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Cadernos de História da Educação

versión On-line ISSN 1982-7806

Cad. Hist. Educ. vol.22  Uberlândia  2023  Epub 07-Ago-2023

https://doi.org/10.14393/che-v22-2023-231 

Resenhas

O lugar do ensino da disciplina História da Educação na Escola Normal Oficial de Uberaba: um olhar sobre sua trajetória, percalços e descobertas

The place of teaching the History of Education in the Official Normal School of Uberaba: a look at its trajectory, mishaps and discoveries

El lugar de la enseñanza de la asignatura Historia de la Educación en la Escuela Normal Oficial de Uberaba: una mirada a su trayectoria, percances y descubrimientos

1Universidade Federal de Uberlândia (Brasil). smarloncesar@gmail.com

Guimarães, Rosângela Maria Castro. O Ensino de História da Educação na Escola Normal. Entre o prescrito e a realidade escolar (Uberaba, Minas Gerais, 1928-1970). Série Monografias, v.4. Coleção História, Pensamento e Educação. Uberlândia: Edufu, 2016. 274pp.


A obra intitulada “O Ensino de História da Educação na Escola Normal: entre o prescrito e a realidade escolar (Uberaba, Minas Gerais, 1928-1970)”, de autoria de Rosângela Maria Castro Guimarães, foi publicada em 2016 pela Editora da Universidade Federal de Uberlândia (Edufu), na série “Monografias” da coleção “História, Pensamento e Educação”.

A obra foi lançada no formato 16 x 23 cm, em papel pólen, o que confere um tom amarelado às páginas e favorece o descanso visual. Apresenta iconografia relevante à discussão empreendida e gráficos analíticos construídos pela própria autora a partir de documentos encontrados durante a investigação, os quais foram transformados em documentos essenciais para a validação de fontes documentais. A imagem de capa apresenta fotografia em preto e branco, apresentando discentes e docentes da Escola Normal na estação ferroviária, antes da partida para uma excursão a Uberlândia, datada de04 de outubro de 1935

Na introdução, a autora elenca, de forma sucinta e objetiva, a fundamentação teórica que norteou o processo de construção do texto. Em termo de fontes, a pesquisadora consultou a legislação mineira sobre a criação das Escolas Normais no estado de Minas Gerais. Os principais aportes teórico-metodológicos incluíram Magalhães (1999) e Chervel (1990), os quais contribuíram, sobretudo, na consideração deque as grandes finalidades do ensino são, em geral, impostas às escolas, oficialmente, por meio de políticas educacionais de Estado ou de governos, mediante reformas do setor, o que colabora para a fixação dos conteúdos e das metodologias (p.13).

Para Chervel (1990), a condução da pesquisa deve ser realizada em dois planos simultâneos, por meio da utilização de dupla documentação: a dos objetivos fixados e a da realidade pedagógica, sem distanciar-se da pessoa do docente, sendo este o transformador das finalidades de ensino.

Ainda recorrendo a Chervel (1990), a autora destaca que historiar uma disciplina requer do pesquisador que se trate não somente da descrição dos conteúdos programáticos, que são apenas os meios utilizados para alcançar as finalidades impostas à escola - mas, também, dos aspectos relativos ao seu ensino. Assim, cabe-lhe “descrever a evolução da didática, pesquisar as razões da mudança, revelar a coerência interna dos diferentes procedimentos aos quais se apela, e estabelecer a ligação entre o ensino dispensado e as finalidades que presidem o seu exercício.” (CHERVEL, 1990, p.192).

Rosangela Guimarães estruturou a obra em três partes, cada uma delas contendo uma temática geral de abertura, seguida de dois capítulos, cada um contando com subcapítulos, distribuídos em assuntos geradores das reflexões empreendidas com o propósito de revelar as nuances envoltas em sua problemática de pesquisa.

Na primeira parte, a autora discorre sobre os cursos normais e a disciplina “História da Educação: dos primórdios à institucionalização e as prescrições para o ensino em Minas Gerais”, que conta com dois capítulos, sendo: Capítulo I As gêneses dos cursos normais e da disciplina História da Educação: da Europa ao Brasil e Minas Gerais. O Capítulo II Reformas no ensino normal mineiro e introdução da História da Educação no currículo da década de 1920.

No primeiro capítulo, a autora introduz a discussão, apresentando o subtema “Modernidade, escolarização e profissão”, tecendo breves considerações sobre o exercício da docência nos primórdios da Antiguidade, sendo esse processo concretizado aos auspícios do século XIX, irradiando-se pela Europa, com a criação dos cursos normais nas instituições públicas estatais e que, nesse contexto, acabaram por se organizar. Substancialmente, irá situar avanços nos processos de escolarização elementar e normal, iniciados no século XVIII em grande parte dos países da Europa e em especial nos EUA, concluindo que no Brasil esse processo iria se estender até as décadas iniciais do século XX.

