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Cadernos de História da Educação

On-line version ISSN 1982-7806

Cad. Hist. Educ. vol.20  Uberlândia  2021  Epub Jan 29, 2022

https://doi.org/10.14393/che-v20-2021-44 

Dossiê - Traços que deixam traços: arquivos pessoais no tempo presente

A primeira comunhão feminina entre dois lados do oceano (Brasil e Espanha): imagens arquivadas de educação e religião

La primera comunión femenina entre dos lados del océano (Brasil y España): imágenes archivadas de educación y religión

Pablo Álvarez Domínguez1 
http://orcid.org/0000-0003-0538-2565; lattes: 3047309926173426

Maria Celi Chaves Vasconcelos2 
http://orcid.org/0000-0002-3624-4854; lattes: 9511377122315447

1Universidad de Sevilla (Espanha). pabloalvarez@us.es

2Universidade do Estado do Rio de Janeiro. maria2.celi@gmai.com


Resumo

O estudo refere-se a arquivos que contêm imagens fotográficas femininas sobre o momento de realização da primeira comunhão, ritual ao qual as meninas estavam submetidas por suas famílias, como um dos cinco sacramentos principais da Igreja Católica. O objetivo central está em analisar os retratos produzidos expressamente para esse fim, o dia da primeira comunhão, com foco em aspectos como a postura, a indumentária, os objetos de cena, o mobiliário, a simbologia religiosa presente etc. De forma mais específica busca-se comparar imagens produzidas no Brasil e na Espanha, durante a primeira comunhão de meninas, na primeira metade do século XX, examinando-se as peculiaridades próprias de cada país. Os procedimentos metodológicos remetem a uma pesquisa qualitativa e histórico-documental que utiliza o método comparado de investigação. Entre os resultados obtidos consta-se a relação estreita entre a primeira comunhão com as práticas escolares, caracterizando-se como um momento ritualizado no contexto do próprio cronograma escolar.

Palavras-chave: Primeira comunhão; Rituais religiosos; Brasil e Espanha

Resumen

El estudio se refiere a archivos que contienen imágenes fotográficas femeninas sobre el momento de la primera comunión, ritual al que las niñas fueron sometidas por sus familias, mediante uno de los cinco sacramentos principales de la Iglesia Católica. El objetivo principal es analizar los retratos realizados expresamente a tal efecto, el día de la primera comunión, a través de un enfoque centrado en analizar aspectos como la postura, la vestimenta, los objetos escénicos, el mobiliario, los símbolos religiosos presentes, etc. Más concretamente, buscamos comparar imágenes producidas en Brasil y España, durante la primera comunión de niñas, en la primera mitad del siglo XX, examinando las peculiaridades de cada país. Los procedimientos metodológicos se vinculan a una investigación cualitativa e histórico-documental, que utiliza el método de investigación comparativo. Entre los resultados obtenidos se encuentra la estrecha relación entre la primera comunión con las prácticas escolares, caracterizada como un momento ritualizado en el contexto del propio horario escolar.

Palabras clave: Primera comunión; Rituales religiosos; Brasil y España

Abstract

The study refers to archives containing female photographic images about the moment of the first Communion, a ritual to which girls were subjected by their families, as one of the five main sacraments of the Catholic Church. The main objective is to analyze the portraits produced strictly for this purpose, the day of first Communion, with a focus on aspects such as posture, clothing, stage objects, furniture, religious symbols present, etc. More specifically, we seek to compare images produced in Brazil and Spain, during the first communion of girls, in the first half of the 20th century, examining the peculiarities of each country. The methodological procedures refer to a qualitative and historical-documentary research, which uses the comparative method of investigation. Among the results obtained is the close relationship between first Communion with school practices, characterized as a ritualized moment in the context of the school schedule itself.

Keywords: First Communion; Religious rituals; Brazil and Spain

Introdução

Uma das fotografias que está sempre presente como parte do acervo de memórias da infância de quem viveu esse período em meados do século XX, é a do ritual da primeira comunhão. Momento esperado pelas famílias, exigido pela igreja católica, estimulado pelas escolas e ensaiado pelas crianças que eram preparadas para “o grande dia”, a primeira comunhão incorporou ao sacramento eclesiástico um elaborado rito de passagem1que, para as meninas, continha adereços relativos à simbologia que pretendia imprimir à ocasião.

A Igreja Católica, por meio de seus Códigos e Constituições eclesiásticas, é detentora dos mesmos rituais e cerimônias espalhadas pela cristandade, a partir das determinações papais, fazendo com que seus sacramentos ocorram de maneira exatamente igual em grande parte do mundo católico ocidental sob égide do Vaticano, com pouquíssimas variações relacionadas às peculiaridades culturais e às permissões de sincretismos que foram incorporadas ao longo dos séculos. Dessa forma, a Igreja católica se converte, desde os mais remotos tempos, em formadora de um modelo cristão comum de cerimônias rituais, possível de ser identificado em qualquer país do mundo, por se basear em uma doutrina única, adaptável às diferentes sociedades e aplicável a qualquer língua.

Entre os ritos que são amplamente praticados e convertidos como festejos públicos em quase todos os países católicos está a primeira comunhão, estabelecida para as crianças quando já estão com o processo de alfabetização consolidado, já atingiram um nível de abstração para compreender as subjetividades presentes no catecismo e também para proceder à confissão dos seus “pecados” que antecede a iniciação à eucaristia. De acordo com Scholl e Grimaldi (2013, p.352), citando o Papa Pio X, “as crianças deviam comungar logo que pudessem ter a mínima noção do que iam receber, mesmo que o resto de sua formação seguisse depois”.

Como modelo adotado de forma muito semelhante na maioria dos países, esse rito envolve as famílias, as paróquias e as escolas, observando as responsabilidades previstas nas próprias prescrições da Igreja. Por um lado, o rito sagrado é o mesmo, baseado na doutrina, detalhado nos catecismos, ensaiado em suas etapas de preparação, profissão de fé, confissão e comunhão, com todo o simbolismo e as insígnias necessárias para aproximarem o céu e a terra nesse pacto que irá acontecer entre os “novos” fiéis e a Igreja. Por outro lado, a festa profana, também semelhante, envolve a preparação da cerimônia de exibição pública, especialmente das meninas, como miniaturas de santas, anjos, noivas de Cristo, requerendo, igualmente, uma elaboração cuidadosa das famílias, quase sempre, tendo como fim último, ser eternizada em uma fotografia edificante, capaz de captar não só uma imagem, mas as sensações e a perenidade instantânea do momento vivido.

O estudo em pauta refere-se à primeira comunhão como objeto de investigação, a partir da análise de arquivos que contêm imagens fotográficas femininas sobre esse momento ritual, ao qual as meninas estavam submetidas por suas famílias, como um dos cinco sacramentos principais da Igreja Católica, em todo o mundo. O objetivo central está em analisar as imagens produzidas expressamente para esse fim, o dia da primeira comunhão, com foco em aspectos como a postura, a indumentária, os objetos de cena, o mobiliário, a simbologia religiosa presente etc. De forma mais específica evidenciam-se imagens rituais, como os “santinhos”2, produzidas no Brasil e na Espanha, durante a primeira comunhão de meninas, na primeira metade do século XX, examinando-se as peculiaridades próprias dessa simbologia em cada país.

