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Cadernos de História da Educação

versión On-line ISSN 1982-7806

Cad. Hist. Educ. vol.21  Uberlândia  2022  Epub 13-Sep-2022

https://doi.org/10.14393/che-v21-2022-110 

Dossiê 3 - A pedagogia personalizada e comunitária no espaço ibero-americano (1950-1970)

As visitas técnico-pedagógicas de Pierre Faure ao Brasil para a formação de professores

Las visitas técnico-pedagógicas de Pierre Faure a Brasil para la formación de profesores

Daniele Hungaro da Silva1 
http://orcid.org/0000-0002-5767-1847; lattes: 9375667073219155

1Instituto Federal de Santa Catarina (Brasil). danihungaro@hotmail.com


Resumo

O objetivo deste artigo é compreender as visitas técnico-pedagógicas de Pierre Faure para ministrar as Semanas Pedagógicas que ocorreram no Rio de Janeiro e em São Paulo, respectivamente nos anos de 1955 e 1956. Faure foi um padre jesuíta francês que elaborou uma proposta inovadora de Educação Nova Católica: a Pedagogia Personalizada e Comunitária (PPC). A referência de Faure como educador percorreu mundo afora chegando a ser convidado para visitar o Brasil e ministrar as Semanas Pedagógicas promovidas pela Associação de Educação Católica (AEC). As visitas deste educador ao Brasil são aqui compreendidas como um modo de circulação, visto que este conceito, de acordo com Roger Chartier (1992), significa uma série de operações de disseminação de textos escritos em revistas especializadas, falas em congressos ou visitas de educadores em circuitos específicos. Até o momento, é possível afirmar que a pedagogia de Faure tonificou a posição católica no campo escolar brasileiro.

Palavras-chave: Educação Nova Católica; Visitas Técnico-Pedagógicas; Pedagogia Personalizada e Comunitária

Resumen

El propósito de este artículo es comprender las visitas técnico-pedagógicas de Pierre Faure para enseñar las Semanas Pedagógicas que tuvieron lugar en Río de Janeiro y São Paulo, respectivamente en 1955 y 1956. Faure fue un sacerdote jesuita francés que desarrolló una propuesta innovadora para la Nueva Iglesia Católica. Educación: Pedagogía personalizada y comunitaria (PPC). El referente de Faure como educador viajó por todo el mundo y fue invitado a visitar Brasil y enseñar las Semanas Pedagógicas impulsadas por la Asociación de Educación Católica (AEC). Las visitas de este educador a Brasil se entienden aquí como una forma de circulación, ya que este concepto, según Roger Chartier (1992), significa una serie de operaciones para la difusión de textos escritos en revistas especializadas, discursos en conferencias o visitas de educadores. en circuitos específicos. Hasta ahora, es posible afirmar que la pedagogía de Faure ha fortalecido la posición católica en el campo escolar brasileño.

Palabras clave: Nueva educación católica; Visitas Técnico-Pedagógicas; Pedagogía Personalizada y Comunitaria

Abstract

The purpose of this article is to understand Pierre Faure's technical-pedagogical visits to teach the Pedagogical Weeks that took place in Rio de Janeiro and São Paulo, respectively in 1955 and 1956. Faure was a French Jesuit priest who developed an innovative proposal for New Catholic Education: Personalized and Community Pedagogy (PPC). Faure's reference as an educator traveled around the world and was invited to visit Brazil and teach the Pedagogical Weeks promoted by the Catholic Education Association (AEC). The visits of this educator to Brazil are understood here as a way of circulation, since this concept, according to Roger Chartier (1992), means a series of operations for the dissemination of texts written in specialized magazines, speeches at conferences or visits by educators in specific circuits. So far, it is possible to affirm that Faure's pedagogy has strengthened the Catholic position in the Brazilian school field.

Keywords: New Catholic Education; Technical-Pedagogical Visits; Personalized and Community Pedagogy

Introdução

Pierre Faure ingressou na ordem jesuíta na década de 1920, dedicando-se por 60 anos consecutivos à educação nas diversas funções: professor universitário no Líbano e na França, diretor de escola primária e de escola de formação de docentes. A partir de 1937, ele passou a intervir no campo escolar, quando criou, em Vanves, o Centre d’Études Pédagogiques e passou a colaborar em várias revistas pedagógicas. Três anos depois, em parceria com Hélène Lubienska de Lenval, começou a ministrar cursos de verão para capacitação docente e, posteriormente, estabeleceu, em Paris, um centro de estudos pedagógicos, três escolas normais e um colégio de aplicação. Em 1945, criou a revista Pédagogie e dirigiu-a até 1972, convertendo-se no principal meio de divulgação da sua experiência educativa - a Pedagogia Personalizada e Comunitária (AUDIC, 1998).

Faure encontrou as bases pedagógicas de sua proposta educativa em leituras clássicas, tais como a Ratio Studiorum, a Escola Nova, o Plano Dalton, entre outros. Influenciado pelas reformas educacionais francesas do pós-guerra (KLEIN, 1998), Faure apropriou-se também do método montessoriano e, através de lentes católicas, dialogou com a Pedagogia Sagrada de Hélène Lubienska de Lenval (AVELAR, 1978, p.11). Como membro da Companhia de Jesus, apoiou-se nos Exercícios Espirituais de Inácio de Loyola e defendeu uma educação que proporcionasse ao estudante interiorização e ação. Além disso, enfatizou a riqueza de sua estruturação para o trabalho em sala de aula e deu ênfase no trabalho educativo e pessoal do estudante. A proposta pedagógica do padre Pierre Faure constituiu-se em um hibridismo de matrizes escolanovistas que defendia o ativismo do estudante, porém filtrada na perspectiva católico-jesuítica.

Para Silva e Dallabrida (2020), a relação de Pierre Faure com o Brasil iniciou-se em 1951, quando o padre esteve no Rio de Janeiro no qual fez uma fala no 4º Congresso Interamericano de Educação Católica, realizado no Rio de Janeiro. Após isso, o padre foi convidado para publicar textos no Boletim SERVIR da AEC do Brasil. esta mesma associação resolveu promover anos depois duas semanas pedagógicas com o objetivo de renovação das práticas educativas de professores dos colégios católicos. A primeira em 1955, no Rio de Janeiro e, a segunda no ano de 1956 em São Paulo. Para ministrar estas semanas que visavam a formação de professores para uma nova concepção de educação católica, Pierre Faure foi convidado para estar pessoalmente no Brasil e falar sobre sua pedagogia. Nesse sentido, este artigo analisa o relatório sobre as duas semanas pedagógicas promovidas pela AEC do Brasil que estão compiladas em uma única fonte impressa que trouxe a síntese dos conteúdos trabalhados por Pierre Faure, convidado especial do Centre d’Éstudes Pédagogiques de Paris. A análise desdobra-se em apresentar os temas trabalhados por Faure nas palestras de cada um dos dias, bem como identificar a maneira como estas semanas pedagógicas estavam sendo pensada pelos organizadores da AEC.

Em meados da década 1950, mais especificamente em 1955 e 1956, Pierre Faure foi convidado pela AEC para ministrar no Brasil dois cursos de formação para professores católicos. Estes cursos, que aconteceram no Rio de Janeiro no Colégio Sacré Coeur e, em São Paulo no Colégio Sion, tiveram por finalidade formar professores do ensino primário para um ensino católico renovador que pudesse acompanhar os discursos escolanovistas que se diziam representar a modernização para a escola pública, universal e laica. Em suma, a ideia das semanas pedagógicas organizadas pela AEC do Brasil era fazer avançar a discussão necessária sobre um novo ideário de Escola Católica no Brasil da década de 1950.

