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Cadernos de História da Educação

versión On-line ISSN 1982-7806

Cad. Hist. Educ. vol.18 no.2 Uberlândia mayo/ago 2019  Epub 26-Sep-2019

https://doi.org/10.14393/che-v18n2-2019-15 

DOSSIÊ: ARTIGOS

Escola mista? Coeducação? Um desafio histórico para a educação de meninos e meninas

Patrícia Rodrigues Augusto Carra1 
http://orcid.org/0000-0003-1954-1053; lattes: 5923196932499177

1Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Brasil) prac@terra.com.br


RESUMO

O artigo traça um panorama da educação feminina no Brasil, apresenta fatores que levaram a paisagem escolar brasileira ser majoritariamente mista, discutindo o conceito de escola mista e escolarização diferenciada por sexo. Foi produzido com base em levantamento bibliográfico das áreas História da Educação, Sociologia e História prioritariamente. Constata que escola mista não significa a oferta de uma escolarização não diferenciada por sexo e reflete sobre a possibilidade de o ambiente escolar constituir-se como um espaço contributivo para a igualdade de gêneros. O texto infere a importância de um olhar atento para o sistema educacional e suas diferentes instâncias e para sujeitos que frequentam os ambientes educativos. Refletir sobre a importância de uma educação igualitária exige, entre outros fatores, pensar sobre a instrução disponibilizada (ou não) para homens e mulheres ao longo do tempo, nesse sentido, a História da Educação é espaço de grande importância.

Palavras-chave: Escola mista; Igualdade de gêneros; Educação feminina

ABSTRACT

The article outlines a panorama of women's education in Brazil, presenting factors that have led the Brazilian school landscape to be largely mixed-sex, discussing the concept of mixed-gender schools and gender-based education. The study was based on a bibliographical survey chiefly on the areas of History of Education, Sociology and History. It looks at the fact that mixed-sex schooling does not mean the offer of undifferentiated education for both genders and reflects on the possibility of the school environment being established as a space that contributes to gender equality.The text infers the importance of a close examination of the education system and its different instances and of the subjects that frequent educational environments. Reflecting on the importance of equal education calls for, among other things, thought on the instruction made available (or not) to men and women over time, and in this sense the history of Education is something of great importance.

Keywords: Mixed-sex schools; Gender equality; Women's education

RÉSUMÉ

Cet article propose un panorama de l'éducationféminine au Brésil, ilprésente des facteurs qui ontprovoqué un paysagescolairebrésilien de majoritémixteendiscutant le concept d'une école mixte et la scolarisationdifférenciée par sexe. Il a étéproduit à partir d’un bilanbibliographiquedesdomaines de l’Histoire de l’Éducation, de la Sociologie et de l’Histoire, prioritairement. Il constate que l'écolemixte ne signifie par l’offred’unescolarisation non différencié par sexe et propose uneréflexion sur la possibilité de l'environnementscolaireêtre un lieu contributif pour l'égalité des genres. Le texteinfèrel’importance d'un regard attentif sur le systèmeéducationnel et sesdifférentes instances et sur les sujets qui fréquentent les environnementséducatifs. Réfléchir sur l’importanced’uneéducationégalitaireexige, parmid’autresfacteurs, penser sur l'instructionofferte (ou non) aux hommes et aux femmes tout au long du temps, dans cesensl'Histoire de l'Éducationest un lieu de grande signification.

Mots-clés : Égalité de genres; Éducation féminine

RESUMEN

Este artículo muestra un panorama de la educación femenina en Brasil, presenta factores que llevaron a que el paisaje escolar brasileño fuese mayoritariamente mixto, discutiendo el concepto de escuela mixta y escolarización diferenciada por sexo. Ha sido elaborado con base en levantamiento bibliográfico de las áreas de Historia de la Educación, Sociología e Historia, principalmente. Constata que escuela mixta no significa la oferta de una escolarización no diferenciada por sexo y reflexiona sobre la posibilidad de que el ambiente escolar se constituya como un espacio que contribuye a la igualdad de los géneros.El texto infiere la importancia de una atenta mirada hacia el sistema educacional y sus diferentes instancias y hacia sujetos que frecuentan los ambientes educativos. Reflexionar sobre la importancia de una educación igualitaria exige, entro otros factores, pensar sobre la instrucción que se pone (o no) a disposición de hombres y mujeres a lo largo del tiempo, en ese sentido, la Historia de la Educación es un espacio de gran importancia.

Palabras-clave: Escuela mixta; Igualdad de géneros; Educación femenina

Introdução

Poucas são as escolas brasileiras que se caracterizam pela administração de um ensino diferenciado por sexo. Um exemplo de escola monoeducativa no Brasil, é o Colégio São Bento, localizado na cidade do Rio de Janeiro. Então, escrever em prol da coeducação pode parecer algo fora de propósito. Será?

Rosemberg (2012, p. 352) afirma que o maior acesso das mulheres à educação escolar não significou, de fato, “[...] igualdade de oportunidade a toda e qualquer mulher, bem como a experiência da co-educação”. A autora lembra que a antiga segregação sexual escolar deixou marcas no ensino, de tal forma que isso se verifica na vivência dos currículos. Segundo ela, desde os anos de 1970, há uma segregação sexual informal, ocorrendo mesmo nas escolas mistas.

Sobre o denominado currículo oculto (APPLE, 1982, 1989; Rosemberg (2012) lembram que, entre outros ensinamentos, a proposta curricular estabelece, simbolicamente, o adequado e o não adequado à homens e mulheres sobre lugares sociais. Este pensamento é reforçado por Canotilho, Magalhães e Ribeiro (2010, p. 171), que ressaltam o fato de que a cultura escolar está dividida em função do gênero e de outras desigualdades sociais (“raça”, etnia, orientação sexual, aparência corporal, capacidade intelectual e física). Segundo as autoras, essa divisão perpassa representações das/os próprios/as docentes sobre o que é próprio ou adequado a rapazes e moças, sobre o seu papel como profissionais e cidadãs/os. Elas destacam que há também ingerência sobre valores e concepções transmitidos a alunas e alunos por meio do que vem sendo denominado de currículo oculto.

A um primeiro olhar, podemos imaginar, em uma escola mista, a mesma educação oferecida para meninos e meninas, mas, ainda que sob o mesmo teto, os currículos e as práticas docentes e administrativas escolares legaram, e ainda legam, aos seus estudantes uma educação diferenciada por sexo. Devido a essa constatação, atualmente, em uma ação política e intencional, busca-se entender ou ensino misto como a instrução de homens e mulheres, em um mesmo espaço físico e temporal, que se denomina, aqui, de coeducação. Em sentido mais amplo, refere-se à ‘co-educação’, como uma escola mista, preocupada em alcançar uma educação igualitária e de qualidade, para ambos os sexos (AUAD, 2006).

É interessante refletir um pouco sobre a grafia desses termos e a implicação dessas diferenças, em termos de significação mais profunda. Daniela Auad (2004, 2006), em sua tese de doutorado e no livro Educar meninas e meninos: relações de gênero na escola, propôs a grafia ‘co-educação’, com o objetivo de fortalecer o debate sobre a temática educação e relações de gênero. A tese da autora e o livro são anteriores à reforma ortográfica. Julga-se importante, no entanto, enfatizar o uso intencional de uma grafia diferenciada como forma de chamar a atenção para a questão educação e igualdade de gêneros.

Neste texto, portanto, o termo ‘coeducação’ está sendo usado como sinônimo de escola mista, sendo que a grafia com destaque, ‘co-educação’, é a opção para a referência à escola mista preocupada com uma educação igualitária e de qualidade para ambos os sexos. Essa diferenciação reforça que, hoje, deseja-se mais do que o acesso e o êxito das mulheres no sistema escolar. Reivindica-se uma escola mista, que ministre educação de qualidade, sem discriminação étnico-racial ou socioeconômica e sem diferenciar conteúdos e práticas pedagógicas para homens e mulheres, conforme ideais masculinos ou femininos hegemônicos (ROSEMBERG, 2012, p. 339).

