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Educação e Filosofia

versão impressa ISSN 0102-6801versão On-line ISSN 1982-596X

Educação e Filosofia vol.36 no.77 Uberlândia maio/ago 2022  Epub 29-Jan-2024

https://doi.org/10.14393/revedfil.v36n77a2022-64947 

Artigos

Discursos sobre ensino de Filosofia no currículo do Ensino Médio: defesa de um problema, concepção curricular e afirmação de uma prática*

Discourse on philosophy teaching in the high school curriculum: defense of a problem, curricular conception and affirmation of a practice

Discursos sobre la enseñanza de la filosofía en el currículo de enseñanza media: defensa de un problema, concepción curricular y afirmación de una práctica

Kleber Santos Chaves** 
lattes: 7842988511765847; http://orcid.org/0000-0002-8005-1865

Benedito Gonçalves Eugênio*** 
lattes: 1274035318009124; http://orcid.org/0000-0002-5781-764X

**Mestre e doutorando pelo Programa de Pós-graduação em Ensino da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (PPGEn/UESB). E-mail: kleber.ksc2@gmail.com

***Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Professor Titular da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). E-mail: benedito.eugenio@uesb.edu.br


Resumo

Neste artigo apresentamos parte dos resultados de uma pesquisa qualitativa e de revisão bibliográfica, cujo problema envolve os sentidos de ensino de Filosofia no currículo para o ensino médio no período de 2009 a 2019. Assim, objetivamos investigar os discursos sobre o ensino de Filosofia no ensino médio, presentes na produção acadêmica dos autores mais recorrentes do campo teórico. Para tanto, aportamo-nos na Teoria do Discurso de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, cuja potência teórica, já afirmada em importantes trabalhos do campo educacional, permitiu-nos identificar o problema do não reconhecimento do ensino de Filosofia como um ponto-nodal que une uma parte da comunidade acadêmica de Filosofia na afirmação antagônica de que tal ensino deve, sim, compor o currículo do nível médio brasileiro.

Palavras-chave: Filosofia; Ensino de Filosofia; Currículo; Ensino médio; Teoria do Discurso

Abstract

In this article we present part of the results of a research of qualitative nature and bibliographic cut whose problem involves the meanings of Philosophy teaching in the curriculum for high school in the period from 2009 to 2019. Thus, we aim to investigate the discourses on teaching Philosophy in high school present in the academic production of the most recurrent authors in the theoretical field. To this end, we focus on the Discourse Theory of Ernesto Laclau and Chantal Mouffe, whose theoretical potency, already affirmed in important works in the educational field, allowed us to identify the problem of the non-recognition of philosophy teaching as a nodal point that unites a part of the academic philosophy community in the antagonistic claim that such teaching should be part of the Brazilian high school curriculum.

Key-words: Philosophy; Philosophy teaching; Curriculum; High school; Discourse Theory

Resumen

En este artículo presentamos parte de los resultados de una investigación cualitativa y revisión bibliográfica, cuyo problema involucra los significados de la enseñanza de la Filosofía en el currículo para la escuela secundaria en el período de 2009 a 2019. Así, nos propusimos investigar los discursos sobre la enseñanza de la Filosofía en la escuela secundaria, presentes en la producción académica de los autores más recurrentes en el campo teórico. Para ello, hemos estado en la Teoría del Discurso de Ernesto Laclau y Chantal Mouffe, cuyo poder teórico, ya afirmado en importantes trabajos del campo educativo, nos permitió identificar el problema del no reconocimiento de la enseñanza de la filosofía como un punto-nodal que une a una parte de la comunidad académica de la Filosofía en la afirmación antagónica de que dicha enseñanza debe, sí, formar parte del currículo del nivel medio brasileño.

Palabras clave: Filosofía; Enseñanza de la filosofía; Plan de estudios; Enseñanza Media; Teoría del discurso

Introdução

Apresentamos neste artigo parte dos resultados de uma pesquisa mais ampla, de natureza qualitativa e revisão bibliográfica, desenvolvida no mestrado e intitulada Sentidos de ensino de Filosofia no currículo para o ensino médio no período de 2009 a 2019. Justifica o recorte temporal do problema a sequência de eventos que modificou sucessivamente o currículo no período. Em 2008, a Lei 11.684 (BRASIL, 2008) inseriu a Filosofia e a Sociologia como componentes curriculares obrigatórios em todos os anos do ensino médio brasileiro, o que ocorreu a partir do ano letivo seguinte (2009). Em 2016-2017, por medida provisória (BRASIL, 2016, 2017), houve uma reforma do ensino médio, oportunidade em que a posição do componente no currículo passa a ser - pelo menos - ambígua; e, em 2018, ocorre a apresentação da versão final da Base Nacional Comum Curricular - BNCC - (BRASIL, 2018), em cujo texto a Filosofia também é tratada de modo incerto.

Para compreender o sentido do Ensino de Filosofia no currículo do Ensino Médio, objetivo geral da pesquisa, promovemos a análise da produção da comunidade acadêmica desse campo em livros e periódicos especializados no tema de 2009 a 2019. Constituíram nossos objetivos específicos: 1) investigar os discursos sobre o ensino de Filosofia no ensino médio presentes na produção acadêmica dos autores mais recorrentes do campo teórico, publicados por meio de livros; e 2) analisar os significados de ensino de Filosofia nos artigos sobre a temática, publicados nos periódicos especializados mais proeminentes desse campo. No presente texto, desenvolvemos o primeiro objetivo específico. Quanto ao segundo e à íntegra da pesquisa, estão acessíveis na Dissertação (CHAVES, 2021).

Detalhando brevemente o corpus, encontramos na sua composição quatro (04) obras autorais de diferentes estudiosos do ensino de Filosofia com ampla representatividade entre os que discutem o tema no Brasil. Com esse recorte, desenvolvemos o presente artigo. Voltando à representatividade, aferiu-se a recorrência das obras nas referências bibliográficas de quarenta e cinco (45) artigos que versavam especificamente sobre o ensino de filosofia no ensino médio, de cinco (05) diferentes periódicos analisados, os quais constituem aqueles que mais publicaram nessa temática, e cuja apresentação dos resultados se encontra em outro artigo1.

Analisamos os dados com a Teoria do Discurso, pensada por Ernesto Laclau e Chantal Mouffe (2015a) e operacionalizada no Brasil por estudiosos como Daniel de Mendonça e Leo Peixoto Rodrigues (2014) e Alice Casimiro Lopes e Mendonça (2015). Com origem no campo político, essa teoria demonstra uma potente capacidade de problematização de outras questões, como as educacionais e de ensino. Isso demonstram Lopes e Elisabeth Macedo (2011) e Lopes, Anna Luiza Oliveira e Gustavo Gilson Oliveira (2018). Por isso, ao nos munirmos com ela, estabelecemos relação com os procedimentos metodológicos do contexto da produção de texto do ciclo de políticas de Stephen Ball (apud MAINARDES; MARCONDES, 2009).

Para exibição dos resultados, organizamos o presente texto em duas sessões, a primeira teórico-metodológica, na qual sinalizamos o contexto epistemológico da teoria, alguns conceitos acionados na leitura dos dados e os contornos e procedimentos metodológicos adotados; enquanto isso, na segunda sessão, apresentamos e discutimos o corpus de análise, oportunidade em que destacamos os discursos sobre o ensino de Filosofia como elaborados nas obras, evidenciando as concepções e os contornos curriculares nelas presentes.