Semana pedagógica de 1955 no Rio de Janeiro

A primeira semana pedagógica ocorreu nos dias 8 e 12 de julho de 1955 no Colégio Sacré Coeur1, na capital do Rio de Janeiro, e foi ministrada por Pierre Faure. Esta semana de formação teve com objetivo oferecer aos educadores, principalmente aos educadores religiosos, a oportunidade de debaterem sobre questões relacionadas às perspectivas novas de Educação Católica. Por isso a semana foi dividia em cinco temas, trabalhados um a cada dia, foram eles: Condições de uma Pedagogia Cristã, Tomada de Consciência, A formação do Espírito, A formação religiosa nas diferentes idades e O despertar do sentido social. No primeiro dia, Condições de uma Pedagogia Cristã, Faure iniciou sua fala afirmando que o dever dos educadores era o de transmitir aos alunos o cristianismo verdadeiro, “ter esse fim em vista, e vivê-lo em nossa atividade”. (AEC, s.d., p.7). No documento publicado pela AEC (s.d.), Faure questionou se o sistema de educação corrigiria, de fato, os males aos quais os professores se queixavam. Diante disso, apontou para o fato de que a formação homogênea não atendia as necessidades próprias dos indivíduos, e que a reforma educacional pretendida pelos professores e educadores católicos deveria ser feita aos poucos e com discernimento.

Nessa perspectiva, o padre iniciou um longo debate sobre a necessidade de reformar o ensino por meio de novos métodos e se era esta a solução necessária para a educação, trazendo pontos negativos e positivos das mudanças nos métodos educacionais. Para ele, a mudança nos métodos por si só não era garantia de sucesso, bem como a adoção de um método sem bases filosóficas só por ter sido considerado bom. No entanto, todos os seres humanos, pertencentes de seu próprio tempo, recebiam influências específicas de cada contexto histórico que deveriam ser pensadas para a solução dos seus problemas educacionais. E uma forma autêntica de pensar sobre isso seria pesquisar os métodos que apresentassem uma forma autêntica e eficaz de educação. Como exemplo de método eficaz na educação, Faure fez referência à filosofia Santo Tomás de Aquino citando alguns dos seus conceitos básicos de educação:

O que é formar um homem? Nem o ver, nem o sentir, distinguem um homem do animal, mas a possibilidade que tem o homem de ser consciente: quando age, sabe que está agindo. Desde a infância o homem aprende a ser consciente, no jogo, no estudo, e em todos os seus atos. O que vale para o homem diante de Deus não é só agir, mas agir porque sabe, agir porque quer agir. Agir sobre si mesmo, desejando tornar-se melhor, é não se contentar de agir por agir, mas visar um progresso; tudo deve ser uma resposta a um chamado de Deus para o melhor. (AEC, s.d., p. 9).

Nesse sentido, para Faure um método ou uma pedagogia eficaz se assemelharia muito a pedagogia cristã que enfatizasse a necessidade da cooperação ativa e consciente da criança, no trabalho de sua educação. Assim, a atividade ativa da criança envolvia: a atividade interior, onde o educador levaria a criança a agir de modo consciente e voluntário e a pedagogia do esforço, ajudando a criança a examinar a própria consciência. A proposta de pedagogia assinalada por Faure não era a de oferecer uma pedagogia do sucesso, visto que o fracasso, para ele, poderia fazer parte do desenvolvimento dos alunos, assim como fazia parte do mistério da Cruz, trazendo consigo o valor espiritual do esforço realizado. No mais, finalizou o dia ressaltando que as condições daquele período direcionavam para a oferta de uma educação que desse aos alunos uma visão de futuro, o senso da família, da santidade do casamento, do dever sublime de educar os filhos. Com isso, os professores precisariam preparar as crianças para uma educação integral de espírito cristão, advertindo-as da ilusão de se esperar uma vida fácil, e preparando-as para aquilo que elas mesmas poderiam realizar no futuro.

No segundo dia Faure falou sobre a tomada de Consciência. Segundo ele, duas teorias poderiam educar os alunos para a tomada de consciência: a teoria funcional preconizada por Claparède e a teoria espiritualista de Ferrière. A primeira defendia uma educação que preconizava os órgãos dos sentidos, que seriam levados a agir por uma necessidade da natureza. Já a segunda preconizava a ideia do interesse que deveria iniciar-se nos alunos. Tais duas teorias precisariam andar juntas, visto que não se poderia educar sem o interesse e esforço dos alunos. Esforço que não era apenas energia física, como também energia vital. Seria preciso então, dar aos alunos motivos que fizessem com que eles agissem, suscitando não somente o interesse sensível, mas também o de ordem racional, radicando num ideal. O aluno consciente seria capaz de esforço e de ação, orientado para um ato objetivamente bom, isento das travas das paixões e dos instintos. Para Faure, o valor moral da ação estava na intenção que animava a consciência. Nesse sentido, os professores deveriam ensinar os alunos a tomada de consciência a partir da observação atenta. Somente assim eles conseguiriam encontrar o que era bom para si e para os outros. No final do segundo dia, na sessão Trabalho em Grupos, Faure, questionou os professores sobre como educar as crianças para a consciência, abrindo este tema para que pudessem se expressar e apresentar suas opiniões e perspectivas.

As respostas selecionadas e publicadas no documento da AEC (s.d.) foram que para educar para a consciência: a) os professores precisariam ensinar os alunos a compreenderem o sentido da ordem e o seu por que, designando cada um o seu lugar, fazendo-o responsável pelos seus objetos, sua carteira e seu material; b) atribuir notas ou pontos aos alunos pela manutenção da ordem, objetos, lugar e trato com as pessoas; c) referir-se em momentos oportunos, ao respeito devido aos objetos dos outros alunos, utilizando-se de conversas e debates entre os próprios alunos; d) combater a transcrição de trechos sem a devida referência, as correções descuidadas, a falsificação de notas; e) não ser exigente demais para as filas, lembrando os alunos que é o respeito à Escola que constitui a disciplina e que, portanto, a fila pode ser um aspecto deste respeito; f) proporcionar oportunidades aos alunos de arrumarem um senso artístico para as classes trazendo, por exemplo, um jarro de flores como decorativo; g) realizar maratonas com os alunos e h) utilizar cadernos de correspondência com as famílias. Além destas indicações aparece, por último, a necessidade de dar as crianças responsabilidades pessoais e sociais, criando o hábito de conduzi-las para a consciência e para a vida espiritual pessoal.

O terceiro dia foi a vez do tema sobre Formação do Espírito. Neste dia, Faure iniciou comentando que o essencial não era transmitir conhecimento aos alunos, mas sim um método. Para ele, o essencial era dar aos alunos um método de trabalho para que eles mesmos pudessem buscar o conhecimento em livros e documentos. Com isso, o método formaria o espírito do aluno para que aprendesse a trabalhar por si, adquirindo a possibilidade do trabalho pessoal e se enriquecer. A formação do espírito deveria ser feita por meio do trabalho pessoal, que se daria através da pesquisa pelo próprio esforço e da instrução. Nesse esforço para que os alunos chegassem a um trabalho pessoal, os professores não deveriam temer a aparência de tempo perdido. O espírito se formaria pouco a pouco e com o tempo surgiriam os frutos. Para auxiliar o trabalho pessoal seria preciso também apresentar aos alunos a ideia de diretriz que seria, em poucas palavras, uma exposição a respeito do trabalho de anotação e organização, procurando encorajá-los e estimulá-los as produções independentes. Feito isso, os alunos deveriam assimilar o seu trabalho como seu, traduzindo o escrito por palavras, vivendo uma mística da matéria e criando um centro de interesse em torno das disciplinas.

No momento do trabalho em grupo, destinado a abertura do diálogo junto com os professores presentes, Faure questionou se os alunos se interessavam pelo trabalho escolar. Na ocasião, as respostas publicadas variaram sendo que alguns responderam que raros alunos se interessavam verdadeiramente pelo estudo, em detrimento da sobrecarga das matérias e da extensão dos programas. Outros responderam que esse interesse poderia ser estimulado pelos próprios professores, daí a necessidade que tinha os responsáveis pela educação de se esforçarem para estabelecer este jogo de interesses em sala de aula. Questionados sobre a natureza de trabalho pela qual os alunos se interessavam, os professores responderam que eram os que geralmente exigiam menor esforço intelectual, tais como desenho, parte experimental das ciências, literatura nacional e línguas. No mais, sobre os trabalhos formativos, os professores responderam que, sem dúvida, eram os trabalhos relacionados às matérias religiosas e morais, e a matemática e o latim, visto que estimulavam os alunos ao exercício da reflexão e raciocínio. Também a redação em suas diferentes formas e diversos assuntos, por exigir um espírito de observação, lógica de ideias e ordem de disposição. No mais, as línguas materna e estrangeira, que deveriam ser estudadas em profundidade e não reduzidas simplesmente a alguns vocabulários ou arranjo de frases. Entre os meios considerados necessários para se atingir estas formações foram citados os seguintes recursos metodológicos: palestras, quadros, visitas a museus e excursões em grupos especializados.