Entende-se que a ‘co-educação’ está entre os elementos básicos, para alcançarmos uma realidade democrática, fruto de relações mais igualitárias. A sua constante busca constitui um aspecto significativo do esforço para o ideal de uma práxis educativa para a democracia1 e para a implementação de um programa de educação que intencione uma formação voltada aos direitos humanos.

O exercício de busca pela ‘co-educação’ pode significar, também, fator contributivo para minorar questões como: a violência doméstica, o feminicídio2, a homofobia e as tensões intergeracionais. Nesse sentido, a prática oportuniza o exercício de se ver frente ao Outro e em relação a si mesmo, de forma mais humanitária; contribui para o entendimento da existência de diferentes masculinidades3 e feminilidades; e gera a possibilidade de desenvolvimento de subjetividades, que signifiquem homens e mulheres mais felizes, plenos.

Assim como Araújo (2005, p. 48), acredita-se que a grande conquista do projeto feminista igualdade na diferença foi a possibilidade de mudança nas relações de gênero:

Essa possibilidade tem permitido aos homens se libertarem do peso do machismo e às mulheres se libertarem do imperativo do feminino, ambos podendo ser sensíveis, objetivos, fortes, inseguros, dependentes, independentes, com liberdade e autonomia, e não seguirem imperativos categóricos determinados pelo gênero. É assim que se concretiza a idéia de gênero como construção social. Nessa perspectiva, a reconstrução do feminino leva necessariamente à reconstrução do masculino. Essa relação nunca será uma relação sem conflito; ao contrário, será sempre um espaço de luta e tensão dialética, onde estão em jogo diferentes poderes e desejos. Por isso, é importante que homens e mulheres, nas suas experiências subjetivas, possam exercitar a lógica, a razão, a intuição e a sensibilidade para construir novos valores e novas formas de se relacionar na vida afetivo-sexual, no casamento, na família, no trabalho, enfim, em todas as relações sociais.

De acordo com Waiselfisz e Maciel (2012): no conjunto de 84 países, o Brasil ocupa a sétima posição, no índice de feminicídios, sendo que esses crimes, geralmente, acontecem na esfera doméstica. Segundo o movimento feminista de Portugal, “União de Mulheres Alternativa e Resposta” (UMAR, 2008, p. 1), a violência no espaço doméstico é a maior causa de morte e invalidez entre mulheres dos 16 aos 44 anos e suas raízes estão nas desigualdades entre homens e mulheres, que persistem graças aos preconceitos e estereótipos de gênero.

Considera-se a escola, como uma das esferas possíveis de atuar, no sentido de almejar uma realidade menos sexista. Nesse sentido, concorda-se com Auad (2003, p.140), quando afirma: “Não há educação para a democracia sem co-educação e, mesmo sendo esta uma ideia prático-regulativa, apenas a sua busca pode tornar a escola uma instituição mais comprometida com o término das desigualdades”. Para UMAR (2008, p.1), a “[...] educação para a igualdade/paridade é basilar desde o jardim de infância, ao nível das brincadeiras, dos papéis de liderança, das dinâmicas e jogos, até aos mais altos níveis do ensino superior”. Como adverte Souza-Leite (2009, p.34), “[...] a conquista da cidadania passa pela conscientização de que a sexualidade habita um corpo político”.

Pensando o espaço escolar como um ambiente de interação humana e de reflexões, pode-se inferir que este possui importantes possibilidades de investimento, em uma práxis pedagógica comprometida com o incentivo à cidadania e aos valores humanitários, bem como se efetivar como lócus de exercício de convivência democrática. Afinal, como lembra Andrades (2010, p. 251): “Estamos aprendendo que, sem igualdade, perdemos todas as pessoas, homens e mulheres”.4

Nesse sentido, os estudos e as investigações relacionados à seara da História da Educação têm grande importância por oportunizar, entre outros fatores: a ciência sobre as razões, em tempos e espaços diferenciados, para o investimento ou não na instrução de diferentes pessoas; a análise dos meios e dos discursos que permeiam os diferentes espaços educativos; a reflexão sobre a escola no imaginário social, como exemplo de uma construção social da realidade (BERGER; LUCKMANN, 2010). Além disso, como lembra Freitas (2013, p. 68), esses estudos advertem que “[...] os tijolos imaginários são tão responsáveis pela edificação da escola quanto o traçado inconfundível de seus territórios internos”.

Refletir sobre a possibilidade de uma educação igualitária exige pensar sobre a instrução disponibilizada (ou não) para homens e mulheres ao longo do tempo. Igualmente, provoca questionamentos sobre quais formações estão ou não ao alcance de diferentes homens e de diferentes mulheres.

1. Educação de mulheres e escola mista no Brasil

Nos primórdios da colonização portuguesa, o ensino esteve confiado e concentrado nas mãos das ordens religiosas, em especial, nas dos jesuítas - era um ensino que objetivava a catequese e a formação da elite colonial. Neste período, as mulheres pouco acesso tiveram ao ensino formal: a maioria não sabia ler nem escrever. Apenas uma pequena parcela de mulheres - em geral, da elite - aprendia a ler5. Escrever era uma habilidade rara na população feminina. Carvalho (2011, p. 23) escreve: “[...] na Colônia, só se via mulher aprendendo a ler nas imagens de Sant’Ana Mestra ensinando Nossa Senhora”.

A educação das mulheres acontecia no lar, no mundo privado. As poucas moças que recebiam alguma instrução formal aprendiam com algum familiar, com preceptores ou, em alguns casos, a partir do século XVII, nos conventos: instituições religiosas católicas dedicadas à formação de jovens do sexo feminino para a contemplação religiosa ou para o casamento e, também, à guarda ou punição de mulheres. (ALGRANTI, 1993)

No Brasil, os conventos são datados a partir do século XVII e revelam-se como espaços dúbios, podendo representar tanto prisão e castigo, como fuga de destinos previamente previstos para as mulheres da época (casamento nem sempre desejado, maternidade, pouca ou nenhuma instrução). São espaços femininos, em que muitas de suas habitantes foram trancafiadas e para onde muitas mulheres foram impedidas de seguir.

Os conventos, por muito tempo, representaram uma possibilidade de instrução formal para a população feminina, o que não significa terem objetivo de atender a um número considerável de interessadas ou serem espaços educativos transgressores, em relação ao esperado pela sociedade da época, para as mulheres de então. Segundo Novais (1984, p. 19), “[...] até o ano de 1811 existiam cinco conventos no Brasil, localizados, um na Bahia, dois no Rio de Janeiro e dois em São Paulo”.

Sobre o ideal hegemônico das mulheres do Brasil Colônia, é preciso considerar que este, na realidade, não era possível ou extensivo a todas:

[...] quando falávamos em família na Colônia logo vinha à mente o modelo patriarcal: o de uma família extensiva, constituída por parentes de sangue e afins, agregados e protegidos, sob a chefia indiscutível de uma figura masculina. A família patriarcal teve grande importância, marcando inclusive, [...], as relações entre sociedade e Estado. Mas ela foi característica da classe dominante, [...]. Entre a gente de condição social inferior a família extensiva não existiu, e as mulheres tenderam a ter maior independência, quando não tinham marido ou companheiro. Em Ouro Preto de 1804, por exemplo, considerando-se 203 unidades domésticas, apenas 93 eram encabeçadas por homens. Mesmo em relação às famílias de elite, o quadro de submissão das mulheres tinha exceções. Em determinadas circunstâncias, elas desempenharam um relevante papel nas atividades econômicas. (FAUSTO, 1996. p. 43)

As observações de Fausto (1996) não diminuem o peso do poder/leis masculinas sobre as mulheres. Apenas levam a inferir espaços de insubordinação/resistência e a realidade feminina de luta cotidiana pela sobrevivência. Destaca-se o fato de que essa luta ocorre, sem as mesmas garantias legais que beneficiam o universo masculino, ou apesar da organização social oficial e religiosa, forjada de forma androcêntrica.