No que tange aos procedimentos metodológicos, trata-se de uma pesquisa qualitativa e histórico-documental que parte de um estudo teórico sobre a primeira comunhão como rito religioso, para, a seguir, analisar a materialidade das imagens fotográficas obtidas sobre essa cerimônia, utilizando, por fim, o método comparado de investigação. Reconhecendo o uso da imagem como documento histórico educativo (DEL POZO, RABAZAS, 2010; 2012), entre as fontes acessadas no estudo foram pesquisados arquivos pessoais (CUNHA, 2019), além de acervos privados e públicos possuidores de imagens fotográficas de cerimônias de primeira comunhão, com ênfase em arquivos com imagens do Colégio Notre Dame de Sion em Petrópolis, uma escola católica feminina, onde essa era uma das solenidades mais importantes do ano letivo, e no acervo do Museo Pedagógico da Faculdade de Ciências da Educação da Universidade de Sevilha (MPFCCEUS) (ÁLVAREZ; REBOLLO; NÚÑEZ, 2016), que possui uma coleção de fotografias relativas a essas cerimônias em diferentes locais da Espanha, especialmente em Andaluzia.

Para tratar de um tema que tem seus primeiros registros junto à própria popularização dos mecanismos fotográficos, tornou-se necessário delimitar um período de análise para o detalhamento dos aspectos de materialidade que podem ser depreendidos das imagens pesquisadas. Nesse sentido, optamos pela primeira metade do século XX, considerando que, no período entre guerras, houve um avanço e difusão do catolicismo no mundo e a consolidação do Código de Direito Canônico de 19173.

A primeira comunhão como um rito religioso: dever das famílias, párocos e professores

O século XX está marcado por sua localização em meio aos dois Concílios Ecumênicos da Igreja Católica da era moderna, o Concílio Vaticano I realizado entre 1869 e 1870 e o Concílio Vaticano II de 1962 a 1965, sendo que, ambos, cada um em seu tempo, procuravam dar respostas às questões da contemporaneidade, desde conciliar a “oposição entre fé e razão”, até a tentativa de “ampliar os horizontes da autoconsciência da Igreja católica em vários aspectos” (RIBEIRO, 2006, p.72).Na “Declaração de Fé Católica”, a partir do Concílio Vaticano I, a profissão de fé observava que existiam sete sacramentos da “Nova Lei”, “instituídos por Nosso Senhor Jesus Cristo e necessários para a salvação, ainda que cada pessoa não precise recebê-los todos”. São eles: batismo, confirmação, eucaristia, penitência, extrema unção, ordem e matrimônio (CONCÍLIO VATICANO I, 1870, s/p.). Quanto à eucaristia, sua preparação era fundamental para recebê-la, pois era considerado que

no Santíssimo Sacramento da Eucaristia estão verdadeira, real e substancialmente o Corpo e o Sangue, juntamente com a Alma e a Divindade, de Nosso Senhor Jesus Cristo; e que ali ocorre a conversão de toda a substância do pão em Seu Corpo e de toda a substância do vinho em Seu Sangue; a esta conversão a Igreja Católica chama “transubstanciação” (CONCÍLIO VATICANO I, 1870, s/p.)

Na última ceia que Jesus Cristo celebrou com os Doze Apóstolos podemos encontrar a base da primeira comunhão como ritual cristão e como ato cerimonial e sacramental, tendo a sua origem no século XIII, especificamente em 1215, quando o Concílio de Latrão decidiu que apenas os menores que houvessem alcançado a idade da discrição (entre doze e quatorze anos) podiam receber este sacramento (RICO, 2006). Assim, a eucaristia revertia-se em um dos mais importantes sacramentos da Igreja Católica, visto que, após o batismo, era quando o cristão já consciente, na infância, aderia de “livre vontade” à religião. De acordo com Pereira (2012), a primeira comunhão é o ato de receber a eucaristia pela primeira vez, o que difere da comunhão da pessoa adulta, já iniciada na vida cristã, que ocorre em todas as missas, quando recebe a eucaristia. Para esse autor, a comunhão é a essência da vida da Igreja e está imbricada de “um conjunto de elementos simbólicos que formam não só uma cerimônia repleta de signos e de representações, mas também algo medular da religião católica” (PEREIRA, 2012, p.34). O autor aborda esse sacramento como o “elo” que permeia todos os outros sacramentos, configurando um pacto social com o sagrado, cuja iniciação se dá pela primeira comunhão, que é vista como rito de passagem e de iniciação à adesão à comunidade religiosa.

Para Pereira (2012, p.35-36), a comunhão se trata de um “pacto social inclusivo” e a sua iniciação, a primeira comunhão, faz parte dos chamados “sacramentos de iniciação cristã”, existentes desde os primeiros cinco séculos do cristianismo, quando era realizada antes e/ou junto do batismo, tendo em vista que este já ocorria com o indivíduo adulto. A prática de obrigar as crianças a se confessar e comungar ocorre por volta do século XIII, quando a idade da razão era considerada entre os 7 e 8 anos. Entre o Concílio Vaticano I e Vaticano II, essas idades variaram de acordo com as recomendações eclesiais, observando-se que as crianças fizessem a primeira comunhão quando já estivessem alfabetizadas.

O Código de Direito Canônico (CDC) de 1917, vigente durante o período em que esse estudo se concentra, prescrevia no seu cânone 853 que “qualquer baptizado, não proibido por lei, pode e deve ser admitido à comunhão”, mas a eucaristia somente deveria ser dada às crianças que tivessem o conhecimento e o gosto por este sacramento, ou seja, com idade para “distinguir o corpo de Cristo da comida habitual, e adorá-la com reverência”, exceto em perigo de morte. (CDC, 1917, cân. 854). Outra condição prescrita no CDC de 1917 era um conhecimento mais completo da doutrina cristã e uma preparação mais cuidadosa, nomeadamente que, de forma adequada à sua idade” (Ibidem). Ainda assim, caberia ao confessor “o julgamento sobre os arranjos suficientes dessas crianças para a primeira comunhão”, bem como aos pais ou aqueles que tomam o lugar dos pais (Ibidem). Ou seja, o pároco era responsável por garantir que as crianças chegassem “à mesa sagrada” em pleno uso da razão e com provisões de catequeses suficientes.

Além do pároco, o cânone 860 imputava a responsabilidade pela primeira comunhão a todo o círculo mais próximo da criança, tornando esse sacramento uma obrigação coletiva que envolvia a família, a igreja e a escola: “A obrigação do preceito da comunhão, que incumbe aos impubes, recai também principalmente sobre os seus responsáveis, a saber, pais, tutores, confessor, professores e pároco”. Adiante, os cânones 1329 e 1330 reforçavam o dever catequético dos párocos como “um dever especial e muito sério”, de preparar os filhos para receberem com dignidade os sacramentos da penitência e da primeira comunhão (CDC, 1917).

As normas do CDC de 1917 perduraram ao longo de grande parte do século XX, considerando que o próximo Código de Direito Canônico só será promulgado pelo Papa João Paulo II em 1983, como Constituição Apostólica “Sacrae Disciplinae Leges” (CDC, 1983). Contudo, no que tange à primeira comunhão, continuou sendo um importante pacto sacramental, entre os principais que regiam a vida religiosa: “os sacramentos do batismo, da confirmação e da santíssima Eucaristia acham-se de tal forma unidos entre si, que são indispensáveis para a plena iniciação cristã” (CDC, 1983, cân. 842). Para tanto, deveria ser precedido de formação catequética “ampla e aprofundada”, ministrada durante “tempo conveniente”, preparando devidamente as crianças para a primeira recepção da eucaristia (CDC, 1983, cân.777). Além disso, mais uma vez se reiterava:

Para que a santíssima Eucaristia possa ser administrada às crianças, requer-se que elas tenham suficiente conhecimento e cuidadosa preparação, de modo que, possam compreender o mistério de Cristo, de acordo com sua capacidade, e receber o Corpo do Senhor com fé e devoção (CDC, 1983, cân. 913).