Como se depreende das discussões, o reconhecimento do ensino de Filosofia como problema filosófico atravessa as obras, pois elas leem uma realidade na qual essa dificuldade é latente. Por isso, nossa pesquisa apresenta as nuances antagônicas presentes nos diferentes autores. Para eles, o ensino é um problema que diz respeito à Filosofia, porquanto os afeta, e a Filosofia, como desdobraremos adiante, parte dos problemas da subjetividade para alcançar campos outros, como o reflexivo, o da crítica ou o conceitual.

Considerações teórico-metodológicas

Podemos classificar a Teoria do Discurso (TD) como inserida em um contexto dos “Pós”: pós-marxismo (LACLAU; MOUFFE, 2015b), pós-estruturalismo (WILLIAMS, 2012) e pós-fundacionalismo (MENDONÇA; RODRIGUES, 2014). Com isso, a TD encapa a crítica a uma realidade pensada em estruturas com centros fundantes de identidades essencializadas, de tal forma que categorias rígidas pudessem apreender e expressar a realidade de maneira definitiva.

Distintamente, nosso entendimento, apoiado em Ernesto Laclau e Chantal Mouffe (2015a), como também em Lopes e Macedo (2011), Lopes (2013) e Cunha (2013), pensa a realidade, e nela o Currículo, como um campo de profundas disputas. Ou seja, como lugar do discurso e das tensões pelo estabelecimento de significados precários.

Nessa esteira, interessa-nos o processo de atribuição significativo que vai de encontro à ideia corrente de “natureza das coisas”, conforme Laclau e Mouffe, uma vez que os

[...] fatos naturais também são fatos discursivos. E eles o são pela simples razão de que a ideia de natureza não é algo que já esteja lá, a ser lida a partir das aparências das coisas, mas é, ela mesma o resultado de uma construção histórica e social lenta e complexa. Chamar algo de natural é uma forma de concebê-lo que depende de um sistema classificatório. (LOPES; MENDONÇA, 2015, p. 41)

Somente entendendo que até mesmo o significante “natural” é ele próprio uma construção realizada, discursivamente, pela atribuição de um sentido, é que podemos afirmar todo e qualquer existente conhecido como elemento (menor constituinte) da realidade que é discursiva. Destaca-se nesse contexto o discurso como prática de articulação, seja a articulação que acionamos para dar um sentido a um novo elemento - descoberto - seja a articulação que se faz entre os diferentes elementos para formação de uma cadeia de equivalência que, em torno de um ponto-nodal, estabelece um momento que anseia pelo fechamento (definição, acabamento) do seu sentido. Sendo essa sutura (fechamento) uma impossibilidade, o momento resultante da prática articulatória pode chegar a hegemonizar-se, ou seja, a estabelecer-se no lugar “da falta” (do centro fundante) um sentido provisório.

Dessa forma, os autores entendem que o discurso é “a totalidade estruturada resultante desta prática articulatória” (LACLAU; MOUFFE, 2015a, p. 178). Como toda articulação é provisória - ainda que diante do momento hegemônico possamos ter a impressão de sua fixação definitiva - não é estranho que haja desarticulação de elementos que tenham formado um momento para a formação de outro, ou mesmo para um certo isolamento de determinados elementos dos demais.

Com tais eventos, podemos chegar à compreensão do sentido dentro da TD, já que “a impossibilidade de uma fixação última de sentido implica que deve haver fixações precárias, do contrário, o fluxo das diferenças seria impossível. Mesmo para que se possa diferir, subverter o sentido, há de haver um sentido” (LACLAU; MOUFFE, 2015a, p. 187, grifo dos autores). Ou seja, o sentido é o resultado da ação discursiva sobre os elementos e os momentos e, por isso, sobre a realidade. O sentido está (analogamente) para a nossa perspectiva teórica assim como a essência esteve para perspectivas anteriores, distinguindo-se ambos os conceitos pela flutuação das identidades que os elementos ganham no campo discursivo, impensável às essências.

Com isso, em nossa pesquisa, optamos por analisar as obras com o auxílio metodológico do contexto da produção de texto do ciclo de políticas de Stephen Ball e Mainardes (2011)2, em movimento de cooperação semelhante ao que pode ser observada nas pesquisas realizadas por Dias, Abreu e Lopes (2012), Silva, A. (2014) e Silva, Z. (2020).

Ademais, entendemos que o Ensino de Filosofia se configura em uma área bastante específica, ao lidar com questões curriculares, metodológicas, didáticas e outras mais diretamente ligadas à sala de aula, particularmente na educação básica. Notamos que a produção desse campo mais pontual se acentua gradativamente a partir da segunda metade da década de 1990, tendo como picos os anos de 2002, 2009 e 2012. Por este motivo, detemo-nos em levantar aquelas obras do campo do Ensino de Filosofia que aportavam artigos produzidos na área no período de 2009 a 2019. Com isso, chegamos a um conjunto de autores recorrentes, a partir da qual nós construímos critérios que nos levaram àqueles de produção mais diretamente relacionada ao problema do currículo de ensino de Filosofia no Ensino Médio brasileiro, como apresentamos no quadro 1, abaixo.

