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Educação e Filosofia

versión impresa ISSN 0102-6801versión On-line ISSN 1982-596X

Educação e Filosofia vol.35 no.73 Uberlândia ene./apr 2021  Epub 11-Ene-2024

https://doi.org/10.14393/revedfil.v35n73a2021-53046 

Artigos

A educação do homem interior: O cultivo da vontade em Agostinho de Hipona

La educación del hombre interior: el cultivo de la voluntad en Agostinho de Hipona

The education of the inner-man: The cultivation of will in Augustine of Hippo

Daiane Rodrigues Costa* 
http://orcid.org/0000-0003-2007-2303; lattes: 7291433553630261

Angelo Vitório Cenci** 
http://orcid.org/0000-0003-0541-2197; lattes: 5553067405853480

*Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Filosofia (UNISINOS)., mestre pelo Programa de Pós-graduação em Educação/UPF, graduada em Filosofia/ UPF.Professora da rede privada de educação básica. Desenvolve pesquisas relacionadas à formação humana, filosofia da educação e filosofia na Idade Média, com ênfase na obra filosófica de Agostinho de Hipona, sobretudo em sua ética e metafísica. E-mail: rodriguesdaiane14@yahoo.com

**Doutor em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Professor na Universidade de Passo Fundo (UPF). E-mail: angelo@upf.br


Resumo

O estudo aqui apresentado tem como objetivo principal a investigação da formação humana nas obras filosóficas Comentários Literal ao Gênesis, A Trindade e O livre-arbítrio, de Agostinho de Hipona. Para isso, aborda-se a noção da antropologia do referido autor; a sua compreensão de corpo e alma (dimensão humana no homem animal) e, por último, objetiva-se explicitar alguns pressupostos de uma educação do ser humano orientada a uma boa formação da vontade. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, exploratória e de caráter hermenêutico. Agostinho concebe a ideia de homem como um ser dotado de corpo e alma. A alma, quando bem formada, pode conduzir os indivíduos à vida com sabedoria e, portanto, a uma beata vita. A vontade é o que movimenta toda as outras dimensões do ser humano e, por isso, ela deve ser bem formada. A educação da vontade, para o pensador, consiste em realizar o jogo de utilizar os objetos que servem de meio para algo e fruir ou contemplar aquilo que é fim em si mesmo. A vontade humana difere do que se passa no reino animal e é capaz de guiar bem o homem, concedendo-lhe minimamente uma relação de desprendimento com a matéria. Conclui-se, a partir dessas linhas mestras do pensamento do autor, que a ética agostiniana ao mesmo tempo que estabelece princípios para o bem agir e lograr uma vida feliz, exige, para isso, um processo formativo que consiste na educação da vontade, uma vez que Agostinho compreende-a como livre em si, isto é, como autodeterminante, ela pode voltar-se por si àquilo que é presença constante, isto é, a objetos de foro contemplativo e afastar-se, tanto quanto possível, dos ditames de uma vida submetida ao mundo material.

Palavras-chave: Formação; Vontade; Cultivo; Santo Agostinho; Alma

Resumen

El estudio aquí presentado tiene como objetivo principal la investigación de la formación humana en las obras filosóficas Comentarios Literal al Génesis, La Trinidad y El Libre-Arbitrio, de Agostinho de Hipona. Así, se trata la noción y antropología del referido autor, su comprensión de cuerpo y alma (dimensión humana en el hombre animal) y, por último, se objetiva explicitar algunos supuestos de una educación del ser humano orientada a una buena formación de la voluntad. Es una investigación bibliográfica, exploratoria y de carácter hermenéutico. Agostinho concibe la idea de hombre como un ser dotado de cuerpo y alma. El alma, cuando bien formada, puede conducir los individuos a la vida con sabiduría y, por lo tanto, a una beata vita. La voluntad es lo que conduce todas las otras dimensiones del ser humano y, de esta manera, ella debe de ser bien formada. La educación de la voluntad, para el pensador, supone realizar el juego de utilizar los objetos que sirven como medio para algo y fruir o contemplar aquello que tiene fin en sí mismo. La voluntad humana es distinta de lo que se pasa en el reino animal y es capaz de guiar bien el hombre, le permitiendo mínimamente una relación de desprendimiento con la materia. Se concluye, desde esas líneas maestras del pensamiento del autor, que la ética agostiniana al tiempo que establece principios para el bien actuar y lograr una vida feliz, exige, para eso, un proceso formativo que consiste en la educación de la voluntad, una vez que Agostinho la comprende como libre en sí, es decir, como auto determinante, ella puede volverse a lo que es presencia constante, o sea, volverse a objetos de foro contemplativo y aislarse, tanto como sea posible, de los dictados de una vida sometida al mundo material.

Palabras-clave: Formación; Voluntad; Cultivo; Santo Agostinho; Alma

Abstract

This study is aimed at investigating human formation in the philosophical works On the literal meaning of Genesis, On the Trinity and On free choice of the will, by Augustine of Hippo. To meet that aim, the author’s notion of anthropology is addressed; his understanding of body and soul (human dimension in the human animal) and, finally, we explain some assumptions related to the education of the human being as leading to the good formation of will. This is a bibliographical, exploratory and hermeneutical study. Augustine conceives the idea of man as a being with body and soul. The soul, when well formed, can lead individuals to life with wisdom and, therefore, to a beata vita. Will moves all the other dimensions of the human being and, thus, it must be well formed. For Augustine, the education of the will consists of performing the game of using objects that work as means for something and enjoy or contemplate what is an end in itself. Human will differs from that of the animal kingdom and is capable of guiding man well, granting him a minimal relation of detachment from the material. The conclusion, based on such guidelines from Augustine’s thought, is that Augustinian ethics establishes principles for acting well and reaching a happy life and, at the same time, demands, for those aims, a formative process that consists of the education of the will, as Augustine understands it as free in itself, i.e., as self-determining, for it can turn by itself to what is a constant presence, i.e., to objects of contemplative scope and move away, as far as possible, from the dictates of a life submitted to the material world.

