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Educação e Filosofia

versão impressa ISSN 0102-6801versão On-line ISSN 1982-596X

Educação e Filosofia vol.35 no.73 Uberlândia jan./abr 2021  Epub 11-Jan-2024

https://doi.org/10.14393/revedfil.v35n73a2021-53769 

Artigos

Os pressupostos teóricos de Ilya Prigogine e a epistemologia crítica - um diálogo de convergências?

Ilya Prigogine's theoretical assumptions and critical epistemology - a convergence dialogue?

Los supuestos teóricos y la epistemología crítica de Ilya Prigogine: ¿un diálogo de convergência?

Thiago Weslei de Almeida Sousa* 
http://orcid.org/0000-0001-7221-062X; lattes: 4834572535979672

Dario Xavier Pires** 
http://orcid.org/0000-0002-7235-2369; lattes: 8952227827337083

Wellington Pereira de Queirós*** 
http://orcid.org/0000-0002-9734-7136; lattes: 6527714159537457

*Doutorando em Ensino de Ciências na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Mestre pela Universidade Estadual de Goiás no Programa de Ciências Moleculares com pesquisa na área de Química. E-mail: tsqi@msn.com

**Doutor em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília (UnB). Professor na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: dario.pires@ufms.br

***Doutor em Educação para a ciência pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Professor na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). E-mail: wellington_fis@yahoo.com.br


Resumo

Ter clareza das raízes epistemológicas dos referenciais teóricos utilizados nas pesquisas científicas é primordial para que essas investigações tenham veracidade. Entretanto, alguns autores, por diversos motivos, não explicitam tais informações em suas obras. Surge então a necessidade de se saber onde Ilya Prigogine - físico-químico e filósofo que refletiu sobre a função do tempo, do conhecimento e das leis fundamentais que governam o universo - está epistemologicamente posicionado. Desta forma, a presente investigação buscou analisar, comparar e conectar as perspectivas da epistemologia crítica, uma das mais importantes vertentes da filosofia contemporânea, com as proposições teóricas de Prigogine, buscando encontrar conexões entre elas. Desta pesquisa exploratória de cunho bibliográfico, emergiram da análise de conteúdo as seguintes categorias: conhecimento, história, natureza, utilização e ciências exatas x humanas. Subsidiados pelas discussões aqui construídas, conseguimos constatar que existem intensas convergências entre a epistemologia crítica e a obra de Prigogine. Com isso, confirmamos que o entrelaçamento entre Prigogine e a epistemologia crítica é forte o suficiente para posicioná-lo como epistemólogo com vertente crítica. O arcabouço teórico aqui desenvolvido pode ser utilizado para justificar a utilização das ideias prigoginianas em trabalhos de orientação progressista e também abre espaço para novas pesquisas sobre o posicionamento epistemológico de Prigogine.

Palavras-chave: Progressismo; Teoria Crítica; Relações histórico-sociais; Ciência; Natureza

Abstract

Having clarity on the epistemological roots of the theoretical frameworks used in scientific research is paramount for these investigations to be true. However, some authors, for various reasons, do not explain the information in their works. The need then arises to know where Ilya Prigogine - physicist-chemist and philosopher who reflected on a function of time, knowledge and the fundamental principles that govern the universe - is epistemologically positioned. In this way, the present research sought to analyze, compare and connect with the perspectives of critical epistemology, one of the most important aspects of contemporary philosophy, with Progogine's theoretical proposals, seeking to find connections between them. From this exploratory research of a bibliographic nature, content analysis emerged as the following categories: knowledge, history, nature, use and exact x human. Supported by the discussions built here, he was able to verify that there are intense convergences between a critical epistemology and a work by Prigogine. With this, we confirm that the intertwining between Prigogine and a critical epistemology is strong or sufficient to position him as an epistemologist with critical criticism. The theoretical framework developed here can be used to justify the use of Prigoginian ideas in works of progressive orientation and also opens space for new research on Prigogine's epistemological positioning.

Key-words: Progressiveness; Critical Theory; Historical-Social Relations; Science; Nature

Resumen

Tener claridad sobre las raíces epistemológicas de los marcos teóricos utilizados en la investigación científica es fundamental para que estas investigaciones sean ciertas. Sin embargo, algunos autores, por diversas razones, no hacen explícita esta información en sus trabajos. Entonces surge la necesidad de saber dónde está posicionado epistemológicamente Ilya Prigogine, físico-químico y filósofo que reflexionó sobre una función del tiempo, el conocimiento y los principios fundamentales que gobiernan el universo. De esta forma, la presente investigación buscó analizar, comparar y conectar con las perspectivas de la epistemología crítica, uno de los aspectos más importantes de la filosofía contemporánea, con las propuestas teóricas de Progogine, buscando encontrar conexiones entre ellas. En esta investigación exploratoria de naturaleza bibliográfica, surgieron las siguientes categorías del análisis de contenido: conocimiento, historia, naturaleza, uso y ciencias humanas exactas. Subsidiado por las discusiones construidas aquí, pudo verificar que hay intensas convergencias entre una epistemología crítica y un trabajo de Prigogine. Con eso, confirmamos que el entrelazamiento entre Prigogine y una epistemología crítica es fuerte o suficiente para posicionarlo como un epistemólogo con crítica crítica. El marco teórico desarrollado aquí puede usarse para justificar el uso de ideas de Prigoginian en trabajos de orientación progresiva y también abre espacio para nuevas investigaciones sobre el posicionamiento epistemológico de Prigogine.

Mots-clés: Progresismo; Teoría Crítica; Relaciones históricas; Ciencia; Naturaleza

Introdução

A propriedade intelectual do conhecimento científico tornou-se o principal mecanismo de acumulação de capital. Porém, com pouquíssima frequência, consideram-se as consequências éticas e a deterioração ambiental que o uso indiscriminado da ciência produz. (Elías e Carranza, 2012). Com isso, surge a necessidade de que entendamos como a ciência é inserida no meio social, e é neste contexto que se faz importante a epistemologia.

Zambiasi (2006, p. 152) aponta que “o conhecimento científico é ainda, muitas vezes, apresentado como uma realidade a-histórica e desvinculado da complexidade das implicações que o condicionam”. Neste contexto, a epistemologia empreende dar um novo significado à ideia reduzida, abstrata e impessoal da ciência. Segundo Tesser (1995, p. 92), a epistemologia é “o estudo metódico e reflexivo do saber, de sua organização, de sua formação, de seu desenvolvimento, de seu funcionamento e de seus produtos intelectuais”.

Junto às demais correntes epistemológicas contemporâneas, tem ganhado força uma nova corrente: a epistemologia crítica (Japiassu, 1988, p.137). Com foco na inerente conexão entre política, valores e conhecimento, e fazendo uma profunda problematização do que constitui o legítimo conhecimento científico, a teoria crítica tem sido cada vez mais solicitada no universo das ciências sociais (Fui, Khin e Ying, 2011).

Segundo Japiassu (1988, p.137), a epistemologia crítica se volta para “uma reflexão histórica, feita pelos cientistas, sobre os pressupostos, os resultados, a utilização, o lugar, o alcance, os limites e as significações socioculturais da atividade científica”. Mais especificamente, a teoria crítica concentra seus esforços na investigação de questões como exploração, relações de poder assimétricas, comunicação distorcida e falsa consciência. Desta forma, a teoria crítica tenta compreender como as práticas e instituições são desenvolvidas e legitimadas nas relações de poder e de dominação (Fui, Khin e Ying, 2011).

O dever da epistemologia crítica é uma história ainda em construção, uma vez que ela envolve um novo posicionamento diante da realidade, uma profunda mudança epistêmica e uma verdadeira revolução do pensamento, objetivando tornar o conhecimento científico um conhecimento comum (Elías e Carranza, 2012).

Tornar possível a emancipação do indivíduo e a minimização, ou até eliminação, da desigualdade e da dominação, são princípios fundamentais da teoria crítica (Fui, Khin e Ying, 2011). Corroborando com esta ideia, Moreira e Silva (1994), ao comentarem a emergência da teoria crítica, relatam que ela tenta contribuir para a eliminação dos aspectos que restringem a liberdade, quer seja ela a individual ou a de qualquer um dos diversos grupos sociais.

Para a teoria crítica, todo conhecimento, por mais desinteressado que possa parecer, deve ser questionável, pois nesta perspectiva o conhecimento é tomado como um produto construído por valores com interferências particulares. Com isso, é preciso considerar que a leitura e a interpretação dos dados empíricos são sempre, em maior ou menor grau, influenciadas pela estruturação teórica e pelos pressupostos ideológicos adotados em algum contexto (Fui, Khin e Ying, 2011).