Com o avançar de sua discussão, evidencia-se que no Brasil, apesar de não ter grande destaque, nos fins do século XIX, no Império, também se deu a criação das primeiras Escolas Normais, baseadas no formato francês. Mas, é no contexto europeu que as escolas normais iriam se disseminar, dada a emergência da pedagogia científica, a qual Nóvoa (1996) destaca que foi institucionalizada a disciplina História da Educação.

Em seguida, a autora aborda o processo rumo à escolarização pública brasileira no decorrer do século XIX, a legislação imperial e suas consequências para as províncias, na qual observa-se uma organização estatal no Brasil, o que ocorreu por volta de 1931, na Era Vargas, período no qual ocorrera uma unificação de diretrizes, às quais os Estados da Federação deveriam obedecer, sendo destaque a Lei Orgânica do Ensino Normal, em 1946. Salientando, nesse sentido, que o ensino elementar no Brasil é inicialmente o da França. O resgate e a reconstrução da Escola Normal no Brasil apresentam dificuldades devido ao fato de a estadualização dos sistemas de formação docente ser uma característica desde a sua origem.

Entre a promulgação do Ato Adicional (1834) e a Proclamação da República (1889), Minas Gerais foi o último estado a criar suas escolas normais, sendo que isso ocorreu nos períodos compreendidos entre 1871 e 1884, com a implementação de oito Escolas Normais, sendo uma delas em Uberaba-MG, instituição referência para a realização do estudo da autora. Contudo, faltava às instituições infraestrutura adequada, desde prédios a mobiliários adequados, baixa frequência dos alunos, além de ser constatado que a disciplina de História da Educação não foi inserida no currículo durante a fase imperial.

Ao tecer suas considerações sobre a escolarização em Minas Gerais, no fim do século XIX, o início da organização do Ensino Normal público na capital da província e na cidade de Uberaba, data de meados dos anos 1820, dada a importância da organização de um sistema público de ensino, porém outra questão limitava o processo, qual seja a falta de mestres de primeiras letras que fossem bem capacitados.

Foi também objeto de discussão, abordado pela autora, o pré-curso da disciplina “História da Educação em Minas”, no século XIX, no qual se apresentava o currículo que entraria em vigor a partir de 1833, sendo que o primeiro ano tendia ao básico, no sentido de prover os alunos quanto às competências essenciais ao aprendizado.

No segundo capítulo da primeira parte, a autora trata, a partir de um tema geral, sobre as reformas no ensino normal mineiro e a introdução da História da Educação no currículo, ocorridas na década de 1920. Apresenta, então, um cenário que discorre sobre as reformas que ela considera mais significativas em Minas Gerais, atribuindo-se especial atenção às metodologias de ensino e diversificação e hierarquização dos tipos de escola, em especial a Escola Normal da Capital, então já transferida para Belo Horizonte. Para a autora, tais reformas ocorreram à margem de um viés negativo, no que compreende a significativa redução de gastos com educação por parte do Estado. Como consequência da redução do número de unidades de ensino, ocorreu também a simplificação do currículo.

Nesse cenário de limitações, localizado nesse momento exatamente no governo de Francisco Sales (1902-1906), os cortes de despesas atingiram também os salários de professores, que sofreram achatamento considerável, bem como no encerramento das atividades da Escola Normal Oficial de Uberaba. Dado importante para esse momento, é o da existência das Escolas Normais equiparadas, pertencentes em geral às ordens religiosas, inclusive, para Uberaba, o pioneirismo das Dominicanas de Monteils, com o Colégio Nossa Senhora das Dores.

O curso Normal atravessaria várias mudanças, com respaldo no aparato legislativo, com a promulgação de decretos que visavam reorganizar os quadros de escola, e que, de certa forma, são apresentados na obra, no que a autora se utilizou da construção de tabelas e gráficos para apresentar dados que atestam a qualidade de sua primorosa pesquisa.

A segunda parte da obra foi intitulada “Da escola normal uberabense, dos vestígios do ensino escolar de História da Educação, das novas prescrições e mudanças educacionais em âmbito federal e estadual”. Esse grande tema abarca dois capítulos, o terceiro, nomeado “Primeiras aproximações da Escola Normal Oficial de Uberaba (1928 a 1938) e da cidade” e o quarto intitulado “Tempos de transição nas trajetórias históricas: da disciplina História da Educação e do setor educacional no país (1930 - 1948)”.

