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Revista Eletrônica de Educação

versión impresa ISSN 1982-7199

Rev. Elet. Educ. vol.14  São Carlos ene./dic 2020  Epub 29-Oct-2020

https://doi.org/10.14244/198271994532 

Dossiê Consequências do Bolsonarismo sobre os direitos humanos, a educação superior e a produção científica no Brasil

Autoritarismo de múltiplas faces no Brasil: antissemitismo, bolsonarismo e educação1

Autoritarismo multifacetico en Brasil: antisemitismo, bolsonarismo y educación

IUniversidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos-SP, Brasil - Professor Associado do Departamento de Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de São Carlos. ORCID iD: http://orcid.org/0000-0002-8867-7897. Líder do Grupo de Pesquisa “Teoria Crítica e Formação Ético-Política” (UFSCar/CNPq). Membro da Sociedade Brasileira de Filosofia da Educação - SOFIE. E-mail: luizrgomes@ufscar.br


Resumo

Esse artigo aborda o tema do autoritarismo no Brasil, mediante a reflexão de três conceitos fundamentais: o antissemitismo, o bolsonarismo e a educação. Para o desenvolvimento da argumentação que sustenta a tese desse artigo, três aspectos serão destacados: o primeiro relaciona-se à compreensão da configuração histórico-cultural da sociedade brasileira, que amalgama o autoritarismo à brasileira; o segundo aborda a possível vinculação entre o bolsonarismo e os elementos do antissemismo, que foram desenvolvidos por Horkheimer e Adorno em 1947; e o terceiro insiste na necessidade da autorreflexão crítica, como manifestação prática de inconformismo e combate aos autoritarismos diversos no Brasil.

Palavras-chave: Antissemitismo; Bolsonarismo,Teoria Crítica e Educação

Resumen

Este artículo presenta el tema del autoritarismo en Brasil, a partir de la reflexión sobre tres conceptos fundamentales: antisemitismo, bolsonarismo y educación. Para el desarrollo de la argumentación que sostiene la tesis del artículo, se destacan tres aspectos: el primero se refiere a la comprensión de la configuración histórico-cultural de la sociedad brasileña, que concreta el autoritarismo al “estilo brasileño”; el segundo se refiere a un posible vínculo entre el bolsonarismo y los elementos del antisemitismo, que fueron desarrollado por Horkheimer y Adorno en 1947; y el tercero refuerza la necesidad de autorreflexión crítica, como una manifestación práctica de no conformidad y de lucha contra los diversos tipos de autoritarismo en Brasil.

Palabras claves: Autoritarismo; Antisemitismo; Bolsonarism; Teoría Crítica y Educación

Abstract

This article addresses the theme of authoritarianism in Brazil, by reflecting on three fundamental concepts: anti-Semitism, Bolsonarism and education. For the development of the argumentation that supports the article thesis, three aspects will be highlighted: the first relates to the understanding of the historical-cultural configuration of Brazilian society, which amalgamates a kind of Brazilian-style authoritarianism; the second addresses the possible link between Bolsonarism and the elements of antisemitism, which were developed by Horkheimer and Adorno in 1947; and the third reinforces the need for critical self-reflection, as a practical manifestation of non-conformity and combating the diverse authoritarianisms in Brazil.

Keywords: Authoritarianism; Anti-Semitism; Bolsonarism; Critical Theory and Education

“Chora A nossa pátria mãe gentil Choram Marias e Clarisses No solo do Brasil” (João Bosco e Aldir Blanc, 1979)

Introdução

As discussões atuais sobre o totalitarismo, no sentido das questões formuladas por Arendt (1989) e Weinstein (2018), fazem emergir um conjunto de reflexões sobre o processo de revitalização do autoritarismo no mundo e, mais especificamente, na América Latina. Conforme a argumentação de Jessé Souza , no Brasil recente, o “Golpe Parlamentar-Jurídico de 2016” sacramentou não só o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, como recuperou também uma série de ações autoritárias e violentas, que estão na base da constituição histórico-cultural da sociedade brasileira. A tradição escravista, a exploração e concentração das riquezas nas mãos de poucos e, principalmente a negação de ações republicanas voltadas ao Bem Comum, certamente figuram como elementos importantes para a compreensão das práticas autoritárias, que predominam hoje no Brasil e ameaçam cotidianamente o Estado Democrático de Direito.

Em termos educacionais, o imperativo “Que Auschwitz não se repita!”, enunciado por Theodor Adorno em 19653, se atualiza, quase 80 anos depois de uma das manifestações mais trágicas do nazi-fascismo, que resultou no extermínio em massa de mais de seis milhões de judeus. Uma questão que poderíamos formular neste momento seria: como e por que a cultura autoritária, de feição neofascista, ganha cada vez mais espaço em sociedades ditas “democráticas”, como a brasileira?

Os episódios de autoritarismo são múltiplos e constantes na história do Brasil. Eles podem ser observados, a todo tempo, em vários segmentos da sociedade brasileira. Não se trata apenas de períodos específicos, tais como: o genocídio dos indígenas, por ocasião da invasão das terras brasileiras em 1500; ou dos mais de 300 anos de escravidão oficializada; da Ditadura de Vargas no Estado Novo; dos “Anos de Chumbo” (1964-1984); ou da personalidade autoritária extremista - de tipo fascista - de Jair Bolsonaro, de seu governo e do bolsonarismo4 insurgente; que disputam nosso território e nos ameaçam todos os dias. O autoritarismo, de múltiplas faces, também pode ser observado na “gramática segregativa dos afetos”5, manifestada pelas atitudes de indiferença, ódio ambivalente e ódio segregativo; que marcam as ações violentas dos brasileiros. Os discursos racistas, machistas, homofóbicos, xenofóbicos, entre tantos outros, que se multiplicam no Brasil, nos fazem recordar os versos de Aldir Blanc e João Bosco, eternizados em 1979, na voz de Elis Regina: “Chora a nossa Pátria mãe gentil, choram Marias e Clarisses, no solo do Brasil...”. Choramos não só pelos exilados, torturados e mortos pela ditadura militar; momento em que pedíamos a anistia, mas principalmente porque até hoje algumas vidas valem mais do que outras. Choramos, porque muitos são massacrados, excluídos, não têm voz, não são livres, não possuem direitos e, portanto, não são reconhecidos em sua cidadania e dignidade humana.

Em tempos de neoliberalismo e da COVID-196, com o flagrante colapso do sistema econômico, em um capitalismo que sobrevive da especulação financeira e do endividamento social; a luta pela sobrevivência é humanamente desesperadora. As desigualdades econômicas e sociais, o racismo estrutural, os milhares de desempregados, os discriminados, os ditos invisíveis para o Estado, sem CPF e cadastro nos programas sociais do Governo Federal, os “empreendedores” sem renda e qualquer assistência do Estado; colocam em xeque as garantias constitucionais dos direitos fundamentais, previstas no artigo 5º. da Constituição Federal de 1988, em que:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade... (BRASIL, 2000, p. 15).

O contexto atual nos coloca diante de um conjunto de questões que precisam ser tratadas com muita lucidez, distanciamento crítico e senso de responsabilidade social. Aliás, esse é um termo bastante utilizado e banalizado pelos departamentos de marketing das poderosas empresas e das propagandas dos governos, tanto em nível federal, como estadual e municipal. As ações são muito pouco efetivas, se considerarmos a situação concreta de vida da maioria dos brasileiros, a destruição exponencial do meio ambiente, as ameaças às instituições democráticas, os ataques à cultura, à universidade e às pessoas em geral. Uma espécie de ignorância cínica, que nos ameaça diariamente. Quando Theodor Adorno afirmou no ano de 1965, em uma de suas conferências radiofônicas mais conhecidas, que “o centro de toda educação política deveria ser que Auschwitz não se repita” (ADORNO, 1995, p. 137), o que ele estava querendo nos dizer de fato? Qual o legado e quais as orientações pedagógicas que foram compartilhadas pelo autor? Certamente que havia nas palavras de Adorno um diagnóstico de tempo, um compromisso com a formação humana e uma preocupação desesperada com o futuro da humanidade e das sociedades.

Este artigo fundamenta-se na tese de que a personalidade autoritária encontra um terreno fértil de disseminação social, em lugares e situações em que predominam a instrumentalização da formação, o desenvolvimento da racionalidade técnico-científica e a cultura cega do “progresso”. A formação humana, que é responsabilidade de todos nós, está cada vez mais danificada e distante de uma perspectiva educacional voltada à sensibilidade estética e à dimensão ético-política da vida Comum7. Para o desenvolvimento da argumentação que sustenta a tese desse artigo, três aspectos serão destacados: o primeiro relaciona-se à compreensão da configuração histórico-cultural da sociedade brasileira, que amalgama o autoritarismo à brasileira; o segundo aborda a possível vinculação entre o bolsonarismo e os elementos do antissemismo, que foram descritos por Horkheimer e Adorno em 1947; e o terceiro insiste na necessidade da autorreflexão crítica, como manifestação prática de inconformismo e combate aos autoritarismos diversos no Brasil.