A partir das Reformas Pombalinas (1750-1777), houve a possibilidade de abertura de escolas régias para meninas. Não era um ensino junto aos meninos. Foram previstas escolas para meninos e escolas para meninas, nas quais o docente deveria ser do mesmo sexo que o público discente, e o currículo, diferenciado.

Com a Independência (1822), encontramos registros de preocupação com a formação de professores e com a educação elementar. Em 1835, foi criada uma Escola Normal, para o ensino do método Lancaster ou Ensino Mútuo, voltado à formação de professores homens (BASTOS, 2005a e 2005b).

A Constituição de 1824 (art. 178/32) contém a afirmação: “A instrução primária é gratuita a todos os cidadãos”. Esta determinação foi regulamentada no ano de 1827, através da Lei Geral do Ensino, de 15 de Outubro, primeiro dispositivo legal a regular a instrução pública nacional. Definiu, para o ensino das primeiras letras (ensino primário), currículo e escolas diferenciadas, de acordo com o sexo da criança: devia-se ensinar, aos meninos, ler, escrever, contar, as quatro operações e noções de Geometria. Para as meninas, devia-se ensinar ler, escrever, contar, as quatro operações e bordado e costura.

A Lei de 15 de Outubro de 1827, em parte de seu texto, diz: “Em todas as cidades, vilas e lugares populosos haverá escolas de primeiras letras que forem necessárias”6. A realidade, entretanto, não traduziu essa previsão legal. Poucas crianças tiveram acesso à escolarização, pois o Estado não criou escolas suficientes para atender à demanda da população (MANOEL, 1996). Para ilustrar essa conclusão, basta lembrar que, no ano de 1872, meio século após a Proclamação da Independência do Brasil, apenas 16% da população era alfabetizada. Carvalho (2011) destaca, ainda, a falta de interesse na instrução de pessoas escravas e a ausência de motivação religiosa para se educar, pois não havia, por parte da Igreja Católica, incentivo à prática da leitura da Bíblia.

A educação feminina, nesse período, ganhou importância nas famílias da elite brasileira por sua associação à exposição pública, em uma espécie de vitrine social. “Não mais limitadas a somente parir bebês e gerenciar a casa, as mulheres da elite adquiriram então papéis relevantes na manutenção de redes sociais e das alianças estabelecidas entre as famílias” (HABNER, 2012, p.56). As filhas de representantes da elite brasileira recebiam uma educação voltada para o convívio social: falar francês, conversar polidamente, portar-se com elegância e refinamento, tocar piano.

No ano de 1832, eram raras as brasileiras instruídas e menor era o número das que se dedicavam à escrita. Mesmo os impressos destinados ao público feminino, circulantes na época, eram, na sua maioria, geridos por homens. No conjunto das poucas mulheres que, durante o período imperial, se dedicaram à escrita, estão a mineira Beatriz Francisca de Assis Brandão (1779-1860), as gaúchas Clarinda da Costa Siqueira (1818-1867) e Delfina Benigna da Cunha (1791-1857) e Nísia Floresta, que, no ano de 1832, publicou o seu primeiro livro, intitulado Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens. Foram poucas as iluminadas por uma educação diferenciada, em relação à que era ofertada à população feminina, que estenderam dádivas do conhecer para outras mulheres: “[...] abriram escolas, publicaram livros, enfrentaram a opinião corrente que dizia que mulher não necessitava saber ler nem escrever” (DUARTE, 2003, p.15).

A distância entre o previsto pela legislação para a educação e a realidade foi uma constante durante o período imperial. Não houve investimento suficiente, na criação e na manutenção de escolas. Os gastos com a instrução eram considerados altos pelos governos provinciais, os quais, a partir dos meados desse período, encontraram, nas classes mistas, uma forma de atender à demanda por escolarização: “As professoras recebiam autorização para lecionar aos meninos até uma determinada idade, geralmente entre 12 a 14 anos. Isto abriu um novo campo para o magistério feminino: o ensino masculino/misto” (STAMATTO, 2002, p. 6)7.

Um desdobramento dessa abertura foi o processo de identificação da profissão de professora de primeiras letras ou dos anos iniciais com a maternagem. Sendo a maternidade, segundo o pensar da época, o destino natural feminino, a função primeira da mulher, nada mais adequado do que mulheres professoras de crianças, em um fazer extensivo ao de ser mãe (SCOTT, 2012). No final do período imperial, existiam classes mistas no Brasil, oferecidas em escolas protestantes ou em escolas públicas; contudo, a educação, diferenciada por sexo, ainda era estimulada, e as meninas continuaram a ter menores possibilidades, no mercado de trabalho e de ascensão social, fora do casamento.

O processo de urbanização e modernização, vivenciado no Brasil, em especial, a partir de 1870, e a questão do fim da mão-de-obra escrava trouxeram novos olhares para a educação da população brasileira8. Um dos problemas da seara educativa era a questão dos mestres: quantidade e qualidade9. Na década final do período imperial, vários projetos - tendo como objeto a escolarização pública - foram propostos por políticos brasileiros10, entre eles, Leôncio de Carvalho (1879). Este político apresentou um projeto, que, apesar de restrito à Corte, representou uma tentativa de reorganização do ensino e, chegou, inclusive, a estimular a criação de escolas normais e o ingresso feminino nesses educandários (SAVIANI, 2013)11.

Em relação à Educação Primária, a Reforma de Leôncio de Carvalho (1879) regulamentou a escolarização mista para crianças de até 10 anos, estipulou a duração desse nível de ensino ao período de quatro anos e o dividiu em primeiro e segundo graus. No primeiro grau, além dos conteúdos comuns, as meninas tinham a cadeira de costura simples. No segundo grau, também, havia uma grade curricular comum a todo corpo discente, a qual era complementada por disciplinas específicas para cada sexo: noções de economia doméstica e trabalhos de agulhas, para as meninas, e noções de economia social e prática manual de ofícios, para os meninos (MACHADO, 2005).

À Reforma de Leôncio de Carvalho (1879), Rui Barbosa contrapôs o seu parecer-projeto12, versando sobre todos os níveis da educação, a partir do jardim de infância (SAVIANI, 2013). Rui Barbosa, entre outros aspectos, recomendava a adoção do método intuitivo, defendia classes mistas para crianças com idade entre 5 e 10 anos, o ensino primário obrigatório para meninos e meninas dos 7 aos 14 anos, concedendo às crianças do sexo feminino a possibilidade de faltar 3 dias/aula por mês (MACHADO, 2010). Acreditava serem as mulheres talhadas para o ensino de crianças e determinava que os jardins de infância, as classes mistas e as escolas femininas tivessem, apenas, professoras. Para as turmas masculinas do ensino elementar (7 aos 9 anos), permitia a contratação de professoras ou de professores.

Os debates sobre a questão educacional e sua importância, para o Brasil da época, datados do final do período imperial, tiveram continuidade sob o céu republicano. Igualmente, continuou sendo polêmica a questão da coeducação dos sexos, desaprovada por duas grandes forças: o pensamento da Igreja Católica13 e o pensamento positivista. É possível relacionar a questão da escola mista com as preocupações da nascente República Brasileira, em civilizar e ordenar a população brasileira, a partir da ótica positivista, tão bem sintetizada no lema da bandeira nacional: “Ordem e Progresso”.

Os novos tempos exigiam um cuidado maior com a instrução pública: era preciso formar o trabalhador de acordo com a visão burguesa e modernizar a sociedade. A Primeira Constituição da República (1891) classificou o ensino como laico14 e legou aos Estados a responsabilidade sobre a instrução primária e secundária15. Além do Distrito Federal, vários Estados preocuparam-se com a taxa de analfabetismo e com a expansão do ensino público primário (DA COSTA, 2010). Nesse contexto, uma experiência considerada de grande inspiração foi a Reforma Educacional Paulista (1893) que, aliada a projeto e investimento na formação de professores, desenvolveu laboratório de práticas escolares e de organização para a educação primária, através dos grupos escolares (escolas primárias graduadas).