Novamente, no CDC de 1983, era imputada aos pais a responsabilidade pela busca da paróquia, observância da preparação, marcação e realização, o mais breve possível, do sacramento da primeira comunhão:

É dever, primeiramente dos pais ou de quem faz as suas vezes e do pároco, cuidar que as crianças que atingiram o uso da razão se preparem convenientemente e sejam nutridas quanto antes com esse divino alimento, após a confissão sacramental; compete também ao pároco velar que não se aproximem do sagrado Banquete às crianças que ainda não atingiram o uso da razão ou aquelas que ele julgar não estarem suficientemente dispostas (CDC, 1983, cân. 914).

Nesse contexto de imposição da Igreja, famílias, paróquias e colégios acabaram por transformar a obrigação em um ritual público, que ia do mais simples ao mais elaborado evento, dependendo das condições do grupo de participantes, refletindo nas práticas religiosas as diferenças sociais facilmente notáveis em cerimônias eclesiásticas com o mesmo fim. Pereira (2012, p.36) aponta que ao atingir a família, a primeira comunhão se torna uma festa de visibilidade social para a comunidade, incrementando-se “todos os elementos de solenização”, entre eles as vestes, os ornamentos, as flores. Sua magnitude também passa a ser dramatizada em um cenário de anjos, círios, procissões, decorações, incensos, lembranças impressas, cânticos, e, o mais importante, imortalizar o momento por meio de fotografias que conseguissem captar não apenas a cenografia, mas também o personagem com a postura que denotasse estar devidamente capacitado para aquela ocasião.

No cortejo preparado para a encenação do ritual, é muito significativa a hierarquia que pode ser observada na distância entre o sagrado e o mundano, entre os dirigentes e os dirigidos. Além disso, se por um lado a dimensão social dos festejos pode diminuir a conotação teológica da cerimônia, por outro, essa mesma dimensão atrai “vínculos entre a Igreja e o fiel, e, à vista disso, torna-se conveniente para ambas as partes” (PEREIRA, 2012, p.38). Pereira (2012) observa, ainda, citando Durkheim, que é natural que as crianças diante dos elementos de poder, força e mistério presentes nas cerimônias de primeira comunhão sintam temor, dependência e, até mesmo, entusiasmo.

No dia da celebração dessa cerimonia sagrada, o que a criança vê a sua volta, de todos os lados, o que se oferece aos seus sentidos, o que chama atenção são as múltiplas imagens da eucaristia, desdobradas em símbolos como as indumentárias brancas ou de outras cores, mas confeccionadas especialmente para esse evento, as velas, flores, imagens sacras, enfim, tantos símbolos que são as extensões do sagrado, como o próprio ritual litúrgico e o certificado sobre o qual se firma o pacto com Deus e com a Igreja. [...] A primeira comunhão, colocada assim, de forma ritualística, no centro da vida das crianças, torna-se profundamente representativa, fixando sobre elas seus significados simbólicos, porque, segundo orientações recebidas na catequese, a hóstia consagrada é o único objeto concreto da presença divina que elas podem visualizar (PEREIRA, 2012, p.48).

Nessa perspectiva, as imagens vividas durante a primeira comunhão, entendida como sacramento principal que marca o mistério cristão (MIRALLES; 2000), são eternizadas nas fotografias tiradas para esse fim, fazendo com que o ritual “sobreviva” na memória, por meio dos símbolos relacionados a ele. A fotografia da primeira comunhão seria como um atestado de concretização do rito de passagem que, segundo Gennep (2011), sairia do mundo anterior profano para ingressar na zona sagrada, um novo mundo alcançado por meio daquele rito de entrada então imortalizado pela imagem.

Vestidas de anjos ou pequenas Imaculadas: as imagens da comunhão de meninas

Pierre e Marie-Claire Bourdieu (2006) no artigo “O camponês e a fotografia”, recorrendo a uma etnografia da aldeia do Sudoeste francês onde o autor passou sua infância, analisam os usos sociais e o sentido das fotografias e da prática fotográfica na sociedade camponesa do Béarn, nos inícios de 1960, não em si mesmas e por si mesmas, “mas como sociogramas leigos que possibilitam um registro visual das relações e papéis sociais existentes” (p.31). Os autores demonstram que as fotografias foram introduzidas no ritual das cerimônias da aldeia, no início do século XX, correspondendo à importância social de cada uma delas: primeiro as de casamento e, por volta de 1930, as de primeira comunhão. Assim, as fotografias deviam ser objeto de uma leitura sociológica e possibilitar uma representação suficientemente crível, mas “nunca” por suas “qualidades técnicas e estéticas” (2005, p.34). Pierre e Marie-Claire Bourdieu (2006) acreditavam que “fotografar grandes cerimônias é possível porque - e apenas porque - essas imagens captam comportamentos que são socialmente aceitos e socialmente regulados, ou seja, já solenizados. Nada além do que deve ser fotografado pode ser fotografado” (p.34). A fotografia não era uma representação individual, mas a identificação de um papel social.

O tema da primeira comunhão foi, portanto, um dos primeiros que passou a vigorar no “universo do retrato fotográfico”, nas palavras de Scholl e Grimaldi (2013, p.353). Além disso, esse rito, que era próprio da pré-adolescência, vai, cada vez mais, sendo vinculado à infância, conforme demonstram as fotografias (Idem).

Nesse contexto de atribuir a realização da primeira comunhão entre a infância e a adolescência, nas primeiras décadas do século XX, à educação das jovens meninas é caracterizada por Philippe Lejeune (1997, p.107-108), a partir dos registros em seus diários, em duas fases: até os 14 ou 15 anos, ocorria a primeira fase, “que girava em tomo de um evento central e obrigatório, a primeira comunhão, esperada, preparada, depois lembrada e comemorada. Era um período de segurança para as garotas. Tudo estava organizado, e elas mal tinham alguma escolha a fazer”. E, a seguir, a segunda fase, já voltada à preparação para o casamento. Assim, as fotografias da primeira comunhão marcavam o ápice social esperado da primeira fase da vida das mulheres católicas, eternizando a imagem do comportamento regulado e aceito para cada uma delas, ao cumprir o seu rito de passagem.

De acordo com Mansk (2009, p.245) os ritos de passagem são caracterizados por elementos simbólicos comuns que têm como objetivo valorizar e demarcar a iniciação. No caso da primeira comunhão tratada como um “rito iniciatório”, esses símbolos estão presentes no uso “da água, uso da unção e imposição de mãos, da veste”, entre outros elementos que visavam consolidar e manter a prática ritualística. Dessa forma, era importante que estivessem expostos no cenário e na postura fotografada, a fim de corroborar a observação das prescrições necessárias à iniciação.

