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Cadernos de História da Educação

versão On-line ISSN 1982-7806

Cad. Hist. Educ. vol.22  Uberlândia  2023  Epub 07-Ago-2023

https://doi.org/10.14393/che-v22-2023-195 

Dossiê 3 - História Comparada do Ensino Secundário: renovação da historiografia por comparações, transições, massificações e traduções

Diálogos sobre o Ensino Secundário: História Comparada dos estados da Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe (1942-1961)1

Diálogos sobre la Enseñanza Secundaria: Historia Comparada de los estados de Bahía, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte y Sergipe (1942-1961)

Antônio Pádua de Carvalho Lopes1 
http://orcid.org/0000-0002-1557-6956; lattes: 4610019350546921

João Paulo Gama Oliveira2 
http://orcid.org/0000-0001-9683-5413; lattes: 1683730358783754

Maria do Perpétuo Socorro Gomes de Souza Avelino de França3 
http://orcid.org/0000-0002-6974-2606; lattes: 7005058905002975

1Universidade Federal do Piauí (Brasil). apaduaclopes@gmail.com

2Universidade Federal de Sergipe (Brasil). profjoaopaulogama@gmail.com

3Universidade do Estado do Pará (Brasil). socorroavelino@hotmail.com


Resumo

Este estudo analisou, em perspectiva comparada, a expansão e o acesso ao Ensino Secundário nos estados da Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe, no período de 1942 a 1961, tendo como marcos temporais inicial e final a Lei Orgânica do Ensino Secundário e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, respectivamente. Foram utilizados como fontes os anuários estatísticos e estatísticas educacionais. A análise aponta que a expansão desse nível de ensino foi marcada pela desigualdade de acesso aos Cursos Ginasial e Colegial, pois a maioria dos municípios do interior dos estados somente ofertava o primeiro, concentrando as capitais o maior número de estabelecimentos com o Curso Secundário completo, havendo, portanto, um menor número de Cursos Colegiais. Notou-se ainda, considerando o número de conclusões, uma seletividade no Ensino Secundário, apesar da expansão de matrículas e da oferta escolar ocorridas no período analisado.

Palavras-chave: Ensino Secundário; Expansão; História Comparada

Resumen

Este estudio ha analizado, en perspectiva comparada, la expansión y el acceso a la Enseñanza Secundaria en los Estados de Bahía, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte y Sergipe, en el período de 1942 a 1961, teniendo como balizadores temporales inicial y final la Ley Orgánica de la Enseñanza Secundaria y la Ley de Directrices y Bases de la Educación Nacional, respectivamente. Fueron utilizados como fuentes los anuarios estadísticos y estadísticas educacionales. El análisis apunta que la expansión de ese nivel de enseñanza fue marcada por la desigualdad de acceso a los Cursos primarios y Colegial, pues la mayoría de los municipios del interior de los estados solamente ofertaba el primero, concentrando las capitales el mayor número de estabelecimientos con el Curso Secundario completo, habiendo, por tanto, un menor número de Cursos Colegiales. Se ha notado todavía, considerando el número de conclusiones, una selectividad en la Enseñanza Secundaria, a pesar de la expansión de matrículas y de la oferta escolar ocurridas en el período analizado.

Palabras-clave: Enseñanza Secundaria; Expansión; Historia Comparada

Abstract

This study is a comparative analysis of the expansion and access to secondary education in the Brazilian states of Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte, and Sergipe in the period of 1942 to 1961, a period marked in time initially by the Organic Law of Secondary Education (Lei Orgânica do Ensino Secundário) and at the end by the Law of Guidelines and Foundations of National Education (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional). Statistical yearbooks and educational statistics were used as sources. Analysis indicates that the expansion of this educational level was characterized by unequal access to lower secondary education compared to upper secondary education because most of the municipalities outside the capital cities offered only the former; the capital cities concentrated the largest number of establishments with a full secondary education. Upper secondary education courses, therefore, were fewer in number. Consideration of the number of students concluding the courses showed selectiveness in secondary education, in spite of the expansion of enrollments and offer of schooling that occurred in the period analyzed.

Keywords: Secondary Education; Expansion; Comparative History

Introdução

Este estudo tem por objetivo analisar, em perspectiva comparada, a expansão do Ensino Secundário e o acesso a esse nível de ensino, nos estados da Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe, no período de 1942 a 1961. O recorte histórico da pesquisa considerou, como marco inicial, a aprovação da Lei Orgânica do Ensino Secundário (Decreto-Lei n.º 4.244, de 9 de abril de 1942), em 1942, e, como marco final, a aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n.º 4.024, de 20 de dezembro de 1961), em 1961.

Visando obter o maior número possível de fontes sobre o Ensino Secundário nos estados aqui investigados, foram identificadas as seguintes fontes: anuários estatísticos do Brasil, sinopses estatísticas do Ensino Médio, censos demográficos, legislação educacional, mensagens governamentais, relatórios de secretários de educação, documentação administrativa e pedagógica e matérias publicadas na imprensa periódica e jornais estudantis, dentre outros. No entanto, neste trabalho, privilegiamos as fontes estatísticas, reconhecendo as limitações que a opção por esse tipo de dado representa, em termos de comparação, mas também a relevância de pensar as ações em torno do Ensino Secundário no período a partir desse tipo de fonte.