Com bases no método intuitivo (lições das coisas), a Escola Normal Paulista, sua Escola-Modelo (1890) e seu Jardim de Infância (1896) foram considerados centros de inovações pedagógicas e referência para a instrução pública nacional16. Pensando na coeducação dos sexos, podemos considerar esse projeto menos ambicioso que o proposto tanto pela Reforma de Leôncio de Carvalho (1879) quanto pelos pareceres/projetos de Rui Barbosa (1882 e 1883)17. Apesar de instituir o acesso à Escola Primária para meninos e meninas, com igualdade de oferta de vagas para ambos os sexos (SOUZA, 1998), a educação em classes mistas era prevista, apenas, para crianças com idade de 4 a 6 anos (Jardim de Infância). A Escola Normal e a Escola Modelo eram compostas por sessões masculina e feminina18.

Os conteúdos e as práticas curriculares previstas, apesar de conterem um corpo comum, também eram diferenciados de acordo com o sexo discente. O currículo da Escola Normal de São Paulo previa, por exemplo, Exercícios Militares, Escrituração Mercantil, Agrimensura e Economia Política19 para os homens e Prendas e Exercícios Escolares, Economia Doméstica e Prendas para as moças. Aos alunos, eram oferecidas atividades nas oficinas de tornos e de marcenaria, às alunas, oficinas de modelagem e esculturas em argila e gesso. Para eles, exercícios utilizando bastões e halteres. Para elas, atividades com elásticos.

Nos grupos escolares, existentes durante as primeiras décadas republicanas, a instrução de meninos e meninas, mesmo quando acontecia no mesmo prédio, era diferenciada. Vários são os sinais dessa distinção: classes separadas por sexo, atividades especificas para um ou outro sexo, uso de parte dos espaços escolares em horários diferentes, portões de entrada separados. Em razão da economia de recursos, existiram classes mistas em grupos escolares da época, contudo, também nesses estabelecimentos de ensino, os instrumentos de uma educação particularizada estavam a postos e podem ser exemplificados pela ocupação das carteiras na sala aula, realizada de modo a dificultar a integração entre alunas e alunos.

Entre as várias considerações sobre os grupos escolares e os processos a eles relacionados, destaco alguns aspectos no contexto deste artigo, que, oportunamente, podem contribuir para interrogações: os espaços de poder e destaques ocupados (ou não) pelas mulheres nesses educandários; a presença (ou invisibilidade) de personalidades femininas nos currículos escolares; os lugares ocupados por personagens femininos e masculinos representados materiais didáticos utilizados, por exemplo, nas lições de regras morais e de bom viver ou nas de preceitos de higiene; os trabalhos manuais previstos para a instrução de meninos e os previstos para a instrução de meninas. Cabe indagar, ainda, quem formava a maior parte do corpo de trabalho escolar e quem ocupava os cargos de direção e de inspeção (ALMEIDA, 2016).

Os acontecimentos e os novos pensamentos, presentes nos anos finais do século XIX e os que marcaram o início do século XX, acabaram por influenciar a alteração nas relações sociais e de constituição familiar das camadas urbanas. A ideia de família, aliada a uma valorização da privacidade, passou a ser identificada com o núcleo familiar (pais e filhos) em detrimento da imagem da família extensa (parentes diversos e agregados). Às mulheres, foi atribuído o título de ‘rainhas do lar’ e mantido o espaço doméstico como reino e destino. Aos homens, foi reforçado o status de provedor. Novo arranjo, manutenção da antiga hierarquia de poder em relação aos dois sexos. Mas nem todos aderiram aos valores burgueses, seja por não o desejarem, seja por não terem condições de adotá-los plenamente (SCOTT, 2012).

A modernização da sociedade e a educação da força masculina, segundo o pensamento republicano, eram objetivos que poderiam ser atingidos com o auxílio das mulheres, consideradas “guardiãs do lar”, “força moral da sociedade”. Nesse contexto, autoridades médicas e jurídicas defenderam a educação feminina como meio para atingir e manter o ideário de uma realidade progressista: as mães instruídas seriam agentes de hábitos considerados saudáveis de higiene e de comportamento.

Esses progressistas, porém, não diferiam dos de opinião tradicional, quanto ao pertencimento feminino ao mundo privado, apenas “[...] alargavam o significado do papel familiar feminino ao enfatizar o poder das mulheres de direcionar o desenvolvimento moral de seus filhos e filhas e fornecer bons cidadãos (homens) à nação” (HABNER, 2012, p.57). A ideia de maternidade foi cooptada ao ideal republicano de patriotismo e a mulher foi alçada como propulsora do progresso no interior das paredes de sua casa, nos cuidados para com sua família, na regência do lar. O moralismo continuou como vetor de “controle a partir do próprio oprimido” (MURARO, 1995, p.64).

O lar foi reafirmado como o local ideal para as mulheres de todas as camadas sociais; entretanto, por questões econômicas familiares, muitas mulheres não podiam dedicar-se, apenas aos cuidados deste espaço. As fábricas, nos anos finais do século XIX e nos anos iniciais do século XX, foram o destino de grande parte da mão de obra feminina urbana20. O espaço do trabalho fabril era visto como de ameaça à honra e à família. Nesse contexto, as operárias, ora enxergadas com olhares piedosos e sentidos da sua falta de opção, ora julgadas como provocadoras dos assédios a que se viam submetidas, pouco espaço encontravam para dizer como percebiam a realidade que vivenciavam.

Observando o panorama da educação brasileira, nos anos finais do século XIX e nos anos iniciais do século XX encontramos alguns pensamentos e práticas educacionais diferenciadas das ideias e propostas de instrução oficial. Estas, em geral, estão ligadas a alguns grupos de imigrantes e/ou de trabalhadores socialistas ou anarquistas. Entre os grupos de imigrantes, nas zonas rurais, a condição de mulher conduzia à divisão de trabalho, onde cabia às meninas, além do trabalho na agricultura, os afazeres domésticos. Entre os operários, em especial, entre os anarquistas21, a instrução das mulheres era entendida como uma necessidade política.

Neste mesmo período, encontram-se, também, algumas experiências de educação feminina, voltadas para meninas e moças órfãs e/ou pobres, desenvolvidas por ordens religiosas. Estas tinham um cunho moralista, religioso e de ensino de uma profissão, ou eram voltadas para o desenvolvimento de habilidades que permitissem às educandas trabalharem em alguma função considerada adequada às mulheres, como domésticas, costureiras, bordadeiras, doceiras.

A grande mudança, no panorama brasileiro, em relação ao ensino de meninos e de meninas, aconteceu a partir da década de 1920, com a Escola Nova. O movimento escolanovista, liderado por Anísio Teixeira, defendeu o ensino oficial, obrigatório, gratuito, leigo e misto, mas não transcendeu a visão de mundo conservadora em relação à educação feminina e aos lugares e funções entendidos como próprios das mulheres. A defesa da escola mista, assim como no final do Império, estava casada com o custo econômico da universalização da escola primária. Era proposta uma igualdade formal de oportunidades, sem maiores reflexões sobre questões de gênero, étnicas ou socioeconômicas no espaço educativo.

