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Cadernos de História da Educação

versión impresa ISSN 1982-7806versión On-line ISSN 1982-7806

Cad. Hist. Educ. vol.18 no.1 Uberlândia ene./abr 2019  Epub 06-Mayo-2019

https://doi.org/10.14393/che-v18n1-2019-12 

Artigos

A criação de Institutos de Educação no Brasil como parte de uma história conectada da formação de professores1

La creación de los Institutos de Educación como parte de una historia conectada de la formación docente

Diana Gonçalves Vidal2 

Rafaela Silva Rabelo3 

2Professora Titular de História da Educação na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Diretora do Instituto de Estudos Brasileiros da mesma Universidade. Pesquisadora 1B do CNPq. Membro do Comitê Executivo e Tesoureira da . Coordenadora do Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em História da Educação (NIEPHE). E-mail: dvidal@usp.br.

3Doutora em Educação, na linha História da Educação, pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Pós-doutoranda na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em História da Educação (NIEPHE). E-mail: rafaelasilvarabelo@hotmail.com.


Resumo

O presente artigo tem como objetivo discorrer sobre o papel tanto da New Education Fellowship (NEF) quanto do Teachers College (TC) da Columbia University como centros de legitimação da educação enquanto campo acadêmico emergente e como epicentros de redes de trabalho na educação. Para tanto, exploramos a constituição dos Institutos de Educação do Rio de Janeiro e de São Paulo nos anos 1930 entrelaçada ao movimento da Educação Nova, buscando evidenciar conexões, perscrutando a circulação de sujeitos e ideias no que podemos considerar uma história conectada da formação de professores. Baseamo-nos em bibliografia correlata e em fontes tais como revistas pedagógicas, programas de ensino e relatórios. A discussão aponta para uma trama de relações que interligava sujeitos e lugares nos anos 1920 e 1930, desempenhada por instituições como a NEF e o TC, que se constituíam em territórios sociais e epistemológicos congregados sobre a produção de repertórios acerca da Educação Nova.

Palavras-chave:  Formação de professores; Instituto de Educação; Teachers College; New Education Fellowship

Resumen

El presente articulo tiene como objetivo discurrir sobre el papel tanto de la New Education Fellowship como del Teachers College de Columbia University como centros de legitimación de la educación como campo académico emergente y como epicentros de redes de trabajo en la educación. Para eso, exploramos la constitución de los Institutos de Educación de Río de Janeiro y de São Paulo en los años 1930 entrelazados al movimiento de la Educación Nova, buscando evidenciar conexiones, mirando la circulación de sujetos e ideas en lo que podríamos considerar una historia conectada de la formación de maestros. Nos basamos en bibliografía relacionada y en fuentes tales como revistas pedagógicas, programas de enseñanza e informes. La discusión apunta a una trama de relaciones que interconecta sujetos y lugares en los años 1920 y 1930, articuladas por instituciones como la NEF y el TC, que se constituían en territorios sociales y epistemológicos congregados sobre la producción de repertorios acerca de la Educación Nova.

Palabras clave:  Formación de maestros; Instituto de Educación; Teachers College; New Education Fellowship

Abstract

This article discusses the New Education Fellowship (NEF) and the Teachers College (TC) at Columbia University as centers for the legitimization of education as an emerging academic field and as education network centers. To this end, we investigate the establishment of the Rio de Janeiro and São Paulo Institutes of Education in the 1930s in the context of the New Education movement. We seek to demonstrate connections and examine the circulation of people and ideas in what we consider a connected history of teacher education. We have based our research on an associated bibliography and other sources, such as pedagogical journals, curricula and reports. Our study reveals a web of relationships that connected people and places in the 1920s and 1930s. Central to these relationships were institutions such as the NEF and the TC, which established social and epistemological territories surrounding the production of pedagogical repertoires related to New Education.

Keywords:  Teacher education; Institute of Education; Teachers College; New Education Fellowship

Em 19 de março de 1932 era publicado o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova.

No mesmo dia, ocorria a promulgação do Decreto 3.810 que criava, no Rio de Janeiro, o Instituto de Educação no Distrito Federal na administração de Anísio Teixeira. Em comum, os dois documentos previam a formação docente a nível superior (VIDAL, 2013). Outro elemento que os conectava era o diálogo com ideias e modelos que circulavam no início do século XX e que se convencionou designar por movimento internacional da Educação Nova.

Por um lado, o Manifesto dos Pioneiros se relacionava de várias formas – mas não exclusivamente – com o que vinha sendo produzido nos EUA, principalmente no Teachers College (TC) da Columbia University. Alguns de seus signatários, como o próprio Anísio Teixeira, tinham retornado havia pouco tempo dos EUA e incorporado aos seus referenciais vários autores estadunidenses, ou mesmo a bibliografia que circulava em suas versões originais ou na forma de traduções no Brasil.