Autoritarismo à brasileira

Os traços constitutivos do autoritarismo no Brasil podem ser identificados, em linhas gerais, nas narrativas de obras clássicas da literatura brasileira, publicadas no século XX: “Casa Grande e Senzala" de Gilberto Freyre (1933), “Sobrados e Mucambos” de Gilberto Freyre (1936/2006), "Raízes do Brasil" de Sérgio Buarque de Holanda (1936/1995), “Formação do Brasil Contemporâneo” de Caio Prado Júnior (1942/2000), “Coronelismo Enxada e Voto” de Victor Nunes Leal (1948/1997), “Os Donos do Poder” de Raymundo Faoro (1958/2001), “Formação Econômica do Brasil” de Celso Furtado (1959/2007), "O Povo Brasileiro” de Darcy Ribeiro (1995), “A Elite do Atraso” de Jessé Souza (2017), entre outras, são obras imprescindíveis à compreensão da sociedade brasileira.

Coincidentes em alguns aspectos e contrários em outros, essas obras expressam, com significativa nitidez, algumas características marcantes da cultura brasileira, das quais: o espírito aventureiro, a cordialidade, o elitismo, o dualismo, o personalismo, o patrimonialismo, o familismo, o clientelismo, o coronelismo, o autoritarismo, o escravismo, o racismo, entre outras. A ênfase na formação de uma elite dirigente que ignora, na maioria das vezes, o sentido ético-político da sociedade, só faz acentuar no Brasil, as profundas marcas das desigualdades sociais e raciais, que sempre foram parte de sua história, desde a “descoberta” em 1500, até hoje.

Algumas reflexões específicas sobre os traços formativos da cultura brasileira, que toma como referência as obras clássicas citadas acima, já foram tratadas em artigo recente de Lastória e Gomes (2015)8, de tal forma, que não seria o caso de retomá-las com detalhes aqui. Cabe destacar, nesse momento, os aspectos mais gerais da constituição histórica da sociedade brasileira9, e que pode nos ajudar a compreender o cultivo, em terreno fértil, da ofensiva neofascista, de tipo bolsonarista, que habita o Brasil hoje.

Os argumentos de Caio Prado Júnior apresentados em 1942, em sua obra “Formação do Brasil Contemporâneo”10, demonstram com significativa nitidez a importância da compreensão da história do período colonial no Brasil, nos seus três primeiros séculos (do “descobrimento”, em 1500, até 1822 com a “independência”), pois as marcas do colonialismo não estão registradas tão somente no seu período oficial, mas se fazem presentes até hoje, na vida social, política, econômica, cultural e educacional do Brasil. A questão que poderíamos formular é a seguinte: por que não conseguimos extirpar os elementos que nos escravizam, ainda que os discursos apontem para um determinado “desejo” de emancipação?

Na obra “Raízes do Brasil” de Sérgio Buarque de Hollanda11, publicada em 1936 e considerada no prefácio de Antônio Cândido como “um clássico de nascença”, alguns aspectos da cultura brasileira merecem destaque. Dentre os elementos constitutivos da base cultural e que podem ser interpretados como “raízes”, alguns deles merecem nossa atenção pelo poder de influência exercido na mentalidade e no modo de ser do brasileiro12. Na interpretação de Hollanda (1995) chama a atenção inicialmente, a herança cultural Ibérica advinda do processo de colonização do Brasil pelos portugueses no século XVI, notadamente o espírito da “aventura”, visto como um grande contraste à ética do trabalho, tal como fora tratada por Max Weber:

Uma digna ociosidade sempre pareceu mais excelente, e até mais nobilitante, a um bom português, ou a um espanhol, do que a luta insana pelo pão de cada dia. O que ambos admiram como ideal é uma vida de grande senhor, exclusiva de qualquer esforço, de qualquer preocupação (HOLLANDA, 1995, p. 38).

Do ponto de vista dos valores, que nutrem a forma de conquista dos objetivos dos povos Ibéricos, Holanda indaga: “Essa ânsia de prosperidade sem custo, de títulos honoríficos de posições e riquezas fáceis, tão notoriamente característica da gente de nossa terra, não é bem uma das manifestações mais cruas do espírito aventureiro?” (HOLLANDA, 1995, p. 46). O “personalismo” que acentua a “frouxidão” das instituições, a falta de coesão social e o “desleixo” são outros traços importantes da cultura Ibérica transplantados para o Brasil. O resultado desse processo de personalização da cultura foi a institucionalização de um princípio político baseado na centralização do poder e na obediência como virtude suprema. Trata-se de uma orientação peculiar que demanda a vontade de mandar e a disposição para cumprir ordens. Dentre as diretrizes do processo de colonização católica de feição portuguesa coube à Companhia de Jesus, para além da resistência dos povos indígenas, à tarefa pedagógica de implantar no território brasileiro o princípio da disciplina pela obediência.

Do ponto de vista econômico cabe destacar, pelo seu forte poder de constituição social, os três fatores essenciais que, segundo Prado Júnior (2000), determinaram a estruturação da sociedade agrária brasileira no período colonial: a grande propriedade, a monocultura e o trabalho escravo:

Esses três elementos se conjugam num sistema típico, a “grande exploração rural”, isto é, a reunião numa mesma unidade produtora de grande número de indivíduos; é isto que constitui a célula fundamental da economia agrária brasileira. Como constituirá também a base principal em que se assenta toda a estrutura do país, econômica e social (PRADO JÚNIOR, 2000, p.121).

Cabe salientar, conforme a análise de Celso Furtado (2007), em sua elaboração sobre a “formação econômica do Brasil”, que a partir dos anos 1930 o Brasil desenvolveu-se sobre a base de uma estrutura material, cujo eixo dinâmico foi o processo de industrialização e urbanização. O paradigma econômico que orientou o processo de integração do Brasil ao sistema capitalista mundial foi aquele que se convencionou chamar de “substituição de importações”. Ainda que possamos constatar mudanças nas atividades econômicas, com políticas de produção, exportação e importação específicas na história econômica do Brasil, inclusive com o movimento “nacional desenvolvimentista de industrialização dos anos 1930” (FURTADO, 2007 e IANNI, 1991), e que impactaram o processo de urbanização e desenvolvimento do Brasil; a subordinação e dependência externa, bem como a concentração de renda e riqueza nas mãos de poucos ainda continuam determinando as bases de uma vida social profundamente desigual no Brasil.

Em um país continental como o Brasil, de longa extensão territorial, com terras férteis; o agronegócio global, liderado por grandes grupos econômicos internacionais, tem encontrado cada vez mais espaço na economia brasileira atual. O aumento da produtividade, possibilitado inclusive, com a utilização de alto teor de agrotóxicos e sementes transgênicas, além de intensificar a concentração de renda nas mãos dos herdeiros dos grandes latifúndios, sufoca a agricultura familiar dos pequenos produtores e prejudica a saúde da população brasileira. Trata-se de um conjunto de contradições, com forte poder de destruição e desrespeito à vida e a saúde pública da sociedade brasileira.

A manutenção das desigualdades sociais, distintamente presente no Brasil desde o período colonial, é estruturada conforme os argumentos de Prado Júnior (2000) pelo fundamento econômico das grandes propriedades privadas, da concentração de renda, da separação de classes e escravização do trabalho. Isso significa, segundo a análise recente de Souza (2017), que qualquer ameaça a esse modelo social historicamente constituído pode reacender a chama de práticas autoritárias fascistas.

Também podemos identificar, nas práticas políticas de hoje, aspectos da cultura colonial, que acentuam o “patrimonialismo”, o “coronelismo”, o “clientelismo”, o “familismo” e o “personalismo”, tal como foram tratados nas obras “Raizes do Brasil” de Sérgio Buarque de Hollanda em 1936, “Coronelismo, enxada e voto” de Victor Nunes Leal em 1948 e “Os Donos do Poder” de Raymundo Faoro em 1958. O que essas práticas reforçam, independentemente do emprego dos conceitos, é a forma autoritária de imposição dos interesses privados sobre os públicos, que tendencialmente sempre prevaleceram no Brasil, contrariando, em termos ético-políticos, a vontade da coletividade e a garantia do Bem Comum.