Beleli (2012, p.16) ao recordar suas memórias da primeira comunhão nos anos de 1960 ressalta a “centralidade que as meninas ganhavam na preparação do evento - o frisson na escolha de modelos dos vestidos e seus adereços -, que não passava despercebido ao olhar de certa ‘inveja’ de alguns meninos”, atuando como meros coadjuvantes. Assim, as fotografias testemunham algo que já podia ser percebido, a primeira comunhão era uma cerimônia, prioritariamente, feminina e os meninos cumpriam um papel secundarizado até nas imagens. O ritual funcionava como uma preparação para o casamento, no qual a noiva é a protagonista, aquela cujas fotos podem ser individuais, e para quem a preparação envolve uma mescla de tradição, sensibilidades, afetos e memórias. Como ressalta a autora:

Um ponto alto na preparação era a permissão para usar guirlandas ou grinaldas, em alguns casos, as mesmas usadas pelas mães ou avós em suas bodas. Em busca deste acessório especial, baús e memórias reviradas evocavam lembranças de momentos percebidos como únicos. Primeira comunhão e casamento se encontravam em tempos e espaços distintos, como se o primeiro evento já fosse uma preparação para o segundo, destino “apropriado” para a maioria das mulheres (BELELI, 2012, p.17).

Quanto ao aspecto de gênero, Scholl e Grimaldi (2013, p.368) corroboram, nos anos de 1960, a permanência da prática de separação do grupo de meninos do das meninas para a primeira comunhão, mesmo nos colégios mistos, assim como os autores destacam a “precedência do grupo feminino na comunhão em relação ao grupo masculino”.

Embora a primeira comunhão fosse o ponto alto das cerimônias dos colégios católicos e especialmente aqueles destinados às mulheres, sobretudo, na primeira metade do século XX, quando essas instituições eram muito procuradas, Jacques (2016) afirma que o mesmo ocorria em escolas evangélicas, ainda que buscassem manter-se laicas. Em seu estudo relativo ao Colégio Farroupilha de Porto Alegre, escola de ensino privado fundada por alemães, a autora conclui, a partir de entrevistas realizadas, que “mesmo sendo uma escola laica, os ofícios religiosos para católicos e evangélicos norteavam as práticas educativas da instituição” (JACQUES, 2016, p.7). As cerimônias de primeira comunhão realizadas no Colégio Farroupilha possuíam os mesmos traços vislumbrados nos colégios católicos, com semelhante simbologia relatada pelas entrevistadas da pesquisadora, em que os bancos da igreja eram enfeitados com laços brancos e com as flâmulas do colégio, os alunos entravam em fila um atrás do outro, com uma vela na mão que era acesa e colocada junto aos bancos da nave central. As meninas vestiam branco, assim como as professoras, e entravam segurando um lírio também branco nas mãos (JACQUES, 2016).

As imagens eternizadas através das fotografias também têm a característica de aproximar gerações de mulheres, na medida que o rito de passagem é imposto a todas as adeptas da religião católica romana. Assim, quando revisitadas por suas protagonistas já adultas, podem ser rememoradas da forma como descreve Osman Lins em seu livro “Marinheiro de primeira viagem”, analisado por Nakagome (2014). O autor registra:

Dia santo jardim manhã sol sentado banco presenciando pai mãe dois avós empenhados fotografar duas meninas primeira comunhão trajes litúrgicos uma séria outra sorridente. Imaginar como olharão meninas retratos dentro quarenta anos. Haverão comparar fotografias primeira comunhão netas achando-as parecidas consigo não acreditando passagem tempo lembrando ternura pais avós silenciosos morta claridade desta manhã festiva (LINS, 1980, p.65, apudNAKAGOME, 2014, p.443).

A ideia da semelhança entre as fotografias das avós e das netas é explicitada por Reznick e Gonçalves (2003, p.79) quando demonstram que a primeira comunhão se reveste de uma concepção de “festa cíclica, repetitiva”, na qual os mesmos elementos se reproduzem e estão retratados nas imagens ainda que no intervalo de décadas, sua “temporalidade é variável”. Desse modo, a primeira comunhão não poderia ser datada unicamente pelos elementos de cena de suas fotografias porque se assemelham e todos vivem esses acontecimentos repetidamente, em tempos dissonantes, em contextos completamente distintos, em países diferentes, como no caso do Brasil e da Espanha. De acordo com os autores, a primeira comunhão “possibilita uma percepção ambígua em relação ao tempo” (REZNICK e GONÇALVES, 2003, p.79).

Além disso, Magueta (2015), em estudo aprofundado sobre a prática da fotografia na primeira comunhão, chama atenção para o fato de que os cenários seguem um modelo constante dos manuais de catequese utilizados de forma atemporal, com os mesmos objetos recomendados para compor o retrato: o genuflexório, o altar, crucifixo, castiçal com velas, terço, missal, vasos de flores, imagens sacras ou painéis-cenários com cenas que podiam ser escolhidas entre uma ou duas, sendo comum a de Cristo cercado de iluminação. Tais “painéis-cenários”, por vezes, faziam parte do estúdio do fotógrafo contratado, ou mesmo de um pequeno estúdio montado no próprio local da cerimônia para captar as imagens da ocasião. Em menor escala, é possível que algumas fotografias fossem tiradas nas próprias casas das crianças, antes ou depois da cerimônia, conforme a disponibilidade de contratação exclusiva da família.

De acordo com a autora (MAGUETA, 2015, p.67), “as câmeras de estúdio na década de 1940 ainda se apresentavam presas aos tripés”. Diante dessa limitação, as crianças eram imobilizadas, durante algum tempo, obedecendo as ordens do fotógrafo, que manuseava sua câmera sobre o tripé, para que as meninas, vestidas de santas imaculadas, eternizassem o tão esperado dia da comunhão. A postura também seguia o padrão das “neocomungantes”, que deveria evidenciar a devoção, com a pose ajoelhada ou em pé e as mãos unidas em oração, segurando o terço e o missal. Para Magueta (2015, p.175), os catequizandos eram orientados, conforme os manuais da década de 1940, a adorar o corpo de Cristo, e, portanto, a postura mais verificada é a de joelhos, protagonizando uma “fantasia” do acontecimento, que contava com a “anuência de todos os envolvidos, em diferentes níveis - fotógrafos, família, fotografado”.

A maioria das fotografias individuais do dia da primeira comunhão é de corpo inteiro, especialmente por se tratar de meninas, cujas roupas e adereços foram elaborados para serem mostrados, fotografados e guardados. Assim, desde a grinalda, a medalha no cordão, até o sapato, o ângulo do registro fotográfico procurava preservar ao máximo as possibilidades de visualização dessa indumentária. Uma vez reveladas, as fotografias passavam a fazer parte dos álbuns familiares, a maioria deles de papel cartão verde, coberto por uma folha de seda para não manchar as fotografias, presas com pequenas cantoneiras em cada página, ou simplesmente coladas. Na capa dos álbuns, paisagens ou figuras de crianças, estofadas, pintadas ou aplicadas em trabalho de marchetaria ou metais, com acabamento em um cordão finalizado por um pingente de franjas que servia como marcador, fazia de alguns, verdadeiras obras de arte. Os álbuns emolduravam as fotografias que se pretendiam tão perenes quanto seu invólucro.

As imagens que escolhemos para apresentar nesse estudo, no que se refere à primeira comunhão no contexto brasileiro, na primeira metade do século XX, são relativas a essa cerimônia realizada no Colégio Notre Dame de Sion em Petrópolis. O arquivo pessoal, no qual se encontravam as fotografias, pertenceu a uma ex-aluna chamada Ruth, ou “Querida Ruth”, “Rutinha”, como são as apresentações em seus guardados pessoais de tudo que é direcionado a ela (VASCONCELOS, 2018). Quanto à sua assinatura no material analisado, leva apenas o nome Ruth e, por vezes, os dois sobrenomes que a identificam. Infelizmente, seu álbum que continha as imagens - que se pode deduzir que existiu pelas cantoneiras usadas que estavam armazenadas em um envelope -, já não existe mais, e o arquivo pessoal foi guardado, por quem o retirou do local original, em uma caixa de papelão, a qual denominamos de “caixa de lembranças”, já bastante deteriorada pelo tempo (VASCONCELOS, 2018). De acordo com Cunha (2019, p.99), os arquivos pessoais, escondidos em baús ou caixas, são representações do tempo em que foram produzidos, envoltos à ordem existente.