Apesar de em nenhum momento Dewey ser citado, Cunha (2017) argumenta que as concepções do filósofo estão presentes no Manifesto. Seguindo um caminho semelhante, Carvalho (2004) busca comprovar por meio de uma intrincada rede de relações entre educadores brasileiros e europeus a conexão entre o conteúdo do documento com a Ligue Internationale Pour L’Education Nouvelle (LIEN), que no contexto anglófono ficou conhecida como New Education Fellowship (NEF).

Nos anos 1920 a NEF (ou LIEN) emergiu enquanto um movimento internacional que tinha como proposta reunir educadores de diferentes países na crença que a educação poderia atender às novas demandas de um mundo em mudança. No contexto do fim da Primeira Guerra Mundial e dos clamores por paz e democracia, a referida organização, cuja sede oficial situava-se em Londres, deu origem a seções ao redor do mundo, incluindo representações na América do Sul. O Brasil teve uma seção nos anos 1940. As principais estratégias de disseminação de iniciativas e ideias encontraram bases nas revistas associadas à NEF e em suas conferências regionais e internacionais.

Nesse cenário podemos encontrar não apenas conexões entre o TC, a NEF e o Brasil, mas também centros para a defesa de concepções e propaganda de experiências da Educação Nova, apesar de suas aproximações diferentes, constituindo intricadas redes sociais. No entanto, a consolidação desse repertório para educadores do Brasil e de outros países no mundo não esteve circunscrita a estas iniciativas. Para isso, foi também fundamental a configuração da educação como um campo acadêmico, não restrito às Escolas Normais, mas associado à esfera universitária. De acordo com Watras (2011), o surgimento da NEF coincidiu com a criação de Departamentos de Educação em várias universidades no mundo, o que no caso brasileiro implicou na criação dos Institutos de Educação do Distrito Federal, em 1932, e de São Paulo, em 1933, e sua incorporação à Universidade do Distrito Federal, em 1935, e à Universidade de São Paulo, em 1934, respectivamente.

Esses vestígios conduzem-nos a inquirir sobre a construção de territórios epistemológicos, em diferentes espaços geográficos e sociedades. Ainda a argumentar sobre as disputas de significados associados ao movimento internacional da Educação Nova em relação às hibridações locais. Para tanto, o presente artigo tem como objetivo discorrer sobre o papel tanto da NEF quanto do TC como centros de legitimação da educação enquanto campo acadêmico emergente e como epicentros de redes de trabalho na educação. Colocamos em foco a própria constituição dos Institutos de Educação do Rio de Janeiro e de São Paulo e buscamos evidenciar conexões, perscrutando a circulação de sujeitos e ideias no que podemos considerar uma história conectada da formação de professores.

Para desenvolver a discussão, organizamos o presente artigo em três partes. A primeira explora a constituição da NEF. A segunda discorre sobre a tradição internacional do TC, inquirindo especificamente sobre sua relação com os Institutos de Educação do Distrito Federal e de São Paulo. A terceira examina a criação dos referidos institutos entrelaçados ao movimento da Educação Nova.

A New Education Fellowship

A New Education Fellowship foi fundada em 1921, no primeiro congresso da educação nova realizado em Calais, França. Todavia, suas origens estão entrelaçadas com a Theosofical Fraternity in Education, fundada por Beatrice Ensor em 1915 na Inglaterra. De acordo com Middleton (2017), ao organizar a conferência em Calais, Ensor teve a preocupação de não associar o evento com a teosofia em face da resistência por parte de uma parcela de educadores, o que a levou a usar o nome New Education Fellowship, dando origem à organização internacional que, como afirmamos anteriormente, tinha sede oficial em Londres. A revista The New Era, que havia começado a ser publicada em 19204 sob os auspícios da Theosofical Education Trust, passou a figurar como a revista oficial da NEF. Tais ligações com a teosofia ainda se fariam sentir na NEF, segundo Lawson (1981), ao longo dos anos 1920 e 1930, perceptível nas conferências e artigos da The New Era.

Na ocasião da criação da NEF, Elizabeth Rotten e Adolphe Ferrière foram designados diretores da Fellowship, Beatrice Ensor assumiu como diretora organizadora e Baillie-Weaver como presidente. O comitê central ficou sediado em Londres. As principais formas de comunicação com os membros da NEF se davam por meio de três revistas associadas à Fellowship: The New Era, editada por Beatrice Ensor, Pour L’Ere Nouvelle, por Adolphe Ferrière e Das Werdende Zeitatter, por Elizabeth Rotten. As conferências bianuais também desempenhavam um importante papel. O foco principal era promover discussões relacionadas aos diferentes aspectos da Educação Nova (LARSSON, 1987; JENKINS, 1989; BREHONY, 2004)

Entre as duas guerras mundiais, a NEF organizou sete conferências internacionais5 e uma série de conferências regionais6, em torno de temas centrais à Educação Nova, chamando a atenção de públicos compostos por profissionais, administradores e acadêmicos atuando na área de educação, assim como leigos. Por meio de suas revistas associadas e conferências internacionais, a NEF tornou possível a circulação de teorias, modelos, objetos e pessoas relacionados às pautas da Educação Nova, alcançando lugares diferentes e agregando novos pesquisadores e entusiastas.