A “herança rural” que legitimou a aristocracia fundiária é uma característica determinante no processo de formação da cultura brasileira. Essa herança “patrimonialista”, como fonte do poder político e econômico baseia-se no modelo da família patriarcal, e nesta:

O quadro familiar torna-se, assim, tão poderoso e exigente, que sua sombra persegue os indivíduos mesmo fora do recinto doméstico (...). O resultado era predominarem, em toda a vida social, sentimentos próprios à comunidade doméstica, naturalmente particularista e antipolítica, uma invasão do público pelo privado, do Estado pela família (HOLLANDA, 1995, p. 85).

A indistinta significação sobre o que compete à família e ao Estado gerou o poder de dominação da família patriarcal13 e ao mesmo tempo um desequilíbrio social que perdura até hoje. Em “Os Donos do Poder” Raymundo Faoro destaca:

O capitalismo politicamente orientado - o capitalismo político, ou o pré-capitalismo, centro da aventura, da conquista e da colonização - moldou a realidade estatal, sobrevivendo, e incorporando na sobrevivência o capitalismo moderno, de índole industrial, racional na técnica e fundado na liberdade do indivíduo, mediante a liberdade de negociar, de contratar, de gerir a propriedade sob a garantia das instituições (FAORO, 2001, p. 819).

Não se trata de um processo de burocratização do sistema político, no sentido de Weber, mas de um estamento burocrático, fundado no sistema patrimonial do capitalismo politicamente orientado, que adquire um caráter patriarcal, identificável no mando do fazendeiro, do senhor de engenho, dos coronéis e, também dos setores que definem a agenda política daqueles que portam consigo grande poder decisório nas instâncias deliberativas, especialmente no legislativo. Ainda segundo Faoro:

Em um estágio inicial, o domínio patrimonial, constituído desta forma pelo estamento, apropria as oportunidades econômicas de desfrute dos bens, das concessões, dos cargos, numa confusão entre o setor público e o privado, que, com o aperfeiçoamento da estrutura, se extrema em competências fixas, com divisão de poderes, separando-se o setor fiscal do setor pessoal (FAORO, 2001, p. 823).

Especificamente sobre o “Coronelismo”, Victor Nunes Leal, em “Coronelismo, Enxada e Voto” esclarece que muitas organizações político-partidárias no Brasil são constituídas em âmbito local-municipal, como uma espécie de:

... resultado da superposição de formas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social inadequada. Não é, pois, mera sobrevivência do poder privado, cuja hipertrofia constitui fenômeno típico de nossa história colonial. É antes uma forma peculiar de manifestação do poder privado, ou seja, uma adaptação em virtude da qual os resíduos do nosso antigo e exorbitante poder privado têm conseguido coexistir com um regime político de extensa base representativa (LEAL, 1997, p. 40).

Esse tipo de organização política centrada nos mandos dos coronéis, e sustentada em boa parte pelos “votos de cabresto”, sela um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos latifundiários, proprietários de terras. Por isso, a importância de uma compreensão mais ampla desse fenômeno social, que se fundamenta na estrutura agrária do país e ainda continua mantendo, em muitas cidades do interior, uma forte influência do poder privado na administração pública.

A argumentação de Faoro mostra a força do patronado político que, ao separar a política da vida social, consegue resistir, inclusive, às pressões sociais. “Os donos do poder”, expressão utilizada por Faoro (2001), de natureza personalista e oligárquica, não representam a vontade geral popular, mas os interesses privados de alguns setores da sociedade. O Estado, com sua forma de cooptação e uso da violência, se necessário, resiste aos eventuais conflitos populares, mediante o uso da máquina e aparelhamento governamental de controle estatal. O povo, por sua vez:

[...] oscila entre o parasitismo, a mobilização das passeatas sem participação política e, a nacionalização do poder, mais preocupado com os novos senhores, filhos do dinheiro e da subversão, do que com os comandantes do alto, paternais e, como o bom príncipe, dispensários de justiça e proteção (FAORO, 2001, 837).

A lei, a ser cumprida por uns e ignorada por outros, sob a proteção do lema “para os amigos tudo, para os inimigos a lei”, é uma aparato jurídico não necessariamente comprometido com a Justiça. O sufrágio universal, que tenderia a ser democrático, em termos de um debate público sobre os programas de governo para o país, também é carcomido pelas diversas formas de manipulação da opinião pública, com as Fake News financiadas por empresários e disparadas instantaneamente nas redes sociais. No fim das contas, o eleitor fica sem saber, em profundidade, qual foi o projeto que ele escolheu, mesmo sem ter tido a oportunidade de participar ativamente da sua discussão e elaboração. O governo se encastela na vitaliciedade, com força e domínio que ultrapassam gerações. Ainda nas palavras de Faoro:

Sobre a sociedade, acima das classes, o aparelhamento político - uma camada social, comunitária embora nem sempre articulada, amorfa muitas vezes - impera, rege e governa, em nome próprio, num círculo impermeável de comando. Esta camada muda e se renova, mas não representa a nação, senão que, forçada pela lei do tempo, substitui moços por velhos, aptos por inaptos, num processo que cunha e nobilita os recém-vindos, imprimindo-lhes os seus valores (FAORO, 2001, p. 824).

“O homem cordial”14, tal como fora caracterizado por Hollanda (1995), é uma das “marcas” da cultura brasileira, não necessariamente consensuada, mas que expressa um traço hegemônico de compreensão da sociedade brasileira. Uma espécie de perfil de povo em que prevalece a aparência de afetividade e solidariedade social. Conforme Holanda:

A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que nos visitam, representam, com efeito, um traço definido do caráter brasileiro, na medida, ao menos, em que permanece ativa e fecunda a influência ancestral dos padrões de convívio humano, informados no meio rural e patriarcal. Seria engano supor que essas virtudes possam significar ‘boas maneiras’, civilidade, ou polidez (HOLLANDA, 1995, p. 146-147).

Trata-se, portanto, de um falso modo de vida, observado na forma ordinária de convívio social contrária a polidez, o que implicaria uma atitude moral autônoma de consideração do “outro” na sua própria ação. Conforme Hollanda (1995, p. 147) “Armado dessa máscara, o indivíduo consegue manter sua supremacia ante o social”. São características muito peculiares, que demarcam o que estamos denominando de autoritarismo à brasileira.

Antissemitismo e Bolsonarismo: duas faces de uma mesma moeda

Os regimes totalitários impõem um conjunto de ações em que imperam o horror ao outro, ao diferente, ao oponente, enfim, à pluralidade que configura a política. Conforme Arendt (1989 e 2017), a lógica totalitária destrói a capacidade humana de sentir e pensar, assim como a capacidade de agir. Foi esse tipo de vida que pôde ser observado não só no período da Ditadura Militar do Brasil, mas também no passado colonial, em outros momentos da história e agora, com muitas evidências, nas diversas ações do governo Bolsonaro e, por consequência, do bolsonarismo insurgente.

Nos fragmentos filosóficos que compõem a obra Dialética do Esclarecimento, concluída em 1944, durante a 2ª. guerra mundial, Horkheimer e Adorno desenvolveram um conjunto de reflexões acerca do processo de autodestruição do esclarecimento, do predomínio da racionalidade instrumental, do mito do progresso, do poder destruidor da técnica, da vida administrada e danificada pela indústria cultural, do estado de regressão da civilização esclarecida à barbárie, do significado do horror dos regimes totalitários, entre outros aspectos, muito pertinentes e que, guardadas as diferenças dos períodos históricos, mantém sua impressionante atualidade. Na nota sobre a nova edição alemã, de abril de 1969, em Frankfurt am Main, Horkheimer e Adorno nos advertiam:

Os conflitos no Terceiro Mundo, o crescimento renovado do totalitarismo não são meros incidentes históricos, assim como tampouco o foi, segundo a “Dialética” o fascismo em sua época. O pensamento crítico, que não se detém nem mesmo diante do progresso, exige hoje que se tome partido pelos últimos resíduos de liberdade, pelas tendências ainda existentes a uma humanidade real, ainda que pareçam impotentes em face da grande marcha histórica (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 09).

A autorreflexão crítica, como forma prática de preservação e defesa da liberdade humana, sempre se fez presente nos escritos de Adorno e Horkheimer. Mesmo em regimes autoritários, em que os ataques foram direcionados à liberdade do pensamento, os autores insistiram na perspectiva de uma razão não eclipsada, capaz de transcender a racionalidade técnico-instrumental e de se emancipar. Tratava-se, no contexto dos anos 1940, da regressão efetiva da civilização esclarecida à barbárie. Conforme os autores:

A tendência não apenas ideal, mas também prática, à autodestruição, caracteriza a racionalidade desde o início e de modo nenhum apenas a fase em que essa tendência evidencia-se sem disfarces (...) seu ‘irracionalismo’ é derivado da essência da própria razão dominante e do mundo correspondente a sua imagem (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 16).