Keywords: Formation; Will; Cultivation; Saint Augustine; Soul

Introdução

O presente estudo, de natureza bibliográfica e caráter exploratório, realizado a partir de uma leitura hermenêutica de textos selecionados do autor e de seus comentadores, visa entender se é possível afirmar que, nas ideias de Agostinho de Hipona, enquanto modo de vida para ascender a felicidade, existe um movimento de formação mediante o cultivo da vontade. Subjacente a isso, explora-se como o homem pode educar a sua própria vontade no intuito de formar-se mesmo como humano ao diferenciar-se do restante da natureza e agir moralmente. Neste sentido, o objetivo principal desdobrou-se em três questões. Primeiramente, recorreu-se ao modo como Agostinho entende a origem do ser humano. Já nesse ponto, notam-se as singularidades no modo como o filósofo compreende o homem em relação aos outros seres criados. A possibilidade de ser educado está intimamente alicerçada no entendimento de que o ser humano carrega em si uma capacidade de escolha e de aprender, além de uma vontade livre, numa parte de si que é superior ao corpo e decorrente de sua “imagem e semelhança” ao Criador. Por isso, as suas ações são contingentes e suscetíveis de serem bem formadas, uma vez cumprida essa primeira tarefa, há a proposta de analisar o que Agostinho entende por “alma superior”, compreendendo, então, a faculdade da vontade como parte constitutiva do “homem interior”. Dessa discussão, originou-se o segundo tópico. Por fim, o terceiro ponto trata-se do conceito de vontade, seu devido cultivo e em que isso consiste, tarefa que para o autor está intimamente ligada à sua concepção de “vida feliz”, “vida plena” ou “vida beatificada”.

O ser humano, na concepção de Agostinho, é constituído por uma realidade interior e outra, exterior. A ideia de homem interior é formada a partir da faculdade da vontade, que unida à faculdade da memória e da inteligência, constitui a mens, estrutura superior e tríade da alma humana. Ora, junto a essa estrutura superior da alma, está sua estrutura inferior, aquela relacionada com as sensações advindas do corpo, os sentimentos e as pulsões. Visto que Agostinho entende o ser humano dotado de vontade e esta como livre, é necessário que o homem seja educado de modo a não se perverter em más ações, mas que tenha condições de aspirar aos bens superiores. Portanto, defende-se que a concepção ética de Santo Agostinho introduz uma forma de vida que é transversalizada pelos conceitos de cultivo da vontade e autoformação. A faculdade da vontade deve ser educada e conduzir o pensamento, a atenção ou visão interior, e buscar o conhecimento que habita dentro da própria alma humana (memória). Essa formação advém do exercício de afastamento de uma vida submetida aos ditames do mundo para uma vida espiritualizada na busca pela sabedoria.

1 O homem como ser de vontade

Se a pretensão deste estudo é discorrer sobre a educação do ser humano com base na filosofia de Agostinho, é necessário esclarecer antes o que esse autor entende por “humano”, isto é, o objeto da educação. Para isso, é preciso retomar parte da antropologia que o filósofo traça no tratado sobre A Trindade. Ele reproduz a noção dualista de homem difundida desde Platão. Apesar do corpo ser considerado por ele como uma criação divina, é também inferior à alma:

[...] Para demonstrar a superioridade da alma sobre o corpo, no Sobre a natureza do Bem Agostinho chega a dizer que mesmo uma alma corrompida é superior a um corpo incorrupto, conforme vemos em sua exposição hierárquica dos bens, segundo a ordem natural das coisas (COSTA, 2012, p. 66, grifo nosso).

Essa disposição hierárquica das coisas consiste no grau de não degeneração que elas possuem. A alma, por ser considerada como algo imaterial, não estaria suscetível às vicissitudes do tempo. Entretanto, mesmo considerado com uma natureza inferior à alma, o corpo não deixa de ser uma substância necessária para compor o ser humano.

Três características são específicas da alma na concepção de Agostinho: (a) imaterialidade, (b) ser imagem e semelhança de quem a criou e (c) ter a possibilidade de ser imortal. Como o homem é o único ser da natureza cuja alma pode refletir sobre si mesmo e o mundo em que vive, é considerado como uma criatura acima de todos os outros seres. Por isso, Agostinho definiu e distinguiu a substância que anima o corpo humano como animus, enquanto a que anima o corpo dos animas de anima (PIRATELLI, 2010). Além disso, por entender a alma como uma realidade não material, aquilo que o faz ser a “imagem e semelhança de Deus”, considerou que ela aproximava o homem do Ser divino. Se este cria o tempo e o movimento do mundo, ele mesmo permanece sempre como é, uma vez que não pode ser circunscrito pela temporalidade. Assim, é a alma e não o corpo quem mais assemelha-se a ele. Ela é uma realidade não material e, por isso, é menos suscetível às intempéries do tempo. Ela é o elemento da substância “homem” que o torna imagem e semelhança de Deus,

A concepção de Agostinho, que segue a interpretação bíblica de que o homem é a imagem e semelhança do Criador, o faz começar sua investigação pela Trindade, através da imagem imperfeita de Deus na humanidade. Segundo ele, conhecendo a sua estrutura mais familiar será mais fácil conhecer a própria Trindade divina. Neste sentido, ele dedica um amplo tratado sobre o tema, escrito ao longo de dezesseis anos, intitulado A Trindade. Arendt1 (2008) considera essa obra, além de uma defesa de um relevante dogma cristão, um verdadeiro tratado filosófico de cunho original de nosso pensador.

A primeira tríade que Agostinho encontra é no ato do amor. Amar implica três realidades: o ser que ama, o ser que é amado e o próprio amor. Mas, no caso do sujeito que ama a si mesmo, haverá apenas duas realidades, já que o ser que ama e o ser que é amado fundem-se num único objeto. Assim, há duas realidades distintas entre quem ama/objeto do amor e o próprio amor. Quando a alma ama a si mesma, manifestam-se duas realidades: a mente e o amor. Destarte, elas formam, assim, uma unidade e uma relação de igualdade. Só há amor quando ama-se algo, nesse caso, a mente; e a mente só pode amar a si através do amor (Agostinho, 1984, IX, ii, 2, p. 288-289).

O último elemento dessa Trindade é o conhecimento. Não há possibilidade de amor quando não existe esclarecimento sobre o que se ama. Somente a alma humana pode voltar-se para si. O conhecimento da alma é fruto de um processo reflexivo sobre ela mesma. Assim, a mente deve conhecer-se a si mesma para que possa afirmar que ama a si. O conhecimento da alma por ela mesma é rigorosamente igual ao seu amor por si (desejo de conhecer-se e desfrutar de si) (GILSON, 2010, p. 421). Mente e amor, assim como a mente e o conhecimento, são três realidades que formam, quando a mente ama a si, uma unidade. É impossível haver amor quando não há conhecimento. Esse conhecimento que a alma carrega sobre si é intuitivo. Agostinho vê, pois, no homem, a primeira imagem da Trindade: mens, notitia e amor. Essa imagem trinitária humana é diferente em relação à Trindade divina, que já encontra-se totalmente em ato, enquanto, no homem, está em potência.