As ideias da Escola Nova, a política de nacionalização do Governo Vargas e os custos para implantação e manutenção da escolarização obrigatória e gratuita tornaram o cenário educacional brasileiro composto, majoritariamente, por escolas mistas - mas escolas mistas não significaram uma educação igualitária, não alteraram “[...] as representações tradicionais sobre o feminino e sobre o masculino” (AUAD, 2006, p. 68) e não era essa a intenção. Para ilustrar o descompromisso da adoção do sistema coeducativo de ensino com uma educação igualitária, Scott (2012) lembra um trecho do Decreto-lei 3.200, de 19 de abril de 194122, assinado pelo então presidente Getúlio Vargas:

Devem ser os homens educados de modo que se tornem plenamente aptos para a responsabilidade de chefes de famílias. Às mulheres será dada uma educação que as torne afeiçoadas ao casamento, desejosas da maternidade, competentes para a criação dos filhos e capazes na administração da casa. [grifo do autor]. (SCOTT, 2012, p. 20)

Aos poucos, durante o século XX, o nível de instrução das mulheres, em geral, cresceu por vários motivos. As justificativas estiveram relacionadas à importância da educação das mulheres, para a formação de uma Nação, com população mais ciente dos seus deveres cívicos; à maior qualidade das mulheres como mães, a partir de sua educação; ou às questões de saúde pública.

É relevante considerar que a relação entre instrução de mulheres e questões de saúde pública (e outras) não é uma ideia ultrapassada. Ainda se encontra presente nos discursos e intenções de investimentos, na área da educação. Na década de 1990, organizações multilaterais23, movimentos de mulheres e governos nacionais formaram “uma tríplice aliança para reduzir a pobreza e possibilitar o desenvolvimento sustentável” (ROSEMBERG, 2001, p. 516). Nesse sentido, esse tripé era sensibilizado a investir em projetos e ações na educação de meninas e mulheres por argumentos que enfatizavam - como frutos desses investimentos - a diminuição da mortalidade infantil, a melhoria da produtividade econômica, a redução das taxas de fertilidade. Em geral, não é comum o patrocínio de projetos cujo objetivo e o retorno maior esteja centrado no desenvolvimento pessoal das mulheres beneficiadas. (ROSEMBERG, 2001)

Uma importante consequência da ampliação da oferta da Educação Básica e da educação feminina passar a ser entendida como necessária para o projeto progressista e civilizatório republicano foi a presença feminina no Ensino Superior24. Nos anos de 1940 e 1950, o corpo discente dos cursos superiores era majoritariamente masculino (ARAUJO, 2007). No decorrer dos anos de 1960, nos setores médios da sociedade brasileira, moças passaram a considerar a possibilidade de cursarem o ensino superior e investirem, inclusive, em profissões que, na época, eram vistas como pertencentes ao mundo masculino, tais como: engenharia, economia, agronomia, informática (AREND, 2012).

Pesquisas sobre escolaridade brasileira apontam que, durante a década de 1970, o sexo feminino representava a maioria dos matriculados e formandos no Ensino Médio. Esta estatística está, em parte, relacionada à formação de professoras para as séries iniciais (magistério). A Lei número 4.024 de 20 de dezembro de 1961 - Lei de Diretrizes e Bases (LDB) - garantiu equivalência entre os cursos secundários. Esta medida permitiu que muitas normalistas continuassem os estudos em cursos de nível superior; um dos desdobramentos dessa possibilidade foi muitas professoras buscarem cursos que as permitissem lecionar para o Ensino Médio.

Na década de 1990, foi observado que a maioria das pessoas matriculadas e concluintes dos cursos superiores de graduação era do sexo feminino e, na passagem para os anos 2000, a Pós-Graduação continha mais mulheres do que homens no conjunto estudantil. As pesquisas demonstram que os indicativos de maior aceleração educacional feminino no nível superior, característicos até a década de 1980, estão diminuindo e que as categorias, acesso e progressão escolar, estão relacionadas a fatores como a renda familiar. Sobre estes resultados investigativos, Rosemberg (2012) conclui:

[...] o melhor desempenho escolar entre meninas, moças e mulheres adultas do que de meninos, rapazes e homens adultos, praticamente desaparece nos níveis de renda médios e superiores. [...] as desigualdades de rendimento familiar, “cor/raça”, região e local de residência, bem como geração, afetam mais intensamente a escolaridade de homens e mulheres no Brasil que as diferenças de sexo, o que faz com que acesso e a progressão na educação das mulheres seja equivalente (mas não idêntica) aos de coetâneos masculinos (ROSEMBERG, 2012, p 350-1).

Os indicativos de maior acesso à educação formal para o público feminino não refletem o mesmo percentual em relação à igualdade de oportunidades para as mulheres em geral se comparado aos homens. Até o início dos anos 2000, apesar dos registros de grande número de matrículas femininas na Educação Superior, estas estavam concentradas em determinadas áreas de ensino, como nas licenciaturas, nos cursos de menor investimento econômico e nos menos valorizados pela nossa sociedade e pelo mercado de trabalho. Lembrando Bourdieu (1999), as relações desenvolvidas no mundo escolar, mesmo quando este está apartado da influência da Igreja tradicional, continuam reproduzindo o que é idealizado a partir da relação patriarcal. Isto está refletido na maior valorização de algumas disciplinas escolares em detrimento de outras.

No decorrer do terceiro milênio, segundo Rosemberg (2012), as análises estão indicando que os diferenciais entre o número de estudantes homens e mulheres, em relação às áreas de conhecimento, estão diminuindo. Isto se verifica, pois ocorre uma maior entrada de mulheres em carreiras anteriormente vistas como ‘masculinas’. Vale ressaltar, entretanto, que o mesmo movimento não é observado em relação a homens e cursos estigmatizados como femininos. Diante desta informação, são válidas as considerações de Macedo (2010) sobre o maior acesso ao Ensino Superior pelas mulheres portuguesas:

Mas é claro que tão notável acesso à educação superior e, embora mais lentamente, às posições dominantes no mercado do trabalho só é possível numa sociedade, como a nossa, em que as mulheres de classe média e alta continuam a ter outras mulheres de classes e etnias mais desfavorecidas que fazem o trabalho doméstico que só por mulheres - e não por homens - continua a ser feito. [...]. O grande paradoxo, no entanto, é que de facto continua a haver uma hierarquização, que há uma continuada exploração econômica de mulheres, não só por homens, mas também por outras mulheres. Mas por muito negativo que isso seja, também significa que as diferenças estão agora a ser definidas não tanto em termos de sexualidade quanto em termos de classe social. É melhor? É pior? É diferente (MACEDO, 2010, p.59).

As considerações de Macedo (2010) referem-se à persistência de representações hegemônicas sobre o que é do homem e sobre o que é da mulher. Segundo o autor, não é uma redefinição ou divisão de papéis no mundo privado que permite à mulher de classe média e alta vivenciar o mundo público, e sim o trabalho de outras mulheres, em seus lares. Acrescento aqui a questão do cotidiano de dupla jornada, característico da vida feminina, de forma mais ou menos intensa, em diferentes níveis sociais.

As afirmações acima remetem ao aspecto das hierarquias de gênero estarem condicionadas às de classe e etnia. Em relação ao sistema educacional, é imperativo refletir se não devemos repensar nossos questionamentos e indagar: “[...] como as hierarquias de gênero interagem com as de raça e classe para produzirem um sistema educacional tão excludente quanto o brasileiro?” (ROSEMBERG, 2001, p.518).