O avanço desenfreado do progresso15, a venda em liquidação da cultura, o cerceamento da imaginação teórica como preparação para o caminho do desvario político, o esclarecimento paralisado pelo temor da verdade, a dominação cega, a anulação do indivíduo pelo poder econômico, são algumas das teses da Dialética do Esclarecimento que reforçam “A ideia de que hoje importa mais conservar a liberdade, ampliá-la e desdobrá-la, em vez de acelerar, ainda que indiretamente, a marcha em direção ao mundo administrado...” (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 10).

O ensaio “Elementos do Anti-Semitismo: limites do esclarecimento”, que praticamente encerra a obra Dialética do Esclarecimento, é apresentado após densas reflexões sobre os conceitos de esclarecimento e indústria cultural, absolutamente indispensáveis para a compreensão dos elementos do autoritarismo de feição nazifascista, e que fora tipificado como movimento do antissemitismo. Trata-se de uma espécie de “nexo universal do ofuscamento”16, caracterizado por uma relação intrínseca entre luzes e ofuscação que marcam, de forma inequívoca, os limites do esclarecimento. Para Horkheimer e Adorno (1985) a figura histórica mais acabada da Dialética do Esclarecimento foi o antissemitismo. Estamos diante, portanto, da necessidade de uma reflexão antropológica profunda, que nos faça chegar reflexivamente, ao outro nas suas diferenças. Essa seria uma atitude de combate à mentalidade antissemita, que impossibilita as pessoas de enxergarem o outro, em sua peregrinação cega e paranoica pela autoconservação. São muitos os elementos do antissemitismo, que coincidem e completam o estudo sobre a personalidade autoritária, realizado por Adorno e outros três pesquisadores, nos Estados Unidos, no período de 1944-1947. É importante observar que as semelhanças entre o movimento do antissemitismo e o bolsonarismo17 são mais do que meras coincidências.

A conversão de uma doutrina falsa em verdadeira é o primeiro dos elementos do antissemitismo destacados por Horkheimer e Adorno em que os judeus são tomados como “... a anti-raça, o princípio negativo enquanto tal; de sua exterminação dependeria a felicidade do mundo” (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 157). A atitude patológica e irracional dos fascistas, que se espalha pelo planeta, em que o ódio e a vontade de extermínio são expressos na imagem da vítima que eles projetam, se faz presente sempre que se pretende impor, de forma autoritária, o falso como verdadeiro. Na conduta antissemita não há sujeitos verdadeiros, porque não há reflexão que permita ao sujeito devolver ao objeto aquilo que dele recebeu. A questão da naturalização da frieza imposta pela sociedade burguesa, em que a suposta unidade dos homens já estaria realizada por princípio, reforça e potencializa o existente. Temos muitas situações e exemplos no Brasil, inclusive com o movimento do bolsonarismo, que amplifica a cultura do extermínio e faz emergir os fascistas em potencial18. O racismo estrutural no Brasil, com toda cultura de discriminação e preconceito nele envolvidos, não faria sentido, se as pessoas fossem verdadeiramente esclarecidas e reconhecidas em sua dignidade pela sociedade.

O antissemitismo como racionalização da dominação e naturalização do sofrimento é outro elemento importante da análise de Horkheimer e Adorno, que seria importante considerarmos. Na auto-afirmação da personalidade autoritária do movimento bolsonarista de tipo fascista, os ataques à universidade, à cultura, aos artistas, ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao Congresso Nacional e às Instituições Democráticas, observados diariamente no Brasil, configuram-se como uma tentativa desesperada de dominação, em que os “indivíduos obcecados e privados de sua subjetividade se veem soltos enquanto sujeitos” (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 160). Trata-se de um comportamento típico, desencadeado por situações de obscurantismo, privação de subjetividade e, ao mesmo tempo, de soltura da agressividade19, em que:

Por mais corretas que sejam as explicações e os contra-argumentos racionais, de natureza econômica e política, não conseguem fazê-lo, porque a racionalidade ligada à dominação está ela própria na base do sofrimento (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 159).

A razão instrumental “esclarecida” contenta-se com o domínio do objeto, seja ele qual for. Ela confere um poder ao sujeito, ao mesmo tempo em que o empobrece. Para um sujeito pleno de uma razão também plena, que não se limitasse a projetar luzes, não haveria corte entre sua diferença e sua semelhança relativamente ao objeto. Seria mais da ordem da mimese da razão plena, do que da dominação.

Não existe um antissemitismo genuíno e, certamente, não há nenhum antissemita nato, porque as vítimas podem mudar de acordo com a conjuntura: “...vagabundos, judeus, protestantes, católicos, cada uma deles pode tomar o lugar do assassino, na mesma volúpia cega do homicídio, tão logo se converta na norma e se sinta poderoso enquanto tal” (HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 160). Poderíamos nos perguntar: quais são as vítimas que estão sendo alvo de sucessivos ataques no Brasil hoje? Os negros, os indígenas, os homossexuais, os nordestinos, os pobres, os refugiados, os intelectuais, a universidade, a ciência, a cultura na sua rica e plural diversidade, enfim, de forma totalmente desesperada, àqueles que estão sendo impedidos de respirar? São muitos os casos e o que Adorno e Horkheimer nos ensinam é que as vítimas podem variar, mas a lógica sistêmica do extermínio não. Essa é uma das características importantes do antissemitismo que precisamos tomar consciência, no sentido de desenvolvermos ações efetivas de combate, especialmente no campo da educação.

A energia psíquica mobilizada pelo antissemitismo político é a idiossincrasia racionalizada, que só pode ser superada pela autorreflexão crítica. Adorno e Horkheimer (1965, p. 168) esclarecem que: “Tudo o que não se ajustou inteiramente ou que fira os interditos em que se sedimentou o progresso secular tem um efeito irritante e provoca uma repugnância compulsiva”. A sociedade nada mais é do que um prolongamento compulsivo das situações de ameaça vividas pelos humanos, que se reproduzem no indivíduo como auto-conservação e dominação. “Eles reproduzem em si a insaciabilidade da potência de que têm medo” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p.171) e continuam “quanto mais medonhas as acusações e as ameaças, quanto maior a fúria, mais compulsório o escárnio” (p.172). A compulsão de ódio e a recusa à informação e ao conhecimento, que caracterizam o movimento bolsonarista, são mecanismos de defesa e de preservação de uma vontade autoritária, que não pode ser questionada e ameaçada em hipótese alguma.

Outro elemento do antissemitismo bastante explorado por Horkheimer e Adorno, com base na psicanálise de Freud, é a questão da projeção. O antissemitismo baseia-se numa falsa projeção, uma forma patológica de tornar o mundo semelhante à própria doença. “Os impulsos que o sujeito não admite como seus e que, no entanto, lhe pertencem são atribuídos ao objeto: a vítima em potencial” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 174). É interessante notar, como esse comportamento passa a ser adotado pela política fascista, uma vez que o “...objeto da doença é determinado realisticamente, o sistema alucinatório torna-se norma racional no mundo, e o desvio a neurose” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 174). A obsessão pelo extermínio, o desejo permanente de matar um suposto inimigo, visto como perseguidor, e que o força à defesa, também é uma das marcas do bolsonarismo extremista. Nesse contexto, as formas de percepção da realidade, rigorosamente descritas por Kant na Crítica da Razão Pura, são diretamente afetadas devido ao abismo que se cria entre o objeto e o dado indubitável dos sentidos. O indivíduo se torna incapaz de perceber, todas as vezes que ele apenas projeta o seu estado doentio no outro. “Ao invés de ouvir a voz da consciência moral, ele ouve vozes; ao invés de entrar em si mesmo, para fazer o exame de sua própria cobiça de poder, ele atribui a outros os ‘Protocolos dos Sábios de Sião’” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 177). Os atos individuais de terror, ou atos coletivos de extermínio cuidadosamente planejados, na forma de ataques cibernéticos, como, por exemplo, as Fake News, caracterizam a ação bolsonarista20. Trata-se, portanto, do que Freud tão bem denominou como o impulso condenado, castrado, transformado em agressão, ou seja, a perda quase que completa da capacidade de percepção e reflexão. O fato do indivíduo não refletir mais o objeto e, muito menos sobre si mesmo, faz com que a capacidade de discernimento fique totalmente comprometida. Discernimento esse, absolutamente indispensável à política e à República21.