Cria-se uma espécie de “aliança” de igualdade entre as três realidades e uma união indissociável (Agostinho, 1984, IX, iv, 5-6, p. 292-293). Nessa relação, o produto da mente é o seu conhecimento. Ela mesma concebe-o ao voltar a si, um saber próprio que é exatamente igual ao que ela é. Antes da alma conhecer-se, quando ainda ignorava-se, já existia a potencialidade de conhecer-se. Nesse caso, quando a mente se conhece, ela gera o seu conhecimento. Mas porque não se pode afirmar que a mente ama-se se ela gera também o seu amor? Agostinho responde que ele também já estava como potência antes da alma amar a si. Só é possível a mente encontrar o verbo se ela deseja-o e parte para uma busca que não cessa até alcançar seu objetivo. Ora, o conhecimento é como o nascimento de um filho, cuja mente, enquanto pai, concebe-o através da vontade de gerá-lo. Esse mesmo desejo que originou a busca pelo conhecimento torna-se amor, isto é, uma contemplação da verdade gerada e é ele que impulsiona o desejo a buscar novos conhecimentos (Agostinho, 1984, IX, xii, 18, p. 306). Dessa forma,

realiza-se, de fato, certa imagem da Trindade: a própria mente; seu conhecimento, que é a sua prole e verbo gerado dela mesma; e um terceiro elemento, o amor. Esses três formam uma única unidade e são de uma mesma substância. A prole, ou seja, o conhecimento não é inferior à mente, se esta se conhece na medida de todo o seu ser. O amor também não é inferior, se a mente se ama a si mesma na proporção em que se conhece e existe (Agostinho, 1984, IX, xii, 18, p. 306).

A memória é a primeira faculdade da nova trindade humana constatada pelo autor. Ninguém pode amar algo que ignora completamente. O amor pressupõe que já existe certo conhecimento pelo objeto amado. Assim, uma pessoa pode amar outra, mesmo sem conhecê-la pessoalmente, mas apenas por saber que é alguém de virtude, ou pela sua beleza, etc. O mesmo ocorre quando alguém deseja alcançar o conhecimento, por exemplo, “[...] quem despenderia cuidados e esforços para aprender retórica, se não soubesse que se trata da arte de bem falar?” (Agostinho,1984, X, i, 1, p. 309). Não é possível amar o que é desconhecido, porque só é impelido a amar algo quem já possui um conhecimento genérico do objeto. O que pode acontecer é o desejo de querer conhecer melhor, em aspectos mais esmiuçados, particulares, tal objeto. Assim sendo, aquele que deseja saber pode amar através de uma fantasia que imagina ser o objeto conhecido, feita a partir de um conhecimento mais comum; pode-se amar algo que conduz a conhecer coisas novas e ama-se, também, o próprio saber, porém, nunca o desconhecido (Agostinho, 1984, X, ii, 4, p. 314).

Uma vez que Agostinho defende que ninguém ama o desconhecido, há um problema em admitir que a alma ama a si mesma quando se procura, uma vez que ainda é desconhecida para si. Daí vem sua pergunta, “o que, pois, ama a alma, quando com afinco procura conhecer a si mesma para se conhecer, sendo-lhe desconhecida?” (trin. X, iii, 5, p. 316). Agostinho conclui que a alma conhece a si, porém não tem esse conhecimento presente integralmente por pensar também em outras coisas relacionadas com o mundo. O filósofo de Hipona adota o preceito grego “conhece-te a ti mesmo”, mas o reformula. Para ele, a regra vale para a alma refletir sobre si de modo a não esquecer o que ela deve fazer: governar bem o corpo e deixar ser dirigida pelo seu criador; estar abaixo do que lhe é superior (Deus) e acima do que lhe é inferior (a matéria).

Quando a alma dedica-se muito mais às coisas corporais, obstrui a sua visão com uma densa nuvem de imagens exteriores que a impede de ver a si puramente. Desse modo, Agostinho distingue a ideia de conhecer a si mesmo da de pensar em si mesmo. A alma, ao invés de pensar em seu conhecimento mais profundo, prefere deter-se em imagens de objetos materiais, das coisas do cotidiano, do prazer e das glórias passageiras. Daí, a distinção de Agostinho entre conhecer e pensar. A alma já se conhece, mas pode decidir por não pensar em si. Quando ela equivoca-se em relação ao que ela mesma é, o seu engano consiste em seu pensamento e não em seu conhecimento. Segundo Sérvulo:

[...] A mente não deixa de se conhecer mesmo quando não pensa em si, e mesmo que venha a ter um pensamento equivocado enganando-se a respeito de sua verdadeira natureza (por exemplo, ao se considerar substância corporal). Quando isso ocorre, o erro não está na notitia - conhecimento inseparável do próprio ser da alma - mas na cogitatio, pois a alma pensando sobre si mesma pode interpor entre si mesma e seu verbo uma série de imagens sensíveis, e se considerar como sendo tais imagens sensíveis. Essa ilusão provém de uma má orientação do amor, que em vez de se dirigir para o espiritual, fixa-se no móvel” (1996, p. 59-60, grifos da autora).

A alma não se conhece, mas se reconhece na medida em que passa por essa purificação das imagens externas quando pensa em si e quando acessa todas as verdades. Nas palavras do autor: “Com efeito, não dizemos que um homem conhecedor de muitas ciências não ignore a gramática, quando nela não pensa, por estar mais preocupado com a medicina. Pois uma coisa é não conhecer e outra não pensar em si mesmo” (Agostinho, 1984, X, v, 7, p. 319, grifo nosso). Aí está claramente uma reformulação da primeira imagem trinitária do homem. A faculdade que antes era o conhecimento, agora, passa a ser a memória. Já que não é possível pensar que se pode amar o desconhecido e que a alma possui em si uma parte que se procura, e outra que é encontrada, então, ela deve conhecer-se em sua totalidade. Nesse caso, a alma não se conhece, mas já é conhecida ou, nas palavras de Gilson, “[...] é por isso que, quando o pensamento vem a se perceber, não se diz que ele se conhece, mas que se reconhece” (2010, p. 423).

Assim como a alma entende, ela sabe que deseja e esse querer é orientado por sua vontade. Para desejar é preciso igualmente existir e viver. Ela também sabe que se recorda e, mais uma vez, necessita ser e viver para poder recordar-se. Sabe-se, por conseguinte, que a alma possui essas três faculdades: inteligência, memória e vontade. As duas primeiras são versadas na ciência de muitas coisas, enquanto a última as faz buscar e gozar dessas coisas, usá-las com alguma utilidade (Agostinho, 1984 X, x, 13, p. 327). Em suma, na memória, guarda-se o conhecimento, sobretudo, o de si. A vontade é o que move a mente para apreender, ou lembrar-se desse conhecimento. A inteligência é a consciência da mente como presente a si mesma (SÉRVULO, 2001). Ela é o que pensa sobre si. O pensar, por sua vez, é o resultado da inteligência. Mesmo a alma, com suas deficiências e erros, por ser humana, não pode perder a sua estrutura. Por isso, segundo o Sérvulo (1996), ela é uma atividade trinitária, isto é, sua própria substância é tríade. A estrutura da alma humana é entendida aqui como uma trindade.