Quadro 1 Levantamento de obras sobre Ensino de Filosofia 

Antes de 2009 Depois de 2009
ALVES, D. J. A filosofia no ensino médio: ambigüidades e contradições na LDB. Campinas: Autores Associados, 2002. ASPIS, Renata Lima; GALLO, Silvio. Ensinar filosofia: um livro para professores. São Paulo: Atta Mídia e Educação, 2009.
ARANTES, Paulo et al. (Orgs.). A filosofia e seu ensino . Petrópolis: Vozes; São Paulo: EDUC, 1995/1996. CARVALHO, Marcelo; CORNELLI, Gabriele (Orgs). Ensinar Filosofia . Cuiabá: Central de Texto, 2013.
CARTOLANO, M. T. P. Filosofia no Ensino de 2º Grau. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1985. CERLETTI, Alejandro. O ensino de Filosofia: como problema filosófico. Belo Horizonte: Autêntica, 2009 (Coleção Ensino de Filosofia).
CERLETTI. A.; KOHAN, W. A filosofia no ensino médio. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. CORTELLA, Mário Sérgio. Filosofia e ensino médio: uma proposta. Petrópolis: Vozes, 2009.
COELHORIBAS, Maria Alice et al. (Orgs.). Filosofia e ensino: a filosofia na escola. Ijuí: Unijuí, 2005. (Coleção Filosofia e ensino, n. 7). GALLO, Silvio; ASPIS, Renata Lima. Ensinar Filosofia: um livro para professores. São Paulo: Atta, 2009.
FÁVERO, A.; RAUBER, J.; KOHAN, W. (Orgs.). Um olhar sobre o ensino de filosofia. Ijuí: UNIJUÍ, 2002. (Coleção filosofia e ensino). GALLO, Silvio. Metodologia do Ensino de Filosofia: Uma didática para o Ensino Médio. Campinas: Papirus, 2012.
GALLO, Sílvio; DANELON, Marcio; CORNELLI, Gabriele. Ensino de Filosofia, teoria e prática. 1. ed. Ijuí: Editora da Unijui, 2004. (v. 1). GALLO, Sílvio; GOTO, Roberto Akira. Da filosofia como disciplina: desafios e perspectivas. São Paulo: Loyola, 2011.
GALLO, S.; CORNELLI, G.; DANELON, M. (Orgs.). Filosofia do ensino de filosofia. Petrópolis: Vozes, 2003. GELAMO, Rodrigo Pelloso. O ensino de filosofia no limiar da contemporaneidade: o que faz o filósofo quando seu ofício é ser professor de filosofia? São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009.
GALLO, S.; KOHAN, W. Filosofia no Ensino médio. Petrópolis: Vozes, 2000.
GHEDIN, Evandro. Ensino de Filosofia no Ensino Médio. São Paulo: Cortez, 2008. GHEDIN, E. Ensino de Filosofia no Ensino Médio. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2009*.
KOHAN, W. O. (Org.). Filosofia: caminhos para seu ensino. Rio de Janeiro: DP&A, 2004/2008. (Ed. Lamparina). HORN, G. B. Ensinar filosofia: pressupostos teóricos e metodológicos. Ijuí: Unijuí, 2009.
KOHAN, Walter O. (Org.) Filosofia no Ensino Médio. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. (v. VI). KOHAN, Walter Omar. Filosofia: o paradoxo de aprender e ensinar. Tradução de Ingrid Müller Xavier. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009.
KOHAN, Walter. Ensino de filosofia: perspectivas. Belo Horizonte: Autêntica, 2002/2005. MATOS, Junot Cornélio et al. Filosofia: Caminhos do Ensinar e aprender. Recife: Ed. Universitária UFPE, 2013.
LIPMAN, Matthew. A Filosofia vai à escola. Tradução de Maria Elice de Brzezinski Prestes e Lucia Maria Silva Kremer. São Paulo: Summus, 1990. PINTO, Maria José Vaz; FERREIRA, Maria Luísa Ribeiro (Coords.). Ensinar Filosofia? O que dizem os filósofos. Lisboa: CFUL, 2013.
LIPMAN, Matthew; OSCANYAN, Frederick S.; SHARP, Ann Margaret. A Filosofia na sala de aula. São Paulo: Nova Alexandria, 1997/2002. RODRIGO, Lídia Maria. Filosofia em sala de aula: teoria e prática para o ensino médio. Campinas: Autores Associados, 2009.
LORIERI, M. A. Filosofia: fundamentos e métodos. Filosofia no ensino fundamental. São Paulo: Cortez, 2002. ROLLA, A. B. M. (Org.). Filosofia e ensino: possibilidades e desafios. Ijuí: Editora da UNIJUÍ, 2009.
MORAES FILHO, Evaristo de. O Ensino da Filosofia no Brasil. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1959. TOMAZETTI, Elisete M. (Org.). Filosofia no Ensino Médio: experiências com cinema, teatro, leitura e escritura a partir do PIBID. São Leopoldo: Oikos, 2012.
MURCHO, D. A Natureza da Filosofia e o seu Ensino. 1. ed. Lisboa: Plátano, 2002. TOMAZETTI, Elisete Medianeira (Org.). Ensino de Filosofia - experiências, Problematizações e Perspectivas. Curitiba: Appris, 2015.
OBIOLS, Guillermo. Uma introdução ao ensino da filosofia. Ijuí: Unijuí, 2002. VELOSO, Renato. Filosofia para adolescentes: práticas pedagógicas para o Ensino Médio. Petrópolis: Vozes, 2012.
PIOVESAN, A. et al (Orgs.). Filosofia e ensino em debate. Ijuí: Unijuí, 2002.
ROCHA, R. Ensino de filosofia e currículo. Petrópolis: Vozes, 2008
SILVEIRA, René J. T.; GOTO, Roberto. Filosofia no Ensino Médio: Temas, problemas e propostas. São Paulo: Loyola, 2007.

* Existe uma edição dessa obra publicada em 2008, consta na coluna ao lado.

Fonte: elaboração própria, dados da pesquisa (referências dos artigos nos periódicos Conjecturas, Educação e Filosofia, Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação (RESAFE), Revista Digital de Ensino de Filosofia (REFILO) e Saberes: revista interdisciplinar de Filosofia e Educação, conforme recorte da pesquisa).

Na construção dos critérios, adotamos primeiro um cronológico, elegendo obras publicadas no período focal de nossa pesquisa (2009-2019), cuja temporalidade está marcada pela Lei 11.684/2008 (BRASIL, 2008), que determinou a obrigatoriedade do ensino de Filosofia em todas os anos do ensino médio brasileiro. No segundo critério, selecionamos obras assinadas por apenas um autor, pois entendemos que um texto organizado assim permite o desenvolvimento mais completo dos raciocínios e argumentos que embasam a posição teórica de cada escritor. Finalmente, o terceiro critério foi o de recorrência. Selecionamos, a partir das referências dos artigos de periódicos do nosso corpus, as quatro obras mais citadas3 sobre Ensino de Filosofia.

Então, chegamos ao elenco composto por Cerletti (2009), em O ensino de Filosofia como problema filosófico;Gallo (2012), em Metodologia do Ensino de Filosofia;Rodrigo (2009), com Filosofia em sala de aula; eGelamo (2009), O ensino de Filosofia no limiar da contemporaneidade.

Resultados e Discussão

Respostas ao que é Filosofia e contexto teórico dos autores

Ao pensarem o ensino de Filosofia, os autores partiram de uma afirmação do que significa a Filosofia. Cerletti (2009) e Gallo (2009) entendem que o ensino filosófico pressupõe a escolha de uma perspectiva dentre as muitas que compõem as filosofias: “[...] para a problemática do ensino de Filosofia, perante essa diversidade penso que só há uma possibilidade plausível: escolher uma perspectiva de Filosofia” (GALLO, 2012, p. 38). Em outras palavras “[...] o que não se deverá deixar de lado é que o tipo de vínculo que se estabelece com a Filosofia é substancial a todo ensino” (CERLLETI, 2009, p. 18).

Uma conclusão possível dessa máxima é que, assim como para ensinar Filosofia é necessário dizer a partir de qual filosofia se aborda as demais, para pesquisar/escrever sobre o ensino de Filosofia é necessário um movimento semelhante. Ou seja, dizer o que se entende por Filosofia. Com isso, é possível inferir das obras de qual Filosofia cada autor parte, bem como quais sentidos de Filosofia são pensados quando os autores elaboram saídas para a problemática de seu ensino.

Cerletti (2008) e Gallo (2012), partindo de Deleuze e Guatarri (1992), entendem-na como “um verdadeiro convite ao pensamento próprio” (GALLO, 2012, p. 45), uma vez que “[...] o ensino filosófico, por sua vez, será repetição e criação [de conceitos]” (CERLETTI, 2009, p. 34). Para ambos, a Filosofia, distintivamente das demais áreas, é aquela na qual se forjam os conceitos.

Gallo (2012) afirma não ser essa a única acepção e distinção da Filosofia, mas é uma que atende ao anseio filosófico da universalidade, uma vez que, ainda que defina, mantém essa definição em aberto. Cerletti (2009, p. 29), pensando sobre isso, afirma que “não há uma maneia exclusiva de definir a Filosofia e essa particularidade é a base de grande parte de sua riqueza e de seus desafios, já que qualquer tentativa séria de abordá-la nos conduz inexoravelmente a ter que filosofar”.

Tal perspectiva, que configura uma espécie de universalidade aberta da Filosofia, coaduna com o prisma pós-estruturalista e pós-fundacionalista, segundo o qual não há um fechamento fundante nas estruturas, mas uma fixação de um centro provisório que supre uma falta dada pela impossibilidade de definitividade apresentada em contexto discursivo.

Enquanto isso, Rodrigo Gelamo parte de uma compreensão mais existencial da Filosofia, que “[...] produz um modo de pensamento que me possibilite pensar o problema que me afeta de forma imanente” (GELAMO, 2009, p. 31). A Filosofia começa nas afetações e consequentes problemas na vida, que impelem a subjetividade a mergulhar na imanência (realidade dada em um único plano) para produzir soluções a uma problemática.