Elías e Carranza (2012, p. 17) dizem que uma das perguntas que norteiam a epistemologia crítica é “como enfrentar o fim das certezas e a perda das utopias?”; e não há como responder à essa pergunta com maestria sem evocar os conceitos que Ilya Prigogine tanto discute em sua obra.

Ilya Prigogine foi um químico russo que viveu a maior parte da sua vida na Bélgica e que dedicou sua vida à pesquisa com ênfase na interface entre química, física e filosofia. Honrado com o Prêmio Nobel de Química de 1977 por suas contribuições à termodinâmica de não-equilíbrio, Prigogine aponta que a ordem dá origem à desordem, que o tempo é na realidade irreversível e que existe uma “flecha do tempo” que indica probabilidades e não certezas. Desta forma, suas reflexões revolucionárias questionam a função do tempo, do conhecimento e das leis fundamentais que governam o universo (Massoni, 2008).

Sobre as escolhas, possibilidades e incertezas, Prigogine diz serem estas as faculdades próprias não só do universo, mas da condição humana (Carvalho e Almeida, 2009). Prigogine acredita que as noções de complexidade, flutuações, bifurcações e criatividade têm relação com o domínio das ciências humanas, mas que elas não podem ser trivialmente transpostas, pois é difícil quantificá-las nas pesquisas sociais como é feito na física. O que deve ser feito então é uma transferência qualitativa (Prigogine, 1996a).

O trabalho científico de Prigogine faz referência direta com as complexas problemáticas sociais, e apesar de nunca ter se autointitulado filósofo, ele partilhou em suas publicações a opinião de que sua pesquisa científica tem grande importância filosófica (Earley, 2006). Inclusive, ele tratava as temáticas humanas com bastante cuidado e responsabilidade, sabendo inclusive discernir as limitações de suas colocações para o universo social. Prigogine (2000, p. 4) chega até a fazer a seguinte reflexão: “As moléculas obedecem às leis; as decisões humanas dependem das lembranças do passado e das expectativas para o futuro”.

Na perspectiva prigoginiana, verifica-se o que ele intitulava de uma Nova Aliança. Ao discutir as bifurcações produzidas pela flecha do tempo, a irreversibilidade das trajetórias e a necessidade de uma ética planetária, Prigogine nos induz a repensar a ligação do homem com a natureza, o humanismo e a própria democracia. Ele advoga que o universo está em construção contínua, sendo as mudanças marcadas principalmente pela novidade e pela criatividade (Carvalho e Almeida, 2009).

Apesar de ser um teórico bastante referenciado por suas contribuições à físico-química e à filosofia, não há investigação que se direcione, especificamente, a explicitar qual é a orientação epistemológica da obra de Prigogine. Uma vez que se faz importante conhecer e entender as raízes epistemológicas dos referenciais teóricos que utilizamos em nossas pesquisas, é preciso saber também de onde Prigogine fala, para que possamos operacionalizar suas teorias com mais propriedade e veracidade.

Este trabalho nasce então da necessidade de saber se Prigogine é um autor que traz em sua obra reflexões com vertentes progressistas que propiciem a emancipação do ser humano em seu tempo e espaço. Almejamos, com esta investigação, analisar, comparar e conectar as perspectivas da Epistemologia Crítica com as proposições teóricas de Ilya Prigogine, buscando encontrar entre elas semelhanças ou mesmo diferenças.

Desta forma, buscamos responder às seguintes perguntas: Existem convergências entre os pressupostos teóricos de Ilya Prigogine e a Epistemologia Crítica? Em quais aspectos e com qual intensidade eles convergem entre si? Esse possível entrelaçamento é forte o suficiente para posicionar, epistemologicamente, Prigogine como um pensador crítico?

Deixamos claro que não pretendemos esgotar nenhum dos assuntos aqui tratados, devido à extensão e à complexidade dos mesmos. Ou seja, a intenção deste artigo não é explanar a epistemologia crítica e as ideias prigoginianas em todas os seus aspectos; pretende-se discutir somente os tópicos destes dois eixos que trazem elementos de convergência ou divergência entre si.

Esta é uma pesquisa exploratória com abordagem qualitativa e, no que tange ao procedimento da pesquisa, esta é classificada como bibliográfica (Gil, 2008). Para a análise dos dados foi utilizada a análise de discurso segundo a metodologia de Bardin (1977).

O epistemológico

O reinado da racionalidade e do positivismo, que transmutou a ciência em instrumento de dominação ao negar a concepção emancipatória da modernidade, hoje não mais se justifica. Desta forma, é preciso superar este discurso totalitário de que a ciência é a detentora de toda e qualquer verdade (Zambiasi, 2006). Segundo Prigogine e Stengers (1991, p. 1), “chegamos hoje a uma situação teórica completamente diferente; a uma descrição que situa o homem no mundo que ele mesmo descreve e que implica a abertura desse mundo”.

Não mais se almeja verdades incontestáveis, e sim aproximações passiveis de correção, modificação ou até de abandono por outras explicações mais plausíveis. Não se trata da deserção da coerência, da observação e da experimentação, trata-se da relativização destes fatores perante a complexidade do real e do pensamento (Zambiasi, 2006). Prigogine e Stengers (1991, p. 14) alertam que “uma ciência desembaraçada de suas ilusões poderia também ser menos dócil”, mas que em contrapartida seria “mais lúcida e mais exigente, quando se tratasse de racionalidade científica.”

Utilizando o conhecimento científico como parâmetro para fazer sérios julgamentos, a sociedade apresenta neste uma confiança bastante alicerçada. Zambiasi (2006, p. 168), Entretanto, acautela que “a ciência moderna projeta uma luz particular sobre o mundo, mas nada prova que só ela seja capaz de fazer perceber toda estrutura do real”. E é por isso que a epistemologia se mostra tão relevante para este momento em que se questiona o existir da ciência.

Em linhas gerais, epistemologia (do grego episteme que significa ciência e logos, discurso), é a ciência da ciência (Tesser, 1995). Segundo Faria (2015), epistemologia é o estudo científico e filosófico do conhecimento que objetiva os saberes, buscando analisar, organizar e sistematizar os seus condicionamentos, esclarecer seus vínculos e avaliar seus resultados e aplicações.

Desta forma, a epistemologia examina os saberes, levando em consideração que a ciência e a filosofia se constroem e se modificam mutualmente. Cabe ressaltar que com esta perspectiva, abandona-se a patogênese, pois tanto a filosofia quanto a ciência são agora passíveis de crítica externa. Em outras palavras, epistemologia pode ser tomada como o estudo sistemático do conhecimento amparado pela ciência e pela filosofia (Faria, 2015).

Todo conhecimento é embebido de interesses, com isso, a ciência e a técnica há muito tempo se apresentam como instrumentos ideológicos de poder, manipulando e legitimando a sociedade dominante (Tesser, 1995). Prigogine e Stengers (1991, p. 74) corroboram com esta ideia ao dizerem que “a ciência é produto da exigência vital de tirar partido do mundo, e seus conceitos são determinados pela necessidade de fabricar e manipular os objetos, de prever e agir sobre os corpos naturais”. Desta forma, é de interesse para a epistemologia as questões lógicas, semânticas, gnosiológicas, metodológicas, ontológicas, axiológicas, éticas, estéticas e pedagógicas (Tesser, 1995).

A epistemologia também assume que o conhecimento científico é transitório e que sempre possui um pano de fundo ideológico, religioso, econômico, político e histórico. Com isso, o objetivo maior da epistemologia é a ressignificação racional do conhecimento científico, investigado todo o processo gnosiológico da ciência sob a óptica lógica, linguística, sociológica, interdisciplinar, política, filosófica e histórica (Tesser, 1995). A epistemologia não tenta negar a especificidade da ciência, nem a sua dimensão social no desenvolvimento do progresso. Pretende, entretanto, provar que a ciência não é mundo alheio, neutro e desinteressado (Faria, 2015).

A epistemologia exerce não somente o seu papel comum de reflexão, mas insere também neste contexto a crítica, explanando aos cientistas que existem filosofias implícitas em suas ciências (Tesser, 1995). Inclusive, existe uma vertente da epistemologia que se caracteriza justamente por seu alto fator de criticidade. A epistemologia crítica.

Epistemologia crítica

A epistemologia crítica surgiu da urgência por um pensamento necessariamente crítico que enfrentasse os paradigmas neoliberais dominantes no campo da ciência durante o século XX (Elías e Carranza, 2012). Seu desenvolvimento teórico e analítico deu-se por cientistas sociais inseridos na Escola de Frankfurt, sendo os principais Karl Marx, Friedrich Engels, Antonio Gramsci, Theodor W. Adorno, Walter Benjamin, Michel Foucault e Pierre Bourdieu (Fui, Khin e Ying, 2011; Elías e Carranza, 2012).