2 A educação do ser humano pela vontade

No tópico anterior, procurou-se apresentar o argumento de que, para Agostinho, o ser humano é formado também por sua vontade. Por ela ser uma mobilizadora das ações humanas, detém-se agora em seu respectivo cultivo para explicitar uma ideia de formação humana presente nos estudos do autor. Para isso, recorre-se aos textos O livre-arbítrio, A Doutrina Cristã, Confissões e De magistro.

O problema da origem do mal foi a pergunta mobilizadora de Agostinho desde sua juventude. Com o propósito de descobrir a resposta, ele adotou inúmeras concepções de mundo, inclusive aquela oferecida pelo maniqueísmo. Todavia, essa concepção, como aponta Oliveira (1995, p. 244) “[...] era cômoda, mas metafisicamente insustentável”. N’O Livre-arbítrio, livro escrito justamente na intenção de discorrer sobre essa questão, ele relembra sua trajetória na busca incessante por uma resposta que trouxesse a tranquilidade da verdade.

Todavia, antes de procurar a origem do mal, é necessário esclarecer o que é uma má ação, do ponto de vista agostiniano. Uma ação não pode ser considerada má devido aos julgamentos externos ou à punição da lei, visto que muitos inocentes são condenados de ambas as partes sem terem agido de forma reprovável. Agostinho mostra-se adepto a uma “moral da intenção”. Para ele, não é possível identificar, no próprio ato externo, a sua maldade ou bondade. Uma ação tornar-se-á má ou boa na sua gênese, isto é, na intenção da qual ela origina-se. Se essa intenção é guiada pela paixão (sentimentos e impulsos corpóreos), a ação será má, mesmo que o ato concreto não resulte, por si, em um mal. No entanto, se a intenção é guiada pela razão, então, todo o ato é bom, mesmo que dele origine-se uma consequência não tão boa.

Neste sentido, a paixão é uma má orientação do desejo que leva o homem a cometer o mal. Segundo Oliveira (1995), o termo concupiscência é consonante à ideia de cupiditas. Conforme a autora, Agostinho refere-se com esse termo ao “[...] grande desejo de bens ou gozos materiais, isto é, às paixões descomedidas [...]” (1995, p. 246). Não são consideradas ações más aquelas onde não há o desejo orientado pela paixão. Em suma, o desejo é mal orientado quando faz com que o ser humano volte-se e conceda demasiada atenção às coisas que se corrompem ao tempo e que são menos valorosas do que ele próprio, pois se degeneram sem sua vontade.

Para Agostinho, o corpo só age mal se a alma já está corrompida. Ela é quem deve governar o corpo. Nesse caso, se este atua de modo a prejudicar a si e aos outros, é porque a sua dimensão superior direcionou-o de forma equivocada. Nada, além de sua própria determinação, pode submeter a razão às paixões. Como a razão aqui é considerada um bem maior do que apetites corporais, e igual entre o intelecto de cada pessoa, nada poderá perverter a razão a ficar submissa dos desejos sensíveis do corpo. Se a paixão fosse mais forte que o intelecto, seria comum os animais mais fortes dominarem os mais fracos, inclusive o ser humano. Mas, ao contrário disso, é o ser humano, com o uso da razão, que domina os animais e a natureza que o cerca (Agostinho, 1995, I, x, 20, p. 50).

Ora, uma vez que o que se encontra abaixo da mente/razão não pode ordená-la e uma razão não pode determinar outra, já que elas se equivalem, poderia um ser superior tornar o intelecto submisso às paixões? Deus não pode submeter a razão às paixões, visto que ele é bom e daí o impasse em admitir a existência do mal. Neste sentido, Agostinho conclui que nada exterior à mente pode forçá-la a viver conforme o desejo pelo mundo sensível a não ser sua própria vontade. “Portanto, não há nenhuma outra realidade que torne a mente cúmplice da paixão a não ser a própria vontade e o livre-arbítrio” (Agostinho, 1995, I, xi, 21c, p.52). Na tradução de Oliveira (1995, p. 251), arbitrium é entendido como “decisão”. Assim sendo, a alma que se subjuga às paixões ao invés da razão, faz isso por “livre decisão”. Decidir é algo que cabe especificamente à faculdade da vontade.

O desejo dos seres humanos por uma vida feliz ou integral, isto é, uma vida na qual os homens dediquem-se ao que de mais preciso possuem, ou a sua especificidade, mostra que eles possuem não apenas uma vontade, mas também uma boa vontade. A boa vontade é aquilo que desperta o desejo humano para aspirar a uma vida sábia, honesta e justa. Nesse caso, é importante esclarecer a diferença entre a vontade e o desejo. Existe um desejo que não passa pelo crivo da racionalidade. É um puro impulso do corpo, um jogo de sensações. Esse desejo, ao ser atendido irrestritamente, torna-se uma má vontade. Por outro lado, se ele é controlado pela racionalidade, torna-se uma boa vontade (REIS, 2013). Quem não possui uma boa vontade tende a preencher a sua vida com as coisas mais baixas da existência, com as quais se ocupam também os animais. Ela não depende de nenhum outro agente externo ao ser humano. As ações, quando originadas da vontade, são de responsabilidade humana.

Agostinho afirma que a vontade foi feita para ser reta e, portanto, boa. Quando, por sua própria escolha, ela volta-se para o mal, isto é, as coisas que são inferiores, perverte sua própria função ou sua própria existência. É nisso que consiste o pecado. Todavia, apesar de conceder à vontade uma tarefa boa, o que Agostinho deixa implícito é a plasticidade que ela tem para voltar-se tanto para um “lado”, quanto para “outro”. Ora, a maleabilidade do ser humano, a contingência de suas ações e o seu livre arbítrio são o que permitem sê-lo educado, isto é, passar por um processo de formação que o converterá num modo de vida. Esse modo de vida, interessou a muitos filósofos e não apenas a Agostinho, porque compreendiam que a última consequência desse caminho é a felicidade como finalidade do ser humano.

Para Agostinho, a felicidade é a finalidade que baliza as ações dos seres humanos. Dessa forma, o modo de vida entendido pelo filósofo permite que se pense enquanto um ato de formação mediante o cultivo de si. Agostinho, em suas palavras, afirma que, em relação à formação da vontade, todo ensinamento deve ter como meta “condenar e reprimir tal movimento da queda para os bens mutáveis, e orientar nossa vontade a escolher os bens eternos, condizendo-a ao gozo do Bem Imutável” (1995, III, i, 2, p. 149, grifo do autor). Em Agostinho, o conceito de beatitude configura-se como o propulsor do pensamento sobre o fim (ou a finalidade) do ser humano. Em última instância, atingir essa função resulta em uma vida feliz. Essa preocupação não é original do bispo hiponense. Antes, já circundava o pensamento grego e helenístico. Mas apesar disso, Agostinho tece novas roupagens a esse antigo problema. Ele não é o único a defender a liberdade dos homens frente aos objetos sensíveis do mundo. As noções de “vida feliz” mais significativas apontam para uma crítica à dedicação exclusiva aos bens materiais, às honrarias, ao prazer do corpo, às glórias etc.