Dessa forma, como os dados estatísticos foram fundamentais para a elaboração deste estudo, necessário se faz reconhecer os limites e possibilidades que eles apresentam. Esses limites iniciam-se mesmo no processo de preenchimento dos formulários para o registro das informações. No que diz respeito a esse aspecto, Deblé (1976, p. 177), descrevendo o processo de produção das estatísticas educacionais, assim o caracteriza, apontando os limites dessa sistemática:

o agente recenseador confia ao professor ou ao diretor do estabelecimento de ensino o trabalho de responder o questionário, prestando-lhe todas as explicações necessárias. A validade das informações recolhidas depende, pois, de dois fatores: a consciência profissional do agente recenseador, que não deve omitir as escolas isoladas e difícil acesso, a consciência profissional e a competência do educador encarregado de responder aos numerosos itens do formulário. Não parece existir, na realidade, possibilidade de controle das informações recebidas.

Desse modo, um primeiro limite advém da própria organização do levantamento, desde a sua concepção até sua aplicação, bem como a confirmação dos dados recebidos. Reconhecemos, ainda, com Gil (2019), o papel das estatísticas como parte integrante da construção de realidades, de “maneiras de ver o mundo” como representações. Reconhecemos, ainda, que está posta uma lógica de classificação nos questionários que estrutura as informações a serem consideradas para o levantamento realizado. Bourdieu (2020, p. 21) nos leva a pensar sobre essas lógicas, quando indaga: “O que é classificar? O que é classificar quando se trata do mundo social?” Assim, estar atento ao modo como se constroem os formulários ajuda a colocar em perspectiva a fonte com as quais estamos trabalhando para a realização da comparação.

C. Souza (2011, p. 205), com um olhar voltado para estatísticas do Ensino Primário, destaca como a produção dos números sobre educação possibilitam também esforços de compreensão “interna” - a partir de estados, regiões ou províncias - e “externa” - entre países, sejam do mesmo continente ou de uma mesma categoria, como também em relação a outras nações tidas como “mais” ou “menos” desenvolvidas. Nosso desafio consiste justamente em trabalhar com essas estatísticas, em uma perspectiva “interna”, com uma análise sobre seis estados do Brasil no tocante à expansão do Ensino Secundário no recorte temporal proposto.

R. Souza (2019, pp. 37-38), ao pontuar a necessidade de estudos acerca das políticas governamentais na expansão do Ensino Secundário, ressalta:

Estudos dessa perspectiva devem observar uma crítica à estatística como discurso e estratégia de poder, além de atentar para as diferenças regionais e demográficas, o problema do desenvolvimento econômico e educacional e as diversas modalidades de escolas oferecendo o curso ginasial, especialmente as Escolas Normais.

No nosso caso específico, as fontes estatísticas, com sua devida crítica, permitem nos aproximar do público envolvido no Ensino Secundário, em diferentes espaços do Brasil, atentos às especificidades locais, mediante às questões impostas pela legislação educacional em diálogo com as políticas públicas voltadas para esse nível de ensino. Todavia, com o uso das estatísticas, não conseguimos, no presente texto, entrever questões próprias de cada estado, quiçá de cada município ou instituição educacional com seus sujeitos, desafios cotidianos e mesmo elementos da cultura material escolar, aspectos que podem ser verticalizados em outros estudos que se concentrem em diferentes aspectos do Ensino Secundário, a partir de diversos ângulos e com a utilização de diferentes fontes documentais, ou que remetam à historiografia desenvolvida nos estados analisados, de modo mais específico. Utilizamos os dados estatísticos, mesmo considerando os seus limites, pois, como indaga Dubet (2015, p. 28),

¿Auque tenga claro que esse material es construído, me valgo de él porque no queda outra opción, em las ciências de hombre y em las ciências em general. ¿Cuántas investigaciones impõem ao lector extensas notas previas de desconstrucción de los datos disponibles para, al final, utlizarlos como todo el mundo y tomarlos em serio?

Há que destacar, ainda, o papel que a elaboração de estatísticas tem na ação de controle e de planejamento do Estado. Senra (2008, p. 35) assim se refere ao lugar da estatística na ação estatal:

Os Estados desde (quase) sempre quiseram enumerar, mensurar, quantificar suas populações, suas riquezas, seus recursos; quiseram as estatísticas. De início, com vistas às guerras, para tributar e para recrutar; depois, para além disso, com vistas a legislar e administrar inúmeros aspectos das esferas pública e privada. No tempo, diversificou e sofisticou a demanda por estatísticas, num movimento contínuo e intenso.

Trabalhando com estatísticas, visamos construir uma história comparada da educação. R. Souza (2013, p.11) considera importante e pertinente a história comparada, por contribuir para o aprofundamento e compreensão da educação no Brasil. “Os estudos regionais (abarcando localidades e estados) fizeram florescer singularidades e especificidades. Porém, não se deve esperar da comparação sínteses genéricas, justaposições ou somatória de estudos regionais”. A história comparada deve ser utilizada com vistas a estabelecer diálogo entre as histórias regionais, possibilitando, dessa forma, identificar contrastes, conexões e aproximações. É nessa perspectiva que o presente trabalho norteia a análise de alguns aspectos do Ensino Secundário.

Neste estudo, concentramo-nos nas categorias "expansão escolar" e “acesso” ao Ensino Secundário, a partir de três eixos de análise: criação de instituições educacionais, matrículas e conclusão de curso nos estados aqui comparados, a saber: Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe.

