), conforme:

Art. 18. O Ministério da Educação fará publicar, no "Diário Oficial", em janeiro de cada ano, a relação completa dos livros didáticos de uso autorizado, agrupados segundo os graus e ramos do ensino, e apresentados, em cada grupo, pela ordem alfabética dos autores (BRASIL, Decreto-Lei no 1.006/38).

No entanto, o presidente do Sindicado Nacional das Empresas Editoriais de Livros e Publicações Culturais, em 1941, solicita à sessão plenária da CNLD que sejam publicados no DOU os livros didáticos aprovados e os respectivos números do processo, como a exclusão da lista dos processos que foram recusados. Nesse caso, os interesses do sindicato estão em resguardar as editoras a não exporem aos leitores títulos reprovados, por isso acarretaria uma situação de desconforto, com prejuízos irreparáveis aos inúmeros autores e suas respectivas editoras. Entre os trâmites legais da CNLD, na 112ª sessão plenária da CNLD, presidida por Pe. Leonel Franca S. J., Alberto de Mendes Oliveira e Rodolfo Fuchs, em relação à solicitação do sindicato, o pedido foi deferido.

O processo de aprovação/autorização segue os trâmites oficiais que universaliza os critérios de análise, ou seja, os pontos de julgamento que são emitidos nos pareceres com o objetivo de sinalizar a transparência do processo. Após a apreciação dos referidos livros didáticos pelos membros das respectivas seções (organizadas pelas áreas específicas do conhecimento), ocorre a sessão plenária da CNLD com a intenção de proferir a emissão dos pareceres oficiais.

Nos casos de “autorização”, os livros didáticos recebem o carimbo de autorização da CNLD, e nos casos de “reprovação”, são emitidos pareceres que sinalizam os pontos em desacordo com a legislação, como a oportunidade das editoras e dos autores realizarem as específicas correções e, depois, efetuarem nova submissão. Entre os aspectos dos trâmites legais que permitem a autorização dos livros didáticos, aponta:

Art. 12. A autorização para uso do livro didático será requerida pelo interessado, autor ou editor, importador ou vendedor, em petição dirigida ao Ministro da Educação, à qual se juntarão três exemplares da obra, impressos ou dactilografados, acompanhados, nesta última hipótese, de uma via dos desenhos, mapas ou esquemas, que da mesma forem parte integrante.Parágrafo único. É vedado aos membros da Comissão Nacional do Livro Didático requerer autorização para uso de obras de sua autoria (BRASIL, Decreto-Lei no 1.006/38).

Tal pioneirismo na política do livro didático, para Certeau (2002, p. 10), “sustenta e determina o poder de conquistar para si um lugar próprio”, em prol da formação da nação. A CNLD constitui um aparato estatal com funções que repercutem na apropriação da cultura nacional, e os intelectuais católicos, laicos e militares que compõem a lista dos membros, além de protegerem os interesses da nação, fortalecem os debates em torno do campo político educacional.

Nesse processo, entre os critérios de admissão dos membros, constam: ocupar posição entre os docentes das principais instituições tradicionais do país; apresentar desempenho no campo pedagógico na área do conhecimento da docência; atuar com neutralidade em relação aos autores e editores de livros didáticos; e não submeter as produções autorais à CNLD.

Art. 9 Fica instituída, em caráter permanente, a Comissão Nacional do Livro Didático. § 1º A Comissão Nacional do Livro Didático se comporá de sete membros, que exercerão a função por designação do Presidente da República, e serão escolhidos dentre pessoas de notório preparo pedagógico e reconhecido valor moral, das quais duas especializadas em metodologia das línguas, três especializadas em metodologia das ciências e duas especializadas em metodologia das técnicas (BRASIL, Decreto-Lei no 1.006/38).

O ministro Gustavo Capanema, compõe a lista dos membros da CNLD com representantes de instituições tradicionais do país, como: Escola Nacional de Engenharia; Escola Naval; Escola Nacional de Veterinária; Colégio Militar; Colégio Pedro II; Instituto de Educação do Distrito Federal; Faculdade de Medicina; Faculdade de Filosofia do Instituto Lafayette; Faculdade de Filosofia Santa Úrsula; Universidade do Distrito Federal; e Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil.

Tal estratégia mobiliza membros das Forças Armadas, da Igreja Católica e um importante grupo de intelectuais e educadores no campo político educacional. Para Schmartzman (2000, p. 204), “de todas as áreas do grande plano educacional, a educação secundária seria aquela em que o ministro Capanema deixaria sua marca mais profunda e duradoura”, pois a representação dos membros entre a comissão na elaboração dos programas do curso ginasial permite reestruturar a Lei Orgânica do Ensino Secundário.