A projeção internacional da NEF é evidente considerando o rápido aumento no número de seções e grupos associados em diferentes países e o número de participantes nas conferências. Apenas para exemplificar, em 1936, a NEF tinha 51 seções nacionais e 23 revistas associadas em 15 idiomas. As conferências internacionais reuniam membros de diferentes partes do mundo. Na sétima conferencia mundial, realizada na Inglaterra em 1936, por exemplo, 50 países foram representados (LARSSON, 1987; JENKINS, 1989).

Países sul-americanos também abrigaram seções e grupos da NEF. As respectivas datas de criação das seções/grupos foram: Argentina (1928), Equador (1930), Peru (1930), Bolívia (1936), Paraguai (1930) e Uruguai (1931)7. No Brasil, a seção foi criada em 1942, sob a direção de Lourenço Filho e secretariada por Celina Padilha, segundo relatórios da NEF.

Apesar da seção brasileira ter sido criada apenas nos anos 1940, distintamente do que ocorreu nos países vizinhos, há evidências que apontam para a presença de educadores brasileiros nas conferências da NEF desde os anos 1920. Dentre as referências mais antigas consta a presença de Laura Jacobina Lacombe na conferência realizada em Locarno, na qual fez uma apresentação sobre a educação pública no Rio de Janeiro (LACOMBE, 1927). É possível que fizesse parte de comissão brasileira enviada por Fernando de Azevedo, à época diretor da instrução pública no Rio de Janeiro. No número 32 da The New Era, publicado em 1927, que traz vários dados sobre a conferência de Locarno, Lacombe consta como delegada da América do Sul, representando o governo brasileiro e a Associação Brasileira de Educação. No mesmo número da revista são indicados os números de membros de cada país, sendo três do Brasil.

A NEF agregava educadores e instituições (re)conhecidos internacionalmente, o que refletia em artigos publicados em revistas associadas, incluindo a The New Era, e na presença de tais educadores nas conferências regionais e internacionais realizadas pela Fellowship. Entre algumas figuras que participaram das conferências é possível citar Susan Isaacs e Percy Nunn, professores do Instituto de Educação em Londres; Adolphe Ferrière e Jean Piaget, vinculados ao Instituto Jean-Jacques Rousseau; e Harold Rugg, Carleton Washburne, Helen Parkhust e Isaac Kandel, associados ao Teachers College/Columbia University e/ou à Progressive Education Association (PEA).

A primeira seção da NEF nos EUA foi criada em 1932, vinculada à PEA e tendo como revista associada a Progressive Education (BREHONY, 2004). Apesar de ser possível perceber que a PEA estava a par das atividades da NEF desde o seu começo com base no conteúdo veiculado pela revista Progressive Education e considerando o número de delegados representando os EUA nas conferências da NEF, a PEA resistiu por algum tempo à ideia de se vincular à NEF, como afirmado por Middleton (2013). Tais preocupações e resistências também são mencionadas por educadores associados à PEA, tais como Rugg (1931) e Washburne (1952).

Há ao menos duas explicações para essa resistência inicial. Primeiro, apesar da NEF naquele momento estar emergindo enquanto uma importante rede social ligando sujeitos de diferentes países, no início ela congregava leigos e educadores associados à teosofia. Segundo, enquanto organizações fundadas em períodos próximos – a PEA foi criada em 1919 – e que tinham objetivos que convergiam em vários pontos, a PEA e a NEF colidiam na busca por protagonismo. Inclusive, Brehony (2004) menciona tentativas não bem-sucedidas de fundir as duas organizações, apesar de não fornecer maiores detalhes.

Teachers College da Columbia University enquanto referência internacional

O Teachers College (TC) da Columbia University foi um importante modelo para formação de professores ao redor do mundo, sendo referência para a criação de instituições semelhantes em outros países, como o Institute of Education da University College London (MCCULLOCK, 2014) ou Edinburgh (Teacher) Training Centre (Moray House) (LAWN, 2014) em Edimburgo (Escócia) nos anos 1920 e 1930.

Originalmente criado em 1887, o TC foi fundado por Grace Hoadley Dodge, Nicholas Murray Butler e James Earl Russel. O nome atual, Teachers College, foi adotado em 1892. No início do século XX um grupo de educadores foi convidado a compor o quadro docente do TC. Esses pioneiros construíram uma tradição e deixaram uma herança que tornaria o TC uma das referências mais importantes do pensamento e prática educacionais nos EUA. Entre os pioneiros incorporados ao TC pelo reitor James Russell estava Edward Lee Thorndike, que foi recomendado pelos seus professores William James e James McKeen Cattell. Thorndike foi contratado em 1899. Enquanto “Edward L. Thorndike liderou o campo da psicologia educacional, John Dewey era o pioneiro proeminente da filosofia educacional” (CREMIN et al, 1954, p. 46, tradução nossa). Apesar de Dewey não ser um membro do quadro docente do TC – estava alocado no Departamento de Filosofia em Columbia, posição que ocupou em 1904 – ele ministrava conferências no TC, convite feito em 1906. Posteriormente, integrou o grupo de professores que compuseram o então recém-criado Departamento de Pesquisa Educacional (CREMIN et al, 1954; CREMIN, 1964).