No quarto dia, o tema sobre a formação religiosa nas diferentes idades levantou a questão da necessidade que esta tinha não somente de instruir, como de fazer viver o que se ensinava, a partir de uma base objetiva. Deste modo, para que esta formação ocorresse de forma positiva na vida prática dos alunos, os professores deveriam pensar estratégias diferentes de rezar a missa, por exemplo, tais como retiros, trabalhos ao ar livre e em meio a natureza e etc. Assim, ao dar instruções para os alunos os professores procurariam também aplicá-las a vida prática, ajudando a criança a “viver cristãmente, falar-lhe familiarmente de Nosso Senhor e, através da liturgia, mostrar-lhe as verdades cristãs fundamentais: Advento, Natal, Epifania, Páscoa, Pentecostes, etc”. (AEC, s.d., p. 25). Para isso, a escola deveria fortalecer o movimento litúrgico, ligando o ensino à vida cristã, e a vida cristã à vida profana, sendo a formação religiosa pensada a partir das idades. Na pré-escola, por exemplo, não se poderiam impor longas orações as crianças, antes que elas tivessem compreendido a quem se dirige. Já no ensino primário e elementar seria necessário proceder à normalização, para que os alunos compreendessem que existia uma ordem exterior a eles e penetrasse pessoalmente no domínio da consciência.

Nesse sentido, como caminho para uma formação religiosa mais vivencial, Faure diferenciou o que seriam orações compreendidas e orações vividas. Para ele, a comunicação de uma verdade religiosa deveria representar a vida. Por isso, não se deveria começar pelas tradições religiosas e a bíblia precisaria ser introduzida desde os primeiros anos até que o papel dos personagens religiosos conduzisse as crianças a uma iniciação progressiva da missa. A formação religiosa poderia então iniciar com a apresentação de personagens bíblicos, levando os alunos a interessar-se pela história bíblica na medida em que conhecesse também a história profana, “Por exemplo: quando se fizer um estudo da história profana mostrar-se-á a transcendência do povo judeu sobre outras civilizações mais avançadas materialmente, especialmente o Egito”. (AEC, s.d., p.28). Para finalizar este dia, no documento publicado pela AEC Faure sinalizou aos professores quanto ao lugar e o papel do catecismo na educação escolar que deveria ser acompanhado de um despertar do sentimento religioso antes da recitação de cor de várias literaturas e dogmas. Para tanto, o professor poderia dar uma ideia central do texto religioso e propor aos alunos a discussão em comum, solicitando aos alunos um caderno de religião que poderia abarcar resumos das aulas, ilustrações e etc. sobre os fundamentos religiosos ligados aos temas humanos, tais como o amor, a natureza, a morte, entre outros. Tal feito formaria uma sensibilidade cristã nos alunos e possibilitaria uma educação cristã em conjunto da educação escolar.

O despertar do sentido social como tema do quinto dia foi discutido por Faure de maneira a fazer críticas em relação ao comunismo no documento publicado pela AEC (s.d.) Faure suscitou que o comunismo não tinha um espírito social. Por isso que o despertar do sentido social não teria como base esta teoria, sendo por sua vez, necessário que os professores ensinassem esta formação aos alunos levando em consideração as seguintes observações:

Há alguns anos aqui, como em toda parte, a palavra social era sinônimo de socialista. A palavra mesmo não era aceita- o homem social era o homem perigoso. Hoje ela está na moda. A palavra facilmente toma colorido político ou filantrópico. E, no entanto, tem uma amplitude bem maior. Pertencer a diversas obras não significa sempre ter espírito social ou senso social. Há pessoas que sob esses títulos pomposos, escondem uma falta de autêntico espírito social. Devemos denunciar, corajosamente, estas dificuldades. A coisa em si mesma é simples. E por ser simples é difícil. Ser social é simplesmente viver em sociedade. O homem não pode viver sozinho. Enquadra-se, forçosamente, na vida organizada da sociedade. Mas há modos diferentes de se viver em sociedade. Primeiramente explorando os outros. A vida romana, por exemplo, tinha muitas instituições fortes, muito bem organizadas, mas de que viviam? Da energia do escravo, tristemente explorado pelos senhores que lhes proporcionavam meios de vida, mas de que vida! Foi essa organização que fez desmoronar a cidade antiga, fenômeno observado nas outras civilizações pagãs igualmente. (AEC, s.d., p. 30).

Tendo como base estas observações para a formação social, Faure defendeu que esta composição fosse direcionada a um mínimo de vida social, onde os deveres de justiça e caridade entre os indivíduos, uns em relação aos outros, fossem ressaltados. Os deveres dos indivíduos em relação ao grupo incluiriam as responsabilidades dos alunos em relação à família e a escola. A noção do dever, da responsabilidade era o que constituía o sentido social na visão de Pierre Faure. E essa noção poderia ser observada em diferentes grupos, nas paróquias, nas congregações, nas diferentes classes, nações, raças. A ideia do dever seria característica essencial do social e possibilitaria aos indivíduos lidar com as diferentes formas de ser, de agir, de se vestir e de pensar intrínsecas aos grupos. A noção exata do dever desenvolveria o hábito e o senso social.

Com isso, na vida coletiva da escola, formar os alunos para o social, equivaleria dizer formá-los para uma sensibilidade do social, onde “[...] um outro existe comigo. E antes de agir eu perguntarei: não o estarei incomodando? Será agradável para o outro o que eu faço? Se não procedermos assim seremos mal-educados, não teremos senso social”. (AEC, s.d., p. 35). Nesse sentido, a vida escolar ofereceria uma série de possibilidades para formar os alunos a pensar no coletivo, direcionando-os a percepção de que o outro existe, visto que a sala de aula seria a soma de muitos alunos. Desta forma, cada aluno estaria implicado a responsabilizar-se pelo espírito coletivo, participando da vida em grupo. Todos e cada um dos alunos constituiriam então uma unidade comunitária e uma consciência do bem comum. A tomada de consciência da existência do próximo e de suas relações com ele deveria se iniciar na escola. Assim, se na escola a criança adquirisse esta percepção, isso a ajudaria mais tarde na sua profissão e nas relações de grupo, de forma a alcançar a compreensão de que era preciso trabalhar não só para si ou para ganhar dinheiro, mas também trabalhar com os outros, pensando no bem comum de todos.

No entanto, a formação do sentido social exigiria de todos os envolvidos um altruísmo pessoal, onde os interesses do grupo deveriam prevalecer sob os individuais. Seria necessário compreender que as diferenças eram um bem enriquecedor da sociedade e que precisaria ser respeitado como tal, desde que não contradissessem o bem comum. A vida social exigiria harmonia dentro da diversidade existente, dentro dos meios de colaboração. Feito não realizável, por exemplo, nos regimes totalitários. A vida social levaria a auxiliar a todos a atingir a verdadeira dimensão humana e a despertar o sentido de solidariedade na consecução dos fins que lhes são próprios. No mais, as escolas seriam laboratórios de vida social. Ateliers onde se forjariam os primeiros ensinamentos sobre o espírito social, tão necessário para a vida em sociedade. “Se na Escola não se fizer uma experiência da verdadeira vida social, como esperar que ela seja vivida mais tarde, fora da escola?” (AEC, s.d., p. 37). Tal feito não poderia ser alcançado de forma isolada, seria preciso que os professores pensassem nesta formação para a vida coletiva junto aos alunos. No mais, foi feito questionário para os professores sobre quais atitudes dos alunos manifestavam ausência de senso social e as respostas variaram, sendo que as publicadas diziam sobre o isolamento e a negação nos movimentos de conjunto ou interesse pelos colegas como características desta ausência do social.