Ao intensificar a presença de intelectuais nos aparatos estatais de regulação da educação (secretarias, departamentos, inspetoria e ensino), como entre as associações e institutos (educacionais), o governo intensifica as discussões em torno das políticas educacionais, em consonância a propostas em vigor e suas novas projeções, e estabelece uma relação entre os membros de instituições tradicionais católicas, leigas e militares.

Em 1940, foi publicado a lista oficial dos membros da CNLD10 após articulações entre os ciclos sociais do governo federal, altera11 o número de membros, como possibilita membros/autores submeter suas obras a uma comissão especial. Foi constituída tal lista, pela seguinte configuração: nome, seguido por data de nomeação e a(s) disciplina(s) de atuação, que sinaliza avanços do projeto de construção institucional:

Abgard Renault 14/08/1939, Francês e Inglês; Adalberto Menezes de Oliveira 26/07/1940, Física (Comandante da marinha); Alonso de Oliveira 14/08/1939, Militar; Álvaro Ferdinando de Sousa da Silveira 14/08/1939, Português; Antônio Carneiro Leão 14/ 08/ 1939, Pedagogia; Armando Pinna 14/08/1939, Ensino Industrial (Clube Naval); Candido Firmino de Mello Leitão 23/07/1940, (não consta); Carlos Delgado de Carvalho 14/08/1939, Geografia; Euclides de Medeiros Guimarães Roxo 14/08/1939, Matemática; Hanemann Guimarães 26/07/1940, Latim e Alemão; João Baptista Pecegueiro do Amaral 26/07/1940, Química; Jonathas Archanjo da Silveira Serrano 14/08/1939, História; José de Melo Morais 26/07/1940, (não consta); Leonel Franca 14/08/1939, Filosofia; Maria Junqueira Schmidt 14/08/1939, Ensino Primário; Rodolpho Fuchs 14/08/1939, Ensino Comercial e Industrial; Waldemar Pereira Cotta 14/08/1939, Matemática (guerra) (FERREIRA, 2008, p. 62).

Após instituído os membros, foram designados a compor as nove seções específicas: Língua e Literatura; Matemática e Desenho; Ciências Físicas e Naturais; Geografia; História; Filosofia, Sociologia e Pedagogia; Metodologia e Técnicas; Matérias do Ensino Primário; e Redação. Tais seções (área do conhecimento) são estruturadas por um relator e dois revisores para elaborar os pareceres e, após os trâmites (pareceres) da seção de Redação, são encaminhados para as deliberações na sessão plenária da CNLD.

A CNLD constitui um aparato estatal em consonância com a centralização do sistema de poder e com posição estratégica na política educacional vigente ao regulamentar os livros didáticos que constituem a formação da nação. Nesse viés, as redes de sociabilidade em torno do governo apontam articulações entre os representantes das instituições tradicionais, que permitem avanços entre as questões da política educacional acerca dos princípios que regem a bandeira da educação.

Os Intelectuais Católicos na CNLD

Entre os membros da primeira lista da CNLD consta a presença dos intelectuais católicos Pe. Leonel Franca S. J., Jonathas Serrano e Maria Junqueira Schmidt. São representantes da pedagogia católica que desempenha papel estratégico entre as instituições tradicionais, sendo membros de órgãos católicos e comissões de aparatos estatais (em especial na educação), tornando estratégica a representação da Igreja Católica (setor organizado da sociedade) no projeto de construção institucional do governo.

A noção de intelectual como agente social, como organizador da cultura, como intérprete das visões de mundo ganha relevância: mais do que escritor de obras desinteressadas/perenes ao modo de filósofos acadêmicos, o grupo católico estava envolvido com projetos que buscavam consolidar a presença do pensamento religioso [...], isto é, ele estava entre a filosofia e a política, entre a cultura e a política (CAMPOS, 2010, p. 13-14).

O Pe. Leonel Edgar da Silveira Franca S. J.,12 foi um líder da intelectual eclesiástica católico e representante da Reação Católica, nomeado assistente eclesiástico por Dom Sebastião Leme entre os principais órgãos católicos: CDV; APCs; LEC; AUC; Associação Jurídica Santo Ivo; Associação das Bibliotecas Católicas; e ACB. Atou na defesa da pedagogia católica entre os eventos católicos da CCBE e CNCE e, no campo universitário, sua representação entre as Faculdades Católicas o posicionou como primeiro reitor da PUC-RIO.