Nas origens do TC estava a tradição dos contatos internacionais. A presença de estudantes estrangeiros era apreciada e o número aumentou ao longo dos anos. De acordo com Cremin et al (1954), em 1923, havia 265 estudantes de 42 países. Entre 1926 e 1927, o número de estudantes estrangeiros chegou a 457. Um dos desdobramentos do número crescente de estudantes estrangeiros foi a criação, em 1923, do International Institute, o que foi possível graças a uma doação do General Education Board, que havia sido fundado havia pouco tempo por John D. Rockefeller. Paul Monroe foi designado diretor e entre os associados estava Isaac Kandel8. Dentre as atividades promovidas pelo International Institute para os estudantes estrangeiros incluíam-se viagens para visitar e estudar as escolas nos EUA.

Alguns dos ganhos do programa de pesquisa do International Institute foram o desenvolvimento da International Educational Library, que era “uma das melhores coleções dessa natureza no mundo” (CREMIN et al, 1954, p. 74, tradução nossa), e a publicação do Educational Yearbook do International Institute do TC, editado por Isaac Kandel, com foco na educação em vários países. O Yearbook, segundo Correia (2011), acompanhou a existência do International Institute – encerrado em 1938 – e sobreviveu por mais de seis anos após o seu encerramento. Além do Yearbook, havia também os relatórios escritos por membros da equipe em países estrangeiros.

A criação do Institute of Educational Research em 1921 foi um marco importante na história do TC. O Instituto era gerido por um quadro administrativo composto por três divisões: (1) Divisão de Psicologia Educacional, Professor Edward L. Thorndike, Diretor; (2) Divisão de Experimentação Escolar, Professor Otis W. Caldwell, Diretor; e (3) Divisão de Estudos de Campo, Professor George D. Strayer, Diretor (CREMIN et al, 1954, p. 76). Além do International Institute e do Institute of Educational Research, é importante ressaltar a criação do Institute of Child Welfare Research, em 1924.

É possível fazer um inventário aproximado dos estudantes estrangeiros que frequentaram o TC com base em documentos do International Institute9. De acordo com os levantamentos de Rabelo (2016), entre os anos 1920 e 1960 o TC recebeu em torno de 120 estudantes brasileiros. Entre eles, provavelmente o mais conhecido na historiografia da educação brasileira seja Anísio Teixeira. Segundo Nunes (2007), a primeira viagem de Anísio aos EUA se deu em 1927, durante a qual frequentou cursos de verão oferecidos pelo TC. A segunda viagem ocorreu entre 1928 e 1929, com bolsa da Macy Student Fund do International Institute, período em que cursou o mestrado no TC e obteve o título de Master of Arts em Educação.

Outros nomes também chamam a atenção entre os brasileiros que constam nas listas, como Isaias Alves de Almeida, educador baiano que frequentou o TC entre 1930 e 1931, obtendo o título de mestre em psicologia educacional. Após retornar dos EUA, Isaias assumiu o cargo de subdiretor técnico da Diretoria Geral da Instrução Pública do Distrito Federal, entre 1931 e 1932, a convite de Anísio Teixeira. Ainda foi chefe do Serviço de Testes e Escalas do Instituto de Educação do Rio de Janeiro, entre 1932 e 1934 (RABELO, 2018).

Noemy Silveira10 consta em uma lista de estudantes de 1930. Segundo Warde (2002), ela não concluiu os estudos planejados no TC, antecipando sua volta a pedido de Lourenço Filho para auxiliar na reforma da educação de São Paulo. Ainda nos anos 1930, Noemy assumiu a cadeira de psicologia educacional no Instituto de Educação de São Paulo e, posteriormente, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) da Universidade de São Paulo (USP), além de ter sido chefe do Serviço de Psicologia Aplicada.

Olga Strehlneek, que foi professora assistente de Noemy no IESP e na FFCL, cursou o mestrado no TC, entre 1939 e 1940, em psicologia educacional. Cabe destacar ainda o grupo de cinco professoras mineiras que embarcou em 1927 para estudar em Nova Iorque – Lucia Schmidt de Castro, Ignacia Ferreira Guimarães, Alda Lodi, Amelia de Castro Monteiro e Benedicta Valladares Ribeiro – e que, ao retornarem em 1929, assumiram cargos na recémcriada Escola de Aperfeiçoamento em Belo Horizonte (FONSECA, 2010; MACIEL, 2001).

