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Revista Eletrônica de Educação

versão impressa ISSN 1982-7199

Rev. Elet. Educ. vol.13 no.3 São Carlos set./dez 2019  Epub 01-Set-2020

https://doi.org/10.14244/198271992697 

Demanda Contínua - Artigos

O potencial de um estudo piloto na pesquisa qualitativa

The potential of a pilot study in qualitative research

Analdino Pinheiro Silva FilhoI 
http://orcid.org/0000-0003-0881-7261

Jonei Cerqueira BarbosaII 
http://orcid.org/0000-0002-4072-6442

IUniversidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Feira de Santana-BA, Brasil - Professor da Universidade Federal do Reconcâvo da Bahia (UFRB). E-mail: analdinofilho@gmail.com

IIUniversidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador - BA, Brasil - Professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA). E-mail: jonei.cerqueira@ufba.br


Resumo

Neste artigo, são discutidas as potencialidades do estudo piloto para o desenvolvimento da pesquisa qualitativa. A argumentação ora apresentada é fruto de um estudo piloto que focalizou os jogos de linguagem matemáticos na formação de professores do campo. A produção de dados ocorreu no curso de Licenciatura em Educação do Campo com Habilitações em Ciências da Natureza e Matemática em uma universidade pública no interior da Bahia, Brasil. O estudo piloto dessa pesquisa não gerou insights apenas para o delineamento da referida pesquisa, mas para qualquer investigação qualitativa. Baseado nisso, argumenta-se que o estudo piloto levanta questões para o refinamento do planejamento da pesquisa, pelo menos, em seis dimensões: ética, metodológica, teórica, analítica, operacional e representacional.

Palavras-chave: Estudo piloto; Pesquisa qualitativa; Planejamento da pesquisa

Abstract

In this paper, it is discuss the points raised from a pilot study for qualitative research planning. The argumentation present here is the result of a pilot study that focused the games of mathematical language on teacher training for rural schools. The data production took place in the Federal University of Reconcâvo Baiano, campus of Feira de Santana, state of Bahia, Brazil. The pilot study did not only provide insights for the research, but for any qualitative inquiry. Based on that, it is suggest that pilot study raises questions for reviewing a qualitative research planning in at least six dimensions: ethical, methodological, theoretical, analytical, operational and representational.

Keywords: Pilot study; Qualitative research; Research Planning

Introdução

No presente artigo, discutimos as potencialidades do estudo piloto1 (EP) para dar consistência ao delineamento da pesquisa qualitativa. Em geral, o piloto é um ensaio de estudo utilizado para testar os métodos, procedimentos e materiais propostos para uma determinada pesquisa, visando ajustá-los (MACKEY; GASS, 2005). Apesar dos EP serem pouco ou mal publicados (ARAIN et al., 2010), esse tipo de estudo é bastante recorrente em pesquisas quantitativas (ARNOLD et al., 2009), especialmente na área de Saúde (GRIX, 2004), e vem se expandindo como parte dos delineamentos das pesquisas qualitativas (KIM, 2011; JANGHORBAN; ROUDSARI; TAGHIPOUR, 2014; WRAY; ARCHIBONG; WALTON, 2017), inclusive, no campo educacional (FONGER, 2011; DANNA, 2012; ISMAIL; KINCHIN; EDWARDS, 2018). Apesar de sua natureza preliminar, os pesquisadores que pilotam estudos têm obrigação ética e científica de compartilhar os resultados para o desenvolvimento e produção de conhecimento (TEIJLINGEN; HUNDLEY; 2001; THABANE et al., 2010; WRAY; ARCHIBONG; WALTON, 2017).

Conduzimos o estudo que ora apresentamos, tentando produzir uma compreensão para a seguinte questão: O que aprendemos sobre o delineamento de uma pesquisa qualitativa a partir de um piloto? Para abordar tal questão, utilizamos como fonte de dados um piloto desenvolvido por nós como parte de uma pesquisa qualitativa que focalizou os conflitos entre jogos de linguagem matemáticos na formação de professores do campo2, cuja produção de dados3 ocorreu no curso de Licenciatura em Educação do Campo com Habilitações em Ciências da Natureza e Matemática em uma universidade pública no interior da Bahia, Brasil. Com base neste caso, argumentamos que o EP serve, ao pesquisador qualitativo, ao propósito de gerar um conjunto de insights que o ajudam a refinar o delineamento da pesquisa, antes de produzir dados para o estudo principal. O insight é aqui compreendido como a capacidade de ver com clareza os elementos e situações que configuram a pesquisa no seu contexto de produção de dados.

Abordar este assunto justifica-se pela importância de se discutir estratégias que ajudem o pesquisador a refinar o delineamento da pesquisa, pois inconsistências metodológicas, teóricas ou analíticas tendem a comprometer todo o estudo (CRESWELL, 2014). Este debate pode ser útil para pesquisadores, iniciantes ou não, interessados em discutir o papel de um piloto no desenvolvimento de pesquisas. Trata-se de uma discussão relevante para pesquisadores do campo educacional, pois estudos pilotos ainda são pouco mencionados na publicação de pesquisas qualitativas (JANGHORBAN; ROUDSARI; TAGHIPOUR, 2014) e, quando citados, estão muito associados à justificativa do método, à experimentação de ferramentas específicas, ou não são fornecidos detalhes das lições aprendidas com este tipo de estudo (TEIJLINGEN; HUNDLEY, 2001; ISMAIL; KINCHIN; EDWARDS, 2018).

Este artigo, portanto, oferece ao leitor detalhes sobre os insights que tivemos ao pilotar um estudo e que contribuíram para dar maior consistência ao planejamento da investigação. Organizamos o artigo da seguinte forma: primeiro, nesta seção introdutória, apresentamos o escopo do artigo. Logo após, apresentamos, resumidamente, o delineamento da pesquisa que foi o ponto de partida para a realização do piloto. Em seguida, descrevemos os procedimentos metodológicos e analíticos do piloto. Depois, apontamos os insights que impulsionaram refinamentos no delineamento do estudo. Ao fim, apresentamos uma proposta de modelo analítico do piloto e tecemos algumas considerações.

O delineamento da pesquisa: de onde partimos

O delineamento de pesquisa qualitativa é de caráter emergente e moldado pela experiência do pesquisador (CRESWELL, 2014). Isto significa que o plano para condução de um estudo qualitativo adquire sua forma durante a investigação. Geralmente, o pesquisador qualitativo parte de um plano inicial de estudo que é paulatinamente aprimorado à medida que a pesquisa se desenvolve.