Foram também muitos os serviços prestados pelo Pe. Franca as instituições governamentais, na condição, por exemplo, de: membro do Conselho Nacional de Educação desde sua fundação em 1931 até 1948; membro do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística a partir de 1937; Consultor Técnico do Conselho Nacional de Estatística; membro da Comissão Censitária Nacional; autor de anteprojeto do Plano Nacional de Educação (1937); membro da Comissão Nacional do Livro Didático (1939); Delegado do Governo no Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC), órgão ligado à UNESCO (ALEIXO, 2004, p. 119).

Nesse caso, a representação do Pe. Leonel Franca S. J., sinaliza traços da relação de poder intrínseco da Igreja Católica no campo político educacional, sendo fundamental compor a lista dos membros de aparatos estatais (educação), e intensificar a expansão da rede de instituições tradicionais católicas na formação da nação.

Entres as produções no campo editorial, constam 14 livros publicados (1918-1952)13, seguidos por oito prefácios de livros (1927-1952), sendo 73 artigos e recensões14 (1907-1948) e inúmeros sermões, discursos e conferências pedagógicas, proferidos às professoras públicas e normalistas do Colégio Sacré Coeur de Jesus (1928-1933), ao Centro Dom Vital (1929-1933), aos Congregados Marianos (1929-1931) e ao Instituto de Formação Familiar e Social (1937-1941) (D`ELBOUX, 1953).

A publicação do livro didático Noções de História da Filosofia, em 1918, aponta os indícios dos saberes que compõem a formação filosófica católica entre as instituições tradicionais, sendo público-alvo o ensino secundário. A permanência desse livro didático no campo editorial está impressa entre suas edições durante o período da instabilidade do ensino de filosofia no currículo oficial.

Em 1918 Leonel Franca publicou seu primeiro livro. Noções de História da Filosofia respondeu a vivas instâncias de vários alunos, desejosos de um subsídio seguro para a preparação de exames, assim como de um guia para a aquisição de conhecimentos sólidos. A edição de 1921 incluiu importante capítulo sobre a Filosofia no Brasil. Em seu prefácio, escreveu o autor: A verdade é o anel supremo de nossa alma. Na sétima edição, de 1940, há o acréscimo de mais 50 páginas sobre a Filosofia Contemporânea. O livro atingiu seus objetivos, preenchendo lacunas e apresentando, em nível introdutório, valiosa síntese histórica (ALEIXO, 2004, p. 112).

É importante mencionar que o referido livro didático (8ª e 10ª edições) compõe, na década de 1940, a lista oficial dos livros didáticos aprovados pela CNLD, após instituição da comissão especial (1941)15 pelo CNE. Tais pareceres da “aprovação” do referido livro didático foram proferidos na seção específica Filosofia, Sociologia e Pedagogia, composta por Vitor Ribeiro Leuzinger (Faculdade Nacional de Filosofia), Américo Lacombe (professor de História na Casa de Rui Barbosa) e Arsílio Papini (Externato Santo Inácio). Nesse viés, as atribuições da comissão especial mantêm o mesmo rigor em relação às questões de cunho político-ideológico e didático-pedagógico, e segue parâmetros e trâmites instituídos pela CNLD.

Na CNLD, Pe. Leonel Franca S. J., foi designado vice-presidente16 na primeira sessão ordinária, seguindo suas atribuições nas duas seções: Filosofia, Sociologia e Pedagogia; e História. No período entre 1941 e 1942, analisou nove livros didáticos, sendo relator principal de seis e revisor de três. Os pareceres de reprovação da primeira seção foram marcados por falhas na organização metodológica e ausência de conteúdos essenciais da respectiva área do conhecimento. Na segunda seção, a falta de correções de informações históricas e o desacordo com a ortografia oficial foram indícios de inúmeras obras reprovadas. Nesse caso, é válido mencionar dois pareceres proferidos pelo padre jesuíta, em 1941: o livro História da Philosophia, do autor D. Ludgero Jasper O.S.B, pela editora Melhoramento, foi considerado “não julgado por não se achar na ortografia oficial”; e sobre História da Civilização, do autor Joaquim Silva, pela Companhia Editora Nacional, sob protocolo nº 33740/41, o “parecer foi que o uso pode ser autorizado” por estar de acordo com a legislação do livro didático (FILGUEIRAS, 2013).