Ao final do dia, o palestrante Faure concluiu o tema do último dia afirmando que ao invés de se falar em formação cristã seria necessário dizer sobre formação social, visto que estes dois termos significavam a mesma coisa mesmo que tivessem nomes diferentes. Além do mais, a formação social poderia existir sem sentido cristão, mas o cristianismo não existia sem sentido social. Com esta ideia, pode-se afirmar que o padre defendia a formação social com base no cristianismo e o catecismo do evangelho. A base da formação para o sentido social defendida por Faure e publicada no documento da AEC encontrava suas bases em:

Dar sentido ao “outro” significa ensinar o segundo mandamento. Consideramos a resposta de Nosso Senhor ao Doutor da lei que lhe perguntava: “Qual é o maior mandamento?” Sua resposta foi “Amar a Deus, e o segundo mandamento é inteiramente semelhante ao primeiro: amar ao próximo como a si mesmo”. Se esqueço que tenho um próximo o primeiro mandamento tornar-se impossível de ser praticado. Quanto mais uma alma ama a Deus, mais se volta para o próximo. Dar sentido do outro, significa ensinar o Dogma da comunhão dos Santos. Somos unidos uns aos outros, participando da vida de Deus, na mesma sociedade: a Igreja. Não se pode pertencer a Igreja sem ser filho de Deus, e consequentemente sem ser solidário com o “outro”. É preciso ter consciência disso e viver essa verdade. Dar sentido ao outro, leva-nos à Santíssima Trindade, como Nosso Senhor a revelou. Deus não é do egoísmo. Deus é trindade. Há três pessoas diferentes, distintas, uma voltada para a outra, pondo em comum tudo o que existe na Sua Natureza Divina. Amam-se de tal modo as pessoas que não são mais que UM. Nós que somos a imagem de Deus, faremos resplandecer esta imagem, na medida em que respeitarmos as diferenças que nos separam. O Espírito Santo inspirador, chama-nos, ama-nos, faz-nos respeitar a natureza dos próximos. O amor verdadeiro traduz-se em serviço aos outros, em benefício do próximo. É impossível ser verdadeiramente cristão sem desenvolver o espírito social. Onde há cristãos surgem comunidades. A história das Comunidades é a história da própria Igreja. (AEC, s.d., p. 40).

A semana pedagógica de 1955 reuniu vários professores que formaram grupos de trabalho para discutir e dialogar sobre os temas diversos. Nesse sentido, foram publicadas as conclusões gerais do evento com base nas perspectivas de alguns dos docentes presentes que afirmaram a necessidade que foram (AEC, 1955): obter dos alunos um esforço consciente; a necessidade de o educador ter como objetivo final a educação cristã, de elaborar regulamentos, escolher métodos e aperfeiçoá-los; apresentar as práticas escolares de forma que elas pudessem ser vividas pelos alunos não somente na escola, mas em casa; tratar as questões urgentes relacionadas ao âmbito escolar nas reuniões de professores, de forma a reconhecer e a trabalhar estes temas também nas semanas pedagógicas, nas reuniões periódicas da AEC. Tal feito demonstrava o desejo desses professores de continuar a participar dessas semanas caso continuassem sendo organizadas em outros anos. Também como conclusões finais da semana de formação vivenciada, os professores (AEC, s.d.) comentaram sobre a necessidade de introduzir em suas práticas cotidianas o trabalho de formação para o senso social dos alunos, procurando conhecer e viver cada vez mais a pedagogia evangélica.

A pedagogia do Evangelho, segundo o documento (AEC, s.d.) teria como fundamento amar cada criança para auxiliá-la a aperfeiçoar-se como Jesus fez com seus apóstolos. E estava explicitada em alguns trechos do Evangelho, nas passagens que contavam as histórias de João Batista, Formação dos Apóstolos, Tentação de Jesus no deserto e Multiplicação dos pães. Assim, comparando a vocação do educador com as passagens de João Batista que demonstram ele preparando o caminho para Jesus, os professores dariam testemunhos de busca, descoberta pessoal e sacrifício. Busca e pesquisa como sinais de humildade, visto que “Eu não sou o Mestre. Ele está no meio de vós”. (AEC, s.d., p. 42). Descoberta pessoal porque “Aquele é o Cristo” (AEC, s.d., p. 42), sendo assim os professores deveriam dar aos alunos a certeza da descoberta. E testemunho do sacrifício porque assim como João Batista preparou os discípulos e entregou-os ao mestre, os professores deveriam diminuir para que os alunos crescessem, não sendo obstáculos para eles, mas degraus. Já os trechos de Jesus na formação dos apóstolos demonstram que o Mestre não faz discursos ao primeiro contato com os discípulos, em respeito as suas almas. Nos relatos do evangelho sobre isso poderia ser retirada a ideia de que Jesus não força a aprendizagem dos apóstolos, mas espera que eles manifestem o desejo de aprender e querer se tornar melhores. Já o relato evangélico da tentação no deserto demonstraria sobre as tentações humanas que desejavam que as coisas fossem mais fáceis, que houvesse vantagens ou atalhos na construção da obra educativa, também sobre a tentação do prestígio que sacrificaria os interesses do aluno, esquecendo que o modelo educativo é sempre manso e humilde. Já a tentação da autoridade, que buscaria ensinar pelo exterior, não estimulando convenientemente o trabalho pessoal dos alunos. Por último, o trecho do evangelho sobre a multiplicação dos pães demonstrava a compaixão de Jesus e dos apóstolos pela multidão que passava fome. Com isso, este trecho ensinava sobre como o sentido de generosidade (o verdadeiro pão da vida) despertaria novas energias e até a multiplicação dela. Em suma, o relato do evangelho sobre a multiplicação dos pães demonstrava que haveria uma profunda conexão entre o Evangelho e a pedagogia cristã.

A Semana Pedagógica de 1955 (AEC, s.d.) trouxe temas relacionados a pedagogia cristã. Nessa direção, a discussão dos temas foi proposta em cinco dias, de forma a apresentar aos professores brasileiros as correntes pedagógicas e teorias católicas que poderiam se misturar e formar um novo método de educação para crianças de diferentes idades, da idade pré-escolar ao ensino secundário. Foi possível observar a iminente preocupação do palestrante Pierre Faure de demonstrar aos professores a possibilidade de uma prática educativa ancorada no evangelho e na pedagogia cristã. Desta maneira, no documento publicado pela AEC (s.d.) Faure citou tanto teóricos da pedagogia moderna como Ferrière e Claparède como trechos do Evangelho na tentativa de demonstrar aos professores que estas duas teorias poderiam andar juntas, o que formaria uma nova pedagogia católica. Na construção de uma prática pedagógica renovadora ancorada nos preceitos católicos, o orador apresentou tanto as teorias, como as técnicas e as metodologias que poderiam ser alcançadas na formação da vida cristã dos alunos. O que significava formar jovens e crianças que, respeitadas em suas necessidades educativas seriam capazes de trabalhar em grupo, cooperando com o coletivo. O tema da formação social demandou maior número de páginas no documento, o que demonstra a preocupação do palestrante em formar alunos para o coletivo, para a vida em sociedade por meio da educação religiosa, mais especificamente cristã e católica. Ademais, os professores presentes também receberam espaço para a discussão em cada um dos dias, trazendo perguntas e respostas, propondo novas perspectivas para a análise dos temas em questão.

Semana pedagógica de 1956 em São Paulo

A segunda Semana Pedagógica ocorreu nos dias 22 a 29 de julho de 1956 no Colégio Sion de São Paulo. Mais uma vez foi Pierre Faure quem conduziu as sessões dos dias reservados para a formação de professores católicos brasileiros. Cabe mencionar que o Colégio de Sion, de São Paulo, foi fundado por uma congregação francesa, em 1901. No bairro de Higienópolis, tornou-se um colégio tradicional e sua filosofia era desvendar os preceitos republicanos, tanto na estrutura quanto na postura das alunas, valorizando a disciplina e a formação moral da elite paulistana. Em seu projeto de colégio confessional feminino, o público-alvo eram as meninas de elite para a formação de futuras mães e esposas. A educação oferecida ressaltava uma perspectiva do cuidado junto com a preservação dos valores cristãos, da disciplina e da moral. (ACHNITZ, 2008). A educação feminina católica era o principal pressuposto norteador da fundação do colégio, que recebeu em meados da década de 1950, Pierre Faure para conhecer sobre suas perspectivas de pedagogia cristã.

