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Reflexão e Ação

versión On-line ISSN 1982-9949

Rev. Reflex vol.26 no.2 Santa Cruz do Sul mayo/agosto 2018  Epub 16-Sep-2019

https://doi.org/10.17058/rea.v26i2.8400 

Artigos do Fluxo

MÍDIAS E TECNOLOGIAS DIGITAIS NA LICENCIATURA: NOVAS REALIDADES, NOVAS FORMAÇÕES1

MEDIAS AND DIGITAL TECHNOLOGIES IN THE PRESERVICE TEACHER EDUCATION. NEW REALITIES, NEW EDUCATIONS

MEDIA Y LAS TECNOLOGÍAS DIGITALES EN LA LICENCIATURA. NUEVAS REALIDADES, NUEVAS FORMACIONES

Simão Pedro P MARINHO2 

2Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil; marinhos@pucminas.bre


RESUMO

O artigo traz uma reflexão sobre desafios para uma formação inicial de professores na Era Digital que possa potencializá-los a promover inovações nas práticas pedagógicas em uma escola que exibe uma nova ecologia cognitiva por conta das tecnologias digitais de informação e comunicação. No desenvolvimento do artigo, é relatada uma experiência inovadora na formação inicial de professores de Biologia que envolveu novos letramentos, envolvendo recursos da Web 2.0, e a utilização de novas linguagens, na forma de infográfico, com o uso de dispositivos móveis. Também se apresentam os resultados de uma enquete feita junto aos estudantes ao final da atividade.

Palavras-chave:  Formação inicial de professores; Tecnologias digitais de informação e comunicação; Novos letramentos; Novas linguagens; Tecnologias móveis

ABSTRACT

The article presents a reflection on challenges for a preservice teacher education in the Digital Age that can empower them to promote innovation in teaching practices in a school that shows a new cognitive ecology because of information and communication digital technologies. In the development of the article, is reported an innovative experience in Biology preservice teacher education involving new literacies, with Web 2.0 resources, and the use of new languages, in the form of infographic, with the use of mobile devices. It also presents the results of a survey taken with students at the end of the activity.

Keywords:  Preservice teacher education; Information and communication digital technologies; New literacies; New languages; Mobile devices

RESUMEN

El artículo presenta una reflexión sobre los retos para la formación inicial del profesorado en la Era Digital que puede darles la posibilidad de promover la innovación en las prácticas de enseñanza en una escuela que muestra una nueva ecología cognitiva debido a tecnologías digitales de información y comunicación. En el desarrollo del artículo, se relata un experimento innovador en la formación inicial de maestros de Biología que implicó en nuevas alfabetizaciones, envolviendo recursos de la Web 2.0, y el uso de nuevos lenguajes, en forma de infografía, con el uso de dispositivos móviles. También se presentan algunos resultados de una encuesta realizada entre los estudiantes al final de la actividad.

Palabras clave:  Formación inicial del professorado; Tecnologías digitales de información y comunicación; Nuevas alfabetizaciones; Nuevos linguajes; Dispositivos móviles

INTRODUÇÃO

Minha aproximação com a informática se deu logo no início dos anos 1980, quando surgiu o microcomputador, como se chamava. Entusiasmado pelas perspectivas oferecidas pela propaganda, comprei um microcomputador baseado no processador Z-80, que tinha dois KBytes de memória, era ligado a uma televisão comum e gravava os dados em um gravador minicassete. Com um neófito absoluto no campo da informática, fiquei entusiasmado com o programa sobre agenda telefônica que recebi para uso no meu microcomputador. Instalei o software, peguei a velha