A presença do padre jesuíta como vice-diretor da CNLD e membro de duas seções permite que ele intensifique a representação da Igreja Católica entre as redes de sociabilidade que constituem o aparato estatal. Além da posição estratégica de assistente eclesiástico católico entre os órgãos católicos, ele constitui alianças com o ministro Gustavo Capanema, o que permite os avanços do projeto de recatolizar a nação e do projeto de construção institucional do governo.

Jonathas Arcangelo da Silveira Serrano, intelectual católico leigo, foi membro do IHGB, Conselho Superior de Ensino/SP e CNE, com atuação no campo da docência entre instituições tradicionais do país (Colégio Pedro II, Instituto Federal/RJ e Escola Normal do Distrito Federal/DF17). Tais atribuições apontam o papel do intelectual no campo político educacional, para Campos (2010, p. 13), “como agente social, como organizador da cultura, como intérprete das visões de mundo”.

No campo editorial, destacam-se, entre outras obras: Epitome de História Universal (1913); Filosofia do Direito (1920); História do Brasil (1933); Epitome de História do Brasil (1933); e Antologia Brasileira (1942). É importante mencionar que entre os livros didáticos do autor consta História da Filosofia (1944), única edição, aprovado em 1946 pela comissão especial da CNLD.

Segundo Campelo (2007, p. 58), Jonathas Serrano é o “juiz do Tribunal Eleitoral do Distrito Federal (1932-1933), integrante da Comissão de Censura Cinematográfica (1932-1934)”. Tais alianças entre a Igreja Católica e o governo apontam a posição estratégica de intelectuais católicos nos aparatos estatais, como sua relação de poder no apoio de lideranças católicas aos projetos governamentais.

No papel de militância católica leiga, constrói sua trajetória relacionada aos inúmeros artigos publicados entre as revistas católicas, atuando diretamente na União Católica Brasileira (UCB), pela defesa das orientações católicas sociais, e como conferencista no Congresso Católico Brasileiro (1918), sobre a importância dos círculos católicos da mocidade, apontando:

A UCB e a Revista Social deveriam realizar a apologética contra os ensinamentos anticristãos veiculados por professores das faculdades em suas aulas, assim como atuar de modo a recrutar os estudantes para a causa católica, em concorrência com o Centro Estudantil, de caráter anticlerical, e a Liga dos Moços, de caráter protestante. Contudo, a principal atribuição da UCB e da Revista Social seria a de “estudar o problema social no Brasil em suas múltiplas faces, nas diversas relações que apresenta com a religião, a moral, o direito, a indústria, a ciência e a arte” (SILVA, 2011, p. 45-46).

A UCB e a Revista Social têm posição estratégica na década de 1930, em consonância com a ACB no recrutamento dos jovens em torno das questões sociais que constituem a nação, possibilitando intervenções de intelectuais católicos nas discussões sociais no país. Nesse caso, Jonathas Serrano desempenha funções estratégicas na defesa dos princípios político-ideológicos como membro dos aparelhos estatais CNCC, CNLD e IHGE e como represente da cultura católica em prol da educação “pela Família, Igreja e Estado”, conforme orientações dos documentos eclesiásticos.

É autor de inúmeros livros didáticos de história18 submetidos à comissão especial, na seção História da Civilização e do Brasil, composta pelos seguintes membros: Eugênio Vilhena Morais (historiador do Arquivo Nacional); Américo Lacombe (professor de História na Casa de Rui Barbosa); e Roberto Bandeira Acióli (professor do Colégio Pedro II). Os pareceres mantêm o rigor imposto pelos trâmites legais, como a defesa dos princípios nacionalistas.

Na CNLD, Serrano atua diretamente entre os membros de três seções: História19; Filosofia, Sociologia e Pedagogia; e Redação. Dos livros didáticos analisados em 1941, sinaliza os pontos de reprovação, centralizados em diversas questões gramaticais e metodológicas, como: o uso inadequado da língua (problema de acentuação, concordância nominal, flexão verbal, uso da vírgula e da grafia em geral); o não cumprimento das instruções pedagógicas da reforma educacional de 1931; e, por fim, a deficiência de materiais e tipografias (qualidade ruim do papel, da encadernação e da impressão, uso correto do itálico, aparato iconográfico, entre outros) (FREITAS, 2006).