1. A organização política dos estados como elemento para compreensão da expansão do Ensino Secundário

É importante observar a divisão interna dos estados analisados em municípios, por ser fundamental para entendermos que a expansão do Ensino Secundário também resulta da história local e do surgimento e consolidação de municipalidades, tendo essa divisão, nos anos de 1940, 1950 e 1960, a configuração exposta na tabela 1.

Tabela 1 Número de municípios por estados (1940, 1950 e 1960) 

ESTADO NÚMERO DE MUNICÍPIOS
1940 1950 1960
Bahia 150 150 194
Maranhão 65 72 91
Pará 53 59 60
Piauí 47 49 71
Rio Grande do Norte 42 48 83
Sergipe 42 42 62
TOTAL 399 420 561

Fonte: Autores; Dados: Brasil (2012)

Faz-se necessário ressaltar que a criação de novos municípios impacta diretamente na demanda pela criação de novas unidades de ensino, que engloba, também, o Secundário. Trata-se de um desdobramento espacial com reverberações no âmbito educacional tanto na construção de prédios, como contratação de professores, matrículas de alunos e mesmo a criação de um sistema de gerenciamento do ensino local, diferente daquele existente quando o espaço ainda era parte de um outro município. No período analisado, houve acréscimo de 162 municípios, considerando todos os estados analisados, reconfigurando a organização político-administrativa desses estados, o que terminava por gerar a necessidade de expansão da rede escolar de Ensino Secundário para as sedes dos novos municípios, especialmente nas localidades onde anteriormente não havia esse nível de escolaridade. Destacamos, contudo, que o aumento no número de municípios nos estados analisados ocorreu de maneira quantitativamente diferenciada. Observamos que, enquanto o número de municípios na Bahia teve um crescimento de 29,33%, no Maranhão, esse crescimento foi de 40%; no Pará, de 13,20 %; no Piauí, de 51,06%; e, em Sergipe, de 47,61%. Diferentemente, o Rio Grande do Norte praticamente dobrou o número de seus municípios, tendo 42 no ano de 1940 e, em 1960, 83 municípios, com aumento de 97, 61%. Isso é um indício do processo de urbanização por que passava a região, mesmo considerando que boa parte dessas localidades se constituíam como pequenos municípios, sendo sua criação resultante, muitas vezes, da ação política de lideranças locais. Debates sobre as condições mínimas para que uma coletividade alcançasse sua emancipação territorial e autonomia intensificaram-se nos anos de 1950 e de 1960, atingindo seu auge logo após a Constituição de 1988. Em 1940, existiam, no Brasil, 1.574 municípios; em 1950, 1.889; e, em 1960, 2.766 (FERRARI, 2016). A onda de emancipação dos municípios deu-se a partir de 1940, com a criação de sistema de tributos partilhados que favorecia os mais pobres. Introduzidas na “Constituição de 1946, as cotas eram iguais para todos os Municípios. Assim, os Governos Estaduais estimulavam a criação de novos Municípios para atrair mais recursos do Governo Federal para o Estado” (MELLO, 1971 apud FERRARI, 2016, p. 57).

É preciso atentar ainda para a extensão territorial de cada um desses estados, pois são díspares, conforme podemos ver na tabela 2.

Tabela 2 Extensão territorial dos Estados (1960) 

ESTADO EXTENSÃO TERRITORIAL KM²
Bahia 563.367
Maranhão 332.174
Pará 1.250.003
Piauí 251.683
Rio Grande do Norte 53.069
Sergipe 22.027

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1960a)

Conforme vemos na tabela 2, há uma variação da área dos estados, ocasionada por diversas modificações nos seus delineamentos ao longo do tempo, permanecendo algumas áreas de litígio. Cabe destacar que essa variação espacial é um fator a ser considerado, quando se analisa a expansão do Ensino Secundário, o que não significa que o estado com maior extensão territorial seja aquele que mais expandiu esse nível de ensino. Há que se considerar a distribuição da população no território e o interesse definido pela política educacional predominante no estado, bem como a força da pressão municipal pela extensão desse nível de escolaridade. No que diz respeito à população por município, a tabela 3 destaca o número de cidades, em cada estado analisado, com população acima de 10.000 habitantes.

Tabela 3 Cidades com mais de 10.000 habitantes (1940, 1950 e 1960) 

ESTADO NÚMERO DE CIDADES
1940 1950 1960
Bahia 10 14 24
Maranhão 01 02 05
Pará 01 02 04
Piauí 02 02 04
Rio Grande do Norte 02 02 04
Sergipe 03 03 04
TOTAL 19 25 45

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1962)

Pelos números expostos, fica nítido o expressivo aumento de cidades com população acima de 10.000 habitantes, entre as décadas de 1940 e 1960, o que aponta um processo de urbanização crescente nos estados. Excetuando a Bahia, os demais possuem números aproximados de cidades com mais de 10.000 habitantes, ao longo do período. Essa concentração da população em localidades que se constituem núcleos mais populosos na região termina por influir na expansão dos níveis de escolaridade, consistindo essa expansão em componente do grau de desenvolvimento da localidade em relação a outras, seja no próprio estado ou em estados vizinhos. Quanto à população, esses estados apresentavam a configuração exposta na tabela 4.