Já em denotação mais pragmática, Lídia Maria Rodrigo entende a Filosofia como aquela que pode “[...] propiciar a todos a oportunidade de desenvolver sua humanidade em termos de um pensamento racional que lhes permita pensar a relação consigo mesmo, com o outro e com o mundo” (RODRIGO, 2009, p. 21). Essa perspectiva, que carrega rastros de uma perspectiva humanista4, dialoga (criticamente) com os documentos curriculares, ainda que alguns deles esperam da Filosofia, mais do que qualquer outro componente, uma marcante colaboração na formação do cidadão.5

Interessante lembrar que todo pesquisador, ao apresentar o aporte teórico que sustenta uma ideia, fornece a quem lê a possibilidade de entender os significados específicos que os conceitos centrais com os quais pensa possuem e a que origem reportam. Com isso, os autores das obras em análise evidenciam as suas abordagens, permitindo-nos traçar um panorama epistêmico.

Assim, observamos que, em Cerletti (2009), Gallo (2012) e Gelamo (2009), repercute fortemente o pensamento de Gilles Deleuze e Félix Guattari (1992), marcadamente as ideias relativas a problema como motor do filosofar e conceito como traço distintivo da Filosofia. Ainda em Gallo (2012) e Gelamo (2009) está presente, de maneira intensa, o pensamento de Jacques Rancière (2007), de quem os autores apreendem a ideia de mestre ignorante e de sociedade pedagogizada.

Ainda nesses dois autores, aparece o pensamento de Nietzsche e das suas marteladas, ao modo como os pensadores do seu tempo lidavam com a Filosofia, institucionalizando-a, o que, para o filósofo alemão, afastava sobremaneira os jovens da vontade de filosofar. Também repercute nos autores a famosa imagem Das três transformações (NIETZSCHE, 2012) nietzschianas do camelo, leão e criança, que pode representar um professor que carrega toda Tradição filosófica nas costas (camelo), que aprende a dizer “não”, liberta-se do peso da carga (leão) e que, finalmente, aprende a dizer “sim” (criança), passando a pensar a partir da vida, o que é uma grande possibilidade para Filosofia. Ainda em Gelamo (2009), Foucault é um autor de destaque, sobretudo pensando os conceitos de regime de verdade e ontologia do presente.

Rodrigo (2009), por sua vez, está fortemente ligada a filósofos da Grécia clássica, como a Platão e Aristóteles, com os quais desenvolve a pesquisa em torno do conceito de Paideia. Além de se sustentar em modernos como Descartes, Maquiavel e Bacon, com quem discute questões políticas e epistemológicas, sempre tendo em vista o plano educacional. Na obra específica, porém, como faz uma discussão mais pontual em torno da didática filosófica, escreve em relação a pensadores que, na Europa contemporânea, já haviam enfrentado a problemática do ensino de Filosofia em suas realidades. Assim, ela dialoga com o português Manoel Maria Carrilho, que apresenta a problemática em Portugal e com o francês Michel Tozzi, que discute as dificuldades e saídas para o componente curricular na escola de massa.

De modo mais disperso, podemos mencionar as discussões em torno de Kant e Hegel sobre o filosofar, seu ensino e os conteúdos necessários a esse processo como, ao menos, tangenciadas em cada uma das obras. Cabendo destaque para Gelamo (2009), que desfaz falsas impressões do dilema e das conclusões dos dois alemães, atualizando o pensamento de ambos, em face da realidade contemporânea.

Também são mencionados pontualmente: Sócrates, conhecimento de si e cuidado de si; Platão, e o processo de chegada ao conhecimento, destaque para a alegoria da caverna; Descartes, e a perseguição ao método; Spinoza, em sua imanência; Derrida, e a impossibilidade de centro fundante.

Duas faces de um mesmo problema: a construção de um ponto-nodal

Considerando as obras, fica evidente que um problema de duas faces une os quatro autores em suas análises sobre a problemática do ensino de Filosofia no ensino médio brasileiro: 1) ainda há um desinteresse da comunidade filosófica pelo tema do ensino de Filosofia6 e 2) existe um problema na formação do professor da disciplina.

Com isso, é possível afirmar que a crítica dirigida à comunidade filosófica e à formação dos professores constitui um ponto-nodal - momento de reunião de elementos - em torno do qual aqueles que mais influenciam a produção de ensino de Filosofia no Brasil convergem em suas distintas análises.

Para Cerletti (2008, p. 51), “[...] a comunidade filosófica acadêmica (salvo muito raras e pontuais exceções) não se preocupa em absoluto com o destino da Filosofia na escola”. Gallo (2012, p. 11), em semelhante percepção, afirma que “os filósofos dão pouca ou nenhuma importância à questão do ensino”. Gelamo (2009, p. 35) interpreta que essa realidade é reflexo do fato de as “[...] questões do ensino da Filosofia serem entendidas como questões educacionais, o que possivelmente as distanciaria dos problemas filosóficos”. Para Rodrigo (2009, p. 3), essa posição dos acadêmicos de Filosofia de “resistência à democratização do saber filosófico” se assenta em um “receio de que a Filosofia só possa ser ensinada na escola de massa à custa de uma inevitável perda da qualidade”.

Percebemos que os autores demonstram a existência de uma espécie de quadro valorativo dos problemas filosóficos. Nele, o ensino de Filosofia - quando muito - parece ocupar um estamento menos destacado. Como apresentado em Rodrigo (2009), os acadêmicos temem a ideia de “rebaixar” a grandeza filosófica à “pequenez” e aos “limites” das comunidades escolares, ainda mais daquelas desprovidas - por múltiplos fatores - das premissas necessárias ao pensar filosófico (erudito).

Em outro momento, Gelamo (2009) apresenta esse mesmo temor na leitura do histórico da Associação Nacional de Pós-graduação em Filosofia (ANPOF) que, de sua fundação, no ano de 1983 até 2006 (vinte e três anos), permaneceu sem um Grupo de trabalho (GT) relativo ao ensino de Filosofia. Quando se organizou o GT Filosofar e ensinar a filosofar, atravessam a escolha do nome os reflexos de uma preocupação em não “desconfigurar” as categorias filosóficas, pois “nomear o GT de ‘ensino da Filosofia’ poderia causar uma confusão com algum tema da Filosofia da educação [...] que escapasse aos interesses da Filosofia, deixando que esse assunto continuasse sendo pesquisado apenas nos programas de Educação” (GELAMO, 2009, p. 36).

Essa separação dos problemas educacionais e do ensino de Filosofia dos problemas filosóficos nos leva a outra face do não reconhecimento do lugar filosófico do ensino de Filosofia: a formação dos professores no nível superior. Ora, se o ensino não é importante, os filósofos não precisam pensá-lo. Isso fica demonstrado na forma como os cursos superiores são organizados:

podemos, grosso modo, assinalar o procedimento de dois modelos de graduação: um construído com base em cursos monográficos que privilegiam a formação do Especialista ou pesquisador, tratando a licenciatura como uma espécie de apêndice ao bacharelado; outro, construído com base na pulverização dos conteúdos filosóficos num grande número de disciplinas, ministradas com base em manuais e bibliografia secundária. (RODRIGO, 2009, p. 68)

O que a autora pontua é vivenciado por gerações de licenciados em Filosofia que, desde muito, percebem nos cursos uma grande preocupação com uma formação para a pesquisa, que exige um sólido conhecimento da tradição filosófica. De fato, é imprescindível conhecer o histórico, os temas, problemas e autores para nos aproximarmos da Filosofia em nível acadêmico. Entretanto, segundo o entendimento dos próprios autores (aqui analisados), esse conhecimento sozinho tanto não é suficiente para formação do filósofo pesquisador quanto, muito menos, o seria para o professor.