A presença de Jonathas Serrano no aparato estatal permite que ele, além de circular entre duas seções específicas da área do conhecimento, atue na seção Redação, conforme Freitas (2006, p. 144), tem atribuição de “estabelecer o julgamento, “negando”, “concedendo” ou indicando notificações na obra”. Tais pareces segue os trâmites legais, sendo direcionados a sessão plenária, para proferir o parecer de aprovação/reprovação.

Nesse caso, é importante mencionar dois pareceres de Jonathas Serrano em 1941: o livro História da Civilização, do autor Joaquim da Silva, pela Companhia Editora Nacional, sob protocolo nº 33740/41, foi aprovado, porém, com observações necessárias às próximas edições; e o livro Idioma Pátrio, do autor professor Modesto de Abreu (não cita editora), pelo parecer nº I-5/1941, “poderá ser aprovado, desde que o autor, em futuras edições, faça os seguintes reparos”, que foram inumerados pelos itens: revisão geral da obra, substituição do excerto, modificação da redação, acréscimo de informações e correção dos erros tipográficos (FILGUEIRAS, 2013).

Maria Junqueira Schmidt é considerada intelectual católica leiga por defender os ideais da pedagogia católica e atuar diretamente no ensino da língua francesa, sendo sócia da ABE nos períodos de interlocução da bancada intelectual católica. Atua como membro da CNLD e da comissão que elaborou os programas para o curso ginasial na reforma educacional do Ministro Gustavo Capanema. No entanto, considera a existência de uma terceira via entre as tendências da pedagogia católica e da pedagogia escolanovista, ou seja, a pedagogia escolanovista católica, defendendo a apropriação dos preceitos pedagógicos católicos em consonância com as inovações pedagógicas.

Nesse viés, um grupo de intelectuais católicos, para Filgueiras (2013, p. 186), “defendiam as renovações educacionais propugnadas pelo movimento da Escola Nova, ao mesmo tempo em que defendiam seus ideais religiosos. Adaptavam assim as novas propostas educacionais aos preceitos católicos”. Tal posição percorre os livros didáticos de Maria Junqueira Schmidt no ensino primário e secundário e de formação dos professores.

Era uma educadora conhecida no estudo de métodos para o ensino da língua francesa, tendo iniciado o ensino dessa língua pelo método direto. Ministrava aula em Francês no ensino secundário do Rio de Janeiro. Participava das discussões sobre o ensino primário e secundário, sobre a educação moral e cívica e a educação religiosa. Em 1942, faria parte da comissão de elaboração dos programas para o curso ginasial da reforma Capanema. Tornar-se-ia importante referência sobre a Orientação Vocacional nos anos 1950. Era autora de livros didáticos e livros para professores (FILGUEIRAS, 2011, p. 32).

Entre os membros da CNLD, apenas três mulheres ocupam espaço privilegiado, sendo Maria Junqueira Schmidt nomeada na primeira lista para desempenhar suas funções entre duas seções: Linguagem e Literatura; e Matérias de Ensino Primário. Depois, Lucia Magalhães é nomeada na segunda lista como especialista de Ensino Primário e, por fim, Heloísa Alberto Torres entra na lista como especialista em História Natural.

Os livros didáticos Heures Joyeuses, La France (3° ano de francês) e Mon Petit Univers, de Maria Junqueira Schmidt, são submetidos à CNLD e direcionados aos membros da comissão especial da seção Línguas e Literaturas, composta por José Lourenço dos Santos (Instituto de Educação), Geyza Calaza Frontin (diretora da Escola São Paulo) e Floriano Ribeiro de Queiroz (professor municipal), responsáveis pelos pareceres dessa relação20.

Entre as obras que circulam no campo editorial, destacam-se: A segunda Imperatriz do Brasil (1927); La Littérature Frrançaise (1944); Les Plus Belles Histoires (1943); e Pequeno Dicionário Frances-Português (1949). E entre os livros didáticos, constam: Heures Joyeuses; La France (3° ano de francês); Mon Petit Univers; My little Word; Cours de Français 1º et 2º ane; e Cours de Français 3° et 4° ane.

A atuação na CNLD permite regulamentar os livros didáticos de língua estrangeira em consonância com o Decreto nº 20.8033 - que institui o método direto como oficial no ensino da língua estrangeira -, com repúdio às traduções errôneas, o ensino da gramática muito sistematizada e inúmeras formas de exercício direcionadas apenas à tradução.