No caso do piloto discutido aqui, partimos de um plano inicialmente delineado em torno dos diferentes usos da linguagem matemática na formação de professores do campo, bem como dos conflitos entre eles. O que chamamos de linguagem matemática são usos da linguagem ligados às mais variadas atividades comunitárias, as quais, enquanto pesquisadores acadêmicos, reconhecemos como práticas matemáticas. Partimos do pressuposto de que no processo formativo da Licenciatura em Educação do Campo, professores e estudantes fazem usos de linguagem matemática associada à diferentes práticas comunitárias. Os licenciandos, por exemplo, se comunicam com base em suas práticas fora da academia, principalmente, apoiados em suas vivências campesinas (GAIA; PIRES, 2016; CREPALDE; KLEPKA; PINTO, 2017). Entretanto, as regras da prática acadêmica oferecem as condições para os significados das palavras no contexto escolar, estabelecendo como as palavras podem ser ditas legitimamente. Ao trazerem para sala de aula usos de linguagem provenientes da prática campesina, que seguem regras implícitas estabelecidas pela cultura camponesa, os estudantes acabam confrontando o escopo de significação das palavras neste contexto, impulsionando conflitos com os usos que são considerados legítimos. Os conflitos são compreendidos aqui em termos de confrontos entre os diferentes usos da linguagem matemática, provenientes de diferentes formas de vida, que são mobilizados por professores e estudantes.

Para sustentar essa problemática, utilizamos como lentes teóricas as noções de forma de vida e jogos de linguagem, ancoradas no pensamento de Ludwig Wittgenstein (2009). A noção wittgensteiniana de forma de vida entrelaça cultura e linguagem e diz respeito ao contexto cultural em que são produzidos nossos usos de linguagem (GLOCK, 1998). Com base nessa concepção, é possível afirmar que o uso da linguagem é orientado conforme as regras da linguagem estabelecidas em uma determinada prática comunitária. Essas regras funcionam como padrões de correção que determinam o que pode ser considerada uma aplicação correta da palavra. O jogo de linguagem, por sua vez, remete à ideia de que o uso de linguagem é regrado e constituidor de significação (Ibid., 1998). Ou seja, o significado de uma palavra é o uso que se faz dela em conformidade com regras. É possível, portanto, pensar na existência de uma diversidade de jogos de linguagem matemáticos gerados em diferentes formas de vida (WANDERER, 2014; SILVEIRA, 2015; KNIJNIK, 2012, 2017). Utilizamos a expressão jogos de linguagem matemáticos para nos referirmos aos usos da linguagem ligados à matemática, em qualquer prática comunitária, cujos sentidos estão nos usos feitos pelas comunidades que os compartilham.

Em termos da Licenciatura em Educação do Campo, é possível afirmar que conflitos emergem entre os diferentes jogos de linguagem matemáticos, ligados a diferentes formas de vida, mobilizados por professores e estudantes no contexto da formação. A partir desta problematização, içamos a questão: quais conflitos ocorrem entre jogos de linguagem matemáticos, pertencentes a diferentes formas de vida, que docentes e discentes mobilizam no contexto da formação de professores do campo?

Ao problematizarmos os conflitos entre os diferentes jogos de linguagem matemáticos, traçamos como propósito geral identificá-los e descrevê-los. O projeto apoiou-se no método qualitativo de pesquisa. Trata-se de uma investigação empírica, inspirada na terapia filosófica de Wittgenstein (2009), na qual buscamos descrever os diferentes usos de linguagem matemática mobilizados por professores e estudantes no contexto formativo, bem como os conflitos entre eles. A tabela a seguir apresenta um resumo do projeto da investigação.

Tabela 1: Características do projeto de pesquisa 

Questão central Quais conflitos emergem entre jogos de linguagem matemáticos, ligados a diferentes formas de vida, que professores e estudantes mobilizam no contexto da Licenciatura em Educação do Campo?
Objetivo Geral Identificar e descrever os conflitos que emergem entre jogos de linguagem matemáticos, provenientes de diferentes formas de vida, mobilizados por docentes e discentes no contexto da Licenciatura em Educação do Campo.
Referencial Teórico Ludwig Wittgenstein (2009). Foco em sua obra “Investigações Filosóficas”.
Contexto de coleta de dados Aulas regulares de matemática do curso de Licenciatura em Educação do Campo com Habilitação em Matemática de uma universidade pública no interior da Bahia, Brasil.
Participantes Estudantes e professores do curso.
Abordagem Metodológica Método qualitativo. Procedimentos: Observações Entrevistas semiabertas Análise de documentos (registro nos cadernos dos alunos, anotações dos professores no quadro, avaliações escritas). Instrumentos: Caderno de observações e de entrevistas, questionário. Registros Gravações em vídeos e áudios; Diário de campo. Folhas de respostas.

Fonte: Autores, 2018.

Na Tabela 1, aparecem listados a pergunta, o propósito, o referencial teórico e a abordagem metodológica do estudo, estabelecidos a priori. Por conta do caráter emergente do plano, decidimos realizar o piloto visando analisar as suas potencialidades para dar consistência ao delineamento do estudo, bem como fazer aprimoramentos, à medida que estes se mostrassem necessários. Na próxima seção, apresentamos detalhes dos procedimentos metodológicos utilizados no piloto.

O estudo piloto

O piloto é considerado um elemento crucial para um bom plano de pesquisa, pois oferece ao pesquisador a possibilidade de refletir sobre a qualidade do delineamento do estudo (WRAY; ARCHIBONG; WALTON, 2017; ISMAIL; KINCHIN; EDWARDS, 2018). Pesquisadores argumentam que para obter êxito com o piloto, o pesquisador precisa estabelecer objetivos claros de viabilidade e critérios analíticos bem definidos para sua implementação (THABANE et al., 2010). No nosso caso, o objetivo do piloto foi avaliar as suas potencialidades para dar consistência ao delineamento do estudo (Tabela 1).

Com este foco, realizamos o EP em uma turma do IV semestre do curso de Licenciatura em Educação do Campo com Habilitação em Matemática em uma universidade pública na Bahia, no âmbito dos componentes curriculares de Matemática na Educação Básica IV (MEBIV) e Elementos da Geometria Plana e Espacial (EGPE). Participaram do estudo duas professoras, responsáveis pelos referidos componentes, e quarenta e três estudantes do curso.

O material empírico do piloto foi produzido no período de 17 de julho a 04 de agosto de 2017, por meio de observações na turma durante as aulas, entrevistas semi-estruturadas com estudantes e professores e através de atividades documentadas, como as anotações no quadro, no caderno dos estudantes ou nos planos de aula dos professores. Os registros das observações e entrevistas foram feitos por gravações em vídeos e áudios e através de anotações no diário de campo. Utilizamos como instrumentos um caderno de observações e de entrevistas.

Os procedimentos analíticos adotados foram: a transcrição das observações e entrevistas, revisão das anotações de campo, leitura preliminar dos textos transcritos para levantamento de ideias iniciais, descrição detalhada dos dados por meio de leitura mais pormenorizada, classificação de episódios selecionados de acordo com o propósito da pesquisa e formulação de interpretações. Os dados foram analisados por meio do exame das notas de campo e de textos transcritos das filmagens e dos depoimentos em áudio. As transcrições foram editadas e delas extraídos os acontecimentos onde as ações comunicativas de professores e estudantes indicaram a incidência de conflitos. Destes acontecimentos, identificamos as ações comunicativas que apontaram diferentes usos de linguagem matemática, identificamos e descrevemos os conflitos.