Agrava a problemática o fato de haver uma cisão nos cursos de licenciatura. Conforme Gallo (2012, p. 123), “investe-se na formação específica (em determinada área do saber) em um departamento ou instituto e na formação do professor em um departamento ou faculdade de educação”. Ainda segundo o autor, isso significa fatiar a formação inicial, de tal forma que professor e pesquisador são formados separadamente. Essa separação significa que o professor não precisa ser também um pesquisador. Revela ainda que a ele estariam fechadas as portas da pesquisa e a participação na construção do conhecimento, o qual deve ser produzido em separado pelo pesquisador, de quem ele tomará as ideias para reproduzi-las em sala de aula.

Cerletti, nesse aspecto da formação, parte de um outro ponto. Segundo ele, existe uma expectativa de que o professor de Filosofia (como de outros componentes) esteja pronto e acabado no fim da licenciatura. Segundo o argentino, isso é um erro, pois há de se considerar a formação como um processo muito amplo, pois

[...] não é possível cifrar todas as expectativas da formação docente no momento inicial (no que seriam as matérias específicas da licenciatura), mas deve-se pensar também nos momentos anteriores - no trajeto de estudante - e posteriores, ou seja, naqueles em que se faz efetiva a profissionalização de professores e professoras. (CERLETTI, 2009, p. 57)

O que o autor recorda é que a atuação dos professores, formados segundo esse modelo dicotômico (pesquisadores vs. professores), impacta a vida de todos os estudantes, mas sobremaneira daqueles que, depois, também se tornarão professores. Para esses, não somente a licenciatura será uma referência, mas a prática daqueles seus professores, com os quais conviveram desde o começo de sua escolarização. Ainda que não saibamos quem serão os futuros professores, é também na escola que começamos a formar esse grupo. De tal forma que as deficiências na formação docente de hoje podem implicar nos professores de amanhã, em uma realidade que lembra uma espiral.

Buscando estabelecer uma síntese desse ponto, temos que os problemas na formação do professor de Filosofia estão vinculados ao não reconhecimento da comunidade acadêmica de Filosofia da importância de se pensar, pesquisar e produzir soluções para a problemática do ensino de Filosofia. Nisso concordam os quatro autores, conforme apresentado acima.

Considerando, na TD, o conceito de ponto-nodal, como aquele que significa o eixo de articulação de diferentes elementos para formação de um momento hegemônico, temos que os autores convergem nesse ponto ao concordarem que o não reconhecimento que existe na comunidade acadêmica de Filosofia gera reflexos na formação dos professores de Filosofia (licenciados) da educação básica, porque, ainda segundo essa postura hegemônica da comunidade de Filosofia, não cabe a essa etapa o pensar filosófico.

Daqui por diante, consideramos o posicionamento do grupo de autores que reflete o ensino de Filosofia organizado em torno desse ponto-nodal que forma um momento antagônico em relação ao discurso preponderante na comunidade acadêmico-filosófica. Um ponto-nodal antagônico se articula por dois motivos convergentes: 1) para fazer contraponto a um momento hegemônico e 2) para aglutinar elementos com fins de desarticular o atualmente hegemônico em detrimento de um novo arranjo que possibilite o (presente) antagônico fazer-se hegemônico.

Nesse processo de afirmação antagônica, os autores produzem discursos para o ensino de Filosofia que desejam articular para hegemonizar. Essa articulação almeja enfraquecer o atual discurso hegemônico de que o ensino de Filosofia não seja um problema filosófico.

A articulação de um currículo: discursos sobre o ensino de Filosofia

Considerando o discurso hegemônico na comunidade acadêmica de Filosofia - que desconsidera o ensino enquanto seu problema - entendemos que a construção do currículo para o ensino médio também está fora do campo de interesse do grupo. Assim, a posição mantida por essa parte da comunidade possibilita uma abertura para que outros atores articulem o currículo, de modo que cedo ou tarde o ensino de Filosofia no nível médio não alcance mais sentido algum (insignificante). Isso leva a Filosofia de volta à “lógica do antiquário filosófico, que atesoura joias para oferecê-las a alguns poucos privilegiados, emudece o filosofar e mutila sua dimensão pública” (CERLETTI, 2009, p. 87).

O cenário atual demonstra que esse discurso hegemônico colhe resultados fartos desde 2017, quando a “reforma” do ensino médio (BRASIL, 2017) feriu gravemente os esforços da corrente antagônica dos filósofos que buscavam, mais entusiasmadamente depois da Lei 11.648/20087 (BRASIL, 2008), afirmar seu lugar na construção do currículo de Filosofia no ensino médio.

Como apresentado, se os autores convergiram antes para afirmar a existência de um discurso hegemônico que desqualifica o ensino de Filosofia como problema filosófico, - uma articulação pela via negativa - pois todos os autores negam o entendimento construído na comunidade epistêmica8 de Filosofia ante um problema que devia ser considerado por ela, agora, em um segundo e consequente momento ao anterior, os mesmos autores articulam um discurso - por via positiva - que encontra síntese no título da obra de Cerletti (2009): O ensino de Filosofia como problema filosófico.

Nesse ponto - ressaltamos - ao apresentarmos a realidade discursiva, entendemos currículo como um discurso que significa uma realidade. Especificamente, como em “[...] qualquer manifestação do currículo, qualquer episódio curricular, é a mesma coisa: a produção de sentidos. Seja escrito, falado, velado, o currículo é um texto que tenta direcionar o ‘leitor’” (LOPES; MACEDO, 2011, p. 42). De forma que o texto está inserido em um contexto amplo de influências, tanto sobre si (em sua produção) quanto de si para a realidade que significa.

Com isso, Cerlleti (2009), ao afirmar categoricamente O ensino de Filosofia como problema filosófico, articula um elemento decisivo ao ponto-nodal antagônico que se posiciona para desarticular o discurso hegemônico, indiferente a problemática do ensino de Filosofia.

Levando essa compreensão às últimas consequências, Gallo (2009, p. 26) entende que “[...] é tempo de nos preocuparmos menos em justifica-la [a Filosofia], afirmando a necessidade de sua presença, para nos dedicarmos mais a uma intensa militância em nossas próprias salas de aula”. Tal militância, incentivada pelo autor no início da década passada, foi atingida em cheio pela reforma do ensino médio e pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Com esses eventos, perdemos, pelo menos, muitas horas-aula. Isso nos pressiona, enquanto docentes, a dois movimentos: ações muito precisas nas salas de aula e a potencialização da articulação em torno da reafirmação da Filosofia no currículo.

Por isso, esse movimento em duas frentes exige uma ressignificação do sentido da Filosofia no currículo, como também uma nova apresentação das aberturas que a aprendizagem dessa disciplina proporciona. Rodrigo (2009, p. 24), na defesa desse espaço curricular, argumenta que “[...] a aquisição de noções introdutórias de filosofia, aliada a certas habilidades intelectuais, oferece ao estudante condições para ampliar sua compreensão de algumas realidades, amadurecendo certas concepções, valores, decisões”.

Enquanto isso, Gelamo (2009), indo além, convida a um exercício da Filosofia que considere, filosoficamente, as afetações daqueles que estão envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, não para uma reflexão sobre, mas uma problematização na vida: “não quero pensar sobre o ensino da Filosofia, mas criar uma estratégia diferente - que faz ressoar Nietzsche, Deleuze e Foucault - para pensá-lo: como um desejo violento de pensar a minha própria vida” (GELAMO, 2009, p. 33).