Tabela 4 População de fato2 (1940, 1950 e 1960) 

ESTADO POPULAÇÃO
1940 1950 1960
Bahia 3.918.112 4.900.419 5.990.605
Maranhão 1.235.169 1.600.396 2.492.139
Pará 944.644 1.142.846 1.550.935
Piauí 817.601 1.064.438 1.263.368
Rio Grande Norte 768.018 983.572 1.157.258
Sergipe 542.326 650.132 760.273

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1947; 1951, 1961)

Nos diferentes estados analisados, destacam-se, em termos de população, a Bahia e o Maranhão, que também têm um número maior de cidades com população acima de 10.000 habitantes. Nota-se também que o crescimento populacional foi variável de estado para estado. Nos anos de 1940 a 1960, a Bahia e o Maranhão eram os estados mais populosos. Esse crescimento, mesmo que em menor proporção, também atingiu os outros estados, sendo Sergipe o que menos cresceu em termos populacionais. O indicador populacional e o de cidades com maior número de moradores criam demandas educacionais que influenciam a constituição de escolas de Ensino Secundário. Na tabela 5, temos o quantitativo populacional na faixa etária dos 10 aos 19 anos, considerada como adequada para o nível de escolaridade aqui analisado.

Tabela 5 População na faixa etária dos 10 aos 19 anos (1940, 1950 e 1960) 

ESTADO POPULAÇÃO
1940 1950 1960
Bahia 931.614 1.110.275 1.407.625
Maranhão 272.297 372.799 590.337
Pará 215.913 254.814 359.150
Piauí 198.619 249.976 307.069
Rio Grande do Norte 187.815 213.538 269.203
Sergipe 126.209 146.377 179.921

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1947; 1952; 1960b)

Em termos de população na faixa etária de 10 a 19 anos, idade provável dos alunos ingressarem no Ensino Secundário, destacam-se a Bahia e o Maranhão em relação aos demais estados, sendo que, no Maranhão, a população nessa faixa etária mais que duplicou nesse intervalo de tempo, e, na Bahia, observa-se um aumento de 51,09%. No Pará, o crescimento foi de 67,89%; no Rio Grande do Norte, 43,71%; em Sergipe, 42,55%; e, no Piauí, 54,60%. Outro dado relevante é que o crescimento ocorreu de maneira mais acentuada entre as décadas de 1950 e 1960, em todos os estados analisados. Esses números possibilitam, inclusive, pensar em termos de defasagem entre população em idade escolar e oferta de vagas no Ensino Secundário e o modo como em cada estado isso foi resolvido. Contudo, por limitações inerentes ao tipo de dado analisado, essa análise não é desenvolvida aqui. Cabe destacar que, ao longo do período analisado, houve aumento, nos diferentes estados em foco, da população em idade de cursar o Ensino Secundário, o que exigiria a expansão do número de vagas e de investimentos na escola secundária.

2. A expansão da escola secundária, considerando unidades escolares, localização e entidades mantenedoras

O crescimento populacional na faixa etária de 10 a 19 anos indica a necessidade de uma expansão que atenda essa demanda, sendo um fator, entre outros, de pressão para a criação de vagas. Pessanha (2021, p. 52), ao tratar dos resultados do Projeto do qual o presente texto deriva, mostra que precisamos problematizar a conclusão de que o crescimento populacional provocou diretamente o aumento no número de matrículas e estabelecimentos de Ensino Secundário, uma vez que “resultados aparentemente semelhantes podem ter sido produzidos por processos diferentes [e vice-versa] devido às características históricas, sociais e políticas de cada estado/região.”

Atentos a essas ponderações, vejamos, na tabela 6, dados das unidades escolares do Ensino Secundário disponíveis para o atendimento da população na faixa etária correspondente.

Tabela 6 Número de unidades escolares de Ensino Secundário (1942, 1946 e 1960) 

ESTADOS UNIDADES ESCOLARES DE ENSINO SECUNDÁRIO
1942 1946 1960
Bahia 33 48 171
Maranhão 11 10 27
Pará 10 16 38
Piauí 9 14 43
Rio Grande do Norte 6 12 27
Sergipe 7 9 32
TOTAL 76 109 338

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1946;1950; 1960b)

Destaca-se o significativo aumento no número de unidades escolares ocorrido entre os anos de 1942 e 1960, nos estados analisados, com um salto de 76 para 338 instituições. Ao analisarmos o crescimento do número de escolas, destacam-se Bahia, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe com o crescimento do número de suas escolas secundárias acima de quatro vezes. Já no Pará e no Maranhão, apesar de crescimento menor, também houve aumento no número de estabelecimentos de Ensino Secundário, indicando um processo de crescimento da oferta escolar em todos os estados analisados, acompanhando uma tendência nacional em relação à expansão da oferta desse nível de escolaridade.

Abreu (2005), discutindo o cenário nacional no trabalho apresentado no Seminário Interamericano de Educação Secundária, realizado em Santiago do Chile em janeiro de 1955, afirma que, em 1954, o país contava com 1771 estabelecimentos desse nível de ensino. Ou seja, contrapondo o Anuário de 1946, que apresenta um número de 827 estabelecimentos de ensino, com o trabalho de Abreu (2005), nota-se que ocorreu duplicação no número de escolas secundárias no Brasil, entre 1945 e 1954.