Além disso, pode ser ingenuidade simplificar as análises a uma generalização das diferenças imbricadas no trato e nas disputas de poder, presentes nas relações entre homens e mulheres, desconsiderando aspectos de ordem econômica, social e de origem étnica, que também caracterizam os espaços educativos e o mundo do trabalho, assim como as concomitantes dimensões do sistema de educação: mercado de trabalho, lugares de formação, mercado de consumo. Nesse sentido, Rosemberg (2001) pondera:

Resolvi, então, apresentar, mais uma vez, um panorama sobre a situação educacional de homens e mulheres no Brasil, porque ele evidencia, a meus olhos, a confluência de descompassos entre (e intra) produção de conhecimentos acadêmicos, agenda dos movimentos feministas - especialmente internacionais (incorporadas nas Conferências) - organizações multilaterais, governo e políticas públicas. Penso, também, que tal panorama constitui uma esfinge para teorias feministas universalistas: a dominação de gênero assume contornos equivalentes em todas as instituições sociais? Em todas as fases da vida? Significa sempre discriminação contra as mulheres? (ROSEMBERG, 2001, p. 518)

O maior nível de instrução do público feminino, em nossa sociedade, ainda não reflete uma alteração significativa na cultura androcêntrica, construída em séculos de modelo patriarcal. Vivenciar escolarização em classes mistas não tem significado uma quebra efetiva deste paradigma, o que torna atual o que foi escrito por Woof (2012)25 durante o século XIX:

Mesmo quando o caminho está nominalmente aberto - quando nada impede que uma mulher seja médica, advogada, funcionária pública -, são muitos, imagino eu, os fantasmas e obstáculos pelo caminho. Penso que é muito bom e importante discuti-los e defini-los, [...]. Mas, além disso, também é necessário discutir as metas e os fins pelos quais lutamos pelos quais combatemos esses obstáculos tremendos. Não podemos achar que essas metas estão dadas; precisam ser questionadas e examinadas constantemente (WOOF, 2012, p. 19).

Como o espaço escolar pode constituir-se como locus de atividades e reflexões contributivas para a igualdade de gêneros? A resposta para esta pergunta não é simples. Para a construção de respostas, é necessário um esforço no sentido de alteração intencional do status de uma escola mista para a qualidade de escola ‘co-educativa’.

2. ‘Co-educação’: um conceito com novo entendimento

A construção e os usos dos conceitos estão sempre relacionados a um contexto político, social, econômico, cultural de uma época e espaço/lugar. Os conceitos possuem historicidade.

O termo coeducação dos sexos é, em geral, lido e usado como sinônimo de escola mista, ou seja, escola que atende pessoas do sexo masculino e feminino. Atualmente, contudo, tem-se o entendimento de que estudar em uma escola mista não significa uma educação não diferenciada por sexo e/ou a busca por uma educação igualitária para meninos e meninas. Por isso, o significado do termo ‘co-educação’ ganhou novo sentido, visando a uma política educacional de igualdade de gênero - que se propõe pensar as construções sociais sobre o ser homem ou ser mulher - e refletindo sobre como a escola pode contribuir para a desigualdade ou para a igualdade de gênero (AUAD, 2003; 2006; ZAIDMAN, 1996).

A perspectiva coeducativa percebe “[...] atitudes e valores tradicionalmente considerados como de homens e de mulheres de modo que possam ser aceitos e assumidos por pessoas de ambos os sexos” (COSTA & SILVA, 2008, p. 11). Nesse pensamento, não há a intenção de negar traços do masculino ou do feminino, mas busca-se compreender os ingredientes sociais, históricos, culturais e antropológicos que os compõe e, evita-se a sua aprendizagem como fenômeno incontestável ou derivado de uma verdade absoluta ou divina. Objetiva-se um espaço de convivência, de interação e de aprendizagens, onde as diferenças entre sexos são reconhecidas, sem dogmas, sem hierarquia de valores e sem imposição de comportamentos e de pendores naturalizados com típicos de meninos ou de meninas (BENEVIDES, 2006).

Uma escola comprometida com a ‘co-educação’ considera três fatores fundamentais: igualdade de acesso não significa igualdade de oportunidades, diversidade e equidade:

a) igualdade de oportunidades que não é sinônimo de igualdade de acesso; b) a diversidade - entende que as meninas e os meninos não são iguais e valoriza cada um enquanto ser único promovendo a existência a partir da diferença, ou seja, a partir do seu reconhecimento e; c) a eqüidade, que tem como objetivo o respeito às características únicas de alunos e alunas, acreditando que as regras, os métodos e conteúdos não atendem às necessidades de todos e todas. ( Grifos nossos, COSTA; SILVA, 2008, p. 11).

Auad (2006) argumenta que, se há possibilidade de a escola ser um dos lugares onde há o aprendizado da separação, do discriminatório, existe também, em contrapartida, a possibilidade de ser uma instituição promotora da igualdade e do entendimento de que diferenças não devem justificar desigualdades. A estudiosa ressalta ser a escola mista, ao mesmo tempo, meio e pressuposto para a existência da ‘co-educação’ e se posiciona:

Defendo as escolas mistas com sistemática reflexão sobre a coexistência de meninos e meninas. Defendo ainda o debate sobre o que é, na nossa sociedade, o masculino e o feminino. Afinal, qual masculino e qual feminino queremos na realidade escolar e fora dela? (AUAD, 2006, p.55)

2.1 A escola diferenciada por sexo e a pedagogia da eficácia

Neste estudo, a escolarização mista é apresentada como a modalidade possível de gerar um espaço educativo comprometido com o fim das desigualdades de gênero. É necessário considerar, entretanto, que há quem defenda a escolarização diferenciada por sexo, como a alternativa mais adequada.

O Colégio São Bento do Rio Janeiro (Brasil), tradicional escola destinada à educação de meninos, por vezes, vem a público dizer sobre ou desmentir intenções de aceitar meninas como integrantes do seu corpo discente26. Os discursos contemporâneos de representantes desta instituição, publicados na imprensa, pouco diferem de discursos proferidos, nas décadas de 1960, 1970 e 1980, pelos defensores da permanência dos colégios militares, ligados ao Exército Brasileiro, como escolas ofertantes de ensino apenas para o sexo masculino (CARRA, 2008 e 2014)27. Também apresentam argumentos semelhantes aos utilizados por pessoas contrárias às escolas mistas nos anos finais do século XIX e na primeira metade do século XX.

As preocupações com a coexistência dos dois sexos, na mesma sala de aula, e/ou os possíveis ganhos ou perdas elencadas nas falas produzidas na atualidade, século XXI, não trazem maiores novidades. Talvez, o tom inovador esteja na defesa da monoeducação, como uma premissa para a conquista de uma sociedade igualitária em termos de gênero.

Para quem defende essa ideia, por serem diferentes, meninos e meninas necessitam de uma pedagogia diferenciada, onde, apesar dos conteúdos ensinados serem os mesmos, o método de ensinar deva ser adequado às peculiaridades de cada sexo. Esse modelo de educandário, assim como o discurso que o ampara, possui defensores em diversos países europeus, na Austrália, em países latino-americanos e nos Estados Unidos. Além disso, recentemente, encontra-se sua divulgação no Brasil28.

Os educandários que adotam a separação discente de acordo com o sexo ou que ministram instrução apenas para um dos sexos são designados, por seus defensores, como “escola diferenciada”. Cabe lembrar, entretanto, que o conceito de educação diferenciada vai além da educação pensada apenas para meninos ou apenas para meninas. No Brasil, quando falamos em educação diferenciada, um exemplo que logo é lembrado é a educação indígena (GRUPIONI, 2001)29.

Este discurso, baseado na eficácia pedagógica e nas diferenças biológicas existentes entre homens e mulheres, alega assegurar uma escola não sexista justamente, por instruir em separado homens e mulheres, evitando tanto a competição quanto a comparação depreciativa entre os dois sexos durante o período de escolarização básica.

Os defensores da chamada escola personalizada ou diferenciada por sexo consideram que diferenças entre meninos e meninas - ritmo de amadurecimento, comportamentos, modos de aprender, gostos, brincadeiras - estão relacionadas a condições inatas. Segundo Charro:

[...] ignoram as diferenças intrínsecas entre os sexos [...] Falemos desta como uma educação diferenciada de segunda geração. Que fique claro que não separo as meninas para prejudicá-las, para ensiná-las costura, enquanto os meninos aprendem matemática. Esta não é tampouco a educação da época do franquismo, baseada em crenças morais e religiosas. Esta educação diferenciada tem como objetivo a igualdade da mulher. Não é, em absoluto, religiosa ou ligada a crenças religiosas ou morais [...] Seria ideal que o modelo misto fugisse do igualitarismo neutralizante dos sexos. Porém, é muito difícil. Se se ensina de maneira fundamentada, lenta e analítica, as meninas se aborrecem, enquanto se se ensina de maneira explícita e ágil são os meninos que se perdem. O ritmo de amadurecimento e desenvolvimento nos homens é muito mais lento que das meninas. Solucionar isto é muito complicado.30

Não se tem dúvida de que meninos e meninas, homens e mulheres, são iguais em direitos e deveres, humanidade e dignidade. Contudo, o dimorfismo sexual-cerebral faz que sejam diferentes em formas de socialização, comunicação, afetividade, sexualidade, comportamento, reações a estímulos idênticos, o que, por sua vez, determina que diferem em sua forma de aprender31 (CHARRO, 2009, p. 112).