Com tais motivações, os autores concebem um currículo para o ensino de Filosofia. Tal concepção está acompanhada de alguns imperativos de realização, ou seja, da prática didática que segue o sentido anteriormente construído para esse currículo.

Ensino de Filosofia e concepções curriculares

O currículo se forja discursivamente pela articulação de elementos em torno de um momento que se impõe como hegemônico, a despeito das forças antagônicas que intentam impedir ou, quando já é tarde, desfazer o arranjo que permitiu aquela fixação hegemônica. Então, currículo não pode ser entendido como um documento criado e implementado por um poder central, cuja observação é automática e pacífica nas esferas, (supostamente) submissas ao poder determinante. Essa visão, presente principalmente nos estudos realizados sob um enfoque estadocêntrico, fica superada em nosso contexto pós-estrutural.

Como a realidade apresentada é discursiva e os elementos precisam ser articulados para que haja uma significação, são várias as partes capazes de influir nos sentidos do currículo. Isso fica evidente como exposto no processo em que se dá significado ao currículo de Filosofia, oportunidade em que se observa o impacto que a concepção da comunidade epistêmica de Filosofia, que desconsidera o ensino como problema filosófico, tem para a hegemonização do processo de revogação (nova expulsão) da Filosofia na educação básica.

Ainda que o seja, também ficou demonstrado que as forças antagônicas dentro da própria comunidade epistêmica concebem um currículo de Ensino de Filosofia para o nível médio, momento em que, para além de uma afirmação curricular, há um processo de afirmação ante aquele movimento emudecedor.

Como pela superação da concepção de um estado “implementador”, supera-se também a de currículo pacífico a ser por todos observado. Perceberemos que os sentidos pensados pelos quatro autores aqui analisados reverberam em muitos outros pesquisadores, o que cria uma corrente antagônica mais ampla.

Dentre aquelas significações de impactos curriculares para o ensino de Filosofia, Cerletti (2009, p. 52) é aquele que destaca o processo de desnaturalização com a qual costumamos afirmar aspectos da realidade, pois “[...] o ‘sentido’ de Filosofia pode consistir, simplesmente, em mostrar que os conhecimentos, as opiniões ou as relações estabelecidas não são naturais, que não estão dadas por si”.

Assim, oportunizar um espaço (carga horária) para a Filosofia no nível médio, conforme se compreende do autor, é dar passagem a um componente curricular que contribuirá para que os estudantes tenham uma ideia da realidade distinta das concretudes e certezas com que outros componentes - como os profissionalizantes - tendem a passar do mundo.

Em perspectiva semelhante, ainda que observando a justificativa para o ensino como disposto nos Parâmetros curriculares nacionais - PCNs (BRASIL, 1999), Rodrigo (2009, p. 25) entende que a Filosofia é indispensável para um avanço no processo educacional, ainda mais se esse processo “[...] almeja um salto de qualidade, ainda que pequeno, na direção da autonomia intelectual e na aquisição de alguns parâmetros que viabilizem o exercício do pensamento crítico”.

Implicitamente, está a ideia de que a Filosofia seja o componente (mais) responsável no desenvolvimento do pensar criticamente dos estudantes. Essa ideia acompanha a defesa do seu ensino, como mostra o Projeto de Lei (PL) que deu origem ao retorno da Filosofia ao ensino médio na década passada, delegando-lhe a contribuir “para uma opinião pública responsável e crítica, convidando para o debate reflexivo” (BRASIL, 2003, s. p., grifo nosso).

Levando o debate para um horizonte mais alargado, Gallo (2012) entende ser necessário superar a ideia de que a Filosofia tem um fim instrumental ou determinado. A Filosofia, em alguma medida, é o campo do inesperado e, paradoxalmente, do limite e da liberdade. Porquanto nos apresenta os movimentos, a irregularidade e o latente perecimento da nossa subjetividade na realidade que nos supera, ainda que dependa de nós para ter sentido. Por isso,

o ensino de filosofia na educação básica - especialmente no ensino médio - coloca-se para além de uma visão meramente instrumental da filosofia, como promotor de uma determinada situação social; [...] ao contrário, representa uma ampliação dos horizontes culturais dos estudantes [...] visando à efetivação do movimento próprio da filosofia, a criação de conceitos. (GALLO, 2012, p. 120)

Conceituar, para Gallo (2012), é a grande tarefa da Filosofia, que só ocorre na interação de uma subjetividade com um mundo a ser significado. Não pode, por isso, a Filosofia estar fechada no propósito - que a justificaria - do pensar criticamente. Em outro momento, Gallo (2012) desenvolve essa ideia, com a mesma intenção de que se entenda o alargamento que a Filosofia permite (e exige) diante do relacionamento dos intelectos para consigo.

Potencializando essa ideia que está presente tanto em Gallo (2012) quanto em Cerletti (2009), Gelamo (2009) percebe a necessidade de livrar a Filosofia de um ciclo apriorístico de pensamento, no qual se tenha uma expectativa tal para o ensino de Filosofia que se ampute, no processo, a Filosofia e seu modo aberto de estar em nome de uma pseudofilosofia completamente acontecida em sua história e em seus conteúdos. Para o autor,

[...] talvez a saída para essa forma circular de funcionamento ante o ensino esteja em uma atitude filosófica de resistência, entendida como uma recusa em aceitar passivamente que os outros digam o que é correto pensar, como é correto pensar e qual é o resultado do pensamento ao qual devemos chegar. (GELAMO, 2009, p. 158)

Nesse sentido, a forma como a Filosofia estará em sala de aula deve considerar a tradição filosófica, a história da Filosofia, os autores e todos os demais aspectos não como a Filosofia mesma, mas como feitios para a atualização (o acontecimento) da Filosofia naquela realidade específica.

Com isso, os autores entendem que a Filosofia se atualiza no enfrentamento dos problemas (DELEUZE; GUATTARI, 1992), que só podem ser experimentados em cada realidade. Essa perspectiva exige a superação da transmissão de problemas filosóficos que não gere, no repetir, uma atualização dos problemas passados a uma realidade presente.

Em outros termos, é necessário significar o momento presente com as experiências do agora. Porque o agora se forjou com articulações que, muitas delas, já não são as mesmas do ontem. Repetir os conteúdos e problemas dos filósofos consagrados, por simples erudição, não colabora para uma significação da Filosofia presente, contemporânea, conectada a essa realidade. Essa posição reforça discursos como aqueles que negam um espaço ao filosofar nas escolas de hoje, porque retornam à mencionada “lógica do antiquário filosófico” (CERLETTI, 2009, p. 87).

Por isso, ao significar no presente a Filosofia e traçar concepções curriculares para seu ensino, os quatro pensadores que acompanhamos nessa análise também desenvolvem saídas atualizadas para a prática docente em um ensino de Filosofia que seja tal como pensado nessa subseção.

A prática didático-filosófica e alguns contornos curriculares

Une os diferentes autores a ideia de que uma didática-geral não é capaz de pensar e produzir os meios necessários para o ensino de Filosofia. Os argumentos para essa afirmação se sustentam no entendimento de que, se o ensino de Filosofia é um problema filosófico, a solução para as questões diretamente relacionadas a esse ensino também precisam sê-lo. Para Cerletti (2009, p. 94), “[...] se a pergunta ‘que é ensinar Filosofia?’ é filosófica, ela não se detém nunca e o horizonte de suas respostas se atualiza a partir da experiência de ensinar e a vontade filosófica do professor de continuar indagando”.

Outro motivo apresentado pelos autores para afirmar uma didática-filosófica está em que a Filosofia configura um tipo de saber distinto do conhecimento científico, das informações do senso comum ou dos dogmas e diretrizes religiosas, dentre outros. Ora, se o significado de Filosofia difere de ciência, opinião e religião, é consequente que difira também o processo de significação que a Filosofia produz da realidade.