Ruth nasceu, muito provavelmente, nos anos próximos à chegada de 1920, na cidade de Petrópolis, não mais Imperial, mas já no Estado do Rio de Janeiro. Pelas cartas e cartões verifica-se que tinha um irmão e duas irmãs. O irmão estudava no Rio de Janeiro e as irmãs no mesmo Colégio Notre Dame de Sion em Petrópolis (VASCONCELOS, 2018). Como as meninas de elite da sua cidade, Ruth estudava na melhor escola e participava das atividades religiosas muito valorizadas na sociedade petropolitana da época, entre elas, a primeira comunhão.

A primeira comunhão de Ruth foi em19284, a de sua irmã Cyrene em 1930, e a de seu irmão Selmo em 1934, o que pode ser constatado nos santinhos trocados entre eles naqueles anos, sendo inúmeros os cartões de primeira comunhão distribuídos entre as meninas que participavam do ritual. A fotografia da primeira comunhão de Ruth, guardada em sua caixa de lembranças, foi realizada no dia 03 de junho do ano de 1928, um domingo, e refere-se a toda a turma de neocomungantes, após a missa em que receberam a primeira eucaristia, no claustro interno do Colégio Notre Dame de Sion.

Segundo Scholl e Grimaldi (2013, p.361), em pesquisa abrangente sobre o assunto, o ritual começava pela manhã com o sacerdote recebendo as crianças à porta da igreja para abençoá-las e aspergi-las com água benta. A seguir, dirigia-se a cada uma delas para receber os votos da profissão de fé, e, logo depois, começava a missa, na qual, a hora da comunhão era dedicada prioritariamente a elas, ajoelhadas, em fila, na organização ensaiada para a ocasião. À tarde, ou após o final da missa, Scholl e Grimaldi (Ibidem) verificam que as crianças “comungantes compareciam diante do altar para a consagração ao Sagrado Coração de Jesus e a Nossa Senhora”, para, em seguida, ser feita a benção solene com o Santíssimo Sacramento.

Essa cerimônia, cujo registro fotográfico faz parte da caixa de lembranças de Ruth, foi realizada no pátio interno do Colégio Notre Dame de Sion, como se vê na Imagem 1, abaixo. Trata-se de uma fotografia tirada do segundo andar do edifício, buscando enquadrar todo o átrio, onde já está sendo celebrada a adoração ao Santíssimo Sacramento, provavelmente, após as meninas comungantes terem saído da missa na Capela5 do Colégio, localizada entre os dois claustros, separando as edificações em estilo renascentista.

Fonte: Arquivo pessoal da autora. Data: 03/06/1928.

Imagem 1 Cerimônia de adoração ao Santíssimo Sacramento após a primeira comunhão no Colégio Notre Dame de Sion, Petrópolis (Brasil). 

A fotografia mostra a cerimônia ao ar livre, no claustro, em frente à estátua de Nossa Senhora do Sion, onde foi erigido um altar para a colocação do ostensório. De frente para o altar, vê-se o celebrante principal, um padre usando capa de asperges e véu umeral com a cruz bordada, ladeado por dois diáconos. Atrás e ao lado direito do altar estão os acólitos, ajoelhados. Ao redor encontram-se também ajoelhadas as meninas que participaram da primeira comunhão, separadas por tamanho, o que pode indicar ser uma organização por turmas, com as menores na frente, seguidas das maiores em pé, em uma fila de pares atrás dos celebrantes. Observa-se, também, alunas pertencentes a alguma congregação religiosa de estudantes, alunas vestidas com o uniforme, e noviças que guardam os estandartes com as imagens de Nossa Senhora. Os familiares, assim como as freiras da congregação e as demais alunas que formam a assistência, ocupam as galerias laterais do primeiro andar e, seguramente, do piso superior também. Nota-se que o conjunto das meninas que fizeram a primeira comunhão está de branco, com vestidos abaixo dos joelhos, e todas levam um véu de organza branca até quase a altura do vestido. As meninas que estão ajoelhadas no entorno dos celebrantes portam uma cesta, a qual, possivelmente, continha flores, pétalas, ou mesmo seus missais e terços, bem como as lembrancinhas ou santinhos, que seriam oferecidos posteriormente. Cabe destacar que a ordenação com que alunas são distribuídas pelo pátio, em perfeita organização, também revela o detalhamento e a importância dada a essa cerimônia que era ensaiada, com antecedência, para que sua imagem pudesse, passados quase cem anos, ainda encantar pela harmonia e perfeição.

A irmã de Ruth, Cyrene, também aluna do Colégio Notre Dame de Sion, fará a primeira comunhão dois anos depois de Ruth, em 14 de outubro de 1930, conforme seu santinho de lembrança oferecido à irmã, juntamente com a sua fotografia deste dia, como se vê na Imagem 2, a seguir.

Fonte: Arquivo pessoal da autora. Data: 14/10/1930.

Imagem 2 Fotografia da primeira comunhão de Cyrene no Colégio NotreDame de Sion, Petrópolis (Brasil). 

Cyrene, possivelmente, passou por um ritual semelhante ao da sua irmã Ruth, registrado na fotografia anterior, com a mesma cerimônia ocorrendo no claustro do Colégio, após a missa da eucaristia. Sua roupa é semelhante à utilizada pelas meninas do grupo que se apresenta junto à estátua de Nossa Senhora do Sion na Imagem 1, com um vestido de cambraia bordada em branco, indo até abaixo dos joelhos e acompanhado de um véu até quase a altura do vestido. O véu também é bordado nas pontas e no alto da cabeça é arrematado por uma grinalda de flores. Ela carrega uma pequena bolsinha do mesmo tecido, para guardar o missal aberto e o terço que tem nas mãos, fotografando na pose de quem está lendo suas orações. No pescoço tem uma corrente que vai até a cintura com uma medalha, possivelmente de um santo. Os sapatos são de tecido, estilo boneca, também de cor clara.

A fotografia foi tirada junto a uma janela, provavelmente na casa de Cyrene, pois o cenário é improvisado, com os símbolos católicos sendo aqueles, comumente, presentes no ambiente doméstico. Fazendo as vezes de altar, um aparador de madeira atrás da menina contém duas imagens em madeira, a primeira de Sant’Ana ensinando a Maria e a segunda de São Francisco de Assis. No fundo encimando o aparador para fazer as vezes de cenário, vê-se dois quadros emoldurados, com cenas bíblicas em que Jesus Cristo dá ensinamentos a crianças e a adultos.

Para o dia de sua primeira comunhão, como era o costume de todas as meninas, Ruth mandou fazer santinhos para oferecer aos familiares e aos amigos como lembranças da ocasião. Entretanto, dedicou todos e não guardou nenhum para si mesma, ou os seus próprios se perderam, restando em sua caixa de lembranças somente diversos santinhos recebidos de outras colegas, neste mesmo dia. Destarte, seus pais, sua avó Maria e sua irmã Cyrene confirmam, nas dedicatórias dos santinhos de recordação que ofereceram a Ruth, a data e os registros de sua primeira comunhão, no Colégio Notre Dame de Sion, como se pode ver nas Imagens 3, 4 e 5.