A autora prossegue sua investigação em busca do conhecimento sobre o ensino da disciplina “História da Educação na Escola Normal Oficial de Uberaba-MG”, por meio da realização de um contraponto entre a escola e a referida cidade, no qual ela elencou contextos e aspectos históricos da comunidade local e da instituição de ensino. Na época, a Escola Normal Oficial passava por instabilidade, sendo suprimida por meio do Decreto n.63, de 15 de janeiro de 1938, com o encerramento de suas atividades por uma década. A cidade contava ainda com a oferta do curso, porém em uma instituição de ensino confessional, sob o comando da ordem religiosa das irmãs Dominicanas de Monteills, o Colégio Nossa Senhora das Dores, em sistema de internato.

Esse educandário contava com um público exclusivamente feminino. Havia falta de profissionais formados, o que acarretava um alto índice de crianças não alfabetizadas, haja vista que a cidade crescia consideravelmente, sendo que Uberaba, naquele momento, era a maior cidade da região do Triângulo Mineiro, principalmente após a passagem da Companhia de Estrada de Ferro Mogiana.

Progressivamente, a autora coloca em tela os processos de ensino e de aprendizagem na Escola Normal Oficial de Uberaba (1928-1938), no contexto das ideias pedagógicas daquela época. O ensino Normal tem como regulamentação o Decreto 9.450 de 18 de fevereiro de 1930, que continha uma reedição do Decreto 8.162, de 20 de janeiro de 1928, que instituiu a reforma dessa modalidade de ensino. Sobre esse assunto, a autora recorre a Chervel (1990), afirma que durante um processo de reformas, é preciso apreciar o peso e a eficácia real da tradição em face das novas finalidades do ensino que se deseja enfatizar, pois pode ocorrer de essas finalidades (assim como os novos métodos) e objetivos ficarem ocultos sob o peso da tradição a ser substituída.

Ao transitar pela discussão sobre os vestígios do ensino da disciplina História da Educação, na Escola Normal Oficial de Uberaba (1928 a 1938),a autora conseguiu outros documentos relacionados à disciplina investigada, sendo um registro funcional, uma carta e um memorandum, envolvendo o professor responsável pelo ensino da disciplina “História da Civilização e da Educação”, algumas outras notícias vinculadas na imprensa local sobre o também palestrante Custódio Baptista de Castro, sendo esses eventos noticiados pela imprensa local, principalmente no Jornal Lavoura e Comércio.

Ao avançar para o quatro capítulo, último da segunda parte, a autora procede à análise de um novo programa para o ensino de História da Civilização, particularmente a História dos Métodos e Processos de Educação (1933), ainda no governo de Olegário Maciel (1930-1933), que era secretariado por Guerino Casasanta. Publica-se o Decreto 10.896,que aprova novos programas de ensino, especialmente de História da Civilização (narrado os fatos educacionais relativos aos povos de cada época), os quais a autora apresenta detalhadamente.

Observa-se, ainda, que a pesquisadora delineia aspectos importantes quanto às mudanças na organização do Ensino Normal brasileiro e mineiro na sua Lei Orgânica do Ensino Normal, bem como sua regulamentação na esfera estadual, dado um cenário o qual acabaria sendo alvo de importantes debates e diante dos quais novos rumos seriam tomados.

A terceira e última parte, nomeada “A história da Escola Normal Oficial de Uberaba (1948 - 1970)” e da disciplina “História e Filosofia da Educação” nos planos prescritivos e do ensino, também há dois capítulos. O quinto capítulo é intitulado de “A identidade histórica da Escola Normal Oficial de Uberaba na dinâmica da cidade nas décadas de 1950 e 1960)” e, o sexto capítulo, foi nomeado “A história da disciplina ‘História e Filosofia da Educação’ na interface prescrição e prática pedagógica (1940-1970)”.

No que contempla a identidade histórica da Escola Normal Oficial de Uberaba, na dinâmica da cidade entre as décadas de 1950 e 1960, decorrem os contextos locais e o processo de reabertura, tendo como referência temporal o fim da Era Vargas (1945), o mandato do chefe do executivo de Uberaba-MG, Luiz Boulanger Pucci, período que propiciaria um salto na área educacional com a inauguração de várias escolas, dentre elas, três grupos escolares. Esse governante passou a ser denominado e conhecido como o prefeito da instrução. Um de seus principais objetivos era a reabertura da Escola Normal na referida cidade.

No início, a escola não possuía sede fixa, o que demandaria a construção de um prédio próprio. Inicialmente, a unidade recebeu a denominação de “Leôncio Ferreira do Amaral”, que fora professor e diretor nessa unidade de ensino. Esteve desligado da unidade por um período de tempo por motivação de sua transferência para Belo Horizonte, para assumir o cargo de diretor geral do Instituto de Educação de Minas Gerais. O perfil da clientela da Escola Normal de Uberaba era predominantemente feminino, sabendo-se, então, que no período em tela se formaram apenas dois normalistas do sexo masculino.