A paranoia, entendida como sombra do conhecimento, é outro elemento do antissemitismo destacado por Horkheimer e Adorno. Ela afeta a cultura como um todo, pois a falsa projeção usurpa a liberdade e a transforma em falsa cultura. Trata-se de um sistema alucinatório, arbitrário e defensivo, com alta capacidade de difamação da experiência e do espírito, que Horkheimer e Adorno caracterizaram como Semicultura, em que:

por oposição à simples incultura, hipostasia o saber limitado como verdade. O indivíduo semiculto não consegue suportar a ruptura entre o interior e o exterior, o destino individual e a lei social, a manifestação como essência. A consciência moral se esfacela. A interiorização do imperativo social é substituída pela identificação pronta e imediata dos valores estereotipados A própria cultura adoeceu (...) A cultura converteu-se totalmente numa mercadoria, difundida como uma informação, sem penetrar nos indivíduos dela informados” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p.184).

No último tópico do ensaio “Elementos do Antissemitismo” Horkheimer e Adorno fazem uma afirmação curiosa: “Não há mais anti-semitas, os últimos foram os liberais que queriam exprimir sua opinião antiliberal” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 186). De fato, historicamente não havia mais, em 1947, com a derrocada do Nazismo, um movimento orquestrado de extermínio dos judeus, contudo a “experiência, substituída pelo clichê e a imaginação ativa na experiência pela recepção ávida” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 187), eram sinais claros de manutenção das características do antissemitismo, que poderiam eleger outras vítimas, que não necessariamente os judeus. A mentalidade do ticket fascista ainda permanecia forte e nefasta, pois quando as massas aceitam o ticket reacionário, típico do antissemitismo, elas obedecem a mecanismos sociais que se reproduzem de forma incontrolada. A cegueira, a estereotipia, a mentalidade do ticket e a aversão ao conhecimento são traços marcantes do bolsonarismo e que atestam a força do comportamento antissemita até hoje.

No mundo da produção em série, a estereotipia - que é seu esquema - substitui o trabalho categorial. O juízo não se apoia mais numa síntese efetivamente realizada, mas numa cega subsunção (...) No campo das ciências sociais bem como no da experiência individual, a intuição cega e os conceitos vazios são reunidos de maneira rígida e sem mediação. Na era do vocabulário básico de 300 palavras, a capacidade de julgar e, com ela, a distinção do verdadeiro e do falso estão desaparecendo (...) As etiquetas são coladas: ou se é amigo, ou inimigo. A falta de consideração pelo sujeito torna as coisas fáceis para a administração (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p.188).

Trata-se, do ponto de vista psicanalítico, da extenuação do narcisismo ferido, em que a fraqueza do eu mantém as pulsões dentro dos limites da auto-conservação. Nesse contexto, as zonas de conflito são enormes e as neuroses, fruto dessa economia pulsional, são inevitáveis. “A irracionalidade da adaptação dócil e aplicada à realidade torna-se, para o indivíduo, mais racional que a razão (...) o homem inteiro tornou-se o sujeito-objeto da repressão” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 190). Uma irracionalidade transformada em loucura, inclusive na ação política de não reconhecimento da pandemia da COVID-19, por parte do governo Bolsonaro.

É só quando a total identificação com essas potências monstruosas é impressa nas pessoas como uma segunda natureza e quando todos os poros da consciência são tapados, que as massas são levadas a esse estado de absoluta apatia que as torna capazes de realizações fantásticas (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 191).

A mentalidade do ticket, produto da industrialização e de sua propaganda, adapta-se, segundo Horkheimer e Adorno, às relações internacionais. O esquematismo da indústria cultural faz com que o senso de realidade e a própria experiência ético-política, não sejam mais resultado de um processo dialético entre o sujeito e a realidade.

O ticket reacionário que contém o anti-semitismo é adequado à síndrome destrutivo-convencional (...) só o ticket fornece um objeto adequado de perseguição. Os elementos do anti-semitismo, baseados na experiência e anulados pela perda da experiência que se anuncia na mentalidade do ticket, são novamente mobilizados pelo ticket. Já tendo entrado em decomposição, eles trazem para o neo-anti-semita a má consciência e, com ela, a insaciabilidade do mal”. (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 192).

Não é só o ticket antissemita que é antissemita, mas a mentalidade do ticket em geral, que continua forte, destrutiva e muito presente em solo brasileiro. Tudo indica, portanto, que o antissemitismo e o bolsonarismo são duas faces de uma mesma moeda.

Educação como autorreflexão crítica

A necessidade de compreensão da educação como autorreflexão crítica foi expressa por Theodor Adorno, em um dos textos educacionais mais corajosos e de combate ao autoritarismo que conhecemos na história mundial. Trata-se do ensaio “Educação após Auschwitz”, publicado em uma coletânea de ensaios sobre a educação, sob o título “Educação e Emancipação” no ano de 1971. São diversos textos, fruto de conferências e debates transmitidos pela Rádio de Hessen na Alemanha, no período de 1959 a 1969: “O que significa elaborar o passado”; “a filosofia e os professores”; “televisão e formação”, “tabus acerca do magistério”; “educação após Auschwitz”; “educação - para quê?”; “a educação contra a barbárie” e “educação e emancipação”. O artigo Teoria da Semiformação de 1959, que não fez parte da coletânea “Educação e Emancipação”, também integra o conjunto dos textos educacionais de Adorno. A análise dos referidos textos é de fundamental importância, tanto para a compreensão dos fundamentos pedagógico-emancipatórios de Adorno, como para a reflexão da situação atual da educação.

“Educação após Auschwitz” é o título de uma palestra de Adorno transmitida pela Rádio de Hessen, na Alemanha, no dia 18 de abril de 1965 e publicada em 1967. Trata-se de uma reflexão de 55 anos atrás sobre um dos acontecimentos mais trágicos da história da humanidade. O curioso é que 25 anos depois do genocídio de aproximadamente seis milhões de judeus, a situação, relativa aos motivos que poderiam conduzir as pessoas à vontade de extermínio, não havia mudado e Adorno toma esse fato histórico concreto, como objeto principal de sua reflexão educacional. Para Adorno (1995, p. 119) “A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação”, e continua:

A pouca consciência existente em relação a essa exigência e as questões que ela levanta provam que a monstruosidade não calou fundo nas pessoas, sintoma da persistência da possibilidade de que se repita no que depender do estado de consciência e inconsciência das pessoas (ADORNO, 1995, p. 119).

Para Adorno a consciência, a autorreflexão crítica, o discernimento e a autonomia são elementos indispensáveis à formação humana, com capacidade de definição, inclusive, dos rumos da história. O autor explicita, logo no início da sua exposição, o que Auschwitz significa:

A barbárie contra a qual se dirige toda a educação. Fala-se da ameaça de uma regressão à barbárie. Mas não se trata de uma ameaça, pois Auschwitz foi a regressão; a barbárie continuará existindo enquanto persistirem no que têm de fundamental as condições que geram essa regressão. É isto que apavora (ADORNO, 1995, p. 119).

Entender as condições que geraram a regressão foi uma das tarefas da teoria social crítica de Adorno, pois os processos psicossociais que possibilitaram o extermínio planejado de milhares de pessoas em Auschwitz, ainda se podiam notar e continuam presentes até hoje. Recorrer à Psicanálise de Freud, especialmente as obras “O mal-estar na cultura” e “Psicologia de massas e análise do eu” foi o caminho percorrido por Adorno para entender Auschwitz, pois se “a barbárie encontra-se no próprio princípio civilizatório, então pretender se opor a isso tem algo de desesperador” (ADORNO, 1995, p.120). O frankfurtiano argumentava que o fato de Auschwitz ter ocorrido, “... não pode ser minimizado por nenhuma pessoa viva como sendo um fenômeno superficial, como sendo uma aberração no curso da história... (ADORNO, 1995, p. 120).

Adorno entendia, no seu tempo, que era extremamente limitada a possibilidade de mudar os pressupostos objetivos, isto é, sócio-políticos, que geram acontecimentos como Auschwitz e que, por isso, haveria a necessidade de entendermos os processos de formação subjetiva, no sentido da tomada de consciência dos mecanismos que tornam as pessoas capazes de cometer atos bárbaros. Mas o que seria a barbárie? O autor faz uma consideração importante, em um debate com Hellmut Becker transmitido pela Rádio de Hessen em 1968, no texto “A educação contra a Barbárie”:

Entendo por barbárie algo muito simples, ou seja, que estando na civilização do mais alto desenvolvimen to tecnológico, as pessoas se encontrem atrasadas de um modo peculiarmente disforme em relação a sua própria civilização - e não apenas por não terem em sua arrasadora maioria experimentado a formação nos termos correspondentes ao conceito de civilização, mas também por se encontrarem tomadas por uma agressividade primitiva, um ódio primitivo ou, na terminologia culta, um impulso de destruição, que contribui para aumentar ainda mais o perigo de que toda esta civilização venha a explodir, aliás uma tendência imanente que a caracteriza (ADORNO,1995, p.155).