Orientados pela análise sobre os resultados do piloto, elaboramos um plano analítico baseado em seis dimensões: dimensão ética, dimensão metodológica, dimensão teórica, dimensão analítica, dimensão operacional e dimensão representacional. Estas dimensões são aqui definidas em termos de um conjunto de questões que orbitam o delineamento da pesquisa qualitativa.

Nas próximas seções, apresentamos as dimensões, alguns dados analisados e os insights gerados a partir de um recorte de situações. Visando preservar a identidade dos participantes, nomeamos os estudantes de E1 (estudante um) a E4 (estudante quatro) e as professoras de P1 (professora um) e P2 (professora dois).

Dimensão Ética: a pesquisa cumpre procedimentos éticos?4

A dimensão ética analisa a conduta do pesquisador em relação às pessoas e ao contexto que pretende estudar, em todas as fases da investigação. Durante o planejamento do estudo, tínhamos em mente que as questões éticas deveriam ser consideradas em todas as fases da pesquisa (CRESWELL, 2014). Assim, procuramos nos conduzir considerando algumas recomendações, tais como a garantia do bem-estar, da dignidade, dos direitos e da proteção dos participantes da pesquisa (FLICK, 2009). Já no nosso primeiro contato com os potenciais voluntários, procuramos criar uma relação de confiança a partir da exposição clara e detalhada da pesquisa (seus objetivos, métodos, etc.), bem como dos princípios éticos a serem considerados no estudo, de modo a muni-los com as informações necessárias para compreenderem o seu papel e seus direitos na pesquisa e, dessa forma, tomarem uma decisão autônoma e esclarecida quanto a participarem ou não da investigação.

Durante o processo de obtenção do consentimento, aplicamos um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), cuidando para que essa etapa não se reduzisse a mera obtenção de assinaturas. Para isso, incentivamos uma leitura atenta e cuidadosa do documento, destacando sua importância e função na pesquisa, especialmente no que tange à proteção do participante em aspectos como a preservação da sua autonomia, segurança e confidencialidade. Discutimos, por exemplo, o caráter voluntário da participação, o respeito aos interesses e necessidades dos participantes, o fato da não-participação na investigação não acarretar qualquer prejuízo, os eventuais riscos ou desconfortos que poderiam causar as nossas observações ou entrevistas e as possibilidades para que as declarações fornecidas fossem sigilosas e não permitissem identificações (como o uso de códigos, nomes fictícios, etc.).

O uso do TCLE nesta fase piloto foi fundamental para direcionarmos alguns pontos do processo de sua aplicação para o estudo principal. Por exemplo, em relação à redação do documento, foi necessário esclarecer/elencar/justificar algumas cláusulas para melhorar a compreensão dos leitores; já em relação à nossa postura, enquanto pesquisadores, foi importante orientar a turma a assinalar palavras/expressões/cláusulas não compreendidas para serem discutidas no grupo. Atitudes como essas geraram maior interação pesquisador(autor)-TCLE(texto)-participante(leitor), e resultaram em um maior envolvimento coletivo com a proposta, o que consideramos ter sido fundamental para o andamento do estudo, podendo contar com a participação consentida de praticamente toda a turma.

A análise do piloto mostrou ainda que, a partir do nosso contato com os participantes, foram demandadas outras posturas eticamente relevantes. A exemplo, uma pergunta feita por uma estudante e participante do estudo a um dos pesquisadores no momento da apresentação da pesquisa: “Você aqui [pesquisador] vai contribuir com a nossa formação?” (Estudante E1. Caderno de Campo, jul. 2017).

Em certa medida, já haviam sido apresentadas as prováveis contribuições do estudo para os participantes da pesquisa, porém, muito centradas na nossa voz, no que prevemos e dissemos que seriam essas contribuições. Entretanto, a fala inesperada da estudante emergiu muito oportunamente, não apenas refletindo o mero desejo de saber como iria beneficiar-se do estudo, mas como uma voz que fala do e sobre o seu lugar no processo de produção da pesquisa, acenando sobre a possibilidade de não estarmos sensíveis às suas necessidades.

Diante de tal questão, o insight foi a tática de envolvimento. Ao invés de tentarmos dar uma resposta, decidimos convidar os estudantes a debaterem o assunto, incentivando-os a falarem sobre como entendiam que a nossa presença e proposta de pesquisa poderiam contribuir para sua formação. Na discussão, a fala de outra estudante elucidou uma situação: “A questão é que estamos perdendo o hábito de usar nossas estratégias matemáticas aqui na universidade. (...) Tem professores que querem [que os estudantes façam] do jeito que está no livro ou do jeito que eles estão ensinando (...) e aí tudo se torna mais difícil pra gente”. (Estudante E2. Caderno de Campo, jul. 2017).

Na análise, depoimentos como este indicaram que o contexto acadêmico, em alguma medida, silenciava as estratégias matemáticas dos estudantes, e isto, para eles, representava um grande desconforto. Assim, eles achavam que a pesquisa poderia encorajá-los a utilizarem as estratégias matemáticas que já sabiam, o que, para eles, além de ajudar nos assuntos de matemática a serem estudados, contribuiria para valorizar a história e a cultura de seus ancestrais, conforme sugeriu a estudante E2: “A pesquisa vai ser boa pra gente aqui, porque valoriza o que a gente sabe, a nossa cultura, os nossos ancestrais (...) e os estudantes que estão aqui [na universidade] estão perdendo esse hábito”. (Estudante E2. Caderno de Campo, jul. 2017). Por conta de posições como esta, modificamos algumas partes do plano inicial do estudo, como foi o caso das contribuições e relevância da investigação, que passaram a refletir essas perspectivas.

A análise do piloto mostrou que experiências como estas foram fundamentais para orientar a nossa postura diante de questões eticamente relevantes, como foi o caso de lidar com as expectativas dos participantes. Procurar estar mais sensível às suas vozes, dialogar com elas e posicioná-las no estudo, foi crucial não apenas para produzirmos outras perspectivas sobre os benefícios da pesquisa, mas, sobretudo, para desenvolvermos uma relação de confiança com os próprios participantes na fase principal do estudo.

Condutas como estas são eticamente importantes e devem ser priorizadas em qualquer estudo qualitativo, em todas as fases da investigação. É papel do pesquisador, portanto, conduzir-se de modo a estar sensível aos interesses e necessidades dos participantes, envolvê-los no estudo e deixar as suas vozes falarem (CRESWELL, 2014). Ao lançar mão do piloto, o pesquisador qualitativo pode aproximar-se de situações éticas não previstas e potencialmente relevantes, orientando-se na elaboração de um protocolo de conduta diante de dilemas éticos que, como afirma Flick (2009), só acontecem no campo, no contato com pessoas e instituições.