Inerentemente, qualquer epistemologia já nasce crítica por interrogar os princípios, as hipóteses e os resultados de todas as ciências (Tesser, 1995). Faria (2015, p. 18) corrobora com esta ideia afirmando que “a epistemologia é, em essência, crítica”. Porém, quando a epistemologia recebe a designação de epistemologia crítica, ela tem esse caráter interrogador ainda mais acentuado.

Mais especificamente, a epistemologia crítica caracteriza-se como uma tentativa de se compreender a transformação estrutural do homem em seu relacionamento consigo mesmo, com seu mundo simbólico e com o mundo material ao seu redor (Elías e Carranza, 2012). Desta forma, o ponto de chegada pretendido pela teoria crítica é a consolidação de uma sociedade mais justa e democrática, buscando diagnosticar os problemas da sociedade moderna e identificar a natureza de suas mudanças sociais (Layder, 1994).

Segundo Tesser (1995), Elías e Carranza (2012) a epistemologia crítica está alicerçada em vários questionamentos, sendo os principais: Como é possível adquirir um conhecimento digno de crédito? Que interesses orientam, dirigem e comandam a ciência? Qual é a verdadeira função que a atividade científica deve desenhar na sociedade? Qual o papel da ciência? Como poderiam ser reformuladas as questões básicas da ciência? A partir de um pensamento crítico, como poderíamos repensar as respostas a todas as questões geradas pela produção de conhecimento? E como enfrentar o fim das certezas e a perda das utopias?

No que tange aos pressupostos da epistemologia crítica, estes estão sintetizados no Quadro 1, que foi formulado a partir das discussões de Morrow e Brown (1994) e das colocações de Japiassu (1988) e Bunge (1980).

Quadro 1 Pressupostos epistemológicos da Epistemologia Crítica 

Não existe uma única ciência, pois não é possível que apenas uma ciência constitua o sistema definitivo do saber. O que existem são ciências, um conjunto plural.
O valor da objetividade cientifica não está atrelada à reprodução fidedigna da realidade, mas sim aos valores dos objetos construídos.
Não é possível que a objetividade científica se isente de fazer escolhas, e nem que esta esteja isenta de erros.
O que se chama de verdade cientifica é na verdade uma não contradição - convergência entre os modelos e as predições que eles podem autorizar e os fatos realmente pertinentes.
As relações sociais e a análise social sempre têm uma dimensão interpretativa (hermenêutica).
Significado e linguagem (formas de construção da realidade) revelam e ocultam as experiências dos sujeitos.
As estruturas podem ser específicas da espécie ou historicamente constituídas e, às vezes, conscientemente transformadas.
As variáveis das estruturas sociais e culturais não podem ser determinadas pela análise probabilística.
O significado e as estruturas mudam constantemente no espaço e no tempo.

Fonte: Japiassu (1988); Morrow e Brown, (1994) e Bunge (1980). Elaborado pelo autor.

A partir do quadro 1, é possível inferir que “a teoria crítica tenta tomar consciência dos imperativos ideológicos e pressupostos epistemológicos que nortearam a tomada de decisão” (Fui, Khin e Ying, 2011, p. 132). Prasad e Caproni (1997) apoiam esse pensamento, afirmando que a teoria crítica se volta para temas como construção social da realidade, poder e ideologia, fenômenos sociais ou organizacionais e reconhecimento da importância da práxis.

Quanto as principais pautas e posicionamentos da epistemologia crítica, eles estão sumariados no Quadro 2, elaborado também a partir das discussões de Japiassu (1988).

Quadro 2 Assuntos de interesse e posicionamentos da epistemologia crítica 

Assuntos de interesse Parecer da epistemologia crítica
Soberania das ciências Que as ciências, hoje em dia, não se impõem mais por si mesmas.
Aceitação dos resultados da ciência Que os resultados das ciências não poderão mais impor-se de modo evidente e triunfante.
Ciência como a verdade Que as ciências não poderão mais constituir as verdades das sociedades atuais.
Virtudes da Ciência Que suas virtudes em nada são evidentes.
Significado da Ciência Que os pesquisadores precisam se interrogar sobre a significação da ciência que estão fazendo.
Utilização do conhecimento científico Que eles não poderão mais fazer abstração da maneira como o conjunto da pesquisa científica é institucionalizado, organizado, orientado, financiado e utilizado por terceiros.
Intencionalidade da produção cientifica Que o próprio trabalho científico está profundamente afetado pelas novas condições em que ele é realizado na sociedade industrial e tecnicizada.
Responsabilidade do pesquisador Que os pesquisadores devem se responsabilizar pelas consequências que suas descobertas poderão ter sobre a sociedade.
Consciência do papel da ciência Cientistas precisam toar consciência de que a ciência está cada vez mais integrada num processo social, industrial e político.

Fonte: Japiassu (1988, p.137). Elaborada pelo autor.

Pelo exposto no quadro 2, fica claro que a epistemologia crítica almeja problematizar o compromisso do cientista. E tais questionamentos surgiram quando a ciência foi considerada como uma entidade inquestionável e o homem da ciência transformou-se numa espécie de mago, detentor potencial de uma chave universal e, portanto, de um saber todo poderoso. (Prigogine e Stengers, 1991; Japiassu, 1988)

Se por muito tempo a ciência poderia resolver todos os males da sociedade, tal sentimento parece agora ter desaparecido, e alguns pensadores começaram a se interrogar se a ciência não estaria inserida nesses mesmos males (Japiassu, 1988). Como afirmam Prigogine e Stengers (1991), em cerca de 150 anos, de fonte de inspiração, a ciência se transformou em ameaça. Os autores ainda afirmam que “o homem da ciência, a exemplo do técnico, é a sede de uma vontade de poder disfarçada em apetite de saber; a sua aproximação das coisas é uma violência sistemática” (Prigogine e Stengers, 1991, p. 23)

Logo, a ciência deixa de ser entendida como o conhecimento genuíno e começa ser enxergada como um conhecimento majoritariamente tecnicizado, racionalizado e industrializado. Sendo este o panorama que deu início a uma série de questionamentos sobre as consequências do avançado desenvolvimento científico para a sociedade e o meio ambiente (Japiassu, 1988). Prigogine chama a atenção para o fato de que não somente as ideologias da ciência tradicional estão sendo questionadas, mas também todos os campos de conhecimento, como a economia, as ciências políticas e a sociologia (Prigogine, 2009).

Sendo um argumento recorrente contra a epistemologia crítica, cabe ressaltar que esta não tem a pretensão de se afirmar como supercrítica, rejeitando a especificidade da ciência e adotando-a com uma concepção completamente relativista ou "irracional”. O que a epistemologia crítica problematiza, na verdade, não é a inexistência da objetividade da ciência. A questão é que essa objetividade, sem suporte epistemológico, reforça as crenças ingênuas ligadas ao prestígio da ciência, prestígio esse que independe dos contextos da realidade e dos meios do conhecimento. Propõe-se então que a ciência seja deliberada segundo o valor social de seus resultados e consequências (Japiassu, 1988).

Nega-se também que a ciência deva ter a si mesma como fim, podendo prestar contas somente a ela mesma. Os cientistas não devem se limitar à desenfreada e desinteressada busca técnica por um saber cada vez maior e mais universal. É preciso que reflitam seus papéis de profissionais neutros e imparciais, onde não é de suas competências refletir sobre os aspectos relacionados à aplicação final de suas pesquisas (Japiassu, 1988). Prigogine e Stengers (1991, p. 33) corroboram com este posicionamento, alegando ser “difícil negar que fatores sociais e econômicos [...] tenham desempenhado um papel preponderante nas origens da ciência experimental”.

Assim, a epistemologia crítica almeja atestar que a falsa ideia de Ciência-Pura tem como consequência (direta ou indiretamente) a irresponsabilidade social dos cientistas, além de conceder ao Estado e às empresas a utilização da enganosa ideia de apolitismo da pesquisa científica.

Prigogine, um epistemológo?

Segundo Grayling (1996), epistemologia é o ramo da filosofia interessado na investigação da natureza, fontes e validade do conhecimento. E são exatamente estes os pontos filosóficos que Prigogine, tendo a termodinâmica como pano de fundo, discute em toda sua investigação teórica.

E assim como faz a epistemologia, Prigogine também procura estabelecer uma ponte entre a filosofia e a ciência. Para ele, a ciência nos dá uma ideia do universo onde nos encontramos, e a filosofia inicia sua discussão na problematização da posição que o homem ocupa no universo (Prigogine, 1997). Com isso, temos indícios para acreditar que a discussão de Prigogine tenha pertinência epistemológica.

Baseando-nos nas reflexões de Bunge (1980), que elencou premissas necessárias para que uma epistemologia seja considerada expressiva, fizemos uma checagem se Prigogine realmente comtempla os quesitos necessários para que sua obra seja tomada como um suporte epistemológico útil e relevante. Este levantamento pode ser conferido no Quadro 3 abaixo.

