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Revista Eletrônica de Educação

versión impresa ISSN 1982-7199

Rev. Elet. Educ. vol.14  São Carlos ene./dic 2020  Epub 29-Oct-2020

https://doi.org/10.14244/198271994891 

Dossiê Consequências do Bolsonarismo sobre os direitos humanos, a educação superior e a produção científica no Brasil

Apresentação do Dossiê Consequências do Bolsonarismo sobre os direitos humanos, a educação superior e a produção científica no Brasil”

João dos Reis Silva JúniorI 

IUniversidade Federal de São Carlos, Departamento de Educação, São Carlos - SP, Brasil - Email: joaodosreissilvajr@gmail.com


Org.: João dos Reis Silva Júnior, Deise Mancebo e João Ferreira de Oliveira

Este dossiê é uma iniciativa da longeva Rede Nacional de Pesquisa Universitas/Br http://www.redeuniversitas.com.br/ e é tornado público num contexto de muitas crises no Brasil e no mundo. A pandemia do COrona VIrus Disease (COVID-19) expôs o quão vulnerável qualquer nação do Planeta Terra está, independentemente de sua forma política. Porém, o quadro pandêmico de cada país foi agravado ou controlado por meio de seus líderes, cujas instruções são abstraídas e reproduzidas pelo seu povo.

É neste momento, de crise sanitária mundial, que as “máscaras” dos líderes políticos negacionistas caem enquanto as máscaras de proteção individual integram a nova face do ser humano.

No Brasil, os muitos sinais de negacionismo antecedem a pandemia e são provenientes principalmente de líderes políticos, líderes religiosos e influenciadores digitais que possuem grande alcance nas diversas mídias sociais. No momento de produção deste texto - metade do mês de setembro de 2020 -, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) conta-se no Brasil 134 mil mortes confirmadas por COVID-19 e mais de 4 milhões de casos confirmados. Este número poderia ser muito menor, mas o desprezo pela vida humana é parte do modus operandi do governo neoconservador e ideologicamente reacionário de Jair M. Bolsonaro.

Bolsonaro é o resultado da amálgama das reformas e crises políticas do Brasil nos últimos 30 anos e o caos que a nação brasileira experimenta em 2020 é a síntese da mercantilização da vida humana, imposta pelo capitalismo mundial por meio dos neoliberais. Processo posto há aproximadamente meio século pelo Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado (PDRAE), produzido pelo ex-Ministro da Administração e Reforma do Estado Luiz Carlos Bresser-Pereira na primeira metade da década de 1990. Essa reforma foi o ponto de partida para as mudanças estruturais na organização do estado brasileiro como vemos hoje e é parte da transformação do capitalismo mundial que ao final da década de 1980 buscava novos modos de regulação dos estados.

Diante do exposto e para entender o presente momento é necessária uma breve visada histórica, com início em novembro de 1989, mês em que economistas liberais latino-americanos, funcionários do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e do governo norte-americano reuniram-se por convocação do Institute for International Economics, entidade de caráter privado, para discutir medidas econômicas que posteriormente desdobraram-se em Reformas do Estado em mais de sessenta países. Esta reunião realizada em 1989 ficou conhecida como o Consenso de Washington, quando teve início a acentuação do declínio do processo civilizatório por meio da transformação dos direitos humanos dos cidadãos em mercadoria com o objetivo de reduzir o custo do trabalho vivo. O Brasil não ficou de fora e por meio do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) a lógica do Consenso de Washington tornou-se prática ativa dos governos federais desde 1995, intensificado por Michel Temer (2016-2018) e Bolsonaro na atualidade.

Destarte, desde a década de 1990 o que ocorre no Brasil é a redução da esfera pública e o aumento ao máximo da esfera privada, processo que pretende cada vez mais comerciliazar os direitos dos cidadãos para manter a lógica da mercantilização (o espólio humano). Porém, em 2008, outra forte crise econômica global fez esse movimento se acentuar em função da busca do capital financeiro por mais lastro. Fato que originou um novo regime de acumulação financeira que exigiu reformas mais duras para espoliar ainda mais o trabalhador e a ciência.