Dimensão Metodológica: os procedimentos e instrumentos são viáveis?

A dimensão metodológica trata da viabilidade dos procedimentos e instrumentos utilizados na produção e armazenamento dos dados. Os resultados-p5 confirmaram que a condução de observações e entrevistas semi-estruturadas era viável para identificarmos diferentes usos de linguagem matemática no contexto acadêmico, bem como os conflitos entre eles. Foi o que aconteceu, por exemplo, já no primeiro dia de observação em campo. A Professora P1 explanava para a turma sobre “Aplicações da Geometria” e, para isso, fazia uso de slides no PowerPoint projetados em um datashow. Em um dado momento, ela apresentou um slide contendo duas fotos de hortas mandalas6 como possíveis exemplos de aplicações para a realidade do campo. A conversa com os estudantes aconteceu nos seguintes termos:

Professora P1: Eu trouxe algumas aplicações para nossa realidade. Por exemplo, olha só [mostra fotos]: a horta mandala. Acho que muitos de vocês já viram, não é? Aí tem muitos conceitos geométricos, né? Círculos...

Estudante E3: Pirâmide!

Professora P1: Pirâmide? [meneia a cabeça]

Estudante E3: [silenciou-se]

Professora P1: É um cone, não é? [a professora segue explanando o assunto]

(TRANSCRIÇÃO DE FILMAGEM, 2017).

Considerando o contexto em que foram evocadas estas falas, suspeitamos de que se tratava de usos diferentes do termo “pirâmide”. Entretanto, a simples observação não nos deu elementos suficientes para essa identificação. O insight foi utilizar entrevistas para complementar os dados da observação. A análise das entrevistas revelou que a estudante usou o termo referindo-se a um “objeto de forma triangular na ponta” (Estudante E3. Entrevista I. Entrevistador: primeiro autor, 2017). Já a professora, quando questiona a estudante, referia-se a pirâmide no sentido mais convencional do termo, como uma “forma geométrica poliédrica que possui uma base, faces laterais triangulares e um vértice comum” (Professora P1. Entrevista II. Entrevistador: primeiro autor, 2017).

Dessa forma, a partir das análises, foi possível identificar que os jogos de linguagem matemáticos operados pela estudante e pela professora, produziram diferentes significados para o termo “pirâmide”, impulsionando conflito de significação da palavra naquele contexto. Enquanto a professora evoca um significado fortemente ligado à regra do contexto escolar, a estudante evoca um sentido, por assim dizer, mais intuitivo, provavelmente ligado a contextos fora do universo acadêmico.

Um achado importante foi que, embora as observações estivessem focadas na ocorrência de conflitos entre jogos de linguagem ligados a diferentes formas de vida (Tabela 1), os conflitos também ocorreram, independente dos contextos de origem destes. A partir desta situação, o insight foi incluir casos deste tipo no estudo principal para enriquecer a quantidade de dados sobre o problema a ser investigado e, portanto, criar mais possibilidades de análises sobre os conflitos. Assim, para o estudo principal, a questão central e o objetivo geral de pesquisa sofreram modificações como consta na Tabela 2.

Tabela 2: Questão central e objetivo geral do projeto após o piloto 

Questão central Quais conflitos emergem entre jogos de linguagem matemáticos, ligados a diferentes formas de vida, que professores e estudantes mobilizam no contexto da Licenciatura em Educação do Campo?
Objetivo Geral Identificar e descrever os conflitos que emergem entre jogos de linguagem matemáticos, provenientes de diferentes formas de vida, mobilizados por docentes e discentes no contexto da Licenciatura em Educação do Campo.

Fonte: Autores, 2018.

A expressão “ligados a diferentes formas de vida” foi eliminada com o intuito de melhor refletir o tipo de pergunta necessária para entender o problema em inquérito. Os resultados-p também constataram a necessidade de refinarmos perguntas pré-elaboradas. No episódio da pirâmide, por exemplo, em um primeiro momento, as conversas foram realizadas com base em perguntas elaboradas no fervor do acontecimento. Tratava-se de pergunta do tipo: o que você entende por pirâmide? Entretanto, a análise do piloto evidenciou que este tipo de pergunta não ressoava as perspectivas teóricas que sustentavam o estudo. Como o foco da investigação era ver o uso e não uma definição do uso, não seria uma questão de perguntar “o que você entende por”, mas de interrogar “quais as situações em que você utiliza a palavra em questão”, o que ressoa, inclusive, com o que sugere o próprio Wittgenstein (2009) quando afirma que não se indague qual é o significado de uma palavra, mas indaga-se qual é o seu uso. A partir desta análise, foram feitas algumas mudanças nas perguntas. Como no episódio citado, tivemos que retomar as entrevistas e lançar outros tipos de questões.

A análise também mostrou que a gestão de entrevistas logo após o término da aula foi bastante profícua, pois favoreceu a memória dos participantes sobre o vivido, contribuindo para obtermos informações mais precisas, praticamente no contexto do acontecimento. Além disso, otimizou o tempo da coleta e, por conseguinte, da análise dos dados, já que esta última pode ser feita antes do nosso retorno a campo. Nos casos em que as entrevistas ficaram para depois, geralmente por limitações de tempo, os resultados não foram tão satisfatórios. Em alguns casos, tivemos um trabalho enorme para concluir algumas informações. A análise evidenciou ainda que os limites de operacionalizar as entrevistas no time now, ficaram por conta da inconsistência de algumas questões quando elaboradas no fervor das observações. Por outro lado, fazer perguntas mais refinadas foi um ponto forte na operacionalização das entrevistas time later.

Sobre o uso de gravadores em vídeo/áudio, os resultados sugeriram que eles foram ferramentas úteis para permitir a análise de jogos de linguagem (verbais e não verbais) em todos os episódios. No caso da “pirâmide”, foi possível ver e rever falas e gestos nas interações comunicativas, o que foi fundamental para realizar as análises. Outra vantagem foi que possibilitou avaliar a postura do próprio pesquisador na condução de técnicas de observação e entrevista.

Em síntese, as situações aqui descritas ilustram alguns desafios que estão postos aos pesquisadores qualitativos na busca do exigido rigor metodológico do estudo. Como vimos, aproximar-se do background onde o estudo principal será realizado e pilotar procedimentos e instrumentos qualitativos de investigação pode auxiliar o pesquisador nesta tarefa. À luz do piloto, o pesquisador pode ganhar insights metodológicos que o ajudem na definição da questão de pesquisa, no refinamento de perguntas ou ainda na formulação de questões emergentes, diminuindo os riscos de problemas potenciais com essas questões.

Além disso, pesquisadores argumentam que o piloto é útil para evitar perguntas enviesadas, respostas confusas ou ainda com questões que os participantes se recusam a responder (ISMAIL; KINCHIN; EDWARDS, 2018). No caso de pesquisadores inexperientes, pode ser uma rica oportunidade para desenvolverem habilidades de pesquisador qualitativo na condução de observações e entrevistas, na escolha dos locais mais apropriados para as entrevistas ou, ainda, na negociação com os participantes (FONGER, 2011; JANGHORBAN; ROUDSARI; TAGHIPOUR, 2014).