Para Bunge (1980), a epistemologia deve ter destaque no contexto científico por conseguir contribuir com este contexto de diversas formas. No Quadro 4 estão sumariadas estas contribuições para que possamos contestar se a obra de Prigogine realmente as comtempla.

Tomando como base as relações estabelecidas no quadro 3, as contribuições sumariadas no quadro 4 e tendo discorrido sobre o assunto durante todo este trabalho, concluímos que a obra prigoginiana é realmente relevante para o mundo epistêmico, mostrando-se, então, como um aparato que pode - e deve - ser utilizado nas discussões atuais que envolvem a construção e finalidade da ciência.

Quadro 3 Condições para uma epistemologia ser considerada relevante e as proposições teóricas de Prigogine. 

Premissas segundo Bunge (1980), Morrow e Brown (1994), Japiassu (1988) Proposições teóricas de Prigogine
Referir-se à ciência propriamente dita. Ainda que o que tema central das investigações de Prigogine seja a termodinâmica, ele a utiliza como pano de fundo para suas proposições filosóficas sobre a ciência como um todo. Caso semelhante ocorre com dois importantes epistemólogos: Fleck (2010), que utilizou a sífilis como suporte para as discussões filosóficas, e Lacey (2010), que fez o mesmo utilizando a temática transgênicos.
Ocupar-se de problemas filosóficos que se apresentam no curso da investigação científica ou na reflexão sobre os problemas, métodos e teorias da ciência. Prigogine (1991) ocupa-se de repensar os grandes princípios da física clássica, buscando uma nova relação que se estabelece entre a ordem e a desordem e trazendo a tona a discussão da redução da natureza a leis deterministas e da eliminação da seta do tempo.
Propor soluções claras para tais problemas, soluções consistentes em teorias rigorosas e inteligíveis, adequados à realidade da investigação científica. Prigogine (1991) propõe como solução um desprendimento dos pressupostos da ciência clássica, acreditando que estes nos impedem de ler o mundo de forma integral, e sugere uma nova forma de conexão entre os homens e a natureza, uma nova aliança. De uma forma geral, Prigogine aposta em uma nova leitura do ser humano, da natureza e de seu entrelaçamento, baseando-se na inserção da probabilidade e da irreversibilidade como pontos iniciais para explicar o mundo.
Ser capaz de distinguir a ciência autêntica da pseudociência. As discussões de Prigogine (1991) concentram esforços justamente em tentar mostrar que a ciência clássica, ao tentar ser inquestionável, adicionou traços de divindade a si própria. Ele tenta desmistificar essa leitura da ciência, sem pretender que ela não tenha racionalidade.

Referência: Elaborado pelo autor segundo Bunge (1980), Morrow e Brown (1994), Japiassu (1988) e Prigogine (1991).

Quadro 4 Contribuições que a epistemologia traz a ciência como um todo. 

Trazer à tona os pressupostos filosóficos (em particular semânticos, gnosiológicos e ontológicos) de planos, métodos, ou resultados de investigações científicas de atualidade.
Elucidar e sistematizar conceitos filosóficos, empregados em diversas ciências.
Ajudar a resolver problemas científico-filosóficos.
Reconstruir teorias científicas de maneira axiomática, pôr a descoberto seus pressupostos filosóficos.
Participar das discussões sobre a natureza e o valor da ciência pura e aplicada, ajudando a esclarecer as ideias a respeito.
Servir de modelo a outros ramos da filosofia, particularmente a ontologia e a ética.
E capaz de criticar programas e mesmo resultados errôneos, como conseguir novos enfoques promissores.

Referência: Bunge (1980), Morrow e Brown (1994), Japiassu (1988).

Num contexto mais amplo, a ordem e a desordem, conceitos marcadamente discorridos pela teoria prigoginiana, fazem parte do nosso universo e, portanto, devem fazer parte do universo epistêmico. E esse é outro elo inegável de aproximação entre Prigogine e a epistemologia. Uma vez que as teorias simplificadoras não mais conseguem explicar o real, é preciso buscar o movimento da razão dialógica, objetivando a reconstrução paradigmática o pensamento complexo.

Sendo justamente o pensamento complexo a especialidade de Prigogine, com a utilização de seus conceitos de fenômenos irreversíveis, estruturas dissipativas, flecha do tempo e o caos, ele pode contribuir substancialmente para resolver uma importante questão epistemológica que é a necessidade de combinar o simples e o complexo em um mesmo universo científico (Zambiasi, 2006).

O discurso de Prigigine e a epistemologia crítica

Entre o estabelecimento das perspectivas que ensaiamos na sessão 2 e uma teoria geral da sociedade, há uma grande distância, e assim como Prigogine deixa claro em sua obra, também não temos a intenção de tentar transpô-la. Por outro lado, a base da explicação teórica de Prigogine - a qual afirma que a presença de interações não lineares numa população determina a possibilidade de modos de evolução particulares - é uma verdade para todo nosso universo, seja qual for a população (Prigogine e Stengers, 1991).

Com respeito às ciências humanas, Prigogine, em alguns momentos, declara que ele não é um pesquisador com pertinência para discutir problemas sociais. Ele chega até a afirmar que “excede de longe a competência de um físico descrever a origem e variedade dos valores humanos” (Prigogine, 2005, p. 69).

Ainda assim, Prigogine acreditava que as suas reflexões pudessem ser “aproveitadas” em diversos sistemas complexos distintos dos das ciências da natureza. Prigogine chega, inclusive, a afirmar que suas construções teóricas pudessem ter um sentido também no estudo dos fenômenos sociais e em alguns trechos de sua obra, faz essa relação de forma direta, como pode ser visto no fragmento abaixo.

[...] é muito frequente a ideia de que foi de grupos restritos, excluídos e às vezes até, perseguidos pelo resto da sociedade, que vieram certas inovações que abalaram essa mesma sociedade: poder inovador de grupos minoritários caracterizados por uma situação marginal em relação aos circuitos dominantes. (Prigogine e Stengers, 1991, p. 132)

Na perspectiva prigoginiana, assim como todo sistema vivo, os sistemas sociais são naturalmente não-lineares e se encontram longe do equilíbrio - cada ação é, então, tomada como uma resposta devolutiva que pode ser positiva ou negativa. Com isso, não há dúvidas de que existem, no meio social, a auto-organização e as condições para o aparecimento de estruturas dissipativas (Prigogine, 2005).

Ao apreciar a obra de Prigogine, é comum, em diversos momentos, nos questionarmos se ele está falando somente do comportamento físico de um sistema, ou se suas reflexões se referem diretamente ao comportamento de uma sociedade. Observe, por exemplo, como as suas conclusões sobre nucleação parece tratar se também de uma revolução social diante de um momento de crise.

O problema da estabilidade em face desse tipo de mutação enuncia-se assim: os novos constituintes introduzidos em quantidade infinitesimal produzem, entre os constituintes do sistema, um novo conjunto de relações de transformação que entram em competição com o modo de funcionamento já estabelecido no seio desse sistema. Se, em relação a essa intrusão, as equações cinéticas do sistema são estáveis, o novo modo de funcionamento não poderá impor-se, e os “inovadores” que o introduziram e se reproduzem graças a ele não sobreviverão; se, pelo contrário, a flutuação é capaz de se impor, se a cinética que produz a multiplicação dos “inovadores” é rápida bastante para que estes, longe de serem destruídos, invadam o conjunto do sistema, atingindo uma concentração macroscópica, todo o sistema adotará um novo modo de funcionamento, e sua atividade será descrita por novas equações cinéticas.” (Prigogine e Stengers, 1991, p. 134)

De um modo geral, as interações descritas por Prigogine parecem ter uma ligação direta com a forma com que a sociedade se comporta perante as instabilidades. Ele inclusive faz questionamentos dentro de sua teoria que nos leva a relacionar diretamente o comportamento dos sistemas físicos com o dos sistemas sociais.

[...]que acontecimentos, que inovações ficarão sem consequências, quais os outros que são suscetíveis de afetar o regime global, de determinar irreversivelmente a escolha de uma evolução; quais as zonas de escolha, as zonas de estabilidade? E, na medida em que o tamanho, por exemplo, ou a densidade do sistema pode desempenhar o papel de parâmetro de bifurcação, como é que um crescimento puramente quantitativo pode abrir a possibilidade de escolhas qualitativamente novas? (Prigogine e Stengers, 1991, p. 140)

Até suas metáforas seguem esse perfil, como em “uma molécula isolada não é nem sólida nem liquida”, nos levando metaforicamente a relacionar a existência de uma única molécula com o que somos nós individualmente e em grupo (Prigogine, 2000).