Muitos defensores da educação diferenciada no século XXI negam a questão religiosa ou a influência da Igreja Católica nos seus argumentos. Podemos, contudo, perceber essa presença nos discursos e concluir que esse modelo de educação serve aos princípios defendidos por congregações/organizações religiosas conservadoras.

Esse discurso está datado do século XXI e apresenta-se como construído com base no conhecimento científico, na defesa de uma pedagogia de eficácia, na qualidade da educação formal, na busca de educação não sexista e no direito de escolha das famílias quanto à educação escolar que desejam oferecer aos seus filhos e filhas. Seus argumentos, contudo, não se datam, exclusivamente, deste século: são extremamente semelhantes a discursos presentes em outras épocas, como, por exemplo, os circulantes nas décadas de 1970 e 1980 nos espaços do Colégio Militar de Porto Alegre e da comunidade na qual este educandário esta inserido (CARRA 2008 e 2014)32. Traz uma roupagem contemporânea, mas percebo-o carregado de velhas certezas.

Conclusões

É possível considerar que os discursos que defendem a escolarização separada por sexo, assim como os que defendem a escola mista, esclarecem forças, movimentos e funcionamentos das relações de gênero, bem como as mudanças no universo destas relações.

Não nego que mulheres e homens sejam diferentes. Aliás, homens e homens também possuem diferenças entre si. Mulheres e mulheres possuem diferenças entre si. Penso que muitas das funções e/ou características naturalizadas de homens e mulheres permeiam o cultural e, neste sentido, fazem parte também do subjetivo.

Não entendo como o fato de educar em separado pode garantir uma educação não sexista ou incentivar lideranças femininas ou relações igualitárias entre homens e mulheres, independentes de sua orientação sexual, opção política, origem ou religião. Vivemos em mundo plural e é neste mundo que desenvolveremos nossas relações, escolhas e ações.

O debate acerca da educação de homens e mulheres persiste, é atual e está aberto. Creio que a História da Educação tem muito a contribuir com esse debate e com os esforços para a construção de uma realidade menos sexista, os quais passam, também, pelo universo escolar. Neste sentido, lembro as palavras de Antonio Nóvoa (2004) quando ele responde à pergunta: Para que serve a História da Educação? “Para explicar que não há mudanças sem história - o trabalho histórico é muito semelhante ao trabalho pedagógico. Estamos a lidar com a experiência e a fabricar memórias” [grifo do autor] (ANTONIO NÓVOA, 2004, p.11). Assim como Nóvoa (2004, p.10), também, “não estou a falar de uma história cronológica, fechada no passado. Estou a falar de uma história que nasce nos problemas do presente e que sugere pontos de vista ancorados num estudo rigoroso do passado”.

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1Sobre Educação para a Democracia e sobre a diferença entre Educação Democrática e Educação para a Democracia, ver Benevides (1996 e 1998).

2Feminicídios: homicídios em que as vítimas são mulheres e as causas estão relacionadas a razões de gênero. São crimes onde a vítima é morta por ser mulher, o que relaciona este conceito, também, à misoginia. Há, também, o termo femicídio, em geral utilizado como sinônimo de feminicídio. Nesse sentido, são interessantes as abordagens de Pasinato (2011), Correa (1981 e 1983) e Engel (2000).

3Sobre masculinidades/questão masculina, ver: Tolson (1977), Welzer-Lang (2001), Jablonski (1995), Oliveira (1998), Nolasco (1995) e Joaquim (2010).

4Tradução livre do original: “Estamos aprendiendo que sin igualdad perdemos todas las personas, hombres y mujeres”. O termo igualdade, neste texto, refere-se ao incluso na proposta da cidadania democrática e, como afirma Benevides (1998, p.140 e 141): “[...] não se supõe a igualdade como uniformidade de todos os seres humanos com suas saudáveis diferenças de raça, etnia, sexo, ocupação, talentos específicos, religião e opção política, cultura no sentido mais amplo. [...]. As diferenças não significam necessariamente desigualdades”.

5Sobre educação da mulher, ver Rosemberg e Pinto (1985) e Rosemberg, Piza e Montenegro (1990). Estes trabalhos trazem, além das considerações das autoras, um estudo da arte sobre o tema.

6A Lei de 15 de Outubro de 1827 foi a primeira a prever a criação de escolas públicas para meninas (DUARTE, 2003); contudo, condicionou a existência desses estabelecimentos à deliberação das autoridades locais quanto à sua necessidade. Os docentes deveriam ser do mesmo sexo que o corpo discente. Um avanço para a época foi a determinação de igual salário para professores e professoras (art. 13.º). Vale ressaltar, no entanto, que se está falando de avanço retórico, visto que essa igualdade não se verificou na prática. O ensinar geometria garantia um acréscimo no salário básico; sendo esse conteúdo vetado às meninas, as mestras recebiam menores salários que seus pares do sexo masculino. (SAFFIOTI, 2013).

7A escola mista para crianças não escapou de resistências e debates. Pode-se dizer que, assim como em outros países de maioria católica, a opção pela escola mista não tem suas raízes no significado social de tal decisão. Suas origens são de ordem econômica. (SAFFIOTI, 2013)

8A Reforma Eleitoral de 1881 determinou a necessidade de ser alfabetizado, para ser eleitor. Essa determinação provocou diminuição no número de eleitores e o maior peso ao eleitorado urbano (DA COSTA,2010). Segundo Paiva et. al.(2012, p.67), “[...] tanto para os homens e para as mulheres, quanto para os livres e para os escravos, o nível de instrução foi sensível ao movimento de urbanização”. Ainda, segundo os autores, o censo de 1872 indicou que a população brasileira alfabetizada era composta por 1.565.454 pessoas, sendo 1.564.051 livres (1.013.078 homens e 550.973 mulheres) e 1.403 escravas (958 homens e 445 mulheres). A população brasileira era de 9.930.478. Sobre este assunto, ver, também, Oliveira (2003).

9O número de homens atraídos para o magistério sofria redução, face aos baixos rendimentos e às possibilidades de trabalho, que surgiam em decorrência do avanço do processo de urbanização; e a quantidade de mulheres, trabalhando como professora, não atendia à demanda do magistério. O censo de 1872 revelou 18 professoras na cidade de São Paulo e 313 no Rio de Janeiro (BESSE, 1999, p.125).

10Além das questões internas, deve-se lembrar que, na época, havia, em vários países ocidentais, a defesa da instrução primária, assim como da ideia da importância de sua obrigatoriedade. Entre as diversas propostas apresentadas no Brasil, destaco o Decreto n. 7.247, de Leôncio de Carvalho, e os Pareceres de Rui Barbosa, diferenciados em forma e em conteúdo dos demais projetos apresentados, por serem mais completos e abrangerem todos os níveis de ensino (MACHADO, 2005).

11A iniciativa de instruir moças e rapazes, no mesmo espaço nos cursos de formação docente, gerou críticas e reações diversas. Para lidar com a situação, as escolas que aceitaram mulheres no seu corpo discente, usaram diferentes táticas, como, por exemplo: parede levantada no meio da sala, dividindo homens de mulheres; filas de carteiras destinadas a cada um dos sexos; salas separadas; horários diferenciados; e permissão de familiares acompanharem as moças durante as aulas. (MOACYR, 1934)

12Para Rui Barbosa, o ensino primário seria composto por três cursos - escola primária elementar (7 a 9 anos); escola primária média ( 9 a 11 anos); e escola primária superior (dos 11 aos 13 anos) - com duração de oito anos.