Dimensão Teórica: o referencial teórico sustenta o estudo?

A dimensão teórica analisa a capacidade das perspectivas teóricas sustentarem o estudo. Os resultados-p evidenciaram que os argumentos teóricos até então utilizados, inicialmente centrados em Wittgenstein, não nos deram subsídios suficientes para analisar algumas situações que vieram à tona na investigação, como, por exemplo, episódios caracterizados por forte controle discursivo. Conforme o episódio da pirâmide, tanto na forma como a estudante lidou com o conflito - silenciando-se diante do questionamento da professora - quanto na maneira que a docente reagiu diante do uso equivocado da discente - apontando para o uso correto da palavra - sugere uma situação de forte controle da/na prática discursiva.

Embora Wittgenstein (2009) aborde o fato de uma mesma palavra poder ser utilizada com significados diferentes em uma determinada forma de vida, sua análise não tematiza questões de poder relativas a estes usos. Como este fato emergiu como um dado importante a ser examinado, para melhor compreendermos o objeto em estudo, o insight foi fazermos um movimento teórico que nos desse subsídios para analisar tais questões, ampliando as possibilidades interpretativas. A ideia, então, foi lançar mão também de algumas ferramentas conceituais do pensamento de Michel Foucault (2014), já que este filósofo trata a prática linguística atravessada por relações de poder.

Como Foucault e Wittgenstein são autores de tradições filosóficas distintas, enfrentamos o desafio de estabelecer aproximações cautelosas e coerentes entre algumas de suas ideias, especificamente em relação aos conceitos que pretendíamos operar (como “forma de vida” e “jogos de linguagem”, por parte de Wittgenstein, e “discurso”, “poder” e “verdade”, por parte de Foucault)7. Algumas sintonias entre os dois têm sido apontadas por alguns de seus comentadores (BIRMAN, 2002; VEIGA-NETO, 2007, 2009; GROS; DAVISON, 2011). Para Veiga-Neto (2009), Wittgenstein (nas Investigações Filosóficas) e Foucault convergem ao assumirem posições não-metafísicas, não-essencialistas e não-fundacionalistas em relação à linguagem (VEIGA-NETO, 2009)8. Já Birman (2002), afirma que os dois filósofos convergem na maneira como conceptulizam a linguagem como “jogo”. Para o autor, em ambos os pensadores, a ideia de “jogo” (seja de “linguagem” em Wittgenstein ou de “verdade” em Foucault) sublinha a presença de uma regra de caráter social que o institui e o coloca em funcionamento. Porém, há de se considerar que, enquanto Wittgenstein inscreve sua ideia de “jogo” para enfatizar o caráter regrado da linguagem (WITTGENSTEIN, 2009), Foucault define seu caráter produtivo, isto é, o “jogo” implica regras de produção de verdades (FOUCAULT, 2004). Assim, enquanto em Wittgenstein (2009) as regras conectadas aos “jogos de linguagem” são regras de significação, ou seja, são regras que constituem os significados das palavras nos jogos, em Foucault (2004), as regras ligadas aos “jogos de verdade” criam verdades e produzem condutas.

A aproximação “Wittgenstein-Foucault” também tem sido uma possibilidade de teorizar no campo da pesquisa em Educação Matemática (KNIJNIK, 2012, 2017; WANDERER, 2014, 2017; BELLO; REGNIER, 2017). As pesquisas desenvolvidas por Knijnik (2012, 2014, 2017), por exemplo, mostram possibilidades de articulação de alguns conceitos de Foucault com algumas ideias do segundo Wittgenstein, ampliando as possibilidades analíticas e interpretativas para investigações no campo da Educação Matemática. Ao aproximar a ideia wittgensteiniana de “jogos de linguagem” e a noção foucaultinana de “práticas discursivas”, a autora analisa na forma de vida escolar a existência de variados jogos de linguagem matemáticos (ligados a diferentes formas de vida) e as relações de poder que operam em tais jogos.

Em consonância com essas pesquisas, os resultados-p apontaram que a aproximação entre as ideias de Wittgenstein e Foucault mostrou-se uma ferramenta teórica importante para enxergarmos os jogos de linguagem, não apenas em termos culturais ou interacionistas, mas em termos do poder que opera em tais jogos. Quando a professora fez a pergunta: é um cone, não é? Sua interrogação funcionou como uma tentativa de produzir “verdade” sobre os significados das imagens/palavras, de regular o que dizer da palavra naquele contexto, de conduzir conduta. As lentes foucaultianas nos possibilitaram enxergar os jogos em sua produtividade, em seu caráter dinâmico das relações de poder, produzindo modos de pensar e dizer “verdades” matemáticas. Isto contribuiu significavamente para melhor compreendermos os conflitos. Neste caso, um conflito que aparentemente terminou com a sobreposição de um jogo de linguagem (regra) por outro.

Por outro lado, as teorizações foucaultianas também contribuíram para olharmos as resistências aos regimentos de verdade que ocorreram em outras situações, conforme percebemos no seguinte episódio: a Professora P2 resolvia uma lista de exercícios sobre Progressão Aritmética (PA). Antes de resolver a questão, a professora orientou a turma sobre como deveria ser utilizada a regra (termo geral) da PA, dizendo quais procedimentos os estudantes deveriam observar ao resolvê-la. No entanto, no processo de resolução, estratégias não subordinadas à orientação da docente foram sendo utilizadas por alguns estudantes, como, por exemplo, o Estudante E4 que, ao resolver a questão, disse: PA coisa nenhuma! Eu usei a lógica! [risos] (CADERNO DE CAMPO, 2017).

Ao dizer “usei a lógica”, o estudante referiu-se a estar usando uma estratégia matemática sem utilizar a fórmula [regra] solicitada [pela professora] para resolver a questão. (Estudante E2. Entrevista III. Entrevistador: primeiro autor, 2017). Os depoimentos apontaram que o jogo linguístico do estudante estava conectado com a forma de vida onde mora. Quando ele diz eu usei a lógica (sua própria estratégia), é como se dissesse: não estou usando a regra que a professora está falando que eu vou usar. Neste caso, o estudante acaba resistindo ao regimento de verdade da matemática acadêmica. Ao resistir, ele não apenas impediu o que o poder queria dele, mas criou uma outra possibilidade. Resistir é, neste aspecto, sinônimo de criar. Então, resiste criando uma outra coisa, criando algo diferente. Dessa forma, o pensamento foucaultiano contribuiu para olharmos a prática discursiva não como um processo de socialização, mas como um processo descontínuo, ou seja, não é porque o indivíduo está em determinada forma de vida que ele vai estar em consonância com aquela cultura. Haverá consonâncias, mas também haverá resistências, tensionamentos.