Vários aspectos são importantes na compreensão de Adorno sobre a barbárie. Poderíamos destacar pelo menos dois: o primeiro é que a barbárie é produzida pela sociedade dita “civilizada”, com todo o avanço científico e tecnológico que a caracterizam; o segundo é o perigo que esse movimento representa para a humanidade e para a vida do planeta. Colocar o tema da barbárie no centro do debate pedagógico significa dizer, com coragem, que a educação e a cultura podem fazer algo, tanto no agravamento das ações de extermínio, como no favorecimento da vida, da liberdade e do Bem Comum.

Mas quem seriam os verdadeiros culpados de Auschwitz? Os assassinos? Para Adorno (1995) os culpados são os desprovidos de consciência, aqueles que dirigem às pessoas seu ódio e sua fúria agressiva. Trata-se, portanto, da necessidade de compreensão dos impulsos de destruição e agressividade que mobilizam as pessoas. Para tanto, Adorno nos dizia que “... é necessário contrapor-se a uma tal ausência de consciência, é preciso evitar que as pessoas golpeiem para os lados sem refletir a respeito de si próprias. A educação tem sentido unicamente como educação dirigida a uma autorreflexão crítica” (ADORNO, 1995, p.121). O autor é muito claro na sua proposição pedagógica: a educação precisa promover a autorreflexão crítica, produzir uma consciência verdadeiramente antropológica de nós mesmos. Significa, em outras palavras, uma decisão pela reflexão dos aspectos ético-políticos da educação; colocando as questões culturais e sociais no centro do debate.

Nos programas educacionais globais, com a chancela da OCDE22, o ser humano e a dimensão ético-político da educação, não passa de uma camada muito fina de verniz. Conforme Dardot e Laval (2016) a constituição de um “neosujeito” de feição neoliberal faz com que o homem deixe de ser a referência de seu próprio processo educativo. O sistema capitalista neoliberal determina o que o ser humano deve ser e como ele deve agir para se integrar ao sistema e ser reconhecido como uma espécie de case de sucesso. O que importa é a formação das competências e das habilidades técnicas profissionais, que podem formar com eficiência o engenheiro, o médico, o advogado, o web designer entre tantos outros profissionais, cada vez mais subservientes às demandas econômicas do mercado. Formamos na maioria das vezes, sob a tutela da “cultura” businnes, pessoas competitivas, frias, insensíveis, autoritárias, agressivas, sem a consciência devida de sua atuação como ser humano, como pessoa, com responsabilidade efetivamente social, comprometida com o outro e com o Bem Comum.

No estado de claustrofobia que as pessoas se encontram no mundo administrado, em que a “semiformação passou a ser a forma dominante da consciência atual”, nos dizia Adorno na Teoria da Semiformação (ADORNO, 2010, p. 9), o projeto de uma educação emancipatória, contrária a Auschwitz, exige uma ação efetiva e concreta. Nesse aspecto Adorno é bastante incisivo:

Quando falo de educação após Auschwitz, refiro-me a duas questões: primeiro a educação infantil, sobretudo na primeira infância; e, além disto, ao esclarecimento geral, que produz um clima intelectual, cultural e social que não permite tal repetição; portanto, um clima em que os motivos que conduziram ao horror tornem-se de algum modo conscientes (ADORNO, 1995, p. 123).

Os motivos que nos conduzem ao horror precisam estar às claras e devem ser trabalhados com muita maestria pelos adultos, que são os responsáveis pela formação das novas gerações, daí a necessidade de começarmos na primeira infância. Evidentemente, que a quebra do elo de uma corrente autoritária, não pode ser feita de forma violenta, segregativa, polarizada, bolsonarista, mas em um clima cultural e social que coloque o princípio ético-político do Bem Comum no centro de nossas interações. Esse movimento educacional consciente deve ocorrer no interior das famílias, das escolas, dos programas veiculados pela mídia, das postagens nas redes socias, enfim pela sociedade como um todo, com o propósito de levar uma mensagem muito simples: que todas as vidas importam e devem ser respeitadas, que não deve haver vidas melhores do que outras.

Adorno nos apresenta alguns passos nesse processo social de esclarecimento, de tomada de consciência do significado profundo de Auschwitz, e que coincidem com os aspectos do desvelamento da personalidade autoritária e dos elementos do antissemitismo. Vejamos mais alguns deles:

Como nós consideramos as estruturas de autoridade que estabelecem nossos vínculos de compromisso? Essa questão pensada em uma perspectiva psicossocial nos mostra, segundo Adorno (1995, p.123-126), que “as pessoas não se encontram psicologicamente preparadas para a autodeterminação”, que a “perda da autoridade é uma das condições do pavor sadomasoquista”, que “pessoas com traços sádicos reprimidos são produzidas por toda parte pela tendência social geral”. E continua Adorno:

Os vínculos de compromisso, quando não são experimentados por si mesmos, de forma autônoma, convertem-se em uma espécie de passaporte moral, de base heterônoma, dependente de mandamentos, de normas que não são assumidas pela razão própria do indivíduo (ADORNO, 1995, p. 124).

Isso quer dizer que a aposta de Adorno estava circunscrita à formação da autonomia, ao poder da capacidade de autodeterminação crítica, no sentido de Kant, como contraposição à consciência alienada. O autor nos sugere, ainda, uma atenção especial à relação perturbada e patogênica que estabelecemos com o corpo: “Em cada situação em que a consciência é mutilada, isto se reflete sobre o corpo e a esfera corporal de uma forma não-livre é propícia a violência” (ADORNO, 1995, p.126-27). Esse é um aspecto fundamental que exige uma leitura aprofundada dos educadores.

Outro aspecto importante vincula-se às filiações que estabelecemos com os grupos, com os coletivos, que a exemplo do esporte, tanto pode significar fair-play, como pode promover o sadismo, a brutalidade, a agressão. Como enfatiza Adorno, “tudo isso se relaciona de um modo ou de outro à velha estrutura vinculada à autoridade, a modos de agir (...) ao caráter autoritário, que se manifestou em Auschwitz na forma de identificação cega ao coletivo” (ADORNO, 1995, p. 127). É sobre essa questão que deveríamos nos ater e resistir: o esclarecimento sobre o problema da coletivização e o que as filiações aos grupos representam, no sentido de entendermos quais os mecanismos de defesa, os estereótipos, que estão bloqueando a nossa consciência.

A questão da dessensibilização e frieza, proporcionada pela disciplina, pela severidade, é outro aspecto importante que devemos considerar. “Quem é severo consigo mesmo adquire o direito de ser severo também com os outros, vingando-se da dor cujas manifestações precisou ocultar e reprimir” (ADORNO, 1995, p. 128). E continua o autor, “A educação precisa levar a sério o que já de há muito é de conhecimento da filosofia: que o medo não deve ser reprimido” (ADORNO, 1995, p.129).

O “caráter manipulador”, que equivale a consciência coisificada, descrito na personalidade autoritária, se distingue pela fúria organizativa, pela incapacidade total de levar a cabo experiências humanas diretas, por certo tipo de ausência de emoções, por uma espécie de realismo exagerado. As pessoas manipuladoras são incapazes de fazer experiências, no sentido de Benjamin. Por isso que a proposta concreta de Adorno é: utilizar todos os métodos científicos disponíveis, em especial a psicanálise durante muitos anos, para estudar entender por que uma pessoa se torna assim, tão fria e desumana. “Na medida em que se conhecem as condições internas e externas que os tornaram assim, seria possível tirar conclusões práticas que impeçam a repetição de Auschwitz” (ADORNO, 1995, p.131). O “ser assim”, adverte Adorno, “... é apreendido equivocadamente como natureza, como um dado imutável e não como resultado de uma formação” (ADORNO, p.132).