Muito certamente essa forma de explicar o científico, evocando principalmente a ordem e a desordem, quase como se os objetos tivessem vida, parece ser uma maneira de Prigogine reafirmar, ainda que inconscientemente, sua escolha epistemológica. Escolha essa que cada vez mais acreditamos ter diversos objetivos em comum com a epistemologia crítica.

Encarando a ciência como uma prática cultural, Prigogine afirma que as problemáticas atuais não são problemáticas apenas cientificas, e que os valores em jogo não são todos de ordem científica (Prigogine e Stengers, 1991). Enquanto Einstein acredita que a ciência é o caminho para escapar das frustrações do mundo, Prigogine questiona se realmente ainda seria esse o papel da ciência (Prigogine, 2009).

Indo nesta mesma vertente, Japiassu, (1988) diz que a epistemologia crítica também se interroga se estaria hoje a ciência tentando compensar os sentimentos de impotência, de frustração e de ignorância do homem moderno. Já Giroux e Simon (2002, p. 119), ao debater a essência da epistemologia crítica, corroboram com Prigogine, levantando a mesma questão de maneira mais realista, “Existiria uma forma de ignorância produzida como defesa contra a desesperança?”.

Com pensamento bastante semelhante ao da epistemologia crítica, Prigogine enfatiza que não se pretende que a ciência tenha pertinência de decidir o futuro da liberdade do homem, porém ele tem certeza que “a ideia de uma natureza determinista e estéril, foi, por sua vez parte beneficiaria em certas concepções que se construíram em nossa cultura a proposito dessa liberdade” (Prigogine e Stengers, 1991). No ideário prigoginiano, reformular as tradicionais leis microscópicas é o caminho mais seguro para que se descontrua a imagem contraditória de universo que temos hoje. E é nesta direção que haveria, em um mesmo espaço, lugar para a matéria, para a vida e para o homem (Prigogine, 1996a).

Para Prigogine, é dever de o homem assegurar sua permanência no futuro, ainda que carregue consigo os seus problemas, as suas dores e as suas alegrias (Prigogine, 2000). Indo nesta direção, segundo Prigogine (1997), pensar o incerto é, também, ter consciência da condição humana com seu ambíguo aspecto de liberdade e aflição. Ele afirma que pensar o incerto, também implica em acentuar o irracional e, desta forma, progredir (Prigogine, 1996a). E não há como desvincular Prigogine do compromisso da epistemologia crítica, quando este utiliza com veracidade em seu discurso os termos: dignidade, liberdade e escolha.

E verdade que pensar o incerto exige mais esforço. É menos confortável. É mais preferível refugiar-se no dogmatismo, religioso ou de outra espécie. O dogmatismo extirpa do homem a dignidade. A dignidade humana reside na liberdade, na possibilidade de escolha e progresso. (Prigogine, 2009, p. 41)

Prigogine afirma que o compromisso é árduo, mas o ser humano precisa encontrar o bom senso entre a globalização e a preservação do pluralismo cultural, entre a violência e a política, entre a cultura da guerra e a cultura da razão (Prigogine, 2000). É importante ressaltar que este equilíbrio é um dos pressupostos da teoria crítica, posicionando, mais uma vez, Prigogine dentro do universo crítico.

Sendo um dos maiores propagadores das ciências da complexidade, linha inclusive concordante com a perspectiva da epistemologia crítica, Prigogine não só tem o pensamento concordante com o posicionamento epistemológico crítico, como também pode contribuir efetivamente com essa perspectiva.

Prigogine enxerga as ciências da complexidade como potencialmente capazes de consolidar uma democracia linguística universal. Ainda que o mundo atual seja dominado pela excelência da tecnociência, Prigogine, com sua percepção otimista, acredita na possibilidade de preservação dos benefícios civilizatórios, na extinção dos mimetismos da violência e no fim da acidez das desigualdades (Almeida & Carvalho, 2009).

Ao se direcionar as futuras gerações, Prigogine afirma que seus argumentos têm como objetivo o combate aos sentimentos de resignação ou de impotência. que as ciências da complexidade, ainda que recentes, negam o determinismo e perseveram na criatividade nos mais variados níveis da natureza. Nas palavras do próprio Prigogine, “o mundo está em construção e todos podemos participar dela”, em outras palavras, “o futuro não está dado”. (Prigogine, 2000, p. 5)

Assim como os pensadores críticos mostram pitadas de otimismo, Prigogine também o faz. Em sua concepção, ainda que não ideais, é perceptível a redução do eurocentrismo na produção cultural; uma menor distinção intelectual entre os povos “civilizados” e os “não-civilizados” e a diminuição da distância entre as classes sociais (pelo menos nos países ocidentais). Para Prigogine, a ciência contribuiu e contribui para esta evolução, pois ela une os povos, criando uma linguagem universal (Prigogine, 2000).

Prigogine inclusive advoga a favor da necessidade da criticidade, salientando que a gestão das nossas sociedades depende cada vez mais de um bom uso da ciência e da técnica (Prigogine e Stengers, 1991). Neste sentido, a formulação da ciência proposta por Prigogine ultrapassa o ponto de vista eurocêntrico e oferece uma nova leitura, mais universal e aceitável para as outras culturas, sendo a probabilidade e a irreversibilidade agora atreladas à uma visão menos pessimista não só da natureza, mas também do significado do homem no universo (Prigogine, 2009).

Almeida e Carvalho (2009) afirmam que através das ideias prigoginianas é possível a pratica de um humanismo universal e a consolidação de uma liberdade realmente autônoma, culminando na concretização da democracia planetária.

O constructo teórico de Prigogine pode ser aplicado inclusive neste momento tão delicado e assombroso que estamos vivendo: a pandemia do vírus COVID-19 (popularizado como coronavirus). Neste contexto, a propagação desse vírus pelo mundo parece ser uma flutuação bastante forte. Qual será a bifurcação seguida? O mundo será mesmo depois disso? Esse pensamento é recorrente. Mas o que temos até agora, enquanto escrevo estas palavras, são apenas as incertezas!

Convergências

Nesta sessão serão discutidos os pontos de convergência entre os pressupostos da epistemologia crítica e a obra de Prigogine. Para isto, realizamos a análise de conteúdo segundo a metodologia de Bardin (1977), de onde revelaram-se as seguintes categorias: o conhecimento, o histórico, a natureza, a utilização e as exatas versus as humanas. Todas essas categorias serão dialogadas a seguir.

1. O conhecimento

Prigogine (2005) afirma que na ciência clássica as leis da natureza são determinísticas e reversíveis no tempo. Com isso, o passado e futuro passaram a possuir o mesmo significado e foi neste contexto que a ciência começou a ser referida como certeza, como a verdade.

Já hoje, vivemos num período de profundo questionamento dos conhecimentos científicos validados pela visão colonial e eurocêntrica. Acontecem crises de paradigmas em todas as áreas, uma verdadeira crise epistêmica que gera incertezas nos mais variados campos (Elías e Carranza, 2012). A epistemologia crítica considera que essa crise epistêmica teve início quando a próprio discurso científico dominante considerou a existência de objetos como independentes do sujeito, tomando o tempo e o espaço como propriedades desconexas da construção social do sujeito (Elías e Carranza, 2012).

Para Prigogine, a ciência explica hoje o mundo como se os fenômenos acontecessem e pudessem ser explicados de forma totalmente precisa, como se o universo fosse um motor que funcionasse de modo ideal (Almeida & Carvalho, 2009).

A teoria crítica justamente questiona esse conhecimento científico tomado como linear, causal, mecanicista e determinista. E ao contrário disso, ela considera os conhecimentos como patrimônio próprio da humanidade, indicando que estes conhecimentos são reconstruídos e não reproduzidos, que eles devem ser debatidos e não engolidos (Zambiasi, 2006). Deste modo, o método dialético utilizado pela Epistemologia Crítica preconiza que o conhecimento da matéria jamais é definitivo, absoluto ou total (Calvez, 1959).

Ao admitir o conhecimento humano como um constructo histórico-social desenvolvido coletivamente, a epistemologia crítica, ainda que reconheça as diferenças individuais, tem o coletivo como foco da construção do conhecimento. Faria (2015) explica a lógica que leva a epistemologia crítica a tomar esse posicionamento.

[...] a condição de construção do conhecimento individual pertence, obviamente, ao indivíduo em sua interação com o meio físico (material) e social (das relações entre os sujeitos) e em sua capacidade de construção da lógica abstrata. Sem esta interação não há possibilidade de construção do conhecimento e da lógica. Mas o conhecimento individual pertence ao conhecimento coletivo, não apenas porque é elaborado em uma condição histórica e social, mas igualmente porque o limite dado do conhecimento individual (que pode, é e deve ser ultrapassado) é exatamente o conhecimento coletivamente construído, ainda que parte do mesmo não esteja disponível de forma organizada e sistematizada (Faria, 2015, p. 23)

Indo em uma direção mais política, a epistemologia crítica compreende a construção do conhecimento como um processo focado na recuperação das perspectivas históricas levantadas pelos desfavorecidos, por suas demandas no presente e suas expectativas para o futuro (Elías e Carranza, 2012).