O primeiro dia de formação foi sobre o Ensino Cristão. No documento publicado pela AEC (s.d.), Faure iniciou sua fala indagando os presentes se o ensino formava verdadeiramente os cristãos. Segundo o padre, professores sozinhos não educavam, visto que a escola e a sociedade no geral também tinham grande influência na educação dos alunos. Por isso, trabalhar com educação significaria ir além da ideia de que a figura central era o professor para um trabalho em conjunto, visto que isso traria maiores resultados. Com isso, a defesa de que os alunos deveriam falar mais, se expressar e comunicar as suas ideias, pois na medida em que sua fala precisasse ser construída, assimilaria melhor o conteúdo. O ensino cristão seria aquele que preconizava a natureza integral da criança não negligenciando, portanto, a formação pessoal do educando. Desta forma, seria necessário começar a pensar então em pedagogia cristã que prescrevesse a participação pessoal ao mesmo tempo da participação comum. Esta pedagogia cristã que, respeitaria a natureza do homem, ensinaria os alunos a capacidade de refletir e de julgar os conteúdos encontrados nos livros, alimentando o seu espírito e sua ação. O essencial não era apenas o ensino de conteúdos escolares em si, mas a formação do espírito por meio do ensino.

Nesse sentido, a formação do espírito deveria se dar por meio de noções internas que tornariam os alunos capazes de aprender. Significaria formar os alunos internamente, através da interiorização e do silêncio. “É no silêncio que vão encontrar a si mesmos”. (AEC, s.d., p. 52). Entretanto três dificuldades poderiam ser encontradas para esta formação: a primeira de procurar atingir o total de alunos, sem negligenciar nenhum. A segunda, do tempo curto para desenvolver programas extensos e a terceira a dispersão dos alunos. Com isso, os professores deveriam criar na escola um ambiente de calma e concentração do espírito, buscando oferecer atividades que almejassem o equilíbrio entre corpo e mente, visto que “É a unidade e não a dispersão que traz o equilíbrio”. (AEC, s.d., p. 53). Esse trabalho interior viria da consagração a um ideal, a uma divindade, por isso a necessidade de uma educação cristã que defendesse o desenvolvimento da consciência e da generosidade dos alunos. No mais, em resposta a pergunta se o ensino formava verdadeiramente os cristãos, algumas críticas a respeito da educação católica foram feitas, dentre elas a de que o ensino religioso era, muitas vezes, ainda muito formalista; que se dava menor importância ao estudo da religião do que de outras disciplinas; que o estudo da religião não formava para a vida, não proporcionava o contato com Deus, daí a falta de convicções religiosas. Como contraponto a estas colocações foram apontadas as seguintes sugestões: “[...] professores especializados de religião, principalmente para Cursos Superiores. Sugeriu-se também a criação de um curso especial de religião para adaptar os alunos novos ao nível da classe. Acentuou-se principalmente, a necessidade do contato pessoal entre mestres e alunos.” (AEC, s.d., p. 56). No mais, a educação cristã poderia se dar por meio da abnegação e domínio de si, sentido de esforço, formação de lealdade, e das matérias de literatura, história, geografia, ciências e línguas.

O tema sobre a escolha dos Métodos e Técnicas de Ensino foi trazido como eixo das discussões para o segundo dia de conferência. Nessa direção, os critérios verdadeiros para essa escolha seriam: “O que torna a criança mais adulta, mais consciente, mais responsável, mais capaz de ação e de ideal. O que interioriza a criança e a torna mais profunda. O que fomenta o verdadeiro bem da criança; como Deus, a sociedade, os Pais e ela mesma”. (AEC, s.d., p. 59). Nesse sentido, o padre defendeu que era tarefa dos professores na tarefa de escolha dos métodos considerar as fases do desenvolvimento dos alunos, bem como os meios essenciais para atingi-lo. Assim, para uma criança de idade dos 3 aos 5 anos, caberia aos professores escolher um método que levassem em consideração a aprendizagem pela imitação e repetição, sentidos e mobilidade. Já um aluno de 5 a 7 anos seria interessante observar quais métodos ou técnicas possibilitaria a criança se situar no espaço e tempo, que a levaria a consideração de si própria, passando das atividades externas para a interna. A fase do desenvolvimento dos 7 aos 9 anos seria aquela em que as crianças se afirmariam física e intelectualmente. Seria a idade da objetivação exterior, “Daí o interesse por mapas, tecelagens, coleções etc.” (AEC, s.d., p. 59). Por isso, os professores poderiam optar por métodos e técnicas que privilegiassem os conteúdos apresentados por classificações.

A idade que compreenderia dos 12 aos 15 anos demonstraria potencialmente um novo período de interiorização, onde o aluno se sentiria em oposição em relação aos outros alunos ou adultos, “Sentem-se enigmas para si próprios” (AEC, s.d., p. 59). Por isso, os professores precisariam optar por métodos e técnicas que transmitissem segurança, confiança e afetividade e, sobretudo, as vantagens do esforço, motivando os alunos em direção a um ideal. Por último, dos 15 aos 18 anos, “seriam mais que adolescentes” (AEC, s.d., p. 60), portanto nessa fase os alunos teriam a curiosidade de saber sobre a razão das coisas em seu conjunto. Seria a idade da metafísica propícia ao estudo da razão, da filosofia e da descoberta das coisas. Por isso, a necessidade dos professores de situar a matéria dentro de um contexto geral, estimulando os alunos a atingirem tanto a síntese como a globalização. No mais, em todas as fases do desenvolvimento seria necessário que os professores buscassem tornar os alunos mais maduros, tratando-os como pessoa e não como número com suas responsabilidades e liberdade progressiva. A sugestão de método proposta por Faure foi do método socrático para as aulas de filosofia e religião. Em resumo, também caberia aos professores maior contato pessoal com os alunos.

No terceiro dia, foi levantado o seguinte questionamento: “Como criar condições psicológicas favoráveis ao ensino?” (AEC, s.d., p. 61). No documento, Faure comentou sobre a necessidade de abandonar a ilusão de que ao falar o professor seria compreendido. Para o padre, seria necessário criar antes disso, um ambiente favorável que permitiria ver as coisas. “Exemplo: Na criança agitada nada penetra, pois, ou não ouve ou não presta atenção e nada aprende. É preciso que ela preste atenção, uma atenção tanto interna como externamente” (AEC, s.d., p. 61). Com isso, desde o primeiro dia de aula seria preciso deixar os alunos falarem para que até os mais tímidos se sentissem em casa e adquirissem respeito pela escola. Essa integração específica do primeiro dia de aula do aluno na ordem do ambiente escolar seria uma preparação para as atividades de normalização que viria a seguir. Além desta, Faure também sugeriu que no primeiro dia de aula os professores não falassem sobre o programa, nem explicassem sobre as lições, mas recebessem os alunos individualmente, aplicando exercícios de sondagem no intuito de verificar o nível do desenvolvimento de cada um. Isso porque, o primeiro contato dos alunos com os professores seria decisivo para saber se este se deixaria dominar pela classe ou teria uma atitude controlada, “nunca mostrar mau humor, ser de tal maneira calmo que se acalmem os agitados e se encoraje os tímidos”. (AEC, s.d., p. 61). Nessa perspectiva, a classe ideal teria a quantidade de 30 alunos, sendo importante ao professor ajudar os alunos a desenvolverem uma atitude de autocontrole. O professor deveria formar o aluno para se controlar e controlar o seu próprio trabalho, visto que a aula nunca terminaria e continuaria sempre pelo trabalho pessoal e intelectual do aluno.