A relação que estabelecemos com a técnica é outro aspecto essencial, que deveríamos considerar, conforme Adorno: “Um mundo em que a técnica ocupa uma posição tão decisiva como acontece atualmente, gera pessoas tecnológicas, afinadas com a técnica” (ADORNO, 1995, p. 132). O contato com a técnica não pode ser exagerado, irracional e patogênico. Se assim o for, a humanidade tenderá “a considerar a técnica como sendo algo em si mesma, um fim em si mesmo, uma força própria, esquecendo que ela é a extensão do braço dos homens” (ADORNO, 1995, p. 132). O processo de fetichização da técnica desconecta as pessoas do sentido antropológico que lhes é inerente: uma vida humana digna. O exemplo concreto da fetichização da técnica utilizado por Adorno refere-se àqueles que projetaram um sistema ferroviário para conduzir as pessoas a Auschwitz, com maior rapidez e fluência, de forma totalmente desconectada das vidas das vítimas. Trata-se, em última instância, do estado de profunda frieza, de indiferença nua e crua em relação ao outro. Quantos mil exemplos parecidos poderíamos listar no atual contexto brasileiro?

Adorno nos diz claramente que o primeiro passo, de inconformismo, “seria ajudar a frieza a adquirir consciência de si própria, das razões pelas quais foi gerada” (ADORNO, 1995, p. 136), e que as chances de superação são maiores quando nos responsabilizamos e tratamos bem as nossas crianças. Ainda que “o esclarecimento racional não dissolva diretamente os mecanismos inconscientes (...) ele ao menos fortalece na pré-consciência, determinadas instâncias de resistência, ajudando a criar um clima desfavorável ao extremismo” (ADORNO, 1995, p.136). Precisamos evitar, portanto, como diria Walter Benjamin “o assassinato de nós mesmos”.

Conclusões

O déficit ético-político na formação, com pessoas cada vez mais distantes delas mesmas, do Bem Comum, tem produzido seres humanos cada vez mais danificados, petrificados, autoritários, frios, incapazes de se reconhecer no outro. Um sério risco para o futuro da humanidade que habita um planeta cada vez mais devastado. O desenvolvimento econômico não pode estar à frente da vida, pelo contrário, precisamos compreender a complexidade do tecido socioeconômico do qual somos parte. Devemos nos importar com os outros e, juntos, construirmos um mundo mais justo, humano e feliz. Não é “jogando a sujeira para debaixo do tapete” de nossas casas, de nossas salas de aula, ou de nossos grupos de WhatsApp, que iremos mudar a forma agressiva e violenta como nos relacionamos.

Muitos aspectos do autoritarismo podem ser observados no Brasil hoje, mesmo após o período de sua redemocratização (pós 1985), e que teve avanços em termos de políticas sociais e educacionais, com destaque para a promulgação da Constituição Federal de 1988, hoje ameaçada; para a sanção da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 e para o Plano Nacional de Educação (2001-2011 e 2014-2024), com garantias, participação democrática e metas muito bem definidas para a educação. No entanto, a efetivação de direitos sociais, como a educação, encontra-se em processo de regressão; devido a ofensiva das reformas ultraliberais em curso no Brasil, há vários anos e à mentalidade antissemita insurgente que integra a “cultura” do movimento bolsonarista.

A superação do autoritarismo, especialmente em uma sociedade profundamente desigual como a nossa, não se dará mediante reformas do tipo “Future-se”23, com a quebra da autonomia universitária e o avanço da privatização, do empreendedorismo e das inovações tecnológicas determinadas pelos grandes grupos econômicos. Não se dará ainda, com a imposição do bolsonarismo, fortemente criticado e combatido, no presente momento, por diversos setores da sociedade brasileira. Pelo contrário, a saída está no desenvolvimento humano, com ações concretas de reconhecimento do outro (HONNETH, 2009), mediante o fomento da vida comum como princípio ético-político (DARDOT e LAVAL, 2017) enfim, pela afirmação da humanização (FREIRE, 1974 e 1982); como garantia de uma educação libertadora, crítica e emancipatória voltada ao cultivo de laços afetivos, com respeito à alteridade e à dignidade da pessoa humana.

Voltando a Aldir Blanc (uma das vítimas da COVID-19) e João Bosco, alguns querem exterminar a arte e a cultura, mas muitos desejam e lutam para que o show de todo artista continue hoje e sempre!

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1Essa é uma versão ampliada da conferência online, apresentada no dia 24/06/2020, no evento “Diálogos de Sofie I: a Personalidade Autoritária no Brasil em tempos de neoliberalismo e de Coronavirus: o que esperar da Educação?” O evento foi promovido pela Sociedade Brasileira de Filosofia da Educação - SOFIE e pelo GT 17 da ANPEd.

2SOUZA, Jessé. A radiografia do Golpe: entenda como e porque você foi enganado. Rio de Janeiro: Leya, 2016. Outros dois livros, complementares à pesquisa e ao raciocínio do autor, também são pertinentes: SOUZA, Jessé. A Elite do Atraso: da escravidão a Bolsonaro. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017 e SOUZA, Jessé. A Classe Media no Espelho: sua história, seus sonhos e ilusões, sua realidade. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2018.

3ADORNO, Theodor W. Educação Após Auschwitz in: Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. pp. 119-138.

4Bolsonarismo é um termo criado para designar o caráter ideológico, fundamentalista, conservador, extremista e fascista de Jair Bolsonaro e seus filhos. Trata-se, de um movimento que tem desencadeado muitas pesquisas no Brasil e no mundo, especialmente na área de ciências humanas.

5Termo empregado por Christian Ingo Lenz Dunker, em 2019, no artigo “Psicologia das massas digitais e análise do sujeito democrático” in ABRANCHES et al. Democracia em Risco? São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

6A COVID-19 é uma doença causada pelo coronavírus SARS-CoV-2. Apresenta um quadro clínico que varia de infecções assintomáticas a quadros respiratórios graves.

7Cf. DARDOT, Pierre e LAVAL, Christian. Comum: Ensaio sobre a revolução no século XXI. São Paulo: Boitempo, 2017.

8LASTÓRIA, A. C. Nabuco e GOMES, Luiz Roberto. Educação para a emancipação ou para a personalidade flexível: uma análise política das expectativas em relação ao sistema In: LASTÓRIA, L. A. C. N; ZUIN, A. S.; GOMES, L. R e GRUSCHKA, A. (orgs). Teoria Crítica - Escritos sobre Educação: Contribuições do Brasil e Alemanha. São Paulo: Nankin, 2015.

9Os aspectos histórico-culturais do autoritarismo no Brasil são tratados, de forma ampliada, no ensaio GOMES, Luiz Roberto. Autoritarismo y educación en Brasil. In: Miguel Vedda; Renato Franco; Antônio Álvaro Soares Zuin. (Org.). Estado de excepción en Argentina y Brasil: una perspectiva a partir de la teoría crítica. 1ed. Buenos Aires: Ediciones Herramienta, 2020. O referido ensaio, em edição brasileira, também será publicado pela editora Nankin, de São Paulo em 2020/21.

10PRADO JÚNIOR. Caio. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia. São Paulo: Brasiliense; Publifolha, 2000.

11HOLLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

12Segundo João Cesar de Castro Rocha em Nenhum Brasil Existe - pequena enciclopédia, publicado em 2003, especialmente nos artigos “nenhum Brasil existe: poesia como história cultural” (p. 17-32) e “as ‘origens e os equívocos da cordialidade brasileira” (p. 205-219), as “Raízes do Brasil” de Sérgio Buarque de Holanda, que define a “cordialidade” como um traço estrutural, um tipo ideal em linguagem weberiana, é apenas uma, dentre outras, das leituras possíveis sobre a formação cultural do Brasil. Cf. Também: SOUZA, Jessé. A Elite do Atraso: da escravidão a Bolsonaro. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017.

13A questão da herança rural/família patriarcal é um aspecto polêmico na historiografia brasileira, não coincidente quando se analisa a interpretação de Sérgio Buarque de Hollanda - “Raízes do Brasil” e de Gilberto Freyre - “Casa grande & Senzala” e “Sobrados e Mucambos”. Se para Sérgio Buarque de Hollanda o homem cordial é o brasileiro por excelência, uma espécie de filho da família patriarcal, para Gilberto Freyre em “Sobrados e Mucambos”, o patriarcado é o sintoma de um momento histórico que, com a decadência do patriarcado, gera outro tipo de acomodação social.

14Cf. o sentido da miscigenação hermenêutica, que fora atribuído pela historiografia brasileira ao “homem cordial”, em João Cesar de Castro Rocha. “As origens e os equívocos da cordialidade brasileira” em Nenhum Brasil Existe - pequena enciclopédia. Rio de Janeiro: UniverCidade Editora, 2003 (p. 205-219).

15A crítica ao avanço irrefletido do progresso é uma das ênfases do pensamento de Walter Benjamin e, seria importante considerá-la nesta análise.

16Termo utilizado por Gabriel Cohn no artigo “Esclarecimento e Ofuscação: Adorno e Horkheimer hoje”, publicado na Revista Lua Nova: revista de cultura e política, no número 43, ano 1998.