Fonte: Arquivo pessoal da autora. Data: 03/06/1928.

Imagem 3 Santinho recebido como lembrança dos pais pela primeira comunhão de Ruth, Petrópolis (Brasil)6

Fonte: Arquivo pessoal da autora. Data: 03/06/1928.

Imagem 4 Santinho recebido como lembrança da avó pela primeira comunhão de Ruth, Petrópolis (Brasil)7

Fonte: Arquivo pessoal da autora. Data: 03/06/1928.

Imagem 5 Santinho recebido como lembrança da irmã Cyrene pela primeira comunhão de Ruth, Petrópolis (Brasil)8

Os santinhos de recordação ofertados no dia da primeira comunhão por familiares e amigas evidenciam uma prática comum naquele tempo e contexto, extensiva a todos os que faziam o rito de passagem. Desse modo, as meninas do Sion distribuíam o seu santinho de lembrança e recebiam o das colegas e de todos os convidados para a celebração.

Em um estudo específico sobre os santinhos, Grazziotin e Bastos (2017, p.576-577) afirmam que a prática de distribuição dessas lembranças de primeira comunhão9 “se relacionam com o cotidiano da fé católica que, em nossa sociedade, está intimamente ligado ao contexto da escola, mesmo tomando-se como referência temporal o século XX”. Para as autoras, no final do século XIX e início do século XX, a escola privada, mas também a escola pública, são espaços de formação religiosa, em que pese a laicidade do ensino aspirada nos ideais republicanos, sendo a primeira comunhão um rito promovido dentro das instituições escolares.

Grazziotin e Bastos (2017, p.579-560) sinalizam que as memórias da primeira comunhão “imediatamente, remetem à lembrança da prática da troca de santinhos com os colegas”, cuja presença pode ser constatada desde o século XVIII, “inicialmente, em branco e preto, colorindo-se gradativamente”, assim como os materiais de sua confecção foram ficando cada vez mais elaborados, passando a ter as mensagens impressas em gráficas, com letras douradas, prateadas ou pretas, cabendo apenas a assinatura e a data de quem oferecia o santinho.

Ruth também recebeu santinhos impressos, mas os destacados neste artigo, oferecidos pela sua família, continham impressa apenas a imagem da frente, com o verso do cartão em branco para que fosse anotada a mensagem particular. Como explicam Grazziotin e Bastos (2017, p.587), a venda sem dizeres impressos, possibilitando a personalização, “conferia maior importância à lembrança, que era dada para familiares e amigos”. Os santinhos, normalmente, eram importados da Europa e, no Brasil, vendidos em casas de comércio ou gráficas, como no caso do santinho oferecido pelos pais de Ruth, que é francês, e o ofertado por sua avó que, embora indique ser suíço na frente do cartão, no verso consta o local de venda: “Casa Sucena - Rio de Janeiro”. Quanto às imagens impressas na frente dos santinhos as autoras afirmam:

As imagens destinadas à Primeira Comunhão apresentam os símbolos desse ritual estabelecido pela Igreja Católica: a sigla “JHS” (Jesus Hostia Sagrada); o cálice; o pão, o trigo, a uva, o peixe; o anjo; Jesus Cristo; a pomba; o terço; o catecismo. Algumas apresentam o anjo conduzindo o menino ou menina à Igreja, acompanhado de ovelhas. São os mais abundantes nos álbuns e apresentam cores claras em tons pastéis (GRAZZIOTIN E BASTOS, 2017, p.587).

Os santinhos ofertados pela família de Ruth encontram-se na categoria dos que contém símbolos rituais, com imagens do menino Jesus no colo de seu pai, São José, do próprio Cristo oferecendo a comunhão e de Nossa Senhora com o menino Jesus junto a um pequeno pastor de ovelhas.

Na Espanha, em que pese as diferenças culturais intensas, sobretudo no princípio do século XX, quando não havia os efeitos globalizantes nas sociedades, o ritual seguia exatamente o mesmo padrão, com poucas singularidades. Centrando-nos, portanto, no caso espanhol, e partilhando os pontos anteriores pertinentes ao caso brasileiro, recorremos aos arquivos gráficos do MPFCCEUS, para, através de uma série de fotografias, ilustrar algumas ideias relacionadas, particularmente, com a primeira comunhão de meninas na Espanha. Graças à colaboração e à generosidade dos alunos da Faculdade de Ciências da Educação da Universidade de Sevilha, o museu está a se expandir, gradualmente, ampliando as suas colecções fotográficas e convertendo-se, assim, em um espaço de memória de todos e para todos, em que cada testemunho gráfico constitui uma pista para a história da educação.

Independentemente da classe social a que pertenciam, no dia da primeira comunhão, as meninas vestiam as suas melhores roupas e iam receber o corpo de Cristo cobertas de branco e bem preparadas, tanto por dentro quanto por fora. Nas vilas como nas cidades, da preparação interior eram encarregadas, normalmente, as freiras, enquanto da preparação exterior eram as mães e as avós que, com cuidado e dedicação, compravam ou confeccionavam os melhores vestidos para celebrar um acontecimento tão especial na vida das meninas. Para ilustrar esta ocasião, optamos por selecionar duas fotografias de meninas nascidas em vilas da província de Huelva, localizadas no sul da Espanha. Na Imagem 6, a seguir, encontramos a menina Rosario, fotografada de corpo inteiro, no mês de maio, mês da Virgem Maria, por um fotógrafo profissional, em um cenário preparado com os símbolos relativos ao dia de sua primeira comunhão.

Com uma postura circunspecta e um rosto sereno, a menina perfeitamente vestida e arrumada posa imaculadamente com os cabelos semi-recolhidos, para um dia especial e inesquecível. Reservada e demonstrando timidez, ela se encontra com todo o corpo coberto, incluindo a cabeça, que também é tapada por um véu que simboliza a sua pureza e a sua virgindade. Ela também usa luvas e exibe um conjunto de acessórios singulares ligados à vida cristã. Leva um missal de orações e cânticos a Jesus e Maria, um rosário (cuja coroa de rosas significa a confiança na Virgem Maria como Mãe), uma medalha de simbolismo religioso, brincos de ouro e pulseira. “À tua direita, está a rainha, usando joias de ouro puro de Ofir" (Bíblia Sagrada. Antigo Testamento. Salmo 45:9). Jesus, que é a palavra que se fez carne, se faz presente na vida da menina através dos conteúdos que guarda no missal. O missal, que substitui a Bíblia, simboliza o convite à menina para entrar na vida cristã. «Não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus» (Santos Evangelhos. São Mateus, 4, 3-4). Rosário também carrega uma bolsinha na qual, como todas as meninas, guardaria os santinhos que depois da festa daria como lembrança deste dia para sua família e amigos. Todos esses adereços foram comprados por diferentes membros da unidade familiar, que, como presentes, ofereciam tudo de melhor para aquelas que estavam se preparando para receber Deus para sempre em seus corações. A entrada na comunidade eclesiástica, a partir deste dia, apresentava-se como motivo de orgulho, especialmente para as famílias cristãs praticantes. Neste dia, as meninas eram também encomendadas à Virgem Maria ou a outras santas, geralmente a padroeira de suas vilas e cidades. No caso de Huelva, a patrona a que eram confiadas as meninas é à Virgem de la Cinta.

Fonte: Arquivo do MPFCCEUS. Data: 23/05/1945.