Com Lula na presidência e seus fragmentos de social democracia não seria possível isso acontecer no Brasil. Fato que explica a razão estrutural que fundamentou o golpe de 2016 e provocou o presente tormento social e econômico que marcou a volta do crescimento da desigualdade social no Brasil. Fator que impulsiona o novo regime de predominância financeira baseado na dívida social com o movimento de reformas - cortes de bolsas e financiamentos de pesquisas na CAPES e CNPq, Reforma da CLT (Reforma Trabalhista), Teto de Gastos, Reforma da Previdência e as mais recentes, a Reforma Administrativa e Reforma Tributária, ambas em trâmite.

Esse pacote de destruição de direitos precisou de um representante, alguém muito servil às grandes corporações mundiais e que de forma autoritária resgatasse a censura contra quem questionasse tais reformas e as ações anti-povo. Desse movimento, entre rupturas políticas e crises, solo fértil para o autoritarismo, emerge o Bolsonarismo, produzindo acentuada redução dos direitos humanos e de forma não democrática propaga o negacionismo que finda na pior simbiose social da história recente do Brasil. Por outro lado, a Natureza parece vingar-se do processo civilizatório capitalista, produzindo condições objetivas para o declínio das condições de saúde e sanitária, a PANDEMIA. Fase em que a ciência brasileira é negada por meio de intensa redução de investimentos desde 2016. E, em tempo histórico de maior necessidade de investida na produção de conhecimento, por exemplo, na busca de soluções como a vacina para o coronavírus, uma das pautas do governo Bolsonaro é o perdão da bilionária dívida das igrejas com o Estado.

Contudo, podemos mudar esta realidade. Há esperança!

Na pandemia devemos nos orientar por meio das recomendações dos órgãos competentes como a OMS e na sociedade civil brasileira resistir aos ataques à democracia. Esta revista é um caso exemplar, une produções de intelectuais de diversas áreas do conhecimento no intuito de racionalizar a realidade composta por crises. Neste dossiê, apresentamos ótimas produções do grupo de intelectuais da Rede Universitas/Br e da Sociedade Brasileira de Filosofia da Educação (SOFIE). Leituras recomendadas para entender as contradições da história recente do Brasil e fortalecer a voz crítica de um povo cada vez mais violado pelo comportamento inconsequente de líderes políticos autoritários e subservientes de espoliadores.

O presente dossiê, organizado por João dos Reis Silva Júnior, Deise Mancebo e João Ferreira de Oliveira, contém artigos que discutem e analisam os efeitos do Bolsonarismo na sociedade civil brasileira, que enfrenta nos últimos anos profundas crises sociais, econômicas e políticas que se desdobram de modo direto na produção de ciência e nos direitos dos cidadãos. Neste dossiê, 20 textos tratam, por meio de diferentes perspectivas, como um governo totalitário retorna ao poder convencendo grande parte da nação a apoiar medidas impopulares que a afetam diretamente. Observa-se também nestas produções o cuidado com a história de governos autoritários em todo o planeta e de que modo a democracia brasileira está sendo atacada por meio do reacionarismo. Reação sistemática que flerta com elementos de fases nefastas da história da humanidade, o fascismo e o nazismo.

Deise Mancebo inicia o dossiê discutindo, no artigo Pandemia e educação superior no Brasil, os pandêmicos impactos da COVID-19 na educação superior brasileira em tempos de ultraneoliberalismo. Bruno Pucci, da Sociedade Brasileira de Filosofia da Educação (SOFIE), por meio do texto A Personalidade Autoritária no Brasil em tempos de neoliberalismo e de Coronavírus, analisa as manifestações antidemocráticas que estão ocorrendo no Brasil no crescente ideal neoliberal de Bolsonaro. João dos Reis e Everton Fargoni analisam a ruptura da estabilidade política brasileira, os ataques às instituições, a crise econômica e politização da ciência sob ataque ideológico no artigo Bolsonarismo: a necropolítica brasileira como pacto entre fascistas e neoliberais.

Newton Duarte, Silvia dos Santos e Elaine Duarte tratam as implicações do bolsonarismo para a produção e difusão de conhecimentos nas instituições públicas de ensino superior no artigo O obscurantismo bolsonarista, o neoliberalismo e o produtivismo acadêmico. Maria Rosimary, Ricardo Musse e Afrânio Catani examinam a ascensão da extrema direita no País no artigo Desconstruindo a educação superior, os direitos humanos e a produção científica: o bolsonarismo em ação. O autor Luiz Roberto Gomes, membro da Sociedade Brasileira de Filosofia da Educação e pesquisador do Grupo Teoria Crítica e Educação, aborda no artigo Autoritarismo de múltiplas faces no Brasil: antissemitismo, bolsonarismo e educação o comportamento autoritário do bolsonarismo pela perspectiva da Teoria Crítica da Sociedade.