Nesse sentido, é importante mencionar um parecer da autora Maria Junqueira Schmidt em 1941: o livro Français, 2àme anneé, do autor Louise Jaquier, pela Companhia Editora Nacional, sob parecer n° A-48/1941, foi “aprovado” com ressalvas que determinam que “só pode ter o uso autorizado depois de corrigido os erros de métodos e os senões apontados”. Assim, rompe com vestígios do método indireto, que priorizava a gramática e a tradução, sendo estruturas sintáticas pela memorização de regras gramaticais e de exercícios de tradução (FILGUEIRAS, 2013).

A presença de Maria Junqueira Schmidt no campo político educacional permite, no início da década de 1930, articular a aprovação do método direto (propunha o ensino de línguas sem interferência da língua materna), sendo oficial no ensino das línguas vivas estrangeiras. A representação da professora de francês na CNLD, além de defender o novo método científico (novas diretrizes pedagógicas e mudanças metodológicas), atuou em prol da cultura católica como diretriz na formação da nação, e apropria-se, dessa maneira, de uma “terceira via”: a pedagogia escolanovista católica.

A presença do Pe. Leonel Franca S. J., de Jonathas Serrano e de Maria Junqueira Schmidt entre os 16 membros da CNLD, são indícios da Reação Católica ao reposicionar intelectuais católicos, entre aparatos estatais que constituem o projeto de construção institucional do governo. As intencionalidades comuns da Igreja Católica e governo permitem estabelecer alianças no combate aos preceitos político-ideológico comunista, como criar diques a tais preceitos que inflamam o país, como fortalecer as relações de poder no campo político educacional (secundário e superior), espaço de predomínio das instituições religiosas no período.

Em torno do projeto recatolizar a nação, posicionam como autor/membros de livros didáticos que foram aprovados/autorizados pela comissão especial, mantendo uma rede de livros didáticos católicos (oficializados) na formação da nação. Além das atribuições de membros da CNLD, atuam como censores da cultura católica, em retirar informações que sinalizem de forma explícitos ou implícitos ataques a Igreja Católica.

Para concluir: os sinais do rearmamento católico.

Este artigo tem como objetivo principal investigar a presença de intelectuais católicos na CNLD como vestígios dos avanços do projeto de recatolizar a nação. A presença de intelectuais no CDV, já aponta sinais das articulações estruturadas pelos líderes católicos no campo sócio-político-cultural, ao recrutar o engajamento de intelectuais em prol da cultura católica.

Após a publicação do principal documento eclesiástico no que tange às questões educacionais pela Encíclica Divini Illius Magistri, em 1929, em defesa dos princípios da pedagogia católica, sob manutenção da presença da Igreja, da Família e do Estado na formação da nação, foi intensificada a organização das instituições tradicionais e órgãos católicos. A representação católica no projeto de construção institucional do governo, demonstra um ponto estratégico na ocupação de tais espaços institucionalizados, uma vez que permitem mobilizar ações em torno da cultura católica.

A presença de intelectuais católicos entre os aparatos estatais (educacionais) representa indícios das alianças entre a Igreja Católica e o governo, em consonância com o projeto de resistência às concepções político-ideológicas comunista e anarquista que inflamam o país, como na estruturação teórica e pedagógica dos saberes que passam a constituir a formação da nação.

Nesse viés, os livros didáticos são reconhecidos como objetos de poder, pois constituem a construção identitária da nação. Ao projetar a CNLD para examinar, estimular, indicar e promover aprovação/autorização do livro didático, apontam indícios das intencionalidades do governo na formação da nação, como na composição estratégica dos membros (redes de sociabilidade) para atuarem entre autarquias, conselhos, departamentos, instituições e comissões no campo educacional.

A posição estratégica de intelectuais católicos em torno dos órgãos católicos sinaliza o poder intrínseco da Igreja Católica na organização de setores da sociedade, como os avanços do projeto de recatolizar a nação em torno da aprovação das emendas católicas e articulações que projetam a fundação da PUC-RIO. Tais intelectuais aos posicionar entre os aparatos estatais, são indícios das alianças entre o governo e as lideranças católicas, em prol dos princípios nacionalistas e da cultura católica em detrimento das políticas ideológicas que corrompem a cultura nacional.

Referências

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1Entre 1930 e 1945, o processo de centralização autoritário [...], esteve ancorado na constituição de um aparato burocrático que prestou uma contribuição própria ao sistema de poder então vigente. Esse trabalho de construção institucional determinou a abertura de ministérios - Educação e Saúde Pública (1930), Trabalho, Indústria e Comércio (1930), Aeronáutica (1941) -, de uma série de organismos vinculados em linha direta à Presidência da República (MICELI, 2001, p. 199).