A noção de que a criança deveria assumir o próprio trabalho teria com objetivo ajudar a criança a perceber e a corrigir os seus erros, permitindo-lhe recomeçar de novo. Como exemplo de atividades práticas, no documento publicado pela AEC, Faure sugeriu:

1. Procurar no dicionário, no livro. Dar a criança o hábito de controlar ele mesmo o seu trabalho pela auto-crítica. 2- Há casos em que a criança não é capaz de descobrir os erros. Preparar então, ao lado dos exercícios perguntas e respostas. Quando se trata de língua não é suficiente dar a resposta material, mas é necessário relacioná-la. 3- Fazer a criança ser controlada por outra. Isso é excelente, unindo ao trabalho pessoal o confronto com o dos outros. O mestre reservará seu tempo para coisas mais importantes, por exemplo, casos particulares, preocupando-se sempre com a progressão nas dificuldades apresentadas. (AEC, s.d., p. 63).

Além destas sugestões, a questão da afetividade apareceu como um dos pontos centrais nos discursos faurianos. Para ele, o problema da afetividade era real, visto que somente através de um clima afetivo é que o espírito e o ânimo predominariam. O clima afetivo favorável deveria prevalecer tanto entre professores e alunos como dos alunos entre si. Outro ponto debatido por Faure nesta sessão foi sobre a colaboração dos pais na educação dos filhos. A relação da família com a escola colaboraria não só com o desenvolvimento dos alunos, mas também com a verdadeira concepção cristã. No mais, ao buscar responder a questão inicial do terceiro dia, Faure assinalou a importância dos meios de autocontrole que ajudariam a criança a adquirir por si mesma a autocrítica como atitude de apreciação dos próprios valores e de contribuição para o desenvolvimento de um espírito solidário.

O tema do quarto dia foi sobre como criar condições favoráveis para a Formação Social e Cristã que, de acordo com a perspectiva fauriana, passaria por empregar materiais didáticos que estimulassem os alunos a raciocinar e a refletir, “É o material um meio, cujo fim é dar trabalho ao espírito”. (AEC, s.d., p.66). Nesse sentido, criar um ambiente com a disposição de materiais didáticos era importante, mesmo para as crianças de menor idade, visto que os materiais, ao por o espírito em ação (corpo, memória e imaginação) orientariam a criança desenvolver capacidades de julgar e refletir. Os materiais trariam consigo, “Por exemplo: comparações com o que já tinham visto. Noção de maior e menor, categorias gramaticais, valor, sentido, etc.” (AEC, s.d., p. 66). Entretanto, não bastaria dispor os materiais para que as crianças agissem. Seria necessário também prever objetivos a serem alcançados com cada material. Tais objetivos deveriam ser explicados as crianças que, após compreender a sua razão, faria ela mesma, por conta própria a manipulação do material, “agindo por iniciativa, sem capricho”. (AEC, s.d., p. 67). No mais, o método de Montessori foi citado na palestra de Faure como um excelente indicador para um ensino que partia do simples para o complexo, onde a criança - que tinha como prerrogativa natural de personalidade a inciativa- compreenderia pouco a pouco o significado das coisas, chegando aos temas mais complexos.

Além da aprendizagem pelo sensível, pelo uso e manipulação dos objetos, outra condição para a Formação Social e Cristã era a organização do ambiente da sala de aula. A disposição das carteiras e/ou cadeiras em círculo foi apontada como benéfica, pois isso facilitaria o trabalho coletivo colocando todos no mesmo nível para atividades que envolviam os debates dirigidos, o auxílio mútuo e a autocrítica. Esta profundamente formativa e capaz de formar seres conscientes. Ao utilizar o espaço físico desta maneira, os alunos passariam a transitar livremente, porém exercendo seus deveres de arrumação e limpeza da sala. Além disso, a disposição em círculo possibilitaria aos alunos se verem em relação ao outro, orientados pela crítica construtiva e pelo espírito da solidariedade sadia na construção dos seus próprios valores. “É a arrumação da sala um modo de descansar o espírito e o corpo”. (AEC, s.d., p. 69). Adicionado a isto, era preciso dar incumbências diversas as crianças variando as funções e diferentes atividades como: jogos, passeios, visitas, auxílio aos que precisassem de ajuda, grêmios, e etc., para que fossem aprendendo aos poucos a assumir responsabilidades sociais. A ideia era de que:

A grande equipe é a classe toda onde cada um presta serviço. Isto compreendido não será preciso insistir para que os alunos vivam a doutrina do corpo místico. É a vida cotidiana que forma e não a mera docilidade de um dia de melhor disposição. Só se serve na medida em que é capaz de servir. É a noção inteiramente cristã: “Não agir só para si, mas para os outros”. (AEC, s.d., p. 70).

Como ressaltado no curso do ano de 1955 no Rio de Janeiro, a formação social defendida por Piere Faure tinha estreita relação com o cristianismo, visto que o verdadeiro cristão seria aquele que teria desenvolvido o espírito social e que “A história das Comunidades é a história da própria Igreja”. (AEC, s.d., p. 40). A formação social proposta por Faure estava embasada no dogma da Trindade - no qual Deus era Pai, Filho e Espírito Santo, ou seja, três pessoas - e na passagem de Jesus Cristo com os doutores da lei que lhe questionaram sobre o maior mandamento divino: “Amar a Deus, e o segundo mandamento é inteiramente semelhante ao primeiro: amar ao próximo como a si mesmo”. (AEC, s.d., p. 40). A formação social estaria acoplada à formação cristã oferecida nas escolas, sendo o cristianismo formador do sentido social. Como conclusões finais deste dia, o padre elencou que as condições favoráveis para uma Formação Social e Cristã perpassavam pela oferta de um trabalho escolar cuja motivação não fosse egoísta, pela capacidade de organização do auxílio mútuo dentro da classe, onde os alunos mais avançados ajudariam os mais necessitados, por dar um sentido de comunidade aos atos religiosos e às orações e por estimular os alunos a se encarregarem das atividades de responsabilidade, tais como limpeza do chão da sala de aula, prestar ajuda, entre outras.

No quinto dia de seminário, Faure trabalhou com o assunto da Aprendizagem do Esforço e o Sentido da Cruz. Nesse sentido, a primeira lei seria a da organização do esforço como meio de conduzir os alunos para o verdadeiro sucesso, “Pela correta pedagogia cristã, o que queremos antes de tudo é a formação da consciência, e que a formação da consciência se faça, através de todas as atividades escolares.” (AEC, s.d., p. 72). Isso significaria que os ensinamentos de vida comum deveriam ser incorporados às disciplinas de ensino com o objetivo de despertar e formar a consciência, obtendo da criança o esforço consciente. Essa atitude, da criança colocar-se em ação por meio de uma atividade interior, por meio do seu próprio esforço consciente seria primordial para um trabalho de aperfeiçoamento individual e constitutivo do comum, o que foi chamado no documento publicado pela AEC de pedagogia do esforço. O esforço seria essencial para a realização de um trabalho interior que levaria a criança ao progresso moral e ao aumento da capacidade psicológica. Desta maneira, o esforço conduzido a um objetivo de valor que não poderia ser de si para si e deveria ultrapassar o interesse pessoal do aluno como, por exemplo, a caridade, a concentração, a vontade e etc., o que o tornaria um ser de sucesso. O esforço e o sucesso andariam juntos, sendo aquele estimulado pelos professores a depender: da quantidade de horas do dia - sendo as da manhã mais favoráveis do que as da tarde, das refeições que poderiam tornar o espírito lento e o corpo pesado, bem como as épocas do ano em que o esforço é sempre mais difícil. Em síntese, na primeira lei sobre a Aprendizagem do Esforço e o Sentido da Cruz, o esforço deveria ser organizado a partir do nível do desenvolvimento e o ritmo de vida dos alunos.