As autoras Rhoberta de Araújo, Fabíola Kato e Vera Jacob analisam as três versões do Programa Future-se no artigo O programa Future-se e o desmonte do financiamento público e da autonomia universitária. Monica Molina, Clarice dos Santos e Márcia Brito no artigo O Pronera e a produção do conhecimento na Formação de Educadores e nas Ciências Agrárias: teoria e prática no enfrentamento ao bolsonarismo discorrem sobre os direitos do campesinato como alvo de ataques do bolsonarismo e os intentos de destruição do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária. Larissa Paulo e Gerson Fraga debatem os discursos de Jair Bolsonaro sob o prisma da produção da alteridade por meio do artigo A produção do inimigo ou destruição da alteridade: uma análise dos discursos de Jair Bolsonaro.

Rafael Siqueira e Cleber Braga, por meio do artigo “Meu twitter, minhas regras”: as pautas de costumes na educação bolsonarista, analisam o despudor e costumes dos ex-ministros da educação de Bolsonaro. Alisson Sullivan e Francisco Vieira também analisam os discursos sobre as ciências humanas do bolsonarismo por meio da perspectiva focaultiana no texto Discursos sobre as ciências humanas no bolsonarismo: da repetição à prática. Débora Boenavides discorre no artigo A polissemia enquanto interpretante do confronto entre vozes sociais como o vocabulário dos atores sociais bolsonaristas polemizam questões políticas.

As autoras Daniele Raic, Marilete Calegari e Socorro Pereira cartografam o cenário neoliberal brasileiro na pandemia da COVID-19 no artigo A universidade pública em cenários neoliberais e fascistas: balbúrdias de resistência em tempos de Covid-19. Celso Carvalho e José Eduardo de Oliveira analisam os fundamentos teórico-políticos do processo de ascensão, no Brasil, de forças denominadas neoconservadoras, neoliberais, de extrema direita no artigo A lógica do capital financeiro e sua expressão educacional: a barbárie bolsonarista em ação. Solange Pereira da Silva analisa as narrativas do governo Bolsonaro em tempos de crise de saúde pública no artigo Impactos do Governo Bolsonaro em tempos de Coronavírus no Brasil. Hellen Silva, Maura dos Anjos, Monica Molina e Salomão Hage descrevem os resultados de uma pesquisa sobre políticas, gestão e direito à educação superior no artigo Formação de Professores do Campo frente às “Novas/Velhas” políticas implementadas no Brasil: R-existência em debate. Os autores Marco Antônio, Marilsa Miranda, Crislaine Aparecida e Italo Ariel discutem as relações entre o golpe civil militar de 1964, as reformas educacionais implementadas no período e a Teoria do Capital Humano, no artigo Educação e a ditadura civil militar: as reformas educacionais e a teoria do capital humano (1964-85). Vinício Carrilho Martinez, em seu texto Fascismo: o pior crime contra a democracia, discorre sobre o bolsonarismo e suas características no berlusconismo italiano e os elementos fascistas que o compõe. Alexsander e Edna Brennand produziram o artigo A universidade e a produção do conhecimento sobre violações aos direitos humanos, discorrendo sobre o papel das universidades na defesa da vida, da democracia e do estado de direito, e o papel da ciência como geradora de espaços de resistência no cotidiano. Mariángela Nápoli e Judith Naidorf no artigo Elinor Ostrom y sus aportes a la coproducción del conocimiento científico recuperam as ideias de Elinor Ostrom sobre bens comuns (1990, 1996) com o objetivo de analisar suas contribuições para a coprodução do conhecimento científico.

Boa leitura!

Referências

SILVA JÚNIOR, J. dos R. . Apresentação do Dossiê Consequências do Bolsonarismo sobre os direitos humanos, a educação superior e a produção científica no Brasil. Revista Eletrônica de Educação, [S. l.], v. 14, p. e4891151, 2020. DOI: 10.14244/198271994891. Disponível em: Disponível em: https://www.reveduc.ufscar.br/index.php/reveduc/article/view/4891 . Acesso em: 16 nov. 2023. [ Links ]

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