17Em 26/01/2020, a Folha de São Paulo publicou a matéria “Veja falas preconceituosas de Bolsonaro e o que diz a lei sobre injúria e racismo”. O presidente ataca periodicamente jornalistas, indígenas, mulheres, LGBTs, negros, japoneses, nordestinos, entre outros. São inúmeras frases destacadas, pela matéria, que evidenciam o comportamento paranoico, a visão estereotipada de ciência e das populações, tipicamente praticadas pela mentalidade antissemita de tipo bolsonarista.

18Cf. a matéria da folha de São Paulo, publicada no dia 17/01/2020, “Em vídeo, Alvim copia Goebbels e provoca onda de repúdio nas redes sociais”. As frases, a estética, a trilha sonora de Richard Wagner remetem à propaganda nazista.

19Cf. o caso Sara Winter, extremista bolsonarista, presa pela PF a mando do STF, no dia 15/06/2020.

20Cf. matéria da Folha de São Paulo de 27/05/2020: “Decisão do supremo cita ‘gabinete do ódio’ do Planalto e indica possível associação criminosa”. O Supremo Tribunal Federal está, atualmente, com dois inquéritos em curso para apurar a produção de Fake News, por parte do gabinete do ódio e as ações criminosas de financiamento e disparo na internet, de mensagens contra adversários políticos e grupos contrários à visão distorcida, estereotipada e patológica do governo.

21Cf. NEGT, Oskar e KLUGE, Alexandre. O que há de político na política? São Paulo: UNESP, 1999.

22OCDE: Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

23FUTURE-SE é um Programa do Ministério de Educação, transformado em Projeto de Lei, a ser apreciado pelo Congresso Nacional e que atinge o coração da universidade pública: a autonomia. O Programa já foi amplamente rechaçado pelas Universidades e Institutos Federais.

24This is an enlarged version of the online conference, presented on June 24th, 2020, in the event “Dialogues of Sofie I: The Authoritarian Personality in Brazil in times of neoliberalism and Coronavirus: what to expect from Education?” The event was promoted by the Brazilian Society of Philosophy of Education - SOFIE and by GT 17 of ANPEd.

26SOUZA, Jessé. A radiografia do Golpe: entenda como e porque você foi enganado. Rio de Janeiro: Leya, 2016. Two other books, complementary to the author's research and reasoning, are also relevant: SOUZA, Jessé. A Elite do Atraso: da escravidão a Bolsonaro. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017 and SOUZA, Jessé. A Classe Média no Espelho: sua história, seus sonhos e ilusões, sua realidade. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2018.

27ADORNO, Theodor W. Educação Após Auschwitz in: Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. pp. 119-138.

28Bolsonarism is a term created to designate the ideological, fundamentalist, conservative, extremist and fascist character of Jair Bolsonaro and his sons. This is a movement that has triggered many researches in Brazil and in the world, especially in the area of ​​Human Sciences.

29Term used by Christian Ingo Lenz Dunker, in 2019, in the article “Psicologia das massas digitais e análise do sujeito democrático” in ABRANCHES et al. Democracia em Risco? São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

30COVID-19 is a disease caused by the SARS-CoV-2 coronavirus. It presents a clinical picture that varies from asymptomatic infections to severe respiratory conditions.

31LASTÓRIA, A. C. Nabuco e GOMES, Luiz Roberto. Educação para a emancipação ou para a personalidade flexível: uma análise política das expectativas em relação ao sistema In: LASTÓRIA, L. A. C. N; ZUIN, A. S.; GOMES, L. R e GRUSCHKA, A. (orgs). Teoria Crítica - Escritos sobre Educação: Contribuições do Brasil e Alemanha. São Paulo: Nankin, 2015.

32Translator’s note: In Portuguese, from the word “colonel”, it is characterized by one person, the colonel, who held economic power and exercised local power through violence and exchange of favors.

34The historical and cultural aspects of authoritarianism in Brazil are dealt with, in an expanded way, in the essay GOMES, Luiz Roberto. Autoritarismo y educación en Brasil. In: Miguel Vedda; Renato Franco; Antônio Álvaro Soares Zuin. (Org.). Estado de excepción en Argentina y Brasil: una perspectiva a partir de la teoría crítica. 1ed. Buenos Aires: Ediciones Herramienta, 2020.

35PRADO JÚNIOR. Caio. Formação do Brasil Contemporâneo: colônia. São Paulo: Brasiliense; Publifolha, 2000.

36HOLLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

37According to João Cesar de Castro Rocha in Nenhum Brasil Existe - pequena enciclopédia , published in 2003, especially in the articles “nenhum Brasil existe: poesia como história cultural” (p. 17-32) and “as ‘origens e os equívocos da cordialidade brasileira” (p. 205-219), “Raízes do Brasil” by Sérgio Buarque de Holanda, which defines “cordiality” as a structural feature, an ideal type in Weberian language, which is just one, among others, of the possible readings on the cultural formation in Brazil. Also: SOUZA, Jessé. A Elite do Atraso: da escravidão a Bolsonaro. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2017.

38Translator’s note: The Society of Jesus was founded by Saint Ignatius of Loyola in the midst of Counter-Reformation, in the year 1534. He, together with a group of students from the University of Paris, made vows of obedience to the doctrine of the Catholic Church and were recognized by papal bull in 1540.

39The issue of rural inheritance/patriarchal family is a controversial aspect in Brazilian historiography, not coincident when analyzing the interpretation of Sérgio Buarque de Hollanda - “Raízes do Brasil” and Gilberto Freyre - “Casa grande & Senzala” and “Sobrados e Mucambos”. If for Sérgio Buarque de Hollanda the cordial man is the Brazilian par excellence, a kind of son of the patriarchal family, for Gilberto Freyre in “Sobrados e Mucambos”, patriarchy is the symptom of a historic moment that, with the decadence of patriarchy, it generates another type of social accommodation.

40Translator’s note: The halter vote, known as “voto de cabresto” in Brazil, represented an imposing and arbitrary electoral form imposed by the colonels. it is an expression given by the superposition of two words. Thus, we have “voto”, which is the full exercise of democracy; and the word “cabresto”, from the Latin capistrum, which means "gag or brake". In this way, we have an almost paradoxical concept, insofar as it represents democracy gagged and guided like a pack animal.

41See the meaning of hermeneutic miscegenation, which was attributed by Brazilian historiography to the “cordial man”, in João Cesar de Castro Rocha. “As origens e os equívocos da cordialidade brasileira” in Nenhum Brasil Existe - pequena enciclopédia. Rio de Janeiro: UniverCidade Editora, 2003 (p. 205-219).

42The criticism of the thoughtless advance of progress is one of the emphases of Walter Benjamin's thought, and it would be important to consider it in this analysis.

43Term used by Gabriel Cohn in the article “Esclarecimento e Ofuscação: Adorno e Horkheimer hoje”, published in Revista Lua Nova: revista de cultura e política, number 43, year 1998.

44On January 1st, 2020, Folha de São Paulo published the article “See Bolsonaro's prejudiced Statements and what the law says about injury and racism”. The president periodically attacks journalists, indigenous people, women, gay, lesbian, black people, Japanese, Northeasterners, among others. There are countless phrases highlighted by the article that show paranoid behavior, the stereotyped view of science and populations, typically practiced by the Bolsonarist anti-Semitic mentality.

45See the article in Folha de São Paulo, published on January 17th, 2020, “Em vídeo, Alvim copia Goebbels e provoca onda de repúdio nas redes sociais”. The phrases, the aesthetics, the soundtrack by Richard Wagner refer to Nazi propaganda.

46See the case of Sara Winter, a purported extremist, arrested by the PF at the behest of the STF, on June 15th, 2020.

47See article from Folha de São Paulo on May 27th, 2020: “Decisão do supremo cita ‘gabinete do ódio’ do Planalto e indica possível associação criminosa”. The Federal Supreme Court currently has two investigations underway to investigate the production of Fake News by the hate office and the criminal actions of financing and shooting on the Internet, of messages against political opponents and groups against the distorted view, stereotyped and pathological government.

48See NEGT, Oskar and KLUGE, Alexandre. O que há de político na política? São Paulo: UNESP, 1999.

49OECD: Organization for Economic Cooperation and Development.

50FUTURE-SE is a Program of the Ministry of Education, transformed into a Bill of Law, to be considered by the National Congress and which reaches the heart of the public university: autonomy. The Program has already been widely rejected by Universities and Federal Institutes.

Recebido: 10 de Julho de 2020; Aceito: 31 de Julho de 2020

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