Dentre os vários documentos que trazem a relação de alunos há um intitulado Students from Latin American Countries Registered in Teachers College, Columbia University, 19201940, no qual constam 29 brasileiros. Baseado no documento, ao todo, 11 brasileiros concluíram seus estudos no TC nos anos 1920; 13 nos anos 1930 e 5 nos anos 1940. No entanto, tal documento não inclui os estudantes que permaneceram por um período mais curto, frequentando apenas alguns cursos sem obter um título, como Noemy Silveira. Todavia, tal lista dá uma ideia do fluxo de latino-americanos que estavam desenvolvendo seus estudos no TC e a área de formação. Na referida lista constam 8 estudantes provenientes da Argentina11, 1 da Bolívia, 2 da Guiana Britânica, 24 do Chile, 3 da Colômbia, 19 de Cuba, 7 do Equador, 19 do Haiti, 2 de Honduras, 15 do México, 3 da Nicarágua, 13 do Panamá, 5 do Peru, 132 de Porto Rico, 1 do Uruguai, e 3 da Venezuela, perfazendo um total de 286.

Ainda com base na mesma lista de estudantes provenientes da América Latina, é interessante notar as áreas de formação visadas. No caso dos brasileiros constam áreas como Cuidados de Saúde Pública [no original Public Health Nursing], Psicologia Educacional, Educação Comparada, Educação Infantil [no original Nursing Education], Educação Elementar, Educação Escolar Normal, Ensino de Ciências Gerais, Administração Pessoal do Estudante, Administração Educacional, Desenvolvimento e Orientação Individual, Educação Religiosa, Educação, Educação Sanitária.

Considerando o papel do TC na organização do Institute of Education (IoE) em Londres, também é relevante notar a presença de estudantes ingleses na instituição de Nova Iorque. Entre os anos 1920 e 1930, algo em torno de 132 estudantes ingleses frequentaram o TC. Alguns deles residiam em outros países, tais como China, Japão, Turquia, Índia e Canadá. De acordo com os registros, parcela desses estudantes desejava lecionar nos EUA ou no Canadá. Algumas das áreas pretendidas aparecem com maior frequência, como Psicologia Educacional, Educação Infantil e Jardim de Infância.

O IoE teve suas origens na London Day Training College (LDTC). O LDTC foi fundado em 1902 e apenas em 1932 se tornou o Instituto de Educação da University College London (ALDRICH, 2004). Inicialmente, o LDTC era ligado ao London County Council (LCC), o que ocasionou tensões até a sua independência e conexão com a University of London. Alguns argumentos adotados para defender a independência do LCC tinham o TC como modelo, como explicou John Adams, o primeiro diretor do LDTC, em um memorando escrito em 1914: “O ideal deveria ser o estabelecimento de um departamento na University of London comparável ao Teachers College na Columbia University, New York” (ADAMS, 1914 apud ALDRICH, 2004, p. 621, tradução nossa).

Para Gary McCullock (2014, p. 126) a associação do IoE com a University of London em 1930 pretendia gestar, à semelhança do TC, um centro de estudos sobre educação e um meio de internacionalização da pesquisa educacional.

Isto significava a indicação da equipe que seria capaz de se especializar em aspectos particulares da educação, como história e organização, métodos de instrução e formação, e filosofia e psicologia da educação, e se engajar na pesquisa nessas áreas (tradução nossa).

Martin Lawn (2014) expande essa liderança do TC para o Reino Unido, especificamente a Escócia, para a qual o instituto norte-americano foi não apenas um modelo a ser seguido, mas também um centro responsável pela formação de um número considerável de educadores entre os anos 1920 e 1930.

Por fim, no que concerne à relação entre TC e PEA, outras conexões são passíveis de serem identificadas, considerando o número de professores do TC que eram membros da PEA. Entre os professores estão William Heard Kilpatrick, Harold Rugg e John Dewey. Apesar da PEA ter se tornado uma seção da NEF apenas em 1932, membros da PEA – incluindo alguns daqueles professores do TC – já frequentavam as conferências promovidas pela NEF nos anos anteriores e mesmo publicavam em revistas associadas à Fellowship, como é possível verificar em números da The New Era e da Pour L’Ere Nouvelle.

Os Institutos de Educação no Brasil nos anos 1930

No caso do Brasil, como já afirmado, Institutos de Educação foram criados no Rio de Janeiro em 1932 e em São Paulo em 1933. Incorporaram-se a Universidades em 1935 no Rio de Janeiro (Universidade do Distrito Federal) e em 1934 em São Paulo (Universidade de São Paulo). Lourenço Filho assumiu a direção do IEDF (1932-1937) enquanto Fernando de Azevedo tornou-se diretor do IESP (1933-1938). Tal qual o TC, estes Institutos tinham em comum a proposta de produzir ciência da educação. Nesse sentido, estimulavam os docentes a especializarem-se em aspectos da educação, tais como história, filosofia e psicologia da educação; conduzir inquéritos e pesquisas; e publicar os resultados. De fato, de acordo com o Decreto 4.489, de 11 de novembro de 1933, que regia o vencimento dos docentes do IEDF, publicar trabalhos de uso recomendável aos diversos cursos do Instituto ou obras de cultura geral era condição para recebimento de vantagens salariais.