Ao aproximarmos a lupa para analisar os seis estados aqui investigados, observamos que, em quatro anos, entre 1942 e 1946, houve aumento de 34 estabelecimentos de ensino; e, ampliando para o recorte temporal do trabalho, esse número praticamente quadruplicou. Assim, é possível inferir que o crescimento do número de escolas secundárias registrado no país, de maneira mais ampla, também se fez presente na Bahia, no Maranhão, no Pará, no Piauí, no Rio Grande do Norte e em Sergipe. Na tabela 7, temos a distribuição dessas unidades escolares por localização geográfica, entre a capital e os municípios do interior:

Tabela 7 Distribuição das unidades escolares de Ensino Secundário por sua localização (1942, 1946 e 1960): capital e interior 

ESTADOS UNIDADES ESCOLARES DE ENSINO SECUNDÁRIO
1942 1946 1960
Capital Interior Capital Interior Capital Interior
Bahia 25 08 31 17 41 100
Maranhão 09 02 09 01 09 17
Pará 10 00 14 02 21 08
Piauí 05 04 09 05 10 27
Rio Grande do Norte 03 03 08 04 10 13
Sergipe 07 00 08 01 13 17

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1946;1950; 1960c)

Destaca-se, no início do período analisado, forte concentração do Ensino Secundário nas capitais e pequena taxa de interiorização, não coincidindo, necessariamente, essa interiorização com o maior tamanho populacional das localidades do interior, indicando a existência de outros fatores para a criação de escolas de Ensino Secundário, além desse critério. Há tendência de expansão com maior crescimento da interiorização já na década de 1940, aumentando nas décadas posteriores.

Abreu (2005) assinala que, nesse período histórico, a oferta do Ensino Secundário configurava-se da seguinte forma: os estados mantinham somente um ginásio nas capitais; os municípios não investiam nesta seara; e a União mantinha apenas o Colégio Pedro II no Distrito Federal.

Amado (1973) aponta como um dos limites para a expansão, mesmo em algumas capitais, mas especialmente no que diz respeito à interiorização, era a existência de professorado para esse nível de escolaridade que, segundo esse autor, era recrutado considerando as possibilidades das localidades.

Nos seis estados analisados, nota-se que, em 1942, o estado que mais possuía estabelecimentos de Ensino Secundário era a Bahia. A interiorização fazia-se presente em todos os estados, contudo, nas capitais havia uma maior presença de unidades escolares do Ensino Secundário. Observa-se que, em 1946, firma-se a expansão dessas unidades para as localidades do interior do estado. Em 1946, Bahia, Piauí e Rio Grande do Norte destacam-se nessa interiorização, enquanto Pará, Maranhão e Sergipe figuram, nesse intervalo, com uma ou duas unidades de Ensino Secundário no interior. Em 1960, a expansão intensificou-se, e todos os estados contavam com unidades nas localidades do interior. Dos estados analisados, o Pará foi o que menos interiorizou o Ensino Secundário. Vejamos a tabela 8 com as unidades escolares e suas entidades mantenedoras.

Tabela 8 Unidades escolares de Ensino Secundário por entidades mantenedoras (1945, 1955 e 1960) 

ESTADOS 1945 1955 1960
Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular Federal Estadual Municipal Particular
Bahia1 00 02 01 24 00 08 02 82 00 20 08 113
Maranhão 00 01 00 06 00 02 00 15 00 02 00 24
Pará 00 01 00 07 00 02 00 22 00 03 01 25
Piauí 00 01 00 08 00 02 02 19 00 03 05 29
Rio Grande do Norte 00 01 00 08 00 02 00 15 00 04 01 18
Sergipe 00 02 00 05 00 04 00 13 00 03 01 26
TOTAL 00 08 01 58 00 20 04 166 00 35 16 335

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1945; [195-]; 1960c)

1 Havia três sedes do Colégio Estadual da Bahia em bairros diferentes de Salvador

No que diz respeito às entidades mantenedoras, há que se destacar o predomínio do ensino particular confessional ou laico e a existência dessa oferta por parte da esfera municipal, bem como a ausência da esfera federal e o crescimento gradativo da oferta na esfera estadual. Assim, o número de instituições de Ensino Secundário é maior quanto às mantenedoras particulares (confessionais ou não), em detrimento das instituições mantidas pelo poder público, municipal e/ou estadual.

Abreu (2005) apresenta os dados relativos às entidades mantenedoras no Brasil, em 1954, sendo 435 públicas e 1336 particulares. As escolas públicas estavam divididas em 19 federais, 348 estaduais e 68 municipais.

No que diz respeito aos estados aqui analisados, um primeiro aspecto a destacar é a ausência das instituições federais de Ensino Secundário. Um segundo aspecto concerne à frágil presença das instituições mantidas pelos municípios, no total de 4, em 1955, distribuídas igualmente entre Piauí e Bahia, expandida essa oferta para os demais estados, com exceção do Maranhão, na década de 1960. Por fim, cabe destacar, não apenas a predominância das unidades escolares particulares, mas o acentuado relevo que tais estabelecimentos de ensino possuíram, nesses estados, na oferta do Ensino Secundário.

No recorte aqui proposto, nota-se que estados e municípios mantinham 9 instituições no ano de 1945, a rede particular sendo responsável por 58 unidades escolares. Quinze anos depois, há uma ampliação considerável do poder público, que passa a ser responsável direto por 51 unidades escolares; em contrapartida, o número de estabelecimentos particulares sofre um aumento proporcionalmente ainda maior, atingindo a marca de 335 e mantendo o predomínio da oferta particular de ensino.

Pessanha (2021) destaca a predominância de mantenedoras da sociedade civil sobre as públicas, mas já se observa no final dos anos de 1960 um certo equilíbrio. Assim, os indícios apontam que essa expansão de unidades escolares particulares talvez tenha sido subsidiada pelo poder estatal em meados do século XX, ou seja, mesmo não sendo a entidade mantenedora, o poder público também estaria presente nessa expansão do Ensino Secundário. São questões que ainda precisam ser verticalizadas e analisadas, considerando cada realidade local. Na direção de estudos anteriores, como Amado (1973) e R. Souza (2008), nota-se que a expansão dos estabelecimentos de ensino, nos estados em análise, também segue esse influxo nacional de ampliação das instituições de Ensino Secundário, com destaque ainda para o aumento da oferta na rede particular.