Imagem 6 Fotografia da primeira comunhão de Rosario, uma menina de Huelva (Espanha). 

Comunhão, que provém do latim "communio", significa "participar em comum". E é o momento que, em comunidade, reúnem-se familiares, amigos e pessoas que compartilham crenças religiosas mais ou menos semelhantes, para celebrar a união de um de seus membros com Deus, sobretudo, se for uma menina, de quem é esperada uma vida virtuosa como a da santa padroeira.

Na mesma linha da fotografia anterior, conhecemos na Imagem 7, Manuela, uma menina de Gibraleón, uma vila de Huelva, cuja padroeira é Sant’Ana. A menina aparentemente de classe média, com vestido branco imaculado e sapatos a combinar, mostra-se pura e pronta para receber a Deus pela primeira vez. A fotografia é tirada por um profissional e datada do final de maio, pouco antes das festividades de Corpus Christi. Perfeitamente coberta da cabeça aos pés, Manuela posa sorridente e inocente para imortalizar a alegria de uma data tão importante no calendário de sua vida. Tanto o tecido do vestido como o véu de Manuela são de qualidade superior aos da fotografia anterior. Neste caso, estão decorados com tiras bordadas, as quais representam as boas obras que esta jovem irá realizar ao longo de sua vida. Para a ocasião, Manuela usa um crucifixo no pescoço, em vez de um rosário, como o que aparece na Imagem 6. O crucifixo nos lembra que, a partir daquele momento, os ensinamentos de Jesus devem ser seguidos, tomando cada um a sua própria cruz. “Se alguém quer ser meu discípulo, tem que negar a si mesmo, tomar sua cruz e me seguir”. (Santos Evangelhos. Novo Testamento. São Mateus, 16:24). Na foto, Manuela segura uma vela que representa a luz de Cristo, que a guiará e a iluminará em seus passos até a vida eterna, assumindo o compromisso de ser ela mesma também, uma luz no mundo. Ao lado da vela, encontra-se um ramo de flores brancas, cujo significado espiritual está relacionado com a necessidade de expressar, com delicadeza, um testemunho de fé. As flores brancas devem ser entendidas como signo de louvor, oração e devoção à Maria, mãe de Jesus, exemplo a ser seguido por toda a mulher cristã. Mais uma vez, a menina aparece fotografada com seu missal de orações e sua bolsinha. A fotografia, em formato de cartão postal, contribui para imortalizar a tão sublime recordação cristã.

Fonte: Arquivo do MPFCCEUS. Data: 29/05/1940.

Imagem 7 Fotografia da primeira comunhão de Manuela, uma menina de Gibraleón, Huelva (Espanha). 

Como no caso brasileiro, na Espanha, a tradição de troca de santinhos no dia da primeira comunhão entre amigos e familiares era uma prática muito difundida em todo o país. Santinhos, que, como as fotografias, têm servido de vestígios para a reconstrução de tempos históricos educativos de outrora. Trata-se de objetos que, sem voz, nos falam de memórias e emoções ligadas à primeira comunhão como rito social, cultural e religioso. Entre eles, destacam-se os santinhos que faziam parte destes ritos, tanto no Brasil, como na Espanha, de forma muito semelhante.

A seguir, na Imagem 8, observa-se um santinho que Mª. Antonia oferece à amiga, a título de parabéns. Nele, se vê a imagem de São Luís Gonzaga, padre jesuíta italiano, padroeiro da juventude, que aparece representado como um homem jovem, vestido com uma batina preta e um sobrepeliz. Seus adereços mais característicos são um lírio, referindo-se à sua inocência; uma cruz, referindo-se à sua piedade e sacrifício; uma caveira, referindo-se à sua morte prematura; e um rosário, referente à sua devoção à Virgem Maria. Certamente, a escolha de um santinho com esta imagem para ilustrar o dia da primeira comunhão não é casual, sobretudo, se considerarmos que uma boa cristã deveria ser inocente, prestativa, devotada e sacrificar-se pelo próximo.

Fonte: Arquivo do MPFCCEUS. Data: 16/07/1939.

Imagem 8 Santinho oferecido a uma menina por sua amiga, como lembrança e felicitações no dia de sua primeira comunhão, Sevilha (Espanha)10

O rito de distribuição dos santinhos na Espanha, no dia da primeira comunhão, corresponde ao desejo de imortalizar a lembrança de um significativo momento familiar, memorável e histórico como o da primeira eucaristia. Os santinhos contribuíam para dar um testemunho do evento, e para isso, no verso, eram descritos os detalhes dessa efeméride. Em primeiro lugar, aparece o nome e os sobrenomes da menina que comungava pela primeira vez, precedidos por um desenho de um cálice e do corpo de Cristo. Abaixo, indicava-se o nome da paróquia ou capela onde se celebrou a primeira comunhão, a data e o nome da respectiva vila ou cidade. Normalmente, os santinhos eram feitos de papel pergaminho e/ou de outro tipo de material de qualidade, com motivos dourados ou prateados, e, na frente, um desenho ou ilustração de caráter angelical ou mariano.

Seguem, na Imagem 9, diversos modelos de santinhos, tanto verticais quanto horizontais, cujas inscrições confirmam os registros assinalados. A menina Elvira Hitos Cortez fez a sua primeira comunhão em Huelva, no dia 17 de maio de 1937, no Colégio do Santo Ángel de la Guardia e, para imortalizar este dia, ofereceu à família e aos amigos um santinho no qual um anjo posa de lado, placidamente, e, à sua direita, encontra-se uma imagem da hóstia sagrada. Trata-se de um Colégio pertencente à Congregação das Irmãs do Santo Ángel de la Guarda, que foi fundado em 1880, como a primeira escola da cidade, que atendia, prioritariamente, à educação e à formação feminina, com preferência para as camadas sociais mais necessitadas.

Fonte: Arquivo do MPFCCEUS. Data: 1937.

Imagem 9 otografias de santinhos recordatórios da primeira comunhão11

De acordo com Grazziotin e Bastos (2017), os santinhos representavam muito mais do que a simples imagem estampada, possuindo um “valor simbólico”, além de sua prática de distribuição ultrapassar as fronteiras entre os países, podendo ser encontrada em diferentes sociedades, com características idênticas relativas às subjetividades do ato de oferta, do recebimento e da simbologia que carregavam ao serem distribuídos em uma data tão solene.

A semelhança das circunstâncias que envolviam a primeira comunhão no Brasil e na Espanha demonstram, guardadas as peculiaridades de cada lugar, que as imagens arquivadas de educação e religião relativas à primeira comunhão feminina são muito próximas, embora a distância que separa esses países esteja dimensionada entre os dois lados do oceano.

Considerações finais

A partir da análise dos arquivos de imagens fotográficas femininas produzidas no Brasil e na Espanha, sobre o momento de realização da primeira comunhão, com foco em aspectos como a postura, a indumentária, os objetos de cena e a simbologia existente, percebemos que a religião estava presente no currículo das escolas, por meio das aulas de catequese e a primeira comunhão era o ápice de preparação dessas aulas. Para tanto, era utilizado o catecismo católico ensinado tanto por padres e freiras catequistas, quanto por professores leigos quando se tratava de escolas públicas. De acordo com Pintassilgo (2002, p.555), no que se refere ao ensino básico, a educação religiosa católica é “um dos mais importantes elementos do currículo escolar elementar, tendo como finalidade clara e inequívoca a socialização das crianças e jovens nos princípios do catolicismo”, o que vai se estender até adiantado o século XX.