N’A vida feliz, apresenta-se um Agostinho mais próximo de sua conversão ao cristianismo do que estivera em seus últimos nove anos como maniqueísta, influenciado, agora, mais pela filosofia ciceroniana do que pela literatura apologética, exegética e das sagradas escrituras. Ainda assim, ele estabelece uma ruptura com a filosofia grega, uma vez que para esta a felicidade encontra-se no desenvolvimento da razão e no amor à filosofia. Para Agostinho, a beata vita reside no desenvolvimento racional enquanto meio para chegar a um sumo bem final, que, posteriormente, em sua obra, será a imagem de Deus (Sumo bem e verdade) (FRANGIOTTI, 1998).

Apesar da felicidade estar adiada para um plano realizável plenamente após a vida terrena, em porções menores, ela torna-se possível ainda na vida material, na medida em que a vontade humana for bem orientada, visto que, embora a felicidade seja um bem a ser alcançado ao transcender a própria vida enquanto um corpo vivo, nos primeiros escritos de Agostinho sobre o tema, a beata vita pode ser parcialmente usufruída mediante uma boa conduta humana. Muito próximo do pensamento grego e de seus contemporâneos latinos, ele aponta o movimento filosófico como propulsor da felicidade. Por conseguinte, a aproximação do bem supremo acontece na medida em que esse processo desenvolve-se (SANGALLI, 1998). Agostinho considera, em seu diálogo A vida feliz, que não é possível ser feliz aquele que deseja algo que não pode possuir. Ora, a aspiração por bens materiais que estão muito acima da posse humana é algo que, segundo ele, adoece o espírito. Neste sentido, dificilmente poderá ser feliz aquele que vive o infortúnio de querer e não possuir. Por outro lado, não são todas as coisas que, ao desejar e possuir, conduz o ser humano à felicidade. Querer e possuir vícios, por exemplo, não pode conduzir o ser humano a uma vida bem vivida. Além disso, a posse de algum objeto corporal do desejo não garante o repouso da alma. Esse mesmo objeto pode vir a deteriorar-se no tempo, a encontrar sua finitude como tudo que possui materialidade. Dessa forma, a felicidade não está em possuir ou não possuir objetos da vontade, mas em saber escolher o que se deve desejar, isto é, em almejar o objeto que merece dedicação e em bem orientar a própria vontade.

Neste sentido, o que resta é investigar qual objeto deve ser digno do desejo humano para a fruição de uma vida bem vivida. Agostinho considera que não pode ser feliz alguém que deseja algo e não o possui. Neste caso, já aí deve-se descartar os bens materiais como legitimadores em si da felicidade, pois se faz “necessário que se procure um bem permanente, livre das variações da sorte e das vicissitudes da vida. Ora, não podemos adquirir à nossa vontade, tampouco conservar para sempre, aquilo que é perecível e passageiro” (Agostinho, 1998, II, 11, p. 129). Dessa forma, o que seria sensato ao ser humano é perseguir um objeto que esteja acima das vicissitudes do mundo temporal. Ora, ele refere-se, com isso, à busca humana pela verdade, pelo conhecimento que, em última instância, funde-se na figura de Deus.

Desse modo, o distanciamento do que pode trazer uma felicidade efêmera é um exercício de pensamento e de prática que se desprenderá em consequências concretas na vida das pessoas. É um exercício do pensamento porque é a vontade, enquanto reguladora dos desejos, que deve “treinar” o seu olhar para as realidades que são perenes, que tragam tranquilidade à alma e não aqueles objetos que a preocupam e deixam-na instável. Mas é também um exercício prático, porque esse pensamento, ancorado em um discurso de verdade, converte-se em ações concretas na vida diária. Portanto, Agostinho confirma que a plenitude de bens materiais ainda não é sinônimo de felicidade. Muito pelo contrário, referindo-se ao personagem Orata, de Cícero, conclui que: “Quanto mais inteligente fosse ele, mais perceberia que poderia perder todos os seus bens. Esse receio o perseguiria e verificar-se-ia o dito popular: ‘a um homem sem segurança seu próprio mal o torna conformado’” (Agostinho, 1998, IV, 26, p. 147).

Em última instância, uma vida feliz, para Agostinho, é uma vida que de nada carece. Neste sentido, a carência mais perturbadora é a carência enquanto falta de sabedoria. A sabedoria, conforme o autor, consiste na moderação do espírito: “isto é, aquilo pelo que a alma se conserva em equilíbrio, de modo a não se dispersar em excessos ou encolher-se abaixo de sua plenitude” (Agostinho, 1998, IV, 33, p. 154). Destarte, a destemperança é o rebaixamento da vida humana a prazeres, ambições e paixões que igualariam o indivíduo ao nível dos animais. Ora, viver conforme o equilíbrio nada mais é do que o esforço cotidiano para que o ser humano ascenda a uma realidade que lhe é superior, abandonando cada vez mais seu mundo animal. Trata-se de um verdadeiro processo formativo humano, pois não realizar esse movimento implicaria a realização desvairada dos mais frívolos impulsos, o que não distanciaria o homem do reino da natureza. Alcança-se, aqui, o propósito central deste estudo, na concepção de que esse processo formativo implica a constituição de uma vida feliz.

Agostinho, como foi lembrado anteriormente, entende que a capacidade de desprendimento material é construída por etapas de autoformação. Em suas palavras:

Com efeito, não é um bem de pouco valor, não apenas o fato de ser uma alma, cuja natureza já ultrapassa qualquer corpo, mas também de ser capaz, com a ajuda do Criador, de aperfeiçoar-se a si mesma e, por um piedoso empenho, poder adquirir e possuir as virtudes por meio das quais poderá vir a libertar-se dos tormentos da dificuldade e da cegueira do erro.

Se assim é, a ignorância e a dificuldade dessas almas, no momento de nascer, não serão para elas o castigo do pecado - mas sim um estímulo ao progresso e um início de perfeição. Pois não é pouca coisa, antes mesmo de qualquer boa obra meritória, ter a alma recebido a capacidade de um julgamento natural, por meio do qual prefere a sabedoria ao erro e o repousa à dificuldade. Assim, pode ela chegar àquela Sabedoria e repouso, não por seu nascimento, mas pela constância nos esforços” (Agostinho, 1998, III, xx, 56, p. 213, grifos nossos).