Ainda assim, Gelamo (2009) não chega aos detalhes de uma prática. Os demais autores, ao apresentarem suas propostas didáticas, convergem no entendimento de que cada uma delas deve ser atualizada no contexto específico da sala de aula.

Chama atenção que, ao apresentarem suas propostas, os autores advertem que essas não são modelos prontos e acabados para pôr em prática nas salas de aula. Todos exigem a participação criativa dos próprios professores. Cada um justifica esse entendimento quando afirma: “não se trata, por certo, nem de uma prescrição nem de uma descrição do processo, mas da postulação de uma estrutura mínima [...] que ajuda a tornar inteligível a questão ‘ensinar filosofia’” (CERLETTI, 2009, p. 91); “essas propostas de caminhos não podem ser tomadas como metodologias estanques, que engessam o trabalho do professor, dizendo-lhe como fazer” (GALLO, 2009, p. 85); “[...] não há nenhuma pretensão de que elas [unidades didáticas] sejam tomadas como modelos universais e imutáveis” (RODRIGO, 2009, p. 100).

Aproximando pela síntese as propostas dos autores, delineamos um certo padrão, que parte de chamar atenção dos alunos sobre determinado assunto, algo que lhes toque diretamente, levantar esse assunto a uma problematização, apresentar contextos dessa problematização, buscando apoio nos pensadores da História da Filosofia, refletir criticamente sobre a problematização realizada e atualizar todo esse processo em algo significativo, como um conceito.

Ilustrando esse processo e as especificidades conceituais que os autores apresentam em cada etapa, construímos o esquema abaixo, que traz um quadro e uma figura em espiral, representando esse fluxo contínuo que exige sua atualização na prática docente.

Fonte: Elaboração própria.

Quadro 2 Momentos da prática didático-filosófico 

Figura 1 Momentos da prática 

Importa perceber que, apesar das diferenças nos termos e algumas também no procedimento, a didática-filosófica, da qual os autores tratam, refere-se a um modo de atualizar e significar o processo de ensino e aprendizagem de Filosofia no contexto de elaboração da aula correspondente ao nível médio.

Em Cerletti (2009), os momentos indicados são aqueles que podem orientar o professor de maneira mais ampla a refletir os pressupostos de sua prática. Assim, o momento reflexivo crítico é um momento no qual o (a) docente faz uma revisão da própria trajetória de formação e assume os limites e potências do processo de formulação da sua didática-filosófica. Corresponde a, antes de ensinar, ter clareza de quem é que o vai realizar; já o momento da fundamentação, está relacionado ao levantamento de uma hipótese na qual o (a) docente correlaciona o ambiente, as condições e o caminho percorrido com quem está envolvido no processo de ensino-aprendizagem às bases teóricas que carrega para atualizar essa metodologia; o momento didático, profundamente relacionado aos dois últimos, é a oportunidade de construção do espaço filosófico, no qual as escolhas de o quê e como ensinar se adaptam às pessoas que participam diretamente da construção/reconstrução da aula. Chega-se, por fim, a um novo momento reflexivo crítico, de maneira renovada pelo processo, mas não satisfeita, uma vez que uma questão filosófica o é também pela abertura.

Enquanto Cerletti (2009) pensa os pressupostos anteriores à prática, Rodrigo (2009) e Gallo (2012) têm por palco o cenário da sala de aula. A partir dessa ambiência, eles repensam diretamente a ação docente (em ato).

Lidia Maria Rodrigo (2009) indica cinco momentos que organizam a prática docente. Partindo da Introdução, a autora sugere que essa deve superar uma apresentação da Filosofia como catálogo de soluções distintas para alguns problemas recorrentes. Talvez derive dessa apresentação a ideia de que a Filosofia é um conjunto de ideias de pessoas que, pensando diferente, entram em contradição (entre si) e “dificultam” a vida do estudante. Rodrigo (2009) entende que a superação dessa impressão passa por começar a inspirar uma postura de indagação: o que levou os filósofos àqueles pensamentos? Por quais razões eles produziram aquelas ideias? Com essas perguntas, já avançamos ao momento seguinte. Na Problematização, pode-se encontrar a oportunidade de relacionar a experiência vivida pelos estudantes em nexo com as questões filosóficas. Afinal, as afetações não são exclusividade dos pensadores no passado, mas acontecimento recorrente que, no presente, temos a possibilidade de atualizar.

Para tanto, há que se observar o momento da Contextualização que privilegia o diálogo com a História da Filosofia e coloca em evidência o ambiente no qual os diversos pensamentos se desenvolveram. Uma forma privilegiada de dar passagem aos filósofos é por meio do Texto filosófico, outro momento da prática. Há que se ressalvar que ele não consiste simplesmente na entrega abrupta de um livro ou fragmento para interpretação aleatória. O Texto precisa estar inserido em um momento que se desenvolve após alguns outros, os quais - inclusive - preparam esse momento de interpretação. Finalmente, ao se observar o contexto institucional no qual a Filosofia é feita um componente curricular, Rodrigo (2009) se debruça e faz indicativos também sobre o momento da Avaliação. Para a autora, a Avaliação precisa perpassar todo o processo, e não estar localizado em um tempo e espaço finalísticos; ela consiste em uma forma de observar até que ponto os caminhos vivenciados colaboraram para o aprendizado. Por isso, pode ser transformada em meio para o ensino filosófico, quando superada a ideia de que ela e seu resultado são um fim.

Por seu turno, Sílvio Gallo (2012) pensa a prática em quatro momentos. Começando pela Sensibilização, o autor sugere que os estudantes “sintam na pele” (GALLO, 2012, p. 96) a questão filosófica. Uma maneira indicada para chegar a tanto é o recurso a peças artísticas, sobremaneira aquelas do cotidiano dos estudantes (suas músicas, séries). Partindo daí, passa-se à Problematização, que torna, o que antes (sensibilização) era um tema, um problema. O autor entende que, nessa fase, cabe um exercício da desconfiança, um suspeitar do que parece “já conhecido”. Com essa ambiência, segue-se à Investigação, que propicia uma caminhada pela Filosofia já realizada (História, autores, sistemas), investigando-se como a Tradição lidou com a questão e os limites que fazem com que ela se coloque novamente. Nessa fase, estão dadas as condições para a Conceituação, momento em que a Filosofia é atualizada, uma vez que os estudantes farão, junto ao professor, o exercício de criar conceitos que exprimam alguma resposta (não definitiva) para o problema elaborado no conjunto do percurso.

Finalmente, consideramos que, nesse movimento de elencar momentos que propiciariam o ensino de Filosofia de maneira filosófica, os autores definem os contornos de um currículo para esse ensino, porquanto articulam aqueles elementos mais relevantes para significar uma prática filosófica na docência desse componente. Também é importante perceber, tanto aqui como ao longo de toda a análise realizada, a constante de uma significação aberta.

Assim, destacamos que esse traço de abertura marcante em todos os autores, e muito relevante para a teoria com a qual lemos as obras (LACLAU; MOUFFE, 2015a), é uma outra convergência em suas apresentações: a Filosofia está (ameaçada que seja) no ensino médio para o alargamento dos horizontes, e sua retirada do currículo ou uma diminuição que objetive esse fim só pode significar o cerceamento da vista.