13A Igreja Católica alterou a sua posição acerca das escolas com classes mistas, para homens e mulheres, a partir das decisões do Concílio Vaticano II (1962 -1965), quando - a partir destas novas posições - escolas católicas, aos poucos, passaram a oferecer classes com discentes de ambos os sexos.

14O que não significou o fim da ingerência dos representantes da Igreja Católica, nos assuntos educativos. A ideia de liberdade de ensino somada à sua tradição, no campo do ensino, e à posse de pessoal dedicado ao magistério constituiu grande facilitador no contexto da República Velha (SAFFIOTI, 2013).

15A Constituição de 1891 legou aos Estados e Municípios a responsabilidade pelo ensino primário e secundário. A União ficou responsável pelo ensino superior e, em colaboração com o Distrito Federal, pelo ensino primário e secundário do Rio de Janeiro, então capital do Brasil.

16Os grupos escolares (escolas primárias graduadas), criados em 1893 - uma experiência resultante da Reforma do Ensino Primário e Normal do Estado de São Paulo, promulgada em 23 de novembro de 1893 - estão, entre outros fatores, associados aos processos de profissionalização do magistério primário e de construção da identidade docente. A experiência educativa paulista influenciou reformas educativas em outros Estados brasileiros, apesar de, como adverte Souza (2006, p.117-119), ser esta influência “[...] marcada por ambiguidades, envolvendo atração, repúdio e apropriações diversas. Os grupos escolares constituíram a modalidade de escola primária predominante no Brasil, em meados do século XX (SOUZA, 2006). Esse processo aconteceu concomitante aos esforços para democratização do ensino primário e ao avanço da urbanização.

17Pareceres/projetos de Rui Barbosa: Reforma do Ensino Secundário e Superior (1882) e Reforma do Ensino Primário e várias Instituições Complementares da Instrução Pública (1883).

18Escola Normal aceitava homens e mulheres na qualidade de normalista, contudo, o espaço discente era dividido em razão do sexo. Os alunos ocupavam a ala direita do prédio escolar e as alunas, a ala esquerda. A Escola Modelo era composta por uma sessão masculina e por uma sessão feminina e contribuía com a formação docente através da prática de estágios e da observação do uso de práticas pedagógicas.

19A disciplina de Economia Doméstica, ministrada para as mulheres, previa, por exemplo, lições sobre compra e variedade de alimentos, limpeza e organização da cozinha, cuidados e propriedade de tecidos (linho, algodão, lã e seda), métodos de lavagem, bordado. A disciplina de Economia Política, ministrada para os homens, compunha, por exemplo, lições sobre distribuição e definição de renda, medidas dos salários, origens de conflitos entre patrões e operários, juros, lucros, impostos, relações entre consumo e produção.

20No começo da industrialização brasileira, a maior parcela dos trabalhadores das fábricas era constituída por mulheres e crianças. No início do século XX, as mulheres foram sendo, aos poucos, substituídas por trabalhadores homens.

21Exemplos de escolas anarquistas, na cidade de Porto Alegre, Estado do Rio Grande do Sul: Escola Moderna, datada de 1914, localizada no Bairro de Navegantes, e Instituto de Educação e Ensino Racionalista, localizado na atual Rua Ramiro Barcelos, na época parte da então Colônia Africana. Eram inspiradas no pensamento de Francisco Ferrer. Entre as suas características, estavam o ensino laico e a educação de ambos os sexos juntos.

22Na década de 1940: a maior parte da população brasileira vivia no campo e mais da metade era analfabeta (IBGE, 2010).

23Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (UNIFEM), Banco Mundial, Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

24Importante lembrar que, legalmente, apenas a partir de 1879, foi permitido o ingresso feminino nas instituições de ensino superior. O fim do obstáculo legal não extinguiu a cultura de que, às mulheres, não era necessária uma educação transcendente. Além da resistência social, as jovens que ambicionaram este nível de ensino tiveram que enfrentar, entre outros obstáculos, o fato de que sua educação não tinha como objetivo o preparo para os exames previstos para o acesso aos cursos superiores.

25Trecho do texto intitulado Profissões para mulheres. Virginia Woolf leu esse texto no dia 21/01/1931 para a Sociedade Nacional de Auxílio às Mulheres. O mesmo foi publicado em A Morte da Mariposa após a morte da escritora, em 1942.

26De acordo com informações presentes no site do Colégio São Bento, localizado na cidade do Rio de Janeiro, não há previsão para meninas serem aceitas como alunas no Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

27Sobre esse assunto, ver Carra (2008; 2014).

28No Brasil, esta forma contemporânea de apresentação da escola diferenciada por sexo, apesar de pouco divulgada, existe. Nesta proposta, há, por exemplo, o Colégio Catamarã, localizado em São Paulo (SP) e inaugurado no ano de 1994, oferecendo educação diferenciada por sexo a partir do 6º Ano do Ensino Fundamental e o Colégio Bosque e Mananciais, na cidade de Curitiba (PR), onde, a partir do 2° Ano do Ensino Fundamental, meninos e meninos estudam em classes distintas. As duas instituições de ensino são recentes e declaram seguir a proposta pedagógica baseada no modelo educativo Fomento de Centros de Enseñanza (Espanha). Ainda no Brasil, no Rio de Janeiro (RJ), existe, desde 2007, a AFEF (Associação de Formação Educacional e Familiar) que defende a educação diferenciada por sexo. Esta Associação é mantenedora do Colégio Porto Real - fundado no ano de 2012 e localizado na mesma cidade. Na América Latina, há a ALCED (Associação Latino Americana de Centros de Educación Diferenciada).

29A Constituição Brasileira de 1988 garantiu aos povos indígenas o direito a uma educação escolar diferenciada. Sobre ver, entre outros: GRUPIONI (2001).

30Tradução livre do original: “[...] Se ignoran las diferencias intrínsecas entre los sexos. [....] Hablemos de ésta como una educación diferenciada de segunda generación. Que quede claro que no defiendo la educación que separa a las ninãs para perjudicarlas, para enseñarles costura mientras los ninõs aprenden matemáticas. Ésta no es tampoco la educación de la época del franquismo, basada en creencias morales y religiosas. Esta educación diferenciada tiene como objetivo la igualdad de la mujer. No es en absoluto religiosa, ni ligada a creencias religiosas o morales [...] Sería ideal qie el modelo mixto huyera del igualitarismo neutralizante de los sexos. Pero es muy difícil. Si se enseña de manera razonada, lenta y analítica, las niñas se aburren; mientras que si se enseña de manera explícita y ágil, son los niños que se pierden.El ritmo de maduración y desarrollo en los varones es mucho más lento que el de las niñas. Solucionar eso es my complicado”. (JORNAL El PAÍS, 2006, texto digital)

31Tradução livre do original: “No cabe Duda de que ninõs y ninas, hombres y mujeres, son iguales in derechos y deberes, humanidad y dignidad. Sin embargo, el dismorfismo sexula cerebral hace que sean al mismo tiempo diferentes en formas de socialización; comunicación; afectividad; sexualidad; comportamiento; reaciones ante idénticos estímulos; lo que a sua vez determina que difieran en su forma de aprender”. (CHARRO, 2009, p. 112).

32Sobre o Colégio Militar enquanto escola masculina e o ingresso de trabalhadoras e de meninas na qualidade de alunas neste educandário, vide Carra (2008 e 2014). Sobre o Colégio Militar de Porto Alegre enquanto escola mista, ver Carra (2014).

Recebido: 01 de Abril de 2018; Aceito: 01 de Agosto de 2018

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