No texto A doutrina cristã, Agostinho desenvolve, ainda na primeira parte do livro, uma síntese moral que pode ser entendida como um processo formativo. Nela, encontra-se o que se tenta entender como exercício de autoformação, isto é, um trabalho que o homem exerce sobre si mesmo a fim de aperfeiçoar-se enquanto ser humano. Inicia-se por relembrar que, para ele, o mundo (enquanto totalidade) é classificado de modo a existirem coisas para serem fruídas, coisas para serem usadas e coisas que participam de ambas categorias. O fruir diz respeito ao ato de contemplação. A vontade deseja e não possui descanso até encontrar o objeto desejado. Ora, uma vez conquistado tal objeto, a alma contempla-o e compraz-se com ele. A saciedade perene é, portanto, a finalidade da procura e o término do desejo. Por outro lado, a vontade que não repousa na posse daquilo que é desejado, mas apenas usa tal objeto como um meio para chegar a um estado em que não precisa mais desejar. Quando a alma utiliza algo como meio para chegar a um fim, ela desenvolve uma relação de uso com o mundo. Daí origina-se a ideia de que a posse de nenhum bem material pode fazer o ser humano fruir. Isso ocorre porque a própria condição temporal dos objetos não permite que se possa regozijar-se por muito tempo quando de sua posse. Os objetos e a vida, enquanto um elemento terreno, têm uma determinada duração e caminham para a sua finitude. Agostinho estabelece esse princípio da seguinte forma: “de tudo o que expusemos deduz-se que devemos gozar unicamente das coisas que são bens imutáveis e eternos. Das outras coisas devemos usar para poder conseguir o gozo daquelas” (Agostinho, 2002 I, xxii, 20, p. 58). Além disso, o desejo, enquanto parte constitutiva do ser humano, sempre busca algo a mais, que, no fim, nunca satisfaz. Neste caso, se os bens materiais sempre deixam uma lacuna a ser preenchida no homem, a felicidade encontra-se na posse daquilo que é perene, constante e sem devir. Assim, não é quem possui o que quer que é feliz, mas quem possui esses bens imutáveis.

É possível amar apenas o Bem Imutável de forma absoluta, porque ele mesmo não é sujeitado à corrupção. É concebível amar um semelhante, as glórias e honrarias, e até mesmo aos bens materiais conquistados ao longo da vida. No entanto, é necessário ter clareza que o amor dedicado a esses bens tende a deixar de existir - a própria fruição tende a ter fim - exatamente como esses mesmos objetos estão destinados à corruptibilidade no decorrer do tempo.

É necessário esclarecer que, para o autor, o que movimenta as ações morais é o amor. Como ressalta COSTA (2009), na esteira de Agostinho, o amor define o peso da vontade humana, isto é, a intensidade do desejo. Ele também é um elemento natural do homem, que decorre da livre vontade, uma das faculdades da mens: “Se existe um problema, pois, este não diz respeito ao amor como tal, nem à necessidade de amar, nem ao objeto em si, mas unicamente à intensidade do amor dada ao objeto a ser amado [...]” (COSTA, 2009, p. 39) Nem mesmo a intensidade do amor é má. Ela apenas torna-se prejudicial quando é direcionada de forma incorreta. Apesar dos seres humanos amarem essas quatro formas de objetos, há uma intensidade ou uma hierarquia nesse amor. Neste sentido, quem inverte a ordem dos amores desenvolve alguma forma de vício, contrário a uma vida sábia. A esse desejo de si desordenado, Agostinho chama de orgulho.

O bispo hiponense considera que filósofos como os neoplatônicos não desprezavam o corpo, mas, sim, a corruptibilidade dele na medida em que, nele, o Bem-Uno é exaurido. Se, em Agostinho, o corpo é corruptível porque a mente direciona mal o seu amor, para os neoplatônicos, ele é mal porque está afastado do Bem, sendo assim, impedido de agir bem. Eis aí uma diferença fundante na concepção sobre o corpo de nosso filósofo e das teorias de Plotino e Porfírio. À parte isso, todos os seres humanos correm o risco de cair no orgulho, na dedicação excessiva para si mesmo, desconsiderando o que está a sua volta e as realidades que lhe são superiores, como a busca da verdade - em última instância, a própria imagem de Deus.

Assim posto, os seres humanos podem amar a sua existência, mas esse amor precisa ser bem orientado para não se tornar orgulho. É necessário que a alma ame a si, mas não mais do que aquilo que lhe é superior (o bem imutável). É preciso também amar o corpo, mas não se entregando a todos os desejos e pulsões dele, bem governando-o, dando-lhe o que é preciso para conservar a sua boa saúde. A ordem do amor começa com o Bem Imutável e desce até o nível das coisas mutáveis. O ser humano não deve ser amado por sua possibilidade de corrupção, mas porque pode ascender ao bem imutável. Este, por sua vez, é amado por ele mesmo, daí vem a verdadeira fruição, porque ele jamais passa. Os bens materiais, por sua vez, não devem ser amados por eles mesmos, mas somente na medida em que auxiliam a alcançar ao bem superior. Por isso, Costa (2009) argumenta que o preceito moral de Agostinho é tanto baseado na busca da felicidade, quanto no dever moral.

Na forma apontada pelo bispo hiponense, a felicidade está diretamente associada à plenitude espiritual (e não à plenitude material). Pode-se entender a plenitude como o antônimo da carência, da falta de algo, mas é importante lembrar que, assim como ela não se encontra na falta, também não se acha nos excessos. A plenitude é aquilo que garante uma medida necessária, justa e moderada de algo. Neste sentido, a plenitude espiritual está diretamente associada com a sabedoria, ambos são elementos fundamentais para possuir o bem imutável e, por conseguinte, a felicidade ou a tranquilidade da alma:

Mas nem tudo depende exclusivamente da vontade humana. A graça divina tem um papel fundante na constituição de uma vida feliz para Agostinho. O ser humano “deverá, a partir dela, mergulhar na interioridade de sua própria alma, que é a morada da verdade e, daí, transcender para Deus, que é o princípio e o fim último de todas as criaturas e a própria verdade” (SANGALLI, 1998, p. 147). Agostinho traça um caminho moral que o diferencia, por sua vez, de outros filósofos que pensaram o mesmo problema sobre a felicidade. O que o singulariza de outros pensadores que estiveram no centro dessa discussão é o fato de que, na filosofia cristã, ela não depende exclusivamente da vontade humana. Antes, existe um elemento da graça divina que é simplesmente ofertado ao homem. É por isso que, apesar da filosofia ser, nessa concepção, o caminho para a vida beatificada (vida sábia), ela também pode tornar-se um empecilho para isso.

Agir de forma virtuosa, com sabedoria, está relacionado com os valores que os seres humanos elegem para orientar o agir, pois a ação virtuosa é a exteriorização dos valores que são internos aos sujeitos (ORTIZ, 2012). Trata-se, então, de esclarecer de que forma o ser humano pode galgar esses degraus e reconhecer os valores que pautam o modo de vida ético proposto pelo filósofo. Cabe salientar que essa é uma atribuição singular da educação enquanto caminho que conduz o homem a uma vida beatificada.