Para Prigogine (1991), o conhecimento implica em uma conexão entre passado e futuro, entre o que se conhece e o que se é conhecido, isto é, a realidade do devir é condição indispensável para que essa interlocução ocorra. Desta forma, as leis da natureza assumem uma nova interpretação: não mais versam sobre certezas, mas sim sobre possibilidades, ou seja, admitem o devir e não somente o ser.

A ciência anunciada por Prigogine pretende exibir o elo entre a ciência do ser e a ciência do devir. Ainda que tecnicamente seja um pesquisador exato, Prigogine externa que mesmo “sem estabelecer limites, prefiro pensar que o universo é um devir, assim como a natureza e o homem.” (Prigogine, 1996b, p. 14).

Corroborando com o posicionamento de Prigogine, Japiassu (1988, p. 27), afirma que “nosso conhecimento se apresenta em devir” e que “a tarefa da epistemologia consiste em conhecer este devir e em analisar as etapas de sua estruturação, chegando sempre a um conhecimento provisório, jamais acabado ou definitivo”.

É preciso reanalisar a ideia reduzida e abstrata da ciência. A própria história já nos mostrou que não existe uma ciência abstrata e impessoal, e sim sujeitos que elaboram e implantam determinadas formas de racionalidade (Zambiasi, 2006).

A perspectiva Crítica, diferentemente do que faz a racionalidade iluminista, não erradica a razão, porém manifesta que a racionalidade deve ter a consciência crítica de que ciência e teoria são construídas no enredo de uma história, sendo determinadas pelo social (Zambiasi, 2006).

Indo nesta direção, Prigogine atenta que a razão pode também levar à alienação ou à rejeição do que dá sentido e valor a vida - é necessária a criação de uma nova coerência que incorpore a ciência, mas que não a desprenda dos valores humanos (Prigogine, 2000).

2. O histórico

Zambiasi (2006, p. 151) afirma que ao problematizar a ciência (tomá-la epistemologicamente), ganha relevância a concepção de historicidade e propõe então que “o conhecimento científico seja concebido como um modo de conhecimento muito particular marcado pela historicidade”. Com isso, uma das propostas da epistemologia crítica acaba sendo o restabelecimento e a incorporação dos sujeitos da história.

Qualquer conhecimento é histórico e só pode ser compreendido na história, através dela, e em relação ao seu processo. A ciência é histórica e, portanto, construída. E essa a concepção que é preciso considerar numa epistemologia crítica, numa visão construtivista de ciência. (Zambiasi, 2006, p. 157)

Segundo Prigogine, a história é uma sucessão de bifurcações. (Prigogine, 2000), onde as bifurcações são, ao mesmo tempo, indicações de instabilidade e de vitalidade de uma sociedade, e ainda complementa que “as leis da natureza descrevem um mundo que exige ser compreendido num modo histórico e não dedutivo” (Prigogine, 1996b, p. 17).

Quando questionado sobre o que o levou a refletir sobre as questões próprias de um filósofo, Prigogine disse que a história do pensamento sempre o apaixonou e afirmou que sua intenção é a unificação do tempo dos filósofos e dos físicos (Prigogine, 1997). Prigogine ainda argumenta que enquanto alguns tomam essa história como nossa maldição, ele a enxerga como a nossa esperança. Porém ele pondera: “se a história é nossa esperança, a palavra história comporta igualmente partes de incerteza” (Prigogine, 2009, p. 38).

Prigogine, mais uma vez provando que sua teoria tem pertinência social, incluiu as equações de movimento à percepção histórica que os sujeitos possuem.

Dado que o caos existente na dinâmica é, na verdade, um fenômeno inesperado (as equações de movimento são deterministicas, enquanto que seus resultados são aleatórios), temos que esperar a instabilidade em sistemas sociais porque as decisões não podem ser associadas a nenhuma regra determinística. Cada decisão implica a lembrança do passado e a antecipação do futuro. (Prigogine, 2005, p. 68).

Assim como Prigogine, a epistemologia contemporânea também concebe a ciência marcada pela historicidade, pela construção social e pelos mais variados interesses (Zambiasi, 2006). A teoria crítica dá importante atenção ao contexto dos indivíduos investigados; isso porque o cenário econômico, político e social, influenciam diretamente os aspectos analisados pela corrente crítica, apresentados no Quadro 1 (Fui, Khin e Ying, 2011).

Indo nesta direção, Prigogine (1991) defende que o discurso científico e o discurso social, não mais se desvinculem.

Tal como as ciências da sociedade, as ciências da natureza não poderão mais, agora, esquecer o enraizamento social e histórico que a familiaridade necessária à modelagem teórica de uma situação concreta supõe. Importa, portanto, mais que nunca não fazer desse enraizamento um obstáculo, não concluir da relatividade dos nossos conhecimentos por um relativismo desencantado qualquer. (Prigogine e Stengers, 1991, p. 215)

Cabe ressaltar que o curso de construção da sociedade humana não é dado de forma linear ou mecânica, ao contrário, essa construção se dá maneira dialética, repleta de contradições, antagonismos e conflitos (Zambiasi, 2006). Neste contexto, Prigogine (2009) afirma que o futuro é incerto porque é aberto e que cabe a nós refletir a melhor maneira de realizar o futuro, a fim de que ele coincida com a ideia que fazemos de progresso.

Na perspectiva da epistemologia crítica, a totalidade não é considerada como o conhecimento total e completo de um objeto, com isso, o caráter específico da contradição não é absoluto e não pode ser compreendido se separado da totalidade (Faria, 2015). Desta forma, Prigogine também se recusa à fragmentação do objeto.

Prigogine afirma que a flecha do tempo se manifesta, ainda que de diferentes formas, em todos os níveis, desde a cosmologia às culturas humanas. A história da cosmologia, a história da natureza, a história da vida, da matéria e das sociedades humanas são histórias que se ligam umas às outras (Prigogine, 2005).

Na verdade, após várias décadas de trabalho, penso que essa é a mensagem essencial que desejo transmitir. A ciência se orienta hoje por meio de leis que não são nem deterministas nem reversíveis no tempo, nas quais a realidade não é nunca inteiramente dada, mas se encontra em criação e construção. Essa mensagem reitera a realidade da história, a flecha do tempo. (Prigogine, 2009, p. 38)

Segundo Morin (2000), o entendimento de ordem e desordem (conceitos extraídos da obra prigoginiana) se fixou, trazendo consigo que a história do universo é um formidável empreendimento criativo e destrutivo, que confere organização e também desorganização. Entendendo-a como transitória, a verdade se apresenta como válida porque ela é histórica (Zambiasi, 2006).

3. Natureza

A principal conjectura da globalidade da história humana é o vinculo dos homens entre si e o dos homens com a natureza, que, através do trabalho, conseguem produzir os meios necessários para garantir a sua sobrevivência (Zambiasi, 2006).

Para Zambiase (2006, p. 152), “a teoria crítica apresenta o conhecimento como uma construção histórica que serve de mediação na relação direta homem-natureza”. O universo é agora admitido como fragmentado, repleto de heterogeneidades qualitativas e a natureza se apresenta de maneira complexa e múltipla. Não são mais os fenômenos imutáveis que chamam a atenção, mas sim as instabilidades (Zambiasi, 2006). Prigogine corrobora com o exposto afirmando que as leis da natureza não mais se referem a certezas e sim a possibilidades (Prigogine, 2009).

Prigogine acredita que a ciência somente terá uma abertura universal “no momento em que for, finalmente, capaz de um diálogo com a natureza, da qual saberá apreciar os múltiplos encantos, e, com os homens de todas as culturas, cujas questões ela saberá no futuro respeitar” (Prigogine e Stengers, 1991). E assim como Prigogine evoca a natureza para uma nova aliança entre esta e os homens, Moreira e Silva (2002) também evocam a natureza para justificar a necessidade da epistemologia crítica.

Tratava-se de reconceituar o campo. Enfatizando que a compreensão da natureza é mediatizada pela cultura, o grupo concebia reconceituação como o esforço por desvelar a tensão entre natura e cultura, por descobrir as partes da cultura não guiadas pelas leis da natureza, assim como as partes da natureza que não eram necessariamente obstáculos à ação humana, mas sim produtos do que os homens fizeram e que poderiam, portanto, desfazer. Moreira e Silva (2002, p. 15)

Prigogine (1991) atesta que a ciência moderna foi um sucesso inquestionável no que tange ao avanço tecnológico, mas que seus logros foram catastróficos no tange ao homem e à natureza. E ainda afirma que, tendo negligenciado um diálogo profundo com a natureza, existe um preço a se pagar pela ciência que está sendo praticada. Japiassu (1988), expõe a relação da natureza, ciência, cultura e dominação, indo na mesma direção de Prigogine.