Desta guinada teórica, resultaram outros importantes insights para o desenvolvimento do estudo em sua fase principal, especialmente, em aspectos metodológicos, analíticos e na própria postura de pesquisador. Metodologicamente, passamos a observar os discursos que vemos materializados em coisas ditas, a problematizá-los em ação, a analisar o que permite que professores e estudantes falem da maneira que falam. Do ponto de vista analítico, as análises passaram a interpretar o cenário em que os conflitos surgem, a examinar não a ação dos sujeitos, mas os discursos que os atravessam, suas condições de existência e seus efeitos. Em relação à postura de pesquisador, passamos a questionar o pensamento que nos assujeita, analisar os sentidos que se impõem a nós, a questionar o poder que exercemos ao produzir o estudo e até a forma de relatar seus resultados que, aliás, passou a ser vista como apenas uma das muitas maneiras de produzir alguns sentidos.

Por tudo isso, é importante para qualquer pesquisador qualitativo estar sensível aos limites e possibilidades teóricas que atravessam seus objetivos de investigação. A experiência do piloto não apenas contribui para avaliar o alcance da perspectiva teórica que alicerça o planejamento da pesquisa, mas pode também desvelar outras possibilidades de teorizações e argumentações. Assim, o piloto pode ser útil para aguçar essa lucidez teórica (JANGHORBAN; ROUDSARI; TAGHIPOUR, 2014; ISMAIL; KINCHIN; EDWARDS, 2018).

Dimensão Analítica: a análise e interpretação dos dados é consistente?

A dimensão analítica verifica a consistência do processo de análise e interpretação dos dados produzidos. Trata da organização e compreensão do pesquisador diante dos dados da investigação. A esse respeito, os resultados-p mostraram dois insights: tática de redução e tática de interpretação dos dados produzidos.

O corpus de análise consistiu em doze acontecimentos discursivos caracterizados por diferentes jogos de linguagem operados por estudantes e professores na sala de aula. Os acontecimentos são aqui compreendidos como situações, condições e sentidos de usos de linguagem matemática no contexto acadêmico. Entretanto, os resultados indicaram um procedimento pertinente para redução dos dados: classificar o corpus de análise por categorias relacionadas, sendo Acontecimentos Discursivos Críticos (ADC) - acontecimentos em que percebemos a ocorrência de conflitos - nossa categoria central de análise. Este critério de classificação foi importante para que os dados fossem reduzidos e codificados no estudo, facilitando o processo analítico.

Outro insight fundamental foi em relação aos procedimentos para produzir interpretações. Todo o material foi examinado com base nas teorizações de Wittgenstein (2009) e Foucault (2014) e as análises aconteceram com base em um filtro interpretativo constituído de três níveis: pesquisador, participantes e pesquisadores parceiros. A Figura 1 ilustra o filtro interpretativo utilizado no piloto como tática para avaliar a consistência do processo analítico.

Fonte: Autores, 2018.

Figura 1: Filtro Interpretativo 

Cada uma das partes da figura representa um dos níveis do processo interpretativo. A parte de cima do filtro refere-se ao primeiro nível - camada do pesquisador. A fase onde são produzidas as primeiras linhas interpretativas e que tem o pesquisador como principal elemento filtrante. Nesta etapa, examinamos os ADC à luz de nossas próprias percepções e, claro, orientados pela teoria. Daí surgiram nossas primeiras impressões sobre os conflitos entre diferentes jogos de linguagem matemáticos, constituindo, assim, uma base inicial de interpretações.

Na parte intermediária, está o segundo nível - camada dos participantes. Esta é a fase do feedback dos participantes. Nesta fase, visando produzir análises mais robustas, decidimos convidar os participantes para produzirem suas próprias análises sobre os dados produzidos. Foi uma etapa útil para assegurar que os achados refletissem suas próprias experiências e que nos possibilitou refinar entendimentos sobre o significado de importantes jogos linguísticos identificados em alguns episódios. Por exemplo, foi o feedback dos participantes que nos permitiu inferir que, em um determinado episódio, os estudantes usaram recorrentemente a expressão “usei a lógica” como sinônimo de não terem usado a regra (a fórmula) ensinada pela professora.

A parte de baixo do filtro indica o terceiro nível - camada dos pesquisadores parceiros. Esta é a fase marcada pela presença de pesquisadores pares na revisão das impressões inicialmente produzidas pelo pesquisador e participantes. No nosso caso, compartilhamos também das primeiras intepretações com pesquisadores parceiros, no caso, com nossos pares do Grupo de Pesquisa em Ensino de Ciências e Matemática (ENCIMA) da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Na revisão por pares, fomos alertados, por exemplo, sobre o viés de determinadas posições interpretativas e também sobre o uso de alguns procedimentos analíticos que não ressoavam com as perspectivas teóricas adotadas no estudo, como foi o caso da nossa tentativa de utilizar o software Ensemble de Programmes Permettant L’analyse des Évocations - EVOC (VERGÈS, 2002) para analisar dados.

As linhas tracejadas entre os níveis, indicam justamente essa possibilidade de fluxo contínuo de interpretações, isto é, há conexões possíveis entre os pesquisadores, os participantes e os pesquisadores parceiros. À medida que o pesquisador se movimenta entre as diferentes camadas, transita por diferentes pontos de vistas, desenvolve leituras possíveis e produz outros sentidos sobre os achados. Isto contribui para clarificar os vieses e refinar suas interpretações.

Os resultados sugeriram que o EP foi útil para evitar excessos de informações, remover eventuais equívocos interpretativos e, assim, promover mais consistência e credibilidade ao processo analítico. Foi através da tática do filtro que conseguimos identificar algumas formas de conflitos, tais como o “conflito de palavra”, isto é, divergências quanto ao modo de usar uma palavra; e “conflito de procedimento”, ou seja, embates entre diferentes métodos de resolver uma tarefa matemática. No episódio da pirâmide, por exemplo, um conflito de palavra se manifestou quando a professora e a estudante, orientadas por diferentes regras, produziram diferentes significados matemáticos para um mesmo vocábulo (“pirâmide”). Já no episódio da PA, um conflito de procedimento emergiu quando a docente e o discente se orientaram por diferentes métodos matemáticos para resolverem uma mesma tarefa.

Podemos dizer, portanto, que a credibilidade de uma pesquisa qualitativa está diretamente relacionada ao rigor analítico que o pesquisador qualitativo emprega na pesquisa. Neste sentido, o piloto tem contribuído significativamente para que pesquisadores qualitativos avaliem e refinem os procedimentos analíticos que caracterizam a investigação (RICHARDSON, 2012).

Dimensão Operacional: os equipamentos e a logística são funcionais?

A dimensão operacional avalia o uso de equipamentos, técnicas e logísticas que são funcionais para a investigação. A noção de operacional é aqui entendida em termos de ação que permite ou facilite a realização de outras ações.