2O movimento [...] agregou eclesiásticos e intelectuais conservadores na busca pela reativação do poder político da Igreja romana, por meio do ensino confessional, da organização de instituições católicas de assistência e de uma imprensa comprometida com as doutrinas eclesiásticas (MOURA, 2012, p. 16).

3A plataforma política de Jackson de Figueiredo consiste então em organizar essa elite espiritual que deveria por direito (Teo) lógico conduzir a vida nacional. Sua tarefa é expressamente a de criar instituições que formem, a partir do culto da ordem (e da hierarquia e autoridade, seus correlatos), novos quadros capazes de intervir, em nome do catolicismo e em consonância estrita com as diretrizes da Igreja, em todas as dimensões da realidade brasileira (FILHO, 2007, p. 38).

4Nos primeiros vinte anos do século XX, a igreja investiu na constituição de um clero comprometido com a doutrina romanizadora. A partir dos anos de 1920 empregou sua força na organização do laicato católico (CAMPOS, 2010, p. 173).

5Nasceu em Paris, em 1882. Foi, sem dúvida, um dos maiores filósofos católicos do século XX, influenciando diretamente e expressivamente o meio católico brasileiro, já desde a década de 30. Além de ter escrito inúmeras obras sobre filosofia, religião e política, em 1945 torna-se embaixador da França junto a Santa Sé. Morreu em Toulouse, em 1972 (RODRIGUES, 2005, p. 99).

6Teologia e Filosofia: padre Leonel Franca, Jackson de Figueiredo, Alexandre Correia, padre Teixeira Leite Penido, Almeida Magalhães, Ubaldo Puppi, dom Estevão Bittencourt, frei Pedro Secondi, frei Boaventura, padre Ávila, Henrique Hargreaves. História e Jornalismo: Felício dos Santos, Perilo Gomes, Jônatas Serrano, Oliveira Viana, Hamilton Nogueira, Pedro Calmon, Francisco Sá Filho, Vilhena de Moraes, Juarez Távora, Luiz Delgado, Hildebrando Leal, Almir Madeira, Américo Lacombe, Hélio Viana, Edgard da Mata Machado, Nilo Pereira, Fernando Carneiro, Daniel de Carvalho, Heráclito Sobral Pinto, Hildebrando Accioly, Affonso Pena Júnior, Alfredo Valadão, Hélio Tornaghi, Francisco Mangabeira, Celestino Basílio, Altino Arantes. Letras: Antônio de Alcântara Machado, Durval de Moraes, Jorge de Lima, Paulo Setúbal, Tasso da Silveira, Augusto Frederico Schmidt, Gustavo Corção, Cassiano Ricardo, Plínio Salgado, Murilo Araújo, José Américo de Almeida, José Lins do Rêgo, Andrade Muricy, Murilo Mendes, Otávio de Faria, Alphonsus de Guimarães Filho, Peregrino Júnior, Carlos Lacerda, Carolina Nabuco, Adalgisa Nery, Lúcia Benedetti, Henriqueta Lisboa, Roberto Alvim Correia, dom Marcos de Araújo Barbosa, dom Helder Câmara, Antônio Calado, Mário Matos, Adonias Filho, Odilo Costa Filho, Osman Lins, Gladstone Chaves de Mello, Sílvio Elia, Clóvis Monteiro, padre Augusto Magne, padre João Mohana, José Rafael de Meneses, João Etienne Filho, José Paulo Moreira da Fonseca. Ciências: Raimundo Bandeira, Nerval de Gouveia, Carlos Chagas Filho, Joaquim da Costa Ribeiro, Paulo Sá, Francisco Magalhães Gomes, Brito Velho, Luís Cintra do Prado, Rui Coutinho, Fernando Carneiro (FILHO, 2007, p. 34-35).

7No governo Vargas, a reforma do ministro Francisco Campos irá promulgar o Decreto-lei nº 19.890, de 18 de abril de 1931, que dispõe “Sobre a organização do Ensino Secundário”, com programas de ensino e instruções metodológicas para a nação, e após a reforma educacional do ministro Gustavo Capanema, irá promulgar o Decreto-lei nº 4.244, de 9 de abril de 1942, que dispõe a “Lei Orgânica do Ensino Secundário”, sendo tais diretrizes educacionais os pilares da formação da nação.