Em virtude de seu próprio método e de seus conceitos, a ciência projetou um mundo no interior do qual a dominação sobre a natureza converteu-se também em dominação sobre o próprio homem. E na medida em que a transformação da natureza implica na dominação do homem, o a priori da tecnologia não pode deixar de ser "político", uma vez que ela se torna a forma universal da produção material, define uma cultura e projeta, assim, um "mundo" inteiramente diferente. (Japiassu, 1988, p. 153)

Prigogine assegura que a compreensão da natureza em seu sentido phisis nos possibilita compreender a complexidade que as ciências da sociedade trazem. Ele atesta que a partir do momento em que aprendemos o “respeito” que a teoria física nos impõe para com a natureza, aprendemos igualmente a respeitar as demais abordagens intelectuais, quer sejam as tradicionais quer sejam as criadas pelas outras ciências (Prigogine e Stengers, 1991).

Na perspectiva prigoginiana, assim como para os materialistas dialéticos, concebe-se uma natureza capaz de história. Prigogine inclusive relata em sua obra que suas proposições parecem ter um mesmo posicionamento que as do materialismo histórico dialético, onde, para ambos, compreender a natureza é compreendê-la capaz de produzir os homens e suas sociedades (Prigogine e Stengers, 1991).

Desta forma, Prigogine qualifica a natureza como histórica, capaz de desenvolvimento e de inovação, mas ele também afirma que essa ideia de uma história da natureza já foi discutida há muito tempo por Marx e Engels durante a estruturação da fundamentação materialista. (Prigogine e Stengers, 1991)

4. Quando utilizada

A ciência é hoje uma das diversas práticas sociais e por isso ela influencia e é influenciada pelas ambiguidades e contradições da sociedade na qual está inserida. Tão relevante é a posição que a ciência ocupa na modernidade que ela acaba se tornando uma das mais influentes atividades humanas, chegando ao ponto de consubstanciar-se como umas das características inerentes a existência do homem moderno (Japiassu, 1988).

Para Prigogine a descrição da atividade cientifica não pode, sem violência, ser separada do mundo a qual pertence, desta forma, os problemas que marcam uma cultura têm influência sobre o conteúdo e o desenvolvimento das teorias científicas (Prigogine e Stengers, 1991).

Prigogine afirma que o mundo tem sido compreendido como um autômato que se conduz por leis deterministas onde tudo é predeterminado. Nós, seres humanos, nesta perspectiva, somos apenas telespectadores de um filme que já foi produzido (Prigogine, 1996a). Nesta perspectiva, os únicos que tem spoilers confiáveis são os cientistas, assumindo então posição de destaque.

Conforme aponta Japiassu (1988), o cientista “é uma espécie de iceberg do saber flutuando sobre o oceano de nossas ignorâncias e incertezas”, assim sendo, com a sua posição privilegiada, cria-se a ideia de que ninguém pode contestar o trabalho do cientista.

Prigogine diz que precisamos de uma ciência que “não seja nem um simples instrumento submetido à prioridades que lhe seriam exteriores, nem um corpo estranho que se desenvolveria no seio de uma sociedade-substrato sem quaisquer contas a prestar” (Prigogine e Stengers, 1991, p. 14). Porém, o que se observa hoje é que tanto o cientista quanto a ciência abandonaram seus roteiros de ficção neutra. E agora estão nitidamente atrelados ou ao sistema de financiamento ou a algum poder político. Desta forma, não se pratica a independência da produção cientifica, ou seja, não existe a tal propagada neutralidade cientifica (Japiassu, 1988).

Prigogine lembra que em um mundo em que existe a informação e a desinformação, para conseguir diferenciá-las é preciso cada vez mais conhecimentos e senso crítico (Prigogine, 2000). Mas que fique claro, o ideário da epistemologia crítica não rejeita a ideia de que a ciência possa ser objetiva, porém ela adverte que a ciência, ao fornecer suas verdades, não é totalmente independente do contexto daqueles que a produzem. Neste sentido, faz-se necessário que os cientistas se apropriem dos objetivos reais de suas pesquisas, de modo que o seu fazer científico considere a sua significação final (Japiassu, 1988).

Ao se desvincular da ciência positiva - que se apresenta como isenta e neutra a qualquer interesse - e começar a refletir a ciência de forma crítica, o pesquisador conseguirá refletir sobre as conexões que essa ciência, que ele produz, tem com a sociedade. Realizar esta reflexão faria com que a comunidade cientifica reconsiderasse seus descompromissos tradicionais, logo, preocupando-se com o destino de suas descobertas e invenções. (Japiassu, 1988)

Assim como faz a epistemologia crítica, Prigogine também problematiza a máxima de que a ciência é neutra e nos leva a refletir na impossibilidade de neutralidade total quando a ciência explora a questão de nossa própria existência no interior da natureza. Seguindo o caminho que a ciência tem percorrido, o único sentimento possível em relação ao mundo que nos rodeia é de alienação (Prigogine, 1996b).

Como alega Prigogine, “tornou-se urgente estudar as diversas modalidades de integração das atividades cientificas na sociedade, as quais fazem com que ela seja pouco ou muito finalizada, que ela não fique indiferente às necessidades e às exigências coletivas.” (Prigogine e Stengers, 1991, p. 13) Em síntese, já não é mais aceitável que o cientista desvincule sua produção da posterior aplicação.

Por outro lado, quando os investigadores adotam a epistemologia crítica, eles adotam um movimento de desconstrução/construção e desarticulação/articulação que almeja a superação do conhecimento usual. Os defensores da epistemologia crítica fomentam o questionamento da existência de uma postura neutra, principalmente quando é exigido um posicionamento comprometido com o sujeito histórico (Elías e Carranza, 2012).

O cientista realmente pratica a epistemologia crítica quando ele orienta seus esforços para destramar o papel que sua atividade científica tem para com o meio sócio-cultural. Assumir essa perspectiva epistemológica faz com que o cientista negue a máxima do "saber desinteressado”. Ou seja, o que a epistemologia crítica questiona é se a investigação cientifica tem a transparência e a objetividade incontestáveis que lhe são atribuídas (Japiassu, 1988).

“Como podemos ficar indiferentes aos problemas que envolvem nossa existência? Como podemos evitar de vê-los simultaneamente com o olhar da razão e o olhar da paixão?” são questões levantadas por Prigogine aos que trabalham diretamente com a ciência (Prigogine, 1994). Por isso não é possível dizer que o cientista não acrescenta à atividade científica algum valor de ordem ideológica. É preciso deixar claro que a epistemologia crítica também não repudia a possibilidade de o cientista ser objetivo, porém faz a ressalva que ao descobrir suas verdades, ele pode abstrair-se somente até certo ponto de subjetividade, de suas paixões e de seus preconceitos (Japiassu, 1988).

Não somente o cientista não pode conhecer as coisas em si, mas as questões que pode pôr não tem qualquer pertinência para os verdadeiros problemas da humanidade; nem a beleza, nem a liberdade, nem a ética são objetos do conhecimento positivo e, portanto, de ciência: eles pertencem ao mundo numenal, domínio da filosofia, totalmente estranho ao mundo fenomenal. (Prigogine e Stengers, 1991, p. 70)

Prigogine diz que a sua é esperança é de que possamos construir um mundo que apresente menos desigualdades, menos violência e que preserve os benefícios advindos da ciência. Porém ele deixa claro que seu otimismo não está baseado apenas no potencial da ciência, mas sim ao processo de civilização e melhorias na comunicação (Prigogine, 2009).

Apesar de enxergar avanços, Prigogine atesta que estamos muito longe de nosso ideal, uma vez que os benefícios das ciências ainda hoje permanecem elitizados a apenas uma parcela da população (Prigogine, 1996a). O que Prigogine e a epistemologia defendem é que, nas palavras de Tesser (1995, p. 98), “a ciência utilizada sem consciência torna-se a ruína da alma”.

5. Exatas X Humanas

Com o advento industrialização em grandes proporções, o fazer cientifica ressignificou tanto a sua escala quanto a sua natureza; assim a era da ciência acadêmica autónoma e livre, foi aos poucos sendo substituída pela ciência totalmente quantitativa (Japiassu, 1988). Explicita-se, então, a barreira cultural, exibida na segregação entre as ciências humanas e a cultura das ciências. As ciências humanas acabam distanciando-se dos feitos científicos que deveriam ser o combustível de suas interrogações, e a cultura das ciências mostra-se incapaz de refletir sobre as problemáticas sociais (Zambiasi, 2006).