A análise do piloto confirmou que o uso da filmadora e do gravador de voz são instrumentos úteis para registrar em detalhes as interações discursivas dos participantes. Esses equipamentos conseguem registrar mais detalhes do que aqueles observados pelo pesquisador em suas notas de campo (FLICK, 2009). Através deles, conseguimos armazenar detalhes de interações verbais e não-verbais dos ACD e assisti-los mais de uma vez, subsidiando a análise sobre as tensões. O uso de pastas digitais no computador, por sua vez, serviu como um bom recurso para o armazenamento destes dados.

Por outro lado, alguns problemas técnicos indicaram mais atenção da nossa parte na qualidade dessas ferramentas. Por exemplo, ao assistirmos a gravação da primeira aula, detectamos problemas com o áudio do vídeo, de modo que o que auxiliou a análise fílmica foi o gravador de voz que usamos como um recurso de segurança. Também foi observado que nem a posição e nem o uso de apenas uma filmadora contribuiu para revermos cenas importantes, como a expressão gestual da estudante quando silenciou-se no episódio da pirâmide. Assim, à luz do piloto, o insight foi a tática da cartografia, ou seja, fazer um levantamento da arquitetura da sala (estrutura, espaço, acústica, luminosidade) e mapeamento da dinâmica da aula (posicionamentos e comportamentos mais frequentes de estudantes e professoras) para definir como melhor utilizar e posicionar, não mais uma, mas duas filmadoras.

Com respeito ao local das entrevistas, os resultados evidenciaram que quando realizadas na sala de aula, geralmente logo após a aula, os entrevistados sentiam-se mais tímidos quanto aos seus depoimentos. O insight foi realizá-las em salas mais reservadas, onde os entrevistadores pudessem interagir mais livremente. Outro insight importante foi conduzir entrevistas por telefone, e-mail ou WhatsApp, especialmente, nos casos em que surgiram dificuldades em fazer a entrevista cara a cara.

Apresentamos aqui alguns problemas da parte operacional da pesquisa, como o mau desempenho de ferramentas e dificuldades na gestão do espaço e horário das entrevistas. Os resultados confirmam que o uso de equipamentos e a logística em um estudo podem facilitar ou dificultar o desenvolvimento da investigação (FLICK, 2009; CRESWELL, 2014). Argumentamos, portanto, que o pesquisador qualitativo pode pilotar um estudo para refletir sobre potenciais problemas operacionais e adquirir insights que o auxiliem na elaboração de um protocolo de procedimentos operacionais mais adequados para o propósito do estudo. Isso evita o desperdício de recursos, tempo e dinheiro da pesquisa, contribuindo na condução da investigação.

Dimensão Representacional: a apresentação dos resultados é acurada?

A dimensão representacional examina as estratégias para descrever e divulgar os resultados da investigação. Trata dos recursos que o pesquisador utiliza para redigir e apresentar o relatório final.

Avaliamos a apresentação dos resultados do estudo em dois momentos: primeiro, quando divulgamos achados preliminares para os estudantes, visando obter feedbacks; depois, quando socializamos os resultados para os pesquisadores pares, objetivando verificar a consistência metodológica e interpretativa. Essa tática de divulgação foi um insight importante, pois as duas situações, dadas as suas especificidades, ofereceram ricas possibilidades de refletirmos sobre a melhor forma de descrever, sistematizar e comunicar os resultados do estudo, sem perder de vista o público para o qual comunicamos o relatório de pesquisa.

A análise mostrou que a linguagem utilizada na descrição dos resultados precisou levar em conta peculiaridades das duas audiências, de modo que as informações fornecidas fossem acessíveis, claras e úteis para cada uma delas. Para embasar e sistematizar as informações em cada público, foi preciso exercitar o encadeamento coerente de ideias. As estratégias de escrita utilizadas como o uso de sinopses de acontecimentos discursivos com ilustrações fotográficas, excertos das transcrições de falas e o uso de dados tabulados por categorias se mostraram úteis e consistentes. O uso de tabelas e quadros do Word, também indicaram serem ótimos recursos, sobretudo para diminuir as margens de erros e evitar o desperdício de tempo.

Na apresentação, o desafio foi tentar mostrar dados com análises bem fundamentadas e com base nos resultados mais significativos. A forma como fomos questionados sobre dados que suscitaram dúvidas, demandou da nossa parte a comunicação mais clara de informações, alertando-nos sobre o uso de dados imprecisos ou inadequados e a necessidade de uma redação mais consistente e objetiva. Por outro lado, os questionamentos também foram informativos sobre nossa postura na comunicação dos resultados. O insight foi estar aberto a outros olhares, a outras vozes. Por exemplo, foi importante estarmos abertos ao parecer dos pares, pois contribuiu para produzirmos resultados mais embasados, o que nos trouxe maior segurança e confiança na comunicação dos resultados.

A experiência piloto mostrou que a descrição dos resultados é um processo em construção coletiva. Creswell (2014apud GILGUN, 2005), argumenta que a redação de um estudo é uma representação de processos interativos entre o pesquisador e o pesquisado, cujo processo ajuda ao que ele chama de reflexividade do pesquisador, ou seja, na forma como ele percebe os vieses e os valores da experiência que ele traz para a pesquisa.

Portanto, a posição que tomamos aqui é que ao pilotar a apresentação dos resultados, o pesquisador qualitativo pode desenvolver formas de narrativas coerentes, concisas e intersubjetivas de comunicação dos resultados, tendo em vista sua audiência. No caso de pesquisadores novatos, o piloto pode ser um bom ponto de partida para que ele aprenda lições sobre a relevância da comunicação clara e objetiva de ideias e sobre a escrita do relatório do estudo (FONGER, 2011).

Dimensões analíticas de um piloto: uma proposta

Nesta seção, sistematizamos as seis dimensões que foram constituídas a partir de reflexões sobre os resultados do piloto: dimensão ética, dimensão metodológica, dimensão teórica, dimensão analítica, dimensão operacional e dimensão representacional. Em cada uma delas, distinguimos e tratamos um conjunto de questões específicas que orbitam em torno do delineamento da pesquisa. Todas essas dimensões aparecem esquematizadas na Figura 2.

Fonte: Autores, 2018.

Figura 2: Proposta analítica multidimensional do estudo piloto 

Representamos cada uma das dimensões em círculos próprios para ressaltar que cada uma possui suas próprias especificidades. No entanto, as linhas tracejadas que delineiam cada uma delas indicam que, apesar dessas particularidades, as dimensões não estão fechadas em si mesmas, mas são permeáveis, ou seja, passíveis de interagirem entre si. Por exemplo, os resultados mostraram que ao lidarmos com as expectativas e vozes dos participantes (dimensão ética), à medida que suas falas revelaram informações importantes sobre as pessoas e o contexto a serem observados, demandaram a inclusão de pontos importantes a serem considerados na condução de observações e entrevistas (dimensão metodológica). Estas, por sua vez, revelaram situações, como, por exemplo, a incidência do controle discursivo na sala de aula, que demandaram uma revisão do referencial teórico que sustentava o estudo (dimensão teórica).