Na Primeira República, foi criada uma rede de escolas católicas que se expandiu nas décadas de 1940 a 1960. A predominância dessas instituições de ensino nos estados investigados, como em outros do País, representava a retomada do poder e prestígio da Igreja Católica na sociedade brasileira, restabelecida após 1930 (GONCALVES, 2017). Os incentivos fiscais e financeiros recebidos dos poderes públicos foram fundamentais para a implantação e para a expansão do ensino secundário católico.

A Lei Orgânica do Ensino Secundário, encaminhada pelo Ministro da Educação Gustavo Capanema Filho, em vigor nos anos de 1942 a 1961, determinava a divisão do Ensino Secundário em dois ciclos: 1º Ciclo Ginasial, de quatro anos de duração; e 2º Ciclo Colegial, com os Cursos Clássico (priorizando as Humanidades) e Científico (enfatizando as Ciências Exatas), distribuídos em três anos. Havia ainda o Ensino Técnico (Comercial, Agrícola, Industrial) e o Ensino Normal.

Nos estados pesquisados, a maior oferta de Ensino Secundário era a de cursos ginasiais. A Bahia concentrava o maior contingente de cursos dessa natureza, seguida pelo Piauí, Pará, Sergipe, Rio Grande do Norte e Maranhão. Muitos ginásios foram criados, no período aqui analisado, para atender a demanda de jovens em idade escolar. Poucos eram os colégios, como pode ser visto na tabela 10. A maioria deles encontrava-se na Bahia e, em menor quantidade, no Pará, Sergipe, Rio Grande do Norte, Maranhão e Piauí. Assim, nos estados analisados, a expansão do Ensino Secundário deu-se, principalmente, pela criação de cursos ginasiais, conforme a tabela 9.

Tabela 9 Unidades escolares com Cursos Ginasiais (1940, 1955 e 1960) 

ESTADOS UNIDADES ESCOLARES COM CURSOS GINASIAIS
1940 1955 1960
Bahia 28 93 121
Maranhão 07 14 22
Pará 29 24 22
Piauí 09 23 32
Rio Grande do Norte 09 15 16
Sergipe 07 16 27
TOTAL 89 185 240

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1945; 1955; 1960c)

Há maior oferta do Ensino Ginasial, indicando que a expansão se deu principalmente por esse nível. Dados que dialogam com os números do Brasil, uma vez que Chaloba, Dallabrida e Pessanha (2021, p. 8) mostram como a “matrícula no curso ginasial cresceu muito mais que no curso colegial e a dualidade entre o ensino secundário de formação geral e os ramos do ensino técnico - industrial, comercial e agrícola, permaneceu até a Lei de Diretrizes e Bases de 1961.” Nos estados em foco, os números ascendentes mostram que o quantitativo de unidades escolares ginasiais aumentou de 89 para 240, mostrando que os ginásios mais do que duplicaram entre as décadas de 1940 e 1960. Cabe ressaltar as diferenças nessa expansão em cada Estado. No caso do Pará, houve diminuição no número de ginásios, enquanto o Rio Grande do Norte quase duplicou seus estabelecimentos ginasiais. Ao analisar os dados do Maranhão e do Piauí, nota-se crescimento, de certa maneira uniforme, tendo, aproximadamente, triplicado os estabelecimentos com Ensino Ginasial, diferentemente da Bahia e de Sergipe que conseguiram aumentar a sua rede ginasial em torno de quatro vezes no recorte temporal em análise. A tabela 10 apresenta os cursos colegiais desses estados.

Tabela 10 Unidades escolares com Cursos Colegiais (1945 e 1960) 

ESTADO UNIDADES ESCOLARES COM CURSOS COLEGIAIS
1945 1960
Bahia 11 20
Maranhão 02 04
Pará 05 08
Piauí 01 05
Rio Grande do Norte 01 07
Sergipe 03 03
TOTAL 23 47

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1945; 1960)

Mesmo em ritmo de crescimento menor do que os Cursos Ginasiais, houve crescimento do Colegial nos estados analisados, conforme podemos observar na tabela 10. Esse crescimento ocorreu de maneira mais intensa na Bahia, no Piauí e no Rio Grande do Norte. Em Sergipe e no Pará, o crescimento foi moderado, havendo, no primeiro, manutenção do número de Cursos Colegiais existente em 1945.

3. Matrículas e conclusão de curso no ensino secundário

Conforme a tabela 11, nos estados analisados, houve maior expansão no número de matrícula nas capitais, se comparado ao interior. Embora Bahia e Pará possuíssem o maior número de alunos matriculados, essa expansão também pode ser percebida nos estados do Maranhão, Rio Grande do Norte, Sergipe e Piauí. Em 1942, Pará e Sergipe não apresentaram matrículas no interior, indicando um processo de interiorização desse nível de escolaridade posterior ao ocorrido nos demais estados que já haviam instituído estabelecimentos desse nível de ensino no interior. A partir de 1960, a expansão da matrícula no Ensino Secundário tomou grande proporção na capital e no interior.