A publicação do Manifesto de 1932 e a criação dos dois Institutos, assim, não garantia que uma nova cultura profissional docente se instalasse no Brasil. As estratégias que uniam a propaganda dos princípios da Escola Nova com a elevação da formação docente por meio da criação de Institutos de Educação em Universidades se entreteciam a uma forte política editorial. Não foi por acaso que tanto Lourenço Filho, quanto Fernando de Azevedo iriam se associar a editoras nacionais e coordenar coleções pedagógicas, como a Biblioteca de Educação da Editora Melhoramentos e a Biblioteca Pedagógica Brasileira da Companhia Editora Nacional, respectivamente.

Em carta a Anísio Teixeira, datada de 1 de novembro de 1929, por ocasião da encomenda da tradução de Dewey para a Biblioteca de Educação da Editora Melhoramentos, e praticamente 3 anos antes da escrita do Manifesto, Lourenço Filho evidenciava o espírito que animava este grupo de educadores brasileiros:

As informações da Columbia muito me interessam. Tanto mais que estou com plano de um trabalho, para o anno próximo, que envolve a creação de um “instituto de educação” – uma coisa que seja um desenvolvimento de meus cursos na escola normal, para professores já formados. É preciso doutrinar... (Apud TOLEDO & CARVALHO, 2017, p. 1005).

Dessas coleções pedagógicas constavam tanto autores brasileiros quanto estrangeiros. No que concerne aos estrangeiros, a título de exemplo, é possível destacar a tradução de A escola e a psicologia experimental, de Edouard Claparède, e Educação e sociologia, de Durkheim, ambos por Lourenço Filho, em 1928 e 1929 respectivamente; textos de Dewey, compilados em Vida e educação, por Anísio Teixeira, em 1930 (a que se refere a citação acima), A lei biogenetica e a Escola Activa, de Adolphe Ferrière, em 1929, e Educação para uma civilização em mudança, de Kilpatrick, em 1933, ambos por Noemy Silveira, para a Editora Melhoramentos; Como pensamos e Democracia e educação, de Dewey por Godofredo Rangel e por Rangel e Anísio Teixeira, respectivamente em 1933 e 1936, Educação funcional, de Edouard Claparède, por J.B. Damasco Penna, em 1933, para a Companhia Editora Nacional; ou ainda Princípios elementares de educação, de Thorndike e Gates, por de Haydée Camargo Campos para Saraiva & Cia em 1936.

No que tange aos autores brasileiros, temos, dentre muitos exemplos, Introdução ao Estudo da Escola Nova, de Lourenço Filho, e Cinema e educação, de Jonathas Serrano e Francisco Venâncio Filho, publicados em 1929 e 1930, respectivamente, pela Melhoramentos; Novos caminhos e novos fins, de Fernando de Azevedo, lançado em 1931, o próprio Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, em 1932, Sociologia educacional, de Carlos Delgado de Carvalho, Educação progressiva, de Anísio Teixeira, e Noções de história da educação, de Afrânio Peixoto, os três saídos em 1933 pela Companhia Editora Nacional;

Os autores e os tradutores e tradutoras nacionais mencionados nos parágrafos anteriores foram professores do IEDF, como Lourenço Filho, Anísio Teixeira, Carlos Delgado de Carvalho, Jonathas Serrano, Afranio Peixoto e Francisco Venâncio Filho; ou do IESP, como Fernando de Azevedo, Noemy Silveira e Haydée Campos. Os autores traduzidos estavam associados ao TC como John Dewey, Edward L. Thorndike e William Kilpatrick; ou à NEF, como Adolphe Ferrière e Edouard Claparède. Ao analisar o perfil dos autores traduzidos para a Biblioteca da Educação da Editora Melhoramentos, Maria Rita Toledo e Marta Carvalho (2017, p. 1003-1004) reiteram esta conexão com a NEF (por elas referida por LIEN) ao afirmarem que:

Lourenço Filho optou claramente pelos reconhecidos no movimento internacional pela Escola Nova, que vinham sendo difundidos especialmente na Europa, como Claparède, Ferrière, Piéron, Binet e Luzuriaga. A referência ao debate europeu marcou a BE [Biblioteca de Educação]. Lourenço Filho foi, no período que coincide com a edição dos primeiros volumes da Coleção, o correspondente brasileiro do Bureau International d’Éducation (1928), além de ter se relacionado pessoalmente com figuras importantes da Ligue Internationale pour l’Éducation Nouvelle, como Ferrière e Piéron.

A aproximação entre educadores brasileiros e estrangeiros também era promovida por meio de viagens. Entre os anos 1920 e 1960 houve um aumento perceptível de estudantes brasileiros no TC. É possível rastrear vários desses brasileiros aos primeiros anos dos Institutos de Educação no Rio de Janeiro e em São Paulo. No Rio de Janeiro, além de Anísio Teixeira, Isaías Alves e Lourenço Filho. Apesar de Lourenço Filho não ter frequentado os cursos do TC, ele viajou aos EUA em missões pedagógicas, estabeleceu contato com professores daquela instituição e aproveitou para fazer uma importante encomenda de livros para a Biblioteca da Escola de Professores do IEDF (VIDAL, 2001, p. 139). Em São Paulo estavam Noemy Silveira e Olga Strehlneek. O TC aparecia, principalmente, como uma referência relevante no ensino de filosofia e psicologia nesses Institutos de Educação.