A segunda lei seria a da maturidade, esta que seria o equilíbrio entre os períodos de aceleração e estabilidade. Desta maneira, assim como havia períodos de aceleração e estabilidade nas etapas do crescimento físico, o mesmo se daria para o desenvolvimento mental. Por este motivo, os progressos não se dariam de maneira regular e horizontal, mas por patamares. Em outras palavras: “Os sucessos só aparecem depois de certo tempo de experiências, avanços e recuos, de esforços múltiplos de luta que parece desproporcionada, considerando o esforço feito em determinado momento”. (AEC, s.d., p. 74). Para tanto, os professores não poderiam exigir dos alunos resultados imediatos e deveriam respeitar seus períodos sensíveis, fisiológicos e de maturidade. Os professores precisariam colocar os alunos nas melhores condições para que pudessem produzir o seu melhor esforço, compreendendo-os, amando-os, e dando-lhes orientações em tempos organizados. Respeitando com isso, as leis da maturidade. Entretanto, para que esta lei se produzisse no cotidiano escolar, os professores precisariam estar atentos para as ocasiões em que poderiam dar aos alunos a oportunidade de adquirirem com o próprio manejo pessoal as novas noções. Isto equivaleria dizer dar aos alunos exercícios curtos para que se esforçassem, fazendo uso da lição, resolvendo problemas e assuntos sem se referir unicamente as explicações da classe. O tempo seria o fator indispensável para a maturação. Essa maturação das noções intelectuais só terminaria quando a noção se tornasse coisa familiar, estudada sob todos os aspectos e conteúdo aprendido entre as noções que o aluno já sabia. O professor seria o que estimularia o aluno a realizar este trabalho, dando o tempo necessário para que os alunos fizessem a assimilação, ou seja, a maturação dos novos conteúdos aprendidos.

No sexto dia, o tema sobre o Papel da Emulação foi discutido por Faure com a intenção de levantar pontos positivos e negativos. O início da palestra foi destinado para coletar dados sobre o entendimento deste conceito o que, na visão fauriana, significava um meio de realizar progressos, “Não necessariamente todo meio que nos leva a ultrapassar os outros, mas todo o meio que nos leva a ultrapassar-nos a nós mesmos” (AEC, s.d., p. 80). Como exemplo, citou o esporte que era um meio de competição que não se tratava de passar na frente do outro, mas de melhorar o próprio resultado individual. Nesse sentido, a emulação pessoal, ou seja, a competição em relação a si mesmo seria “a marcha para o ideal”. (AEC, s.d., p.80). Defendida por Faure como uma condição natural da personalidade, a emulação praticada em sala de aula não poderia deixar de levar em conta também a natureza individual e social dos seres humanos:

Não somos capazes de tornar-nos ALGUÉM senão com o auxílio dos outros. Nascemos numa família, numa sociedade. A sociedade obriga a associação com outras famílias para a formação de uma sociedade mais ampla. Somos feitos à imagem de Deus que é TRINDADE. Não há personalidade sem natureza social, sem convívio. Isto é verdade mesmo em Deus: o que constitui cada uma das três pessoas divinas são as relações que têm as três divinas pessoas entre si. (AEC, s.d., p. 80, grifos no original).

O documento publicado pela AEC demonstra claramente a intenção de Faure em relacionar a competição com a imagem divina. Para o proponente, o desejo de progresso era um desejo inerente à condição humana e que, portanto, não poderia ser tirado. Entretanto, este aprimoramento e aperfeiçoamento maior só poderiam ser concretizados na medida em que as pessoas se relacionassem umas com as outras. Somente na relação de troca estabelecida entre iguais é que se cumpriria essa função. A emulação, ou seja, a competição teria um caráter social que permitia as pessoas realizar trocas de saberes, conhecimentos, ajuda, caridade e etc.

De outra parte, poderia haver uma emulação coletiva que reforçasse a vaidade daqueles que já estavam na frente, ou seja, daqueles que eram o objeto da competição. Esta seria contrária a emulação proposta por Faure no documento, visto que ela não proporcionava a cada um dos membros do coletivo a possibilidade de progredir cada vez mais, de se dirigir para um objetivo ou uma meta com a consciência de que todos poderiam chegar lá. Isso seria o que Faure chamou no documento publicado pela AEC de “espírito de equipe” (AEC, s.d., p. 81), onde todos teriam o desejo de chegar a meta, auxiliando uns aos outros. Este clima de entusiasmo favoreceria a todos, de maneira que o encorajamento e o exemplo de uns com os outros poderia bastar para criar o espírito de trabalho em equipe. Desta maneira, ao invés dos professores se preocuparem com as notas dos alunos, que não necessariamente indicariam satisfação do resultado, eles poderiam se preocupar em desenvolver uma atitude, um espírito de emulação que levasse os alunos a desejarem se aperfeiçoar e progredir. Em síntese, a emulação deveria estar voltada para a caridade, sendo algo que contribuísse para o bem comum do grupo.

O tema do sétimo dia, “Como pode o Ensino Formar para a Verdadeira Devoção” iniciou-se em forma de pergunta aos presentes. Para responder à questão, foi mais uma vez Pierre Faure quem conduziu a sessão dialogando com os professores a respeito do ensino religioso o que, na sua visão, “[...] é a síntese da vida humana”. Entretanto, para que o ensino religioso pudesse ser transmitido de forma a alcançar bons resultados, os professores precisariam saber estabelecer boas relações entre Antigo e Novo Testamento, entre a história da Igreja e a história sagrada, além de viver os sacramentos da Igreja, fazer orações e dar exemplos. Além disso, os professores precisariam conquistar a atenção e colaboração dos alunos para que pudessem assimilar esta formação moral, sendo toda informação oferecida um meio de contato entre a alma e Deus. Faure entendia importante esta formação nas escolas por acreditar que nas famílias, em geral, a orientação para a fé se dava de maneira automática e sem uma formação profunda. Além de que, em outras famílias a fé, muitas vezes, era explorada de maneira odiosa. Como conselho aos professores, Faure sugeriu que evitassem imagens e representações grotescas no ensino religioso, visto que a ideia não era conservar ideias errôneas sobre um velho barbado ou uma pomba, mas sim de aproximar as crianças de Deus de forma simples. Em outras palavras, “É preciso que, desde a infância, os alunos se compenetrem de um Criador de todas as coisas, mas que é amor”. (AEC, s.d., p. 88). Com isso, as noções de religião que se relacionassem com a natureza da criança (corpo, mente e espírito) seriam mais facilmente aceitas de maneira que a compreensão de atos e gestos litúrgicos se daria a partir dos sentimentos internos, em manifestação de respeito da criatura ao seu Criador.

Assim, a oração deveria começar com o corpo, com o gesto, e continuar pela palavra, devendo prevalecer o contato com Deus, com quem se fala através de uma elevação da alma. No momento dos primeiros encontros individuais da criança com Deus, caberia aos pais ensinar em casa as primeiras orações e à escola ajudar a fomentar este senso de Deus. A respeito do melhor horário para a lição de religião, o turno matutino foi apontado como sugestão, visto que seria necessário estabelecer antes calma e introspecção e quando possível “[...] um local próprio para a oração e que ao menos, na classe, um lado, um canto seja destinado à oração”. (AEC, s.d., p. 89). Além destas observações, seria necessário que os professores ensinassem ainda a devoção à missa como ponto central da religião, pois a ideia era contar com o trabalho pessoal dos alunos também nesta matéria, de forma a despertar o gosto e o interesse pessoal para este assunto. O ideal seria que os alunos participassem da missa não apenas como um mero assistente, mas como um cristão voltado para Cristo, para a Igreja e para o próximo.

Dando continuidade a este assunto, o tema do último dia da Semana Pedagógica de São Paulo discutiu sobre quais métodos corresponderiam ao ensino religioso e ao ensino profano. Tendo como premissa inicial de que “O ensino profano instruiu e se torna útil. O ensino religioso é um apêlo, reclama colaboração no presente e no futuro”. (AEC, s.d., p. 91), o método para o ensino de religião deveria se embasar na grande obra da Igreja, de esclarecimento e fortalecimento da razão humana. Nessa direção, a liberdade seria um grande bem da personalidade humana que faria dos seres humanos “a imagem de Deus” (AEC, s.d., p. 91) que se desenvolveria em sociedade pelo propósito divino da Trindade. O método para o ensino de religião poderia ser o dedutivo, tendo como ponto de partida a ideia de que os alunos deveriam ser deixados à sua razão para tirar, por indução, suas conclusões lógicas. Pelo método indutivo, o aluno poderia obter uma formação equilibrada através da edificação de seus próprios conhecimentos. Por meio de pequenos problemas, os alunos seriam orientados até que conseguissem chegar à ordem que seu próprio espírito conseguisse nos estudos. A vantagem deste método apontada por Faure nesta conferência era de que os professores não dariam aos alunos a falsa ideia de que possuíam a verdade, nem limitariam o trabalho interior da criança em busca da verdade, “Não devemos tolher o aluno, mas facilitar-lhe a conquista de um progresso” (AEC, s.d., p. 92). No mais, com o ensino da religião os alunos poderiam encontrar respostas para os problemas que iriam além do conhecimento natural, na segurança oferecida pela Igreja.