O material fotográfico examinado denota “a imbricação do ritual da primeira comunhão com a cultura escolar”, como já havia concluído Jacques (2016, p.12), a partir de entrevistas, que corroboram a relação estreita entre a primeira comunhão com as práticas escolares, caracterizando-se como um momento ritualizado no contexto do próprio cronograma escolar.

Além disso, verifica-se que a primeira comunhão era um ritual com marcante protagonismo feminino, no qual o papel dos meninos era o de coadjuvantes ao das meninas, cuja pose, vestimenta e indumentária carregava significados relativos à profissão de fé exigida no momento da eucaristia.

Embora fossem as principais protagonistas do “pacto social inclusivo” e do rito de passagem de iniciação à vida consciente cristã católica, às mulheres também era infringida maior responsabilidade por guardarem o sacramento recebido e delas era cobrado maior rigor na observação de sua conduta social, moral e sexual. Aos coadjuvantes da cerimônia, os meninos, também eram menos rigorosas as marcas de formação que envolviam, por vezes, esses pactos, e havia maior flexibilização na concepção dos pecados.

Certo é que a igreja aliada à escola constituía junto à família um potente triunvirato de formação, não sendo possível deixar de cumprir com os ritos estabelecidos no CDC em vigor, que responsabilizava a todos pela formação dos jovens católicos. Como demonstram as imagens fotografadas e as escritas nos santinhos dados como lembrancinhas, a primeira comunhão era um rito de iniciação obrigatório, e até pouco tempo, o mais importante da fase de infância da vida de todas as meninas. As antigas fotografias da primeira comunhão, desgastadas pelo tempo, referem-se a este tema que tem sido secundarizado do ponto de vista histórico, mas que necessariamente vincula-se com a nossa memória e que precisa ser historicizado.

Com as melhores roupas e trajes compatíveis com a sua classe social e com as suas condições econômicas, as meninas eram preparadas física e espiritualmente para receber Jesus pela primeira vez, no tão festejado dia de sua primeira comunhão. No entanto, também é preciso reconhecer que essa era uma prática pouco inclusiva, pois as meninas de famílias com recursos econômicos limitados, que não tinham possibilidade de arcar com os custos requeridos para a ocasião, sentiam a inoportuna diferenciação de ter que comparecer e assistir ao ato religioso com vestidos muito mais simples e modestos que as outras, quando não os obtinham emprestados ou doados por caridade.

Ainda assim, o ato da primeira comunhão tem sido historicamente a festa por excelência de toda a família e da comunidade eclesiástica; e as fotografias ligadas à história deste ato religioso evidenciam os momentos de alegria e júbilo vividos por todos ao celebrar este acontecimento. Além disso, em ambos os países, Brasil e Espanha, os vestidos das meninas do dia de sua primeira comunhão são marcos de memória, que não se apagam, mesmo para aquelas cujas fotografias se perderam ou que, por razões econômicas, não foram fotografadas, demonstrando que essa indumentária representava muito mais do que uma simples vestimenta naquele dia tão especial.

Contudo, não podemos perder de vista que as aceleradas mudanças que transformam os ritos podem levar ao abandono, durante um período de transição, de objetos considerados em desuso. Nesse sentido, as fotografias de primeira comunhão das meninas, assim como os santinhos, são apresentados como interessantes documentos iconográficos de cunho histórico educacional, que necessitam do olhar atento de pesquisadores, tendo em vista que podem ajudar a reconstruir e interpretar passagens da história da educação feminina.

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1O conceito de rito de passagem utilizado nesse trabalho remete a Arnold Van Gennep (1873 - 1957), em sua obra “Os ritos de passagem”, entendido como período intermediário, liminar, marginal ou fronteiriço que o sujeito percorre para se enquadrar no plano coletivo. Entre os ritos de passagem Gennep identifica aqueles cujo objetivo é agregar-se ao mundo sagrado, o que só se pode fazer pondo em ação esquemas próprios da religião.

2 Grazziotin e Bastos (2017, p.576) identificam os santinhos como cartões impressos com “pequena imagem que representa a figura humana de Cristo, Virgem Maria ou de um santo”.

3O Código de Direito Canónico “Codex iuris canonici” foi promulgado por Bento XV em 1917. O Código entrou em vigor em 19 de maio de 1918, e é conhecido pelos seus dois Papas idealizadores, como Código Pio-Beneditino.

4Os anos da comunhão de Ruth (1928) e Cyrene (1930) só foram possíveis de serem distinguidos após uma verificação minuciosa do acervo em comparação com outros documentos do Colégio Notre Dame de Sion. Portanto, até então, registrava-se a comunhão de Ruth junto com a da irmã Cyrene, fato corrigido neste artigo. Para saber mais sobre o assunto ver Vasconcelos (2018).

5A Capela do Colégio Notre Dame de Sion começou a ser erigida, em 1914, pelo engenheiro Heitor da Silva Costa, que realizou outras importantes obras monumentais religiosas, entre elas, o monumento do Cristo Redentor, no alto do Corcovado, no Rio de Janeiro (ALAMINO, 2008). As instalações do Colégio Notre Dame de Sion em Petrópolis foram vendidas para a Universidade Católica de Petrópolis (UCP), em 1969, que funciona nesse local até os dias atuais, assim como a Capela Nossa Senhora do Sion, na Universidade, que realiza os diferentes cultos religiosos.

6Transcrição do verso do santinho: Á minha querida filha, sendo hoje o dia em que Jesus veiu (sic) ao teu coração pela 1ª vês (sic), oferecemos-te este como lembrança deste augusto dia, Dós teus pais que te abraçam e beijam, Mamãe e Papae. Ave! 3 de Junho de 1928.

7Transcrição do verso do santinho: Ruth que guardes sempre em teu coraçãozinho a doce lembrança da tua 1ª Comunhão. Vovó Maria. 3-6-1928.

8Transcrição do verso: Salve:3-6-1928. Salve!!! Querida irmã. Uma terna recordação de tua 1ª Comunhão. Da amiga e irmã que envia muitos beijos e abraços. Cyrene. Salve:3-6-1928. Salve!!!

9O estudo das autoras Grazziotin e Bastos (2017, p.578) realizado no Memorial Jesuíta Unisinos, vinculado à Biblioteca da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, em São Leopoldo/RS, não se refere apenas aos santinhos de primeira comunhão, mas lembranças “de morte e da missa de sétimo dia; do batismo, da crisma; de festas ligadas às datas de casamento e de seus desdobramentos como bodas de prata, de ouro, de cristal; de consagração religiosa de sacerdócio; de festas religiosas organizadas por patronesses leigos: a cada ritual católico, um santinho correspondente à celebração”.

10Transcrição do verso do santinho: Muchas felicidades te desea tu amiga que pide por tí a Jesús. Mª. Antonia Jurado. Sevilla - 16-7-39.

11Transcrição do verso dos santinhos do original em espanhol: a) Has alimentado Señor a tu pueblo con el manjar de los Ángeles y lo has saciado con Pan Celestial y divino. / Adoremos a Jesús con los Ángeles y pidámosles que le presenten nuestros votos em favor de los seres que nos son queridos. (Mons. De Segur.). b) Recuerdo de la Primera Comunión de la niña Elvira Hitos Cortez. Celebrada em la Capilla del Santo Ángel el día 17 de mayo. Huelva, 1937.

Recebido: 04 de Novembro de 2020; Aceito: 24 de Fevereiro de 2021

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