Com respeito à NEF, mencionamos anteriormente a participação de Laura Lacombe na Conferência de Locarno em 1927. Mas vale a pena nos determos no sentido inverso dessa circulação, ou seja, nos viajantes que vieram ao Brasil em pelo menos um caso particular: Adolphe Ferrière. De acordo com Joseph Coquoz (2012, p. 43), ainda no primeiro Congresso da NEF, em Calais, em 1921, ficou estabelecido que enquanto Beatrice Ensor cuidaria dos países anglófonos e Elisabeth Rotten dos germanófonos, Ad Ferrière se encarregaria de disseminar a NEF entre os países ibero-americanos. Munido de livros e de uma cópia do filme “Home Chez Nous”, Ferrière em 1930 partiu para Portugal, Espanha e América Latina, com a tarefa de estimular a criação de seções locais da NEF (Idem, p. 44).

A despeito de não ter podido desembarcar no Rio de Janeiro em razão da eclosão da Revolução de 1930, Ferrière manteve contato com os educadores brasileiros, recebendo a bordo publicações de Fernando de Azevedo e Deododato de Moraes sobre as reformas educacionais implementadas no Rio de Janeiro e no Espírito Santo, depois veiculadas na edição nr. 67, de abril-maio de 1931, na revista da NEF, Pour L’Ere Nouvelle.

Para além da circulação de sujeitos e da constituição de redes de trabalho, os currículos dos cursos dos Institutos de Educação do Distrito Federal e de São Paulo apontam para vestígios que permitem estabelecer conexões com os EUA e a NEF. De acordo com Vidal (2001) e Evangelista (2002), nos programas dos anos 1930, autores como Dewey, Thorndike, Rugg, Kilpatrick e Kandel, que tinham relações com o TC e/ou a PEA, constam nas referências bibliográficas. Alguns deles inclusive publicaram na revista oficial da NEF, The New Era.

Além das conexões com o TC, os programas desses Institutos também revelam a presença de autores vinculados às seções francófonas da NEF, tais como Ferrière, Claparède, Decroly, Amelie Hamaide e Piaget. Remissões a Kerschensteiner – uma referência germanófona – Pintner, Nunn, Rusk e Findlay – referências britânicas – lançam luz a conexões que têm sido pouco exploradas na historiografia da educação brasileira. Algumas dessas obras constam em suas edições originais, outras aparecem na forma de traduções da Companhia Editora Nacional ou Editora Melhoramentos.

Tomando especificamente o caso do IEDF, analisado por Vidal (2001), a leitura dos Programas de Ensino da Escola de Professores apontava para alguns livros e autores intensamente referidos. Dos nove programas acompanhados de bibliografia, publicados pela Arquivos do Instituto de Educação, de 1937, sete indicavam como leitura, obrigatória ou recomendável, Como pensamos, de John Dewey, e Introdução ao Estudo da Escola Nova, de Lourenço Filho. Com seis citações vinha Educação funcional, de Ed. Claparède, seguido, com cinco indicações, por Vida e educação, de John Dewey. Na quarta posição, como recomendados, estavam Educação para uma civilização em mudança, de Kilpatrick; e Educação progressiva, de Anísio Teixeira.

Referência intensiva confirmada quando confrontada à bibliografia de leitura indicada nos resumos de aula, localizados no Arquivo do CPDOC-FGV. Os livros mais recomendados eram Introdução ao Estudo da Escola Nova, de Lourenço Filho, e Vida e educação, de Dewey, ambos com quatro indicações. Deste último, especialmente, citava-se o prefácio escrito por Anísio Teixeira, “A pedagogia de Dewey”. A escola e a psicologia experimental, de Claparède, Educação e sociologia, de Durkheim, Sociologia educacional, de Delgado de Carvalho, e Como pensamos, de Dewey, vinham em segundo lugar; seguidos por Educação para uma civilização em mudança, de Kilpatrick e Educação funcional, de Claparéde.

A análise dos programas de ensino coincidia com a avaliação de Juracy Silveira (1959, p. 76) sobre a relação entre formação de professores e mercado editorial:

As livrarias, para corresponder a lei da procura, expunham em suas vitrinas e balcões mais centrais as últimas novidades recebidas. Decroly, Ferrière, Claparède, Piaget, Pierón, Kerschensteiner, Kilpatrick, Dewey, Gates chegavam até os professores, no original ou em versão nacional ou espanhola. Introdução a Escola Nova, Testes A B C, de Lourenço Filho; Escola Progressiva, Em Marcha para a Democracia, de Anísio Teixeira; Para Novos Fins, Novos Meios, de Fernando de Azevedo, foram os 'bestsellers', do momento. Não havia professor que não os possuísse, não procurasse, em suas páginas, informações para as suas dúvidas, e sugestões e recursos técnicos para o seu trabalho.