Tabela 11 Número de matrículas no Ensino Secundário: capital e interior (1942, 1946 e 1960) 

ESTADOS MATRÍCULAS
1942 1946 1960
capital interior capital interior capital interior
Bahia 6.599 1.111 9.227 2.432 23.381 19.258
Maranhão 1.623 199 2.227 200 5.844 2.034
Pará 2.675 000 2.980 144 9.957 1.244
Piauí 1.347 558 2.765 976 4.773 4.371
Rio Grande do Norte 1.045 326 1.704 464 4.923 1.913
Sergipe 1.379 000 1.973 62 5.210 1.354

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1946, 1950; 1960)

Contudo, cabe destacar que, apesar da expansão significativa do Ensino Secundário na capital, a interiorização desse nível de ensino foi ganhando força. A progressão crescente dos números mostra aumento de 17.096 matrículas nos estabelecimentos de Ensino Secundário do interior e 14.154 na capital, em um intervalo de catorze anos, o que aponta também para a ampliação do acesso ao Ensino Secundário nesses seis estados.

Ao observar estado por estado, no tocante às matrículas na capital, percebemos que, em 1960, no Pará, Maranhão, Sergipe e Bahia, houve crescimento no número de matriculados superior a três vezes em relação a 1947. Já no Piauí e no Rio Grande do Norte, os matriculados quadruplicaram. Ao voltarmos a atenção para o interior, os números são ainda mais expressivos: Pará e Sergipe não contavam com matrícula para além da capital, na década de 1940, e passaram a contar com mais de 1000 matriculados em 1960. Sobressai-se, ainda, a Bahia com acréscimo superior a dezessete vezes ao número inicial, e o Maranhão que, das suas 199 matrículas, passou a pouco mais de 2.000. Uma interiorização mais moderada, em comparação aos demais estados citados, pode ser observada no Piauí, com crescimento em torno de sete vezes o número de matriculados, nesse intervalo temporal; e o Rio Grande do Norte, que quintuplicou seus alunos.

Abreu (2005) mostra que, em 1954, havia 535.777 discentes matriculados no Ensino Secundário, sendo que 459.489 estavam no Ginasial e 76.286, no Colegial. Os números dizem respeito à concentração da matrícula no Ginasial, ainda mais ao constatarmos que, desses ginasianos, mais de 50% estavam matriculados nas duas primeiras séries do 1º Ciclo.

O autor apresenta outros dados relevantes sobre os matriculados e as entidades mantenedoras, quais sejam: as escolas públicas brasileiras contavam com 143.465 alunos, o que representa 26,8% do total da matrícula, e estavam divididas em 19 federais (6.500 matrículas), 348 estaduais (18.208 matrículas) e 68 municipais (18.757 matrículas) (ABREU, 2005).

Para R. Souza (2008), aos milhares de discentes matriculados nos ginásios e colégios, em meados do século XX, era ensinado na escola secundária a escrever e a falar bem, valorizar os bons autores da literatura, além de amar e exaltar a Pátria. Tendo, ainda, a prática da declinação do latim e a leitura, como também a tradução e versão de línguas estrangeiras, duas ou três; o exercício dos cálculos matemáticos; a valorização da arte do desenho; e a memorização das lições científicas, além de serem incentivados a apreciar poemas. E conclui: “Enquanto a sociedade brasileira transformava-se rapidamente, a escola apegava-se às suas tradições.” (SOUZA, R., 2008, p. 187).

A escola brasileira secundária é retratada com acentuado número de matrículas. Neste cenário de crescimento, quantos que nela ingressaram conseguiram concluir o Curso Secundário? No que diz respeito à distribuição dessas conclusões entre capital e interior, nos diferentes estados, nos anos de 1942, 1946 e 1960, temos a situação apresentada na tabela 12.

Tabela 12 Conclusão de curso: capital e interior (1942, 1946 e 1960) 

ESTADO CONCLUSÃO DE CURSO
1942 1946 1960
capital interior capital interior capital interior
Bahia 1.628 196 1.568 232 3.325 2.227
Maranhão 449 50 306 21 911 246
Pará 658 00 463 18 1.235 171
Piauí 225 112 378 142 523 522
Rio Grande do Norte 284 87 282 87 858 199
Sergipe 287 00 227 00 650 134

Fonte: Autores; Dados: Brasil (1946, 1950, 1961)

Como vimos anteriormente, o número de matrículas no Ensino Secundário crescia a cada ano. A taxa de conclusão, no entanto, é baixa em relação à matrícula nas capitais e no interior de todos os estados. Tais dados corroboram as assertivas de R. Souza (2008, p. 206), quando esta afirma que “[...] boa parte dos alunos concluíam apenas o ciclo ginasial, interrompendo os estudos e ingressando na vida prática ou buscando um segundo ciclo profissionalizante, especialmente o ensino comercial, o mais demandado pelos estudantes.” De modo semelhante, Nunes (2000, p. 47) constata que a:

expansão do ensino secundário favorecendo a iniciativa privada convivia com um sério problema: o da eliminação e do retardamento do aluno no sistema regular de ensino. Os índices de retenção e evasão escolar permaneceram elevados nas gerações de brasileiros que se sucederam de três em três anos a partir de 1942. Variavam em torno de 80%. Logo, apenas 20%, ou menos, dos estudantes que ingressavam nos cursos secundários conseguiam completar seus estudos, sem retardamento, e sair dos ginásios realizando exames vestibulares com sucesso.