No sexto capítulo a autora transitou, estudou e discutiu a história da disciplina “História e filosofia da educação na interface entre o prescrito e a prática pedagógica” no período compreendido entre 1948-1970. A autora elenca a origem e a listagem de conteúdos (com programas) de ensino, quantidade de aulas semanais. As matérias ministradas foram elaboradas pelos docentes da instituição e distribuídas no início de 1947. A disciplina “História e filosofia da educação” passa a fazer parte da matriz curricular proposta.

Porém, a pesquisadora, por meio de levantamento realizado no acervo da Biblioteca da escola, descobriu que constavam dois manuais pedagógicos da disciplina “História da Educação, de Paul Monroe e “História e Filosofia da Educação”, de Theobaldo Miranda dos Santos. Sobre os temas de estudo, a autora relatou a existência de um roteiro básico para o desenvolvimento do ensino em questão. Esse roteiro tratava-se, provavelmente, do programa elaborado no Instituto de Educação de Minas Gerais (IEMG).

Em suas análises, a autora considera que a partir dos estudos da disciplina em questão, esta não foi vista como uma matéria que trouxesse contribuições ou proporcionasse à professora primária lições para o presente em relação ao passado. Aqui considerando que, no programa preparado por Andrade (1947, p. 229), no IEMG, afirmava-se que “[...] a nova cadeira de História e Filosofia da Educação - [...] entre todas, é a que mais concorre para o desenvolvimento cultural do aluno”.

Os conhecimentos trabalhados sob a denominação de “História da Educação”, conforme pôde ser observado no caderno de uma aluna, consistia na descrição das práticas educativas preconizadas por personagens de destaque em algum campo sociopolítico ou do conhecimento (filosófico, religioso, político, científico) ou na descrição das práticas desenvolvidas por determinados povos da antiguidade.

Não foram encontrados documentos legais ou oficiais que referendassem um método de ensino a ser exigido, predominando, nesse sentido, o ensino tradicional, com aulas expositivas, anotações copiadas ou ditadas e provas baseadas na memorização de conteúdos.

Finalizo com a percepção de que Rosangela Maria Castro Guimarães contribui de forma ímpar para a área de estudos que contempla as pesquisas no campo das disciplinas escolares, em especial no ensino de História da Educação nas Escolas Normais, em particular nesse estudo, a escola leiga, sendo de grande valia àqueles que se ocupam desse ofício.

A trajetória de construção de sua pesquisa apresenta um panorama que se sustenta em sólida investigação, pautada em uma averiguação subsidiada em legislação que referenda o interesse inerente aos desdobramentos imbricados no ensino de História da Educação tanto na Escola Normal Oficial de Uberaba-MG quanto no próprio Estado de Minas Gerais. Para tanto, não mensurou esforços na busca de fontes materiais, documentais, elaboração de novas fontes a partir de elementos presentes na história oral (contando com depoimentos significativos à consolidação do seu trabalho).

Por fim, pode-se considerar que os objetivos propostos neste trabalho evidenciam como se deu o ensino da disciplina História da Educação na Escola Normal Oficial de Uberaba”, compreendendo os aspectos inerentes às prescrições em face da realidade escolar, bem como o recorte temporal a que se propôs, considerando ser uma leitura importante para os interessados nessa temática.

Referências

ANDRADE, Maria do Carmo Dufles. Programa de História e Filosofia da Educação. Belo Horizonte: Instituto de Educação de Minas Gerais, 1947, 5.p. (Impresso datilografado). [ Links ]

CHERVEL, André. História das Disciplinas escolares. Teoria e Educação, n. 2, Porto Alegre - Panorâmica, 1990. [ Links ]

JUNQUEIRA, Noemy. Algumas considerações sobre a natureza da atenção e sua influência nos processos educativos. Monografia de conclusão do Curso de Aplicação da Escola Normal Oficial de Uberaba. Manuscrito, 1935. [ Links ]

MAGALHÃES, Justino. Para a história do ensino Liceau em Portugal: Atas e colóquios do I Centenário da Reforma Jaime Moniz (1894-1895). Braga: Universidade do Minho, 1999. [ Links ]

NÓVOA, Antônio. História da Educação: percursos de uma disciplina. Análise Psicológica, n.4 (XIV), 1996.p. 417-434. [ Links ]

Recebido: 10 de Novembro de 2022; Aceito: 15 de Dezembro de 2022

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