Configuravam-se, assim, as bases de uma nova ciência da educação que encontrava acolhida no seio da Universidade, mesclando autores estrangeiros e produção nacional. E, ainda que no alvorecer do Estado Novo, os Institutos de Educação do Distrito Federal e de São Paulo tenham sido extintos, o repertório então constituído logrou sobreviver no interior das Seções de Pedagogia das Faculdades de Filosofia, criadas a partir de 1939, parcialmente em função da permanência de parte do corpo docente. Em São Paulo, com a supressão do IESP do conjunto formado pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP e sua substituição pela Seção de Pedagogia, continuaram no quadro de professores, Fernando de Azevedo e Noemy Silveira, dentre outros. No Rio de Janeiro, foi o então recém-criado Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), em 1937, dirigido por Lourenço Filho, e sua revista, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, com o primeiro número lançado em 1944, o lócus privilegiado de consolidação desse repertório.

Considerações finais

As observações traçadas acima nos auxiliam na compreensão de que, nos anos 1920 e 1930, uma trama de relações interligava sujeitos e lugares. A NEF tecia, no formato de teia, uma intrincada rede unindo educadores de vários países do mundo, ao mesmo tempo em que entrelaçava periódicos e congressos. Produzia assim um repertório comum e partilhado sobre Escola Nova. No entanto, não se constituía no único território social e epistemológico congregado sobre a problemática. Ao contrário, o TC, assim como o Instituto Jean-Jacques

Rousseau e o Bureau International d’Éducation, ambos situados em Genebra, residência de Ferrière, apresentavam-se em tensão/coalização, amalgamando sujeitos e significados em um campo em constituição.

Do mesmo modo, os Institutos de Educação do Distrito Federal e de São Paulo atuaram decididamente na seleção de obras e autores de referência e na promoção de investigações. Valendo-se de posições assumidas em editoras, educadores associados ao Movimento internacional da Educação Nova, dentre os quais se destacam Fernando de Azevedo e Lourenço Filho, desenharam os limites e os contornos do campo educacional no Brasil e lançaram as bases de uma ciência da educação brasileira, não apenas pela criação de especialidades como pelo engajamento na pesquisa e sua socialização por meio de impressos. Ao mesmo tempo, consagraram atores e inventaram uma tradição acadêmica.

Essa tradição se produzia na combinatória de publicações, participação em congressos e viagens em operações que retramavam as redes estabelecidas a partir de outros condicionantes, como a própria natureza do trabalho acadêmico, e que se entrelaçavam a outros tecidos como a política institucional e, mesmo, as políticas de Estado. Geraram um corpus de ideias ainda válido atualmente, em particular associado à psicologia e à filosofia da educação e aos princípios de uma Educação Nova.

Nesses jogos de espelhos produz-se o que Martin Lawn (2014) denomina de geografia e sociologia da ciência, ao retraçar os roteiros internacionais de circulação de sujeitos e apropriação da Escola Nova e as tensões nacionais na constituição das comunidades de sentido e das redes. Coloca-se também em relevância o alerta de Eckhard Fuchs (2007, p. 187), quando afirma que “redes são formas específicas de governança ou de coordenação de ações” (tradução nossa), o que suscita insistir na decifração de suas estratégias.

É seguindo estas sendas que a presente investigação tem se interrogado sobre como o movimento brasileiro consolidou problemas e traçou procedimentos ainda presentes no debate acadêmico sobre educação, rastreando os percursos e as hibridações produzidas no passado e a memória que continua a se projetar sobre a produção historiográfica atual.

1O presente artigo traz resultados de pesquisas financiadas pela FAPESP (Processos 2015/06456-1 e 2016/07024-0).

4Inicialmente a revista se chamava Education for the New Era, assumindo o título The New Era em 1921.

5Montreux (1923), Heidelberg (1925), Locarno (1927), Elsinore (1929), Nice (1932) e Cheltenham (1936) (BREHONY, 2004).

6Dentre as conferências regionais, cabe destacar as realizadas na África do Sul (1934), Nova Zelândia (1937) e Austrália (1937) (BREHONY, 2004).

7Também foram criados grupos no Chile e na Colômbia, cujas datas não foram localizadas, mas é possível inferir que ocorreu entre 1931 e 1933.

8O número 32, publicado em 1927, da revista The New Era traz referências sobre viagens realizadas por professores do International Institute do TC, informando que Isaac Kandel passou o ano de 1926 na Argentina, Brasil, Chile e Uruguai realizando investigações sobre a escola secundária.

9Os documentos estão disponíveis nos arquivos da Gottesman Libraries por meio de uma plataforma online chamada Pocketknowledge. Estão disponíveis as listas de alunos estrangeiros matriculados no TC entre os anos 1920 e 1970. Tais listas indicam o nome, país de origem dos estudantes e, em alguns casos, a área de interesse.

10Noemy Marques da Silveira casou-se em 1934 com Bruno Rudolfer, passando a assinar Noemy da Silveira Rudolfer.

11A lista possibilita assumir o país de proveniência, mas não a nacionalidade.

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Recebido: Junho de 2018; Aceito: Agosto de 2018

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