Já para as matérias ditas profanas, como por exemplo, história e geografia, o essencial seria que os alunos situassem as datas de acordo com os acontecimentos, sem deixar de lado a ideia de que estas eram matérias em constante movimento e de dinâmica viva. Em relação à gramática, o método seria o da análise lógica que nada mais era do que a relação entre linguagem e palavras, palavras e funções; devendo a criança tomar posse do assunto pouco a pouco, tendo tempo para a assimilação das funções e trabalhando com o sistema das fichas. Na Literatura seria necessário estimular os alunos a entrar em contato com os textos, pedindo que os comparasse uns com os outros, “O essencial é possuir o texto, sabendo escolher o que nele há de belo, pondo em evidência os pensamentos, as ideias”. (AEC, s.d., p. 93). Para a literatura, o objetivo era que os alunos chegassem a comparar os gêneros literários. Em matemática, seria necessária a colaboração dos alunos, mais do que em outras matérias, visto que não bastaria que os alunos soubessem fórmulas ou meios de solução, mas sim que os tivesse assimilado para poder aplicá-los nas suas resoluções. Para os professores, não seria importante o programa a cumprir, mas sim o desenvolvimento do assunto de maneira adequada ao nível da classe. Além disso, os professores precisariam transmitir o conteúdo de forma simples, voltando aos conteúdos básicos, se necessário, para que os alunos pudessem aprender, devendo mostrar a eles o que de interessante estariam aprendendo e dispondo de tempo para que pudessem assimilar.

A respeito dos métodos de ensino para as matérias profanas, seria necessário evitar cometer o erro de pedir para os alunos repetirem o que os professores disseram, pois deveria ser concedida a criança a oportunidade de se manifestar da sua maneira a própria compreensão. Assim, caberia aos professores ajudar, estimulando o trabalho de julgamento do aluno, com o fim de obter colaboração real dele. Com o trabalho bem orientado, o aluno seria capaz de aprender o indispensável para o seu desenvolvimento, com a condição de que os professores procurassem atender as suas necessidades de educação, concentração, unificação, e correção dos erros. Além disso, deveriam evitar a disciplina aparente, tais como os sinais, as filas e etc., e buscar a disciplina do trabalho do dia a dia com objetivo ordenado, delegando desde cedo às crianças suas responsabilidades. Este dever de estado seria o que ajudaria a criança a gostar de trabalhar, de ter inciativas e de não perder tempo. O sentido veemente de responsabilidade, quando orientado desde cedo nas crianças, possibilitava uma formação motivada, habituando os alunos aos poucos para alcançar os objetivos superiores do humanismo cristão. Com isso, bases mais profundas e realistas abririam para que os alunos se encontrassem no estudo das matérias sagradas e profanas.

A conferência de 1956 em São Paulo explorou temas relacionados ao trabalho escolar que levariam a criança a realizar o esforço pessoal de maneira consciente. Tal feito teria o intuito de preparar os professores para lecionar uma formação que fosse escolar e, ao mesmo tempo, religiosa. Além disso, foi indicada a necessidade de conhecer melhor a criança, usar métodos indutivos que fossem do simples ao complexo, formação sagrada e profana, formação cristã e social. Também nas ações didático-pedagógica dos professores, deveria haver o esforço de estimular nos alunos uma necessidade da emulação, ou seja, de competição coletiva como algo saudável para o desenvolvimento individual. Essa emulação seria um trabalho voltado para que o coletivo atingisse determinada meta ou objetivo, tendo como perspectiva a necessidade do esforço em equipe, onde todos poderiam avançar no processo de escolarização e contar com ajuda caso precisassem para alcançá-lo. A emulação não estaria direcionada uma vaidade, característica ou a um comportamento específico para que todos seguissem. Por isso que a educação deveria estar pautada pelo pressuposto comunitário, social, onde cada aluno constituiria pessoalmente uma parte importante do coletivo. Por isso que essa formação também seria religiosa e espiritual, para ajudar os alunos a adquirirem uma resposta, uma certeza da responsabilidade de trabalhar em prol do coletivo. Assim, a religião estaria intrinsecamente relacionada a tomada de consciência, aos valores cristãos e a pedagogia cristã. No mais, a formação defendida por Faure, neste documento que representou a conferência da Semana Pedagógica de São Paulo no ano de 1956, era a da pedagogia cristã justificada pelo propósito de que esta formação estaria apta a conduzir os alunos aos preceitos morais e religiosos da Igreja Católica em prol da formação de uma sociedade voltada para a família, para Deus e para a comunidade.

Considerações finais

As duas Semanas Pedagógicas ministradas no Brasil por Pierre Faure para a formação de professores brasileiros tiveram alguns pontos em comum. Em primeiro lugar o fato de que tanto a semana de 1955 no Rio de Janeiro, como a de 1956 em São Paulo foram publicadas pela AEC e compiladas no mesmo documento. Em segundo, que ambas tiveram a mesma estrutura de organização do evento, iniciando cotidianamente com a missa e, após isso, dando sequência com as palestras e diálogo com os professores presentes a respeito dos temas estudados. Ao final, após momento de trocas, eram reunidas algumas das colocações dos professores para os apontamentos conclusivos e encerramento às 17 horas. Além disso, segundo Makowiecki (2020), as sessões pedagógicas ministradas no Brasil tiveram como estratégia metodológica concentrar no período manhã as palestras do padre Pierre Faure e realizar atividades em grupo segundo as especificidades dos participantes e a idade dos alunos a quem os professores ministravam as aulas. E no período da tarde, era destinado um momento para que os grupos de professores se formassem e elaborassem as conclusões das discussões que emergissem. Após isso, os trabalhos retomavam com a aplicação das temáticas estudadas do primeiro momento, encerrando o evento com uma lição da pedagogia do evangelho. Também foi providenciada uma caixa de questões onde participantes poderiam realizar perguntas anonimamente com o intuito de sanar dúvidas que ocorriam no contexto prático do cotidiano escolar e das reuniões, em geral. Por este motivo, o nome dos professores foi mantido em sigilo e não apareceu no documento.

As Semanas Pedagógicas reuniram professores e educadores católicos de diferentes congregações religiosas com o intuito de unificar as relações e estreitar os laços para a reflexão de temas relacionados à pedagogia católica, bem como para a adesão de novas práticas escolares nos colégios católicos de elite. Ademais, vale ressaltar o fato de que Faure retornou ao Brasil em 1959, para ministrar um novo curso de formação de professores, desta vez, para professores do ensino secundário. Esta formação foi realizada no Colégio Sion de São Paulo por ter sido este o local sediado do primeiro curso em 1956, reunindo professores de vários colégios além do Sion, tais como Des Oisseux e Santa Cruz.

Referências

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1De acordo com Cristina Makowiecki (2020), de origem francesa, o Colégio Sacré Coeur de Jesus pertencia a Congregação das Irmãs do Sagrado Coração de Jesus, e chegou ao Brasil no início do século XX com a missão de descobrir e manifestar o amor de Cristo encarnado na humanidade através do serviço da educação para que cada ser humano se descubra construtor de sua história e transformador de sua realidade. Em 1909, o colégio foi transferido para o Morro da Glória; em 1936, migrou para o bairro das Laranjeiras, onde foi construído um novo prédio, onde funcionou até 1968, quando foi fechado.

Recebido: 02 de Setembro de 2021; Aceito: 10 de Dezembro de 2021

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