O método pedagógico de Agostinho, para isso, segue a maiêutica socrática. Trata-se de levar o discípulo, através de um jogo de questões-respostas-refutações, do inferior ao superior; do sensível ao inteligível e do temporal ao eterno. Na medida em que esses aspectos tornam-se claros, o ser humano pode determinar seus valores e agir em consonância com a virtude. O exercício pedagógico consiste em o mestre conduzir, através do jogo de interrogações, o discípulo a constatar o verbo interior que habita dentro de si. Afinal, no De Magistro Agostinho trata da impossibilidade do mestre em assimilar a aprendizagem pelo discípulo. Ele pode, no máximo, apontar a direção para onde se deve direcionar o olhar. O mestre, portanto, “deve agir com cautela, posto que não pode pretender mostrar desde o princípio os objetos mais excelsos, pois poderia deixar o discípulo deslumbrado com sua luz, voltando às sombras” (ORTIZ, 2012, p. 87).

Para entender a forma como um valor pode ser ensinado, é necessário resgatar a argumentação de Agostinho no De magistro. Nele, constata-se que as palavras são signos que possuem validade enquanto representantes de objetos concretos por meio da linguagem. Para o filósofo, não é possível ensinar sem fazer uso de sinais, pois, sem eles, o homem pode cair em inúmeros equívocos. É importante observar que esses sinais dizem respeito tanto às palavras quanto ao gesto de apontar para o objeto cuja palavra significa (definição ostensiva). Neste sentido, a palavra, por si só, não pode ensinar nada de novo. Se não é conhecido o objeto que ela representa, não há possibilidade de entendê-la na linguagem. Se já se conhece o objeto que ela substitui na comunicação, então, ela, sozinha, ensina aquilo que já é sabido. Em outros termos, é apenas contemplando os objetos reais que é possível entender um signo. Caso contrário, este não passará de um som ou um ruído sem qualquer importância. Aprende-se na medida exata em que o objeto a ser aprendido mostra-se em nossa presença gerando, assim, uma visão exterior (do corpo) ou uma visão interior, da mente (uma lembrança). Dessa forma, Agostinho define o sentido de mestre como sendo aquele que mostra a presença da coisa mesma aos sentidos corporais ou à mente do discípulo. O único que pode apresentar a realidade inteligível ao homem interior é Deus, num processo de iluminação das ideias, ou das razões seminais de tudo que é (ESTÉVEZ, 1997).

Agostinho distingue a ciência sensível-prática da ciência inteligível. A ciência sensível diz respeito ao mundo físico, às coisas materiais. Por sua vez, a ciência inteligível só pode ser acessada pelo “homem interior”, que pode “ver com a mente” aquilo que não pode ver com visão do corpo. Mas nem sempre o homem pode contemplar toda verdade inteligível das ideias de uma vez só. Analogamente, seria como olhar diretamente para a luz do sol, o que não é possível sem algum dano físico. Da mesma forma, por estar acostumado com a sombra, sem a verdade, é paulatinamente que o ser humano acessa-a (ESTÉVEZ, 1997). No caso dos valores, como o princípio uti/frui, utilizar efemeramente de coisas que não possuem permanência e fruir das que resistem ao tempo não é possível “mostrar” o objeto que eles correspondem, visto não possuírem materialidade.

Neste sentido, Agostinho afirma que o homem deve ser auxiliado em sua busca pela verdade, o que destaca o papel do mestre nessa trajetória. Trata-se da tarefa de levar o interlocutor, através do jogo de perguntas e respostas, ancoradas numa argumentação lógica, a concluir e contemplar a verdade alcançada por seus próprios esforços. O conhecimento ou a verdade é fruto individual. Ela não se apreende por imposição, violência ou autoritarismos. Cada indivíduo pode contemplá-la e auxiliar os seus semelhantes nessa busca, mas ninguém pode “transferi-la” para outra pessoa. Em última instância, para Agostinho, quem permite e auxilia o ser humano na contemplação da verdade é um “mestre interior”, o próprio Deus, que habita na alma de cada ser humano. A graça divina, mais uma vez, destaca-se como algo que não apenas favorece a contemplação da verdade, mas também torna-a acessível ao homem.

No que tange à educação dos valores, é pertinente fazer uma distinção, para fins didáticos, da diferença entre apreensão e compreensão. A primeira está relacionada às conclusões. Ela pode ser transmitida, memorizada e repetida, isto é, pode ser generalizada. Ao contrário, a compreensão diz respeito às etapas que se deve percorrer para alcançar uma resposta final. A compreensão trata dos meios e não apenas dos fins. Ela não pode ser generalizada, porque se uma pessoa compreende, não está apenas repetindo o que ouviu dizer, ela não obedece e reproduz inadvertidamente o que lhe “transmitiram”. Quem compreende sabe dos meios que sustentam uma conclusão e, dessa forma, não conclui por obediência, mas porque entende o sentido. Do mesmo modo, acontece com quem aprende um valor. A aprendizagem, para Agostinho, está relacionada com a compreensão. Dessa forma, se o sujeito não galga, por seus esforços, todo o árduo caminho argumentativo que sustenta um valor, um princípio que orienta o agir, ele não se sentirá comprometido com este. Por isso, Ortiz (2012) afirma que um valor possui sentido quando quem o coloca em prática “sente-o”, compreende por que está agindo como tal e, por isso, compromete-se em ser orientado por ele.

Essa importante tese de Agostinho permite compreender que, da mesma forma como só se aprende os signos mediante o objeto significado, só se aprende os valores quando eles são sentidos. Não é possível ensiná-los sem que se mobilize essa parte do sentimento (advinda do entendimento) que dá sentido aos valores: “transferido isso ao âmbito dos valores, a consequência é que esses não podem ser ensinados se não forem sentidos interiormente” (ORTIZ, 2012, p. 88). No entanto, como esse trabalho que o ser humano faz em si mesmo - por nós denominado de “autoformação” - necessita de uma verdade que se encontra além do próprio sujeito, cabe-lhe empenhar-se em viver em consonância com ela.

A verdade, o conhecimento - em última instância, o próprio Deus - são o parâmetro pelo qual o homem guia-se para a vida beatificada. Com isso, é possível indicar que, apesar do ser humano trabalhar sobre si mesmo na tentativa de ser autônomo em relação ao mundo, ele prende-se a um parâmetro. Todavia, o próprio trabalho sobre si estaria fadado ao fracasso se não tivesse esse modelo no horizonte. A argumentação de Agostinho sobre a constituição de uma vida beatificada indica o estreito laço existente entre a verdade e a felicidade, isto é, ao descobrir a verdade é possível, por uma ação voluntária, viver conforme ela. Neste sentido, se a felicidade dependesse exclusivamente da concepção de cada indivíduo (sem um parâmetro), seria o mesmo que admitir a multiplicidade da verdade, bem como seria soberba do ser humano pretender colocar-se acima desta ou independente dela.