8Uma das ideias que preponderava no projeto varguista era a de que o País necessitava solidificar os princípios da nacionalidade, mediante uma articulação estreita de esforços, solidarizando vontade e consciências, “reforçando os vínculos da família, da religião e do Estado”, para que convergissem para um movimento de “disciplina e educação”, que, por sua vez, fosse capaz de sobrepor-se aos “particularismos e dissensões” (RODRIGUES, 2005, p. 177).

9A encíclica Divini Illius Magistri (1929) apresenta a importância das sociedades de ordem natural, o Estado e Família, e de ordem sobrenatural, a Igreja, como pilares estruturantes na formação educacional.

10Comissão Nacional do Livro Didático. In: Arquivo Gustavo Capanema, CPDOC-FGV. GC g 1938.01.06 (18), p. 457-458.

11É importante salientar que as alterações no Decreto-lei no 1006/38 possibilitam ampliar o número dos membros da CNLD, como oportunizar a submissão dos seus referidos livros didáticos autorais (a partir da fundação da comissão especial, pela CNE), e após pelo Decreto-lei n.º 2.934/40, altera a data de publicação dos manuais escolares aprovados/autorizados pela CNLD, de 01/01/1940 para 01/01/1942.

12A presença do Padre Leonel Franca, líder da intelectualidade católica, militante das organizações da Igreja e autor de diversas obras de proselitismo, atuando como representante do ensino privado e confessional que, em 1929, atendia a 90% da instrução secundária (MICELI, 2001, p. 300).

13O Método Pedagógico dos Jesuítas - tradução e comentário (obra póstuma).

14Apreciação crítica de uma obra literária ou de um texto.

15Em 13 de julho de 1939, a publicação do Decreto-lei n° 1.417 trouxe modificações referentes à participação das obras de autoria dos membros da CNLD no processo de julgamento. O novo Decreto-lei estabeleceu a criação de uma Comissão Especial, para o exame de livros didáticos de autoria dos membros da comissão, desde que fosse requerida a necessária autorização de uso, na forma da lei. Tal comissão seria composta por três ou cinco membros, escolhidos dentre especialistas estranhos à CNLD e que não fossem autores de livros didáticos sujeitos ao pronunciamento da comissão. Os novos relatores receberiam gratificações de função igual a dos membros da CNLD e estavam submetidos às mesmas normas fixadas pela lei. Porém, a lista com a indicação dos nomes para constituição da Comissão Especial, assim como os critérios de escolha e suas respectivas modificações, data de 11 de fevereiro de 1941, logo após a instalação da CNLD e o início dos trabalhos de julgamento, e todos os nomes contaram com aprovação unânime dos membros da CNLD, ouvidos previamente (FERREIRA, 2008, p. 101-102).

16A primeira sessão ordinária realizou-se em 14 de janeiro de 1941, na sede da Comissão, á rua Álvaro Alvim, nº 31, 19º andar, ainda sob a presidência de V. Exa., tendo sido eleito, por aclamação, para presidente o professor Euclides de Medeiros Guimarães Roxo, e para vice-presidente, o Padre Leonel Franca. Comissão Nacional do Livro Didático. In: Arquivo Gustavo Capanema, CPDOC-FGV. GC g 1938.01.06 (18), p. 664.

17Jonathas Serrano, que desempenhou importante papel na reforma Fernando de Azevedo da Instrução Pública do Distrito Federal e, sendo entusiasta dos métodos novos, integrava ao mesmo tempo o movimento da educação católica (SAVIANI, 2011, p. 271-272).

18Epítome da História Universal; História da Civilização 5° série; História da Civilização vol. I; História da Civilização vol. II; História da Civilização vol. III; História da Civilização vol. IV; Epítome de História do Brasil; compõe a relação de obras didáticas de autoria dos membros da CNLD, a que se refere o oficio n° 16 da Secretaria. In: Arquivo Gustavo Capanema, CPDOC-FGV. GC g 1938.01.06 (18), p. 462-463.

19Na avaliação dos livros didáticos de história, os principais questionamentos do parecerista Jonathas Serrano, renomado educador e autor de livros didáticos do período, abordavam a necessidade de correções de informações históricas, de atualização em relação às novas pesquisas da área e a forma correta de escrever nomes e termos históricos (FILGUEIRAS, 2013, p. 181).

20Relação de obras didáticas de autoria dos membros da CNLD, a que se refere o ofício n° 16 da Secretaria. In: Arquivo Gustavo Capanema, CPDOC-FGV. GC g 1938.01.06 (18), p. 461.

Recebido: 08 de Fevereiro de 2019; Aceito: 02 de Março de 2020

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