Considerações Finais

Na realização da pesquisa percebemos com entusiasmo o crescente interesse de pesquisadores-filósofos sobre o ensino de Filosofia, dada a demanda em publicações de livros sobre a temática (quadro 1). Dentre tantos, os pesquisadores-professores-autores Alejandro Cerletti, Sílvio Gallo, Lídia Maria Rodrigo e Rodrigo Gelamo, como demostrado, foram aqueles cujas ideias obtiveram maior alcance junto aos (demais) pesquisadores do tema. Esses autores, inclusive, têm o pensamento articulado quanto uma das causas da problemática envolvendo o ensino de Filosofia, sobremaneira no ensino médio: não há, dentro da comunidade filosófica, consenso quanto ao reconhecimento do Ensino como um problema seu. Este fato, dentre outros, tem permitido na educação superior uma formação fragmentária dos professores-filósofos.

Ainda essa articulação do pensamento, uma vez que o discurso hegemônico é pelo não reconhecimento, afirma, categoricamente, o ensino de filosofia como problema filosófico (CERLETTI, 2009) tal como qualquer outro apresentado na Tradição. Uma convergência entre as ideias desses pensadores gerou um ponto-nodal, no qual, articulados, os discursos dos quatro autores antagonizam com o discurso hegemônico - na comunidade acadêmica filosófica - buscando dissuadi-lo do atual sentido em prol do reconhecimento deste e da consequente aglutinação de forças para afirmação da Filosofia no ensino médio.

Dessa maneira os autores passam a apresentar o ensino de Filosofia filosoficamente. Para tanto, atribuem um sentido para esse ensino, oportunidade em que observamos as suas concepções curriculares. Para sua realização, as ideias de currículo exigiram também a apresentação dos contornos didático-filosóficos, a partir dos quais o ensino pudesse ocorrer como engendrado. Apesar de diferenças pontuais, sinalizamos que os contornos das práticas se articulam sobretudo ao apresentar a Filosofia não como a soma de sua história e conteúdos, mas como um campo que tem nas experiências e problemas das subjetividades a sua potência.

Ainda que pensados em contexto de maior entusiasmo quanto ao ensino de Filosofia - logo após a aprovação da Lei 11.648/2011 (BRASIL, 2008) - o contexto atual, atingido pela violência da reforma do ensino médio (BRASIL, 2017) e a versão final da BNCC (BRASIL, 2018), exige o entrincheiramento do momento antagônico articulado por pensadores como esses. Faz-se necessário, como conclamava Gallo (2012), militar em favor da Filosofia em nossas salas de aulas, sim, mas também fora delas, para afirmar a Filosofia como uma possibilidade aberta a todos, e não como um tesouro encastelado.

A Filosofia, como apresentada pelos autores e entendida por nós, é o campo da desnaturalização, da desfundamentação, das incertezas e também da consecução de conceitos com os quais significamos a realidade. Assim apresentada, abarca formas de pensar a educação, o currículo e a prática docente em que a realidade seja entendida como um processo contínuo de significação, não como um fato acabado. De maneira convergente, um projeto educacional que compreenda os muitos modos de ser no mundo e os diferentes sentidos que nele possam coabitar está disposto a compartilhar do seu tempo (carga-horária) e espaço com a Filosofia, inclusive constituída como componente curricular.

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* Este artigo resulta de uma pesquisa realizada no Programa de Pós-graduação em Ensino da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (PPGEn/UESB). Uma versão aproximada do texto consta como parte da dissertação (multipaper) de mestrado defendida e aprovada em fevereiro de 2021.

1Disponível como capítulo IV da dissertação de mestrado (CHAVES, 2021).

2Tal auxílio se dá pela “articulação da TD e de um ou mais contextos do Ciclo de políticas de Ball. Isso se deve porque ‘a perspectiva teórica de Laclau e Mouffe complementa o modelo heurístico do ciclo de políticas de Ball, na medida em que promove um melhor entendimento da complexidade das articulações envolvidas na produção das políticas’” (DIAS; ABREU; LOPES, 2012, p. 9). A TD potencializa aquela concepção da categoria discurso que Ball adquire de Foucault, porque maximiza a amplitude discursiva a toda realidade, seja ela linguística ou não-linguística, uma vez que o discurso, como entendido neste trabalho, não está restrito a palavras, mas envolve as ações, imagens, não-ditos e toda a existência já significada” (CHAVES, 2021, p. 27).

3Obras mais citadas considerando as referências bibliográficas dos artigos publicados nos periódicos: 1) Conjecturas; 2) Educação e Filosofia; 3) Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação (RESAFE); 4) Saberes: Revista interdisciplinar de Filosofia e educação; e 5) Revista Digital de Ensino de Filosofia (REFILO) entre os anos de 2009 e 2019, cujo interesse fosse estritamente o ensino de Filosofia. Entre os livros mais citados, figuram como autores (sempre de uma mesma obra): Cerletti (12 vezes); Gelamo (8 vezes); Rodrigo (4 vezes); Gallo (3 vezes); Horn e Kohan (2 vezes, cada); Cortella, Ghedin e Veloso (1 vez, cada).

4Aqui o humanismo pensado como “qualquer tendência filosófica que leve em consideração as possibilidades e, portanto, as limitações do homem, e que, com base nisso, redimensione os problemas filosóficos” (ABBAGNANO, 2007, p. 519).

5As DCNs (BRASIL, 2010, p. 154) recordam que “[...] a LDB define como finalidades do Ensino Médio a preparação para a continuidade dos estudos, a preparação básica para o trabalho e o exercício da cidadania”. A versão original da LDB de 1996 afirma ser o “domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania” (BRASIL, 1996, s/p). Adiante, nos PCN+, lê-se: “[...] a Filosofia [...] tem condições de contribuir de forma bastante efetiva no processo de aprimoramento do educando como pessoa e na sua formação cidadã” (BRASIL, 2002, p. 44), bem como “[...] a apropriação do processo do filosofar é uma maneira de construir uma forma de pensar autônoma, em última análise, um pressuposto decisivo para o exercício da cidadania” (BRASIL, 2002, p. 47).

6Salienta-se desde agora que tal desinteresse é apresentado como fator que colabora para as dificuldades da afirmação do Ensino de Filosofia no currículo do ensino médio. Contudo, não se deve entender que haja, via de regra, uma militância dos acadêmicos em filosofia por este feito, ainda que opiniões nessa direção existam, como apresentado no texto do Prof. João Vergílio Gallerani Cuter, Por que não defendo a obrigatoriedade da filosofia no ensino médio (CUTER, 2016). Ocorre que o fato de não haver interesse de parte significativa da comunidade em Filosofia, destacadamente nos programas de pós-graduação em Filosofia e dos professores-pesquisadores neles inseridos, desagua-se na omissão desse grupo frente à questão. A esse fato atribuímos força de colaborar para a manutenção do discurso hegemônico que diminui ou exclui a Filosofia da política curricular, como desenvolvemos no texto.

7A referida Lei “altera o art. 36 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio” (BRASIL, 2008, grifo nosso). Contudo, a nova versão da LDB (Lei 9.394/1996), que passa a vigorar em 2017 (BRASIL, 2017), estabelece, no art. 35A, na única menção à palavra filosofia, em todo texto, que “§ 2º A Base Nacional Comum Curricular referente ao ensino médio incluirá obrigatoriamente estudos e práticas de educação física, arte, sociologia e filosofia”.

8Entendida aqui como: “rede de profissionais com conhecimento e competência reconhecidos em um domínio particular, e com autoridade legitimada em conhecimentos politicamente relevantes dentro de um domínio ou área de conhecimento” (HAAS apud PIMENTEL JÚNIOR, 2018, p. 225).

Recebido: 02 de Março de 2022; Aceito: 17 de Maio de 2022

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