Declaradamente contra esta ideia, uma das bandeiras de Prigogine é a negação da ruptura que é construída entre a cultura cientifica e a cultura das humanidades. O autor atenta que o pensamento ocidental, junto a sua ideia de um mundo autômato conduzido por Deus, tem caráter nocivo para a compreensão do mundo que realmente existe (Almeida & Carvalho, 2009).

Prigogine afirma que é inegável a busca da ciência pela certeza, mas alertou que durante muito tempo (ou talvez até hoje), também no contexto das ciências sociais, “o progresso deveria se traduzir por uma aplicação das leis cientificas à sociedade”. Com isso, as ciências humanas, caso objetivassem alcançar a certeza, deveriam seguir o modelo proposto pela física (Prigogine, 1996b).

Segundo Prigogine, a visão marcadamente pessimista da existência humana da física clássica, legitimada por Einstein, foi a grande responsável pelo já tradicional embate entre o conhecimento objetivo e o conhecimento subjetivo (Prigogine, 1996b). Prigogine afirma também que Einsten conseguiu alcançar a vocação maior da física clássica: validar o conhecimento somente quando ele retira do conceito de mundo tudo que possa ter o menor traço da subjetividade humana (Prigogine, 1994). Porém, Prigogine é categórico ao nos advertir:

Devemos aprender, não mais julgar a população dos saberes, das práticas, das culturas produzidas pelas sociedades humanas, mas a cruzá-los, a estabelecer entre eles comunicações inéditas que nos coloquem em condições de fazer face às exigências sem precedentes da nossa época. (Prigogine e Stengers, 1991, p. 225)

É preciso entender que as novas necessidades impuseram novas dinâmicas de organização do trabalho científico e acadêmico; a exigência da leitura dos objetos sob outro ângulo está cada vez mais evidente (Elías e Carranza, 2012). Nas palavras de Prigogine, “a ciência de hoje não pode mais dar-se o direito de negar a pertinência e o interesse de outros pontos de vista e, em particular, de recusar compreender os das ciências humanas, da filosofia e da arte” (Prigogine e Stengers, 1991, p. 41).

A verdade é que a ciência tem sido encarada hoje praticamente como uma religião e a linguagem desta nova religião apresenta-se bastante enigmática e ininteligível, chegando quase a ser um dialeto para o restante da população (Japiassu, 1988). “É anunciada uma realidade “distinta”, uma ciência cheia de mistérios, reservada aos iniciados e que reata com as práticas esotéricas dos alquimistas, taumaturgos e outros mágicos” (Prigogine e Stengers, 1991). Prigogine (2009) mostra que essa visão da ciência sendo quase como um credo para a população também tem raízes na ciência clássica.

O modelo para as ciências era a física newtoniana que concebe o mundo numa simetria completa entre o passado e o futuro. Tratava-se de uma visão quase teológica: tal como Deus, não precisávamos distinguir entre passado e futuro e, também como ele, poderíamos atingir certezas. (Prigogine, 2009, p. 67).

Esta religião, a ciência, toma como válido e verdadeiro apenas o conhecimento cientificamente comprovado - isto é, aquilo que pode ser expresso quantitativamente, podendo ser formalizado ou ser reproduzido em condições de laboratório. O conhecimento que não satisfizer a essas condições deverá ser tomado como falso, irreal ou simplesmente subjetivo (Japiassu, 1988).

Em outras palavras, o conhecimento que é tomado como verdadeiro é aquele que tem aplicação universal, tendo pertinência para os mais diversos tempos e lugares e para qualquer pessoa, independente do contexto que esta se insere.

Adotar essa perspectiva implica assumir que tudo que não pertence ao mundo das ciências naturais, deve ser desconsiderado como conhecimento verdadeiro, pois só poderia ter status de objeto de conhecimento, aquilo que possibilite sua repetição em condições de verificação experimental e o que é validado de outra maneira, não possui significação cognitiva (Japiassu, 1988).

Segundo Prigogine, o que diferencia os sistemas físicos dos sistemas sociais é a capacidade de tomada de decisão que o ser humano tem, com isso, não há como tratar o humano como exato, o máximo que pode ser feito é uma descrição estatística da evolução social. E o interessante é que agora essa evolução se mostra entrelaçada com as leis básicas da natureza e isso quer dizer que não há mais um oceano de distância entre as ciências exatas e as ciências da sociedade ou como são vulgarmente diferenciadas, entre as ciências das certezas e as ciências possibilidades (Prigogine, 2005).

Nesta esfera, (Prigogine, 1994, p.35) provoca: “Qual o papel do homem? Retirar-se desde mundo, ou participar na construção de um mundo melhor?”. Com isso, Prigogine reflete sobre como a ciência, que se iniciou sobre o signo da afirmação prometeica do poder da razão, acabou tornando-se a própria alienação humana. É neste cenário, questionando qual é verdadeiro papel das ciências, que ganha pertinência a epistemologia crítica para a sociedade (Japiassu, 1988).

Considerações finais

Esta investigação propôs-se a desvelar a orientação epistemológica da obra do filosofo e físico químico Ilya Prigogine, um dos principais representantes das ciências da complexidade. A intenção foi confrontar a obra prigoginiana com a epistemologia crítica, buscando conversões entre elas que permitam que a obra prigoginiana seja utilizada como referencial teórico em trabalhos com vertentes progressistas.

Primeiramente, a obra prigoginiana mostra que tem cunho epistemológico, em seu sentido mais amplo, ao discutir questões como: propósito da ciência, racionalidade cientifica, positivismo, interesses implícitos no conhecimento científico e relação filosofia-ciências.

No que tange ao viés epistemológico especificamente crítico, a análise de conteúdo revelou que existem sérias convergências entre Prigogine e a Epistemologia Crítica, principalmente ao que concerne as categorias: conhecimento, história, natureza, utilização e exatas x humanas.

Sendo os próprios sujeitos quem elaboram e implantam determinadas formas de racionalidade, tanto Prigogine quanto a epistemologia crítica negam o conhecimento científico como entidade abstrata e impessoal e concordam que o conhecimento científico deve ocupar-se das possibilidades e não mais das certezas.

História é um elemento bastante discutido nas reflexões filosóficas de Prigogine e também da epistemologia crítica e ambos partilham que existe a necessidade do restabelecimento e da incorporação dos sujeitos da história na formulação e execução do plano científico. Tal posicionamento se dá por acreditarem que a ciência seja marcada não somente pela construção social e pelos mais variados interesses, mas principalmente pela historicidade.

A epistemologia crítica e o referencial prigoginiano alegam que a ciência moderna obteve bastante sucesso nas questões tecnológicas, mas que, em contra partida, as consequências desse avanço foram desastrosas para a relação homem-natureza. Concordam entre si também ao dizer que, diferentemente do que faz a ciência clássica, a natureza deve ser analisada da maneira como ela realmente é, complexa e múltipla.

Outro ponto de concordância é que a atividade cientifica não pode, sem graves prejuízos sociais, ser segregada do mundo a qual pertence. O que a epistemologia crítica e Prigogine empreendem é provar que os cientistas devem estar efetivamente conscientes das variadas implicações que seus produtos intelectuais podem trazer, quer sejam boas ou ruins. Buscam, desta forma, conduzir os investigadores para o entendimento de sua responsabilidade social e da impossibilidade de neutralidade total no meio científico.

Outro posicionamento que tanto Prigogine, quanto a Epistemologia Crítica deixam bem claro em suas arguições é que não deve existir predileção, embate e nem limiar de utilização no que se refere às ciências exatas e às ciências humanas. Segundo os mesmos, a ciência não pode mais dar-se o direito de negar a pertinência e o interesse de outros pontos de vista, principalmente os das ciências humanas, da filosofia e da arte.

Baseando-nos nas discussões aqui desenvolvidas, percebe-se que os argumentos apresentados por Prigogine são, de fato, muito semelhantes aos que são propostos pela epistemologia crítica. Com isso e por fim, a nossa conclusão é que o entrelaçamento entre Prigogine e a epistemologia crítica é forte o suficiente para posicioná-lo como epistemólogo com vertente crítica.

Esta investigação mostra sua pertinência ao construir um arcabouço teórico que pode valer-se para justificar a utilização das ideias prigoginianas, com mais propriedade e veracidade, em trabalhos de orientação epistemológica progressista. Tratando-se de uma pesquisa exploratória, esta pesquisa também abre espaço para que novas pesquisas sobre o posicionamento epistemológico de Prigogine sejam desenvolvidas.

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Recebido: 13 de Abril de 2020; Aceito: 22 de Setembro de 2021

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