Por fim, surge dessa concepção uma noção de mestre e uma concepção de discípulo. Para Agostinho, os signos, por si só, não são capazes de ensinar coisa alguma, porque antes o sujeito que aprende já deve conhecer a coisa que está sendo representada. Desse modo, mestre é aquele que pode mostrar o objeto em si e não apenas o seu signo. Quando se trata de conceitos puros, o único que pode mostrá-los é Cristo, visto que mestre terreno algum pode mostrar aquilo que não possui materialidade. Se Deus é o mestre, então, todas as pessoas podem ser discípulas da verdade. No entanto, só pode ser verdadeiramente chamado de discípulo aquele que trabalha para converter a sua vontade em uma boa vontade e que, assim, vive virtuosamente (ESTÉVEZ, 1997).

Considerações finais

A descoberta feita por Agostinho de que o homem é um ser de vontade desdobrou-se em outros importantes estudos acerca do ser humano. Seguindo Oliveira (2008), a concepção de que a pesquisa científica deve ser necessariamente sobre o presente e a compreensão do tempo linearmente constituído, tornando o passado desinteressante, é uma noção obsoleta de compreender a história da humanidade. Isso porque o passado ainda influencia o presente e pode conter importantes lições para compreender e superar os problemas da atualidade, uma vez que “o diálogo com os grandes homens do passado somente é possível, por conseguinte, para aqueles que, no presente, são capazes de entender o seu mundo como história e não como verdade” (OLIVEIRA, 2008, p. 5). A psicanálise, por exemplo, trabalha com a noção de que o indivíduo é “desejante” constantemente. Ora, compreender o ser humano como algo dotado de vontade, como se apresentou no decorrer deste trabalho, é uma concepção já defendida por Agostinho há, pelo menos, dezesseis séculos antes de Freud formular os seus primeiros escritos.

Pelo viés psicanalítico, o querer não possui limites, pois ele está atrelado à insuficiência e à vulnerabilidade que circunda o próprio homem. O capitalismo, por sua vez, consciente desse processo “canaliza”, através da publicidade, o desejo para produtos compráveis, como se eles pudessem colocar fim à busca incessante de modo a preencher essa fragilidade humana. No entanto, ao adquirir determinado produto, a busca não cessa, a vontade não repousa, a intranquilidade e a insegurança de uma existência repleta de caminhos incertos retornam como uma doença que se acreditava estar erradicada (JUNIOR, 2018). Esse processo é descrito por Kehl (2017) como a colonização do inconsciente pelo capitalismo. Dessa forma, por muitas vezes, o sujeito contemporâneo não segue mais modos autênticos de vida, que o realize propriamente enquanto humano, mas aquilo que apenas promete realizá-lo. Entretanto, essa promessa nunca é cumprida como o esperado.

Em seus estudos sociológicos, Bauman (2008) demonstra que a sociedade, por ele denominada de “sociedade de consumidores”, é pautada em um ritmo veloz de produção e de validade dos produtos. A aquisição destes, por sua vez, é sinônimo de inclusão ou exclusão na medida em que os indivíduos aceitam ou não viver conforme essa lógica. Além disso, o próprio campo de escolha dos sujeitos é extremamente limitado, como revela o autor: “ Você também não é livre para influenciar o conjunto de opções disponível para a escolha: não há outras alternativas possíveis, pois todas as possibilidades realistas e aconselháveis já foram pré-selecionadas, pré-certificadas e prescritas” (BAUMAN, 2008, p. 110). Além de tudo, o sociólogo polonês afirma que a sociedade capitalista está ancorada no princípio de que não é possível retardar ou permanecer o que quer que seja. Neste sentido, se, para Agostinho, uma vida baseada na posse de produtos materiais é uma vida menos realizável pela própria natureza deles, uma vez que se degeneram com o tempo, agora os próprios produtos são feitos para não durarem mais do que uma “coleção”, “um prazo”, “uma estação” ou alguns meses.

Ora, o que se pode depreender deste estudo parece tornar Agostinho mais atual em pleno século XXI do que em certo sentido o era há quase dezesseis séculos atrás. O alto índice de produção material revela o consumo desenfreado de nossa era. Descobre-se uma existência insatisfeita constantemente porque não há deleite nos objetos adquiridos. Agostinho alicerça toda sua ética, que se traduz como uma “ética da felicidade”, justamente na noção de “apartação” ou indiferença aos bens materiais. Retornar a grandes pensadores do passado, como é o caso de Agostinho, parece de crucial importância para erigir pilares onde se possa bem sustentar possibilidades de resistência a modos de vida que afetam negativamente a ideia ética de que a vida humana deve ser bem vivida e que isso demanda a educação da vontade.

O filósofo entende que o ser humano, já em sua origem, possui algo de diferente em relação ao restante da natureza. Sua capacidade de pensar, recordar, comunicar-se e escolher o que desejar tornam-no uma criatura singular. Essa particularidade, conforme Agostinho, refere-se à alma, estrutura humana e imaterial. Esta, por sua vez, é formada a partir de três faculdades: memória, inteligência e vontade. É essa última faculdade que destacamos no percurso aqui traçado, uma vez que o ponto central é como cultivá-la para que o ser humano não venha a perder-se numa existência sem sentido, isto é, para que ele desenvolva todos os elementos que o tornam o que ele mesmo é. Assim, uma vida bem vivida pode aproximar-se da felicidade terrena, mesmo que em pequenas porções. Isso acontece na medida em que o ser humano educa sua vontade para desejar objetos que possuam uma existência perene ao invés daqueles que detêm apenas uma curta duração no tempo. Com isso, Agostinho desenvolve um parâmetro para nortear as relações do sujeito com o mundo (entendido apenas como objetos materiais), com o seu semelhante e com ele mesmo, conforme expresso na ideia de utilização e fruição, esboçada no livro A Doutrina Cristã.

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1A autora define bem o dogma da Trindade através do seguinte exemplo: “O paradigma de uma relação mutuamente predicada entre substâncias independentes é a amizade: pode-se dizer de dois homens amigos que são “substâncias independentes” enquanto relacionadas a si mesmos; são amigos somente na relação que mantêm entre si. Um par de amigos só forma uma unidade, só forma Um, à medida que e enquanto são amigos; no momento em que a amizade acaba, eles são novamente duas “substâncias” independentes”. Isso é, a Trindade é um, na relação, sem modificar a “substância de cada pessoa” (ARENDT, 2008, p. 362).

Recebido: 07 de Março de 2020; Aceito: 22 de Setembro de 2021

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