O desenho de formatos circulares semelhantes supõe equivalência, ou seja, não há dimensão de maior ou menor valor, mas todas são partes igualmente importantes no delineamento do estudo. Para a condução da pesquisa, a maneira como o pesquisador posiciona suas argumentações em uma determinada linha teórica é tão importante quanto a maneira como posiciona uma filmadora no ambiente a ser observado e assim por diante.

O desenho da linha circular tracejada conectando as dimensões ressalta dois aspectos: ligação e movimento em torno de um núcleo comum. Ao operar o piloto, o pesquisador coloca em funcionamento um conjunto de questões (éticas, metodológicas, teóricas, analíticas, operacionais e representacionais) conectadas e que gravitam em torno da reflexão sobre o delineamento de um projeto de pesquisa qualitativa. Podemos dizer, analogamente, que este movimento gera um tipo de campo de interação mútua. Isto significa que o processo de refinamento não está limitado a cada dimensão particular, mas nas relações entre elas. À medida que o pesquisador refina determinada dimensão, representa formas de refinamentos do delineamento. Conforme sugerimos, a primeira observação feita a campo promoveu uma reformulação na questão central do estudo, ressoando melhor o tipo de pergunta para o que pretendíamos compreender. A pergunta, por sua vez, ao delimitar melhor o foco de estudo, promoveu ajustes no foco da observação, para que esta pudesse correspondê-la. Estes refinamentos promoveram outros aprimoramentos em várias dimensões, o que nos possibilita argumentar que os refinamentos nas dimensões, ao ressoarem entre si, promovem consistência ao delineamento do estudo. Os resultados apontam que, enquanto fomos tratando e refinando as dimensões, o estudo foi adquirindo viabilidade metodológica, capacidade teórica, consistência interpretativa, funcionalidade operacional, coerência representacional, dando mais potencialidade ao estudo principal.

Esse sistema multidimensional do piloto nos parece uma alternativa potencial para promover consistência ao delineamento da pesquisa qualitativa. Sua função relaciona-se com a identificação de condutas éticas e potencialmente relevantes, o refinamento de métodos específicos, a análise de questões epistemológicas, analíticas e de ordem prática. Assim, pesquisadores poderão prosseguir com a investigação, tendo em vista alcançar seus objetivos de pesquisa.

Algumas considerações

Não se arrisque, teste primeiro o piloto (DE VAUS, 1993). Ao que nos parece, esta é uma recomendação bastante oportuna para os pesquisadores, dados os desafios que estão postos na condução de uma pesquisa qualitativa (CRESWELL, 2014). O pesquisador tem algo a aprender sobre seu projeto de investigação quando desenvolve um estudo piloto, ainda que as lições o levem a refinar todo o plano de investigação. Foi essa a questão que procuramos tratar neste artigo.

Tentamos aqui responder sobre o que aprendemos do delineamento de uma pesquisa qualitativa a partir de um EP. Com base nos resultados, argumentamos que, ao pilotar um estudo, adquirimos um conjunto de insights que orientaram a tomada de decisões sobre um conjunto de questões (éticas, metodológicas, teóricas, analíticas, operacionais e representacionais) que impulsionaram vários refinamentos no projeto de pesquisa, dando consistência ao estudo, antes de iniciar a sua fase principal. Através da condução do piloto, tornamo-nos mais confiantes na pesquisa. É oportuno lembrar que o estudo piloto contribui para o desenvolvimento pessoal do pesquisador, aumentando sua confiança e competência na prática da pesquisa qualitativa (WRAY; ARCHIBONG; WALTON, 2017; ISMAIL; KINCHIN; EDWARDS, 2018). Através do piloto, o pesquisador refina sua própria prática de pesquisa, podendo desenvolver uma série de habilidades, tais como a sensibilidade ética, técnicas de condução de observações e entrevistas, capacidade de argumentação teórica e interpretativa, destreza na operacionalização de ferramentas de estudo ou a ser claro e conciso na comunicação dos resultados da investigação.

Com base nas reflexões aqui apresentadas, construímos uma proposta analítica do piloto, visando subsidiar discussões sobre o potencial do piloto em pesquisas qualitativas. A nossa intenção é oferecer aos pesquisadores qualitativos uma ideia de plano analítico que pode ser útil para auxiliar a pilotagem de um estudo. Não se trata de um modelo definitivo. Várias outras dimensões/questões podem ser desveladas ou, até mesmo, outras possibilidades analíticas podem ser criadas.

Por fim, convidamos pesquisadores qualitativos, inexperientes ou não, a refletirem sobre o potencial do estudo piloto para o desenvolvimento da pesquisa qualitativa. Isto representa abrir-se para discutir sobre o que aprendemos com os erros e acertos que experienciamos nos bastidores das nossas pesquisas e como essas experiências podem contribuir para o desenvolvimento do conhecimento científico.

Agradecimentos

Aos professores e estudantes que participaram do estudo e aos colegas do Grupo de Pesquisa em Ensino de Ciências e Matemática (ENCIMA).

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1Ao longo deste artigo, também nos referiremos ao estudo piloto por “EP” ou “piloto”.

2Referimo-nos a “formação de professores do campo” aos processos formativos ligados à Licenciatura em Educação do Campo. O objetivo do curso é formar educadores do campo, em nível superior e por áreas de conhecimentos, para atuarem nos Anos Finais do Ensino Fundamental, no Ensino Médio e na gestão de processos educativos comunitários (BRASIL, 2013).

3Preferimos utilizar a expressão “produção de dados”, em vez de “coleta de dados”, por compreendermos que os dados empíricos são constituídos nas teias teóricas e metodológicas de uma determinada pesquisa, de modo que eles são inseparáveis de suas condições de produção.

4Neste artigo, descrevemos questões éticas ligadas ao nosso contato com os participantes na primeira fase do estudo.

5Em algumas partes do texto, utilizamos o termo “resultados-p” para nos referir de forma abreviada aos resultados do estudo piloto.

6A horta mandala é um canteiro de formato circular utilizado por agricultores para o cultivo de hortaliças em comunidades campesinas.

7Apresentamos aqui algumas possíveis articulações restritas aos conceitos que estamos operando neste estudo. Isto não significa dizer que não reconhecemos as distinções que marcam as posições filosóficas de ambos os filósofos.

8É possível afirmar, por exemplo, que ambos operam com a ideia de que a linguagem não se restringe a descrever ou representar o mundo, mas como atividade constitutiva da realidade. Na filosofia wittgensteiniana, “é pela linguagem que damos sentido às coisas (mundo)”; e, na filosofia foucaultinana, a linguagem é “constitutiva do nosso pensamento e, em consequência, do sentido que damos às coisas, à nossa experiência ao mundo” (VEIGA-NETO, 2007, p. 89 e 90).

Recebido: 22 de Março de 2018; Aceito: 21 de Março de 2019

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