Ao se considerar a capital, dentre os estados analisados, merece destaque o Piauí, com a maior disparidade entre matriculados e concluintes. Já no interior, a maior desproporção é no estado do Pará, seguido de Sergipe. O estado do Rio Grande do Norte foi o que teve a melhor taxa de proporção de matriculados e concluintes. Dos matriculados no interior, metade, em média, concluía o Curso Secundário.

Conclusões

Os resultados apontam para a expansão do Ensino Secundário nos estados da Bahia, Maranhão, Pará, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe, no período de 1942 a 1961. Expansão essa marcada pela desigualdade de acesso aos Cursos Ginasial e Colegial, pois a maioria dos municípios do interior somente ofertava o primeiro, concentrando as capitais o maior número de estabelecimentos com o Curso Secundário completo, havendo, nos estados analisados, menor número de Cursos Colegiais. Notou-se, ainda, que o número de matrículas no Ensino Secundário não correspondia ao número de conclusões.

Os dados demonstram a expansão de matrículas nos estados pesquisados, tanto na capital como no interior. Mas, comparando-as com os números de conclusão, constatamos que poucos alunos terminavam seus estudos secundários. Não encontramos, durante a pesquisa, informações sobre evasão e repetência que contribuíssem para essa defasagem.

Nesses estados, predominavam as instituições particulares leigas e confessionais sobre as públicas. Quanto ao Ensino Secundário público, era mantido em sua maioria pelos estados, que conservavam na capital estabelecimentos de Ensino Secundário com oferta dos Cursos Ginasial e Colegial, embora alguns municípios do interior ofertassem Curso Ginasial. Não existiam estabelecimentos federais de Ensino Secundário.

Os resultados apontam ainda para a expansão do Ensino Secundário nos estados analisados, considerando o crescimento acentuado da população, do número de estabelecimentos de ensino, das matrículas e da conclusão do curso. Investimos na análise relativa às escolas, identificando suas localizações e caráter administrativo, visando perceber o processo de interiorização da escola secundária. Nesse processo de expansão do Ensino Secundário, havia uma pluralidade de instâncias administrativas que ofertavam a modalidade de ensino na vigência da Reforma de Gustavo Capanema, de iniciativas de cunho estatal a de vinculação a diferentes confissões religiosas e às iniciativas da sociedade civil, como foram os casos dos ginásios montados pela Campanha Nacional de Educandários Gratuitos (CNEG). Há que se destacar alguns aspectos em relação aos estados aqui apresentados:

  • a) Em relação ao Maranhão, a existência do Projeto Bandeirantes, criado em 1960 e implantado nos anos posteriores. Esse projeto foi importante para as cidades do interior do Maranhão, sendo criados, desde sua origem até a década de 1970, 154 estabelecimentos;

  • b) Em alguns dos estados apresentados neste trabalho, como Piauí, Sergipe, Bahia e Maranhão, cabe destacar a ação da CNEG, depois denominada Campanha Nacional de Escolas da Comunidade (CNEC);

  • c) Com relação ao Pará, como em outros estados aqui analisados, nos anos de 1940 a 1960, o Ensino Secundário começou a se expandir para o interior. Os ginásios começaram a ser instalados nos principais municípios da região, em localidades estratégicas que poderiam receber jovens de lugarejos mais distantes para dar continuidade aos seus estudos secundários. A interiorização, nos estados analisados, foi importante para a ampliação do acesso ao Curso Ginasial;

  • d) Embora não seja objeto do presente trabalho, destaca-se a existência de significativo aporte de subvenções de escolas particulares por parte do poder público.

Por fim, certamente várias indagações não esclarecidas ainda existem e necessitam de análises verticalizadas para que tenhamos uma maior apreensão de como a expansão do Ensino Secundário ocorreu nos diferentes estados do Brasil, no período da Reforma Gustavo Capanema. São elementos para outras pesquisas na área da História da Educação acerca de um nível de ensino que, na contemporaneidade, ainda enfrenta tantos problemas e desafios em torno das instituições educacionais, matrícula e conclusão de curso.

Referências

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1Este trabalho é parte do Projeto de Pesquisa Ensino Secundário no Brasil em Perspectiva Histórica e comparada (1942-1961), aprovado pelo Edital Universal n.º 01/2016/CNPq (Processo n° 424377/2016-0), sob a coordenação geral da Prof.ª Dr.ª Eurize Caldas Pessanha, visando constituir uma história comparada da Educação Secundária no Brasil, cuja equipe dos Estados aqui analisados foi constituída por: Sara Martha Dick; Ronaldo Figueiredo Veras; Suane Barbosa; Elizama dos Santos Ferreira de Souza (Bahia); César Augusto Castro e Samuel Luis Velázquez Castellanos (Maranhão); Maria do Perpétuo Socorro Gomes de Souza Avelino França e Laura Maria Silva Araújo Alves (Pará); Antonio de Pádua Carvalho Lopes e Higo Carlos Meneses de Sousa (Piauí); Marta Maria Araújo e Fabio Marques de Oliveira Neto (Rio Grande do Norte); Eva Maria Siqueira Alves; João Paulo Gama Oliveira; Rosemeire Marcedo Costa; Simone Silva da Fonseca e Paulo Mateus Silva Vieira (Sergipe).

2População de fato, segundo Rodrigues (1956, p.188), “[...] é a constituída pelo total das pessoas presentes dentro de suas divisas no instante em que se supõe estar sendo realizado o recenseamento.”

Recebido: 30 de Novembro de 2022; Aceito: 28 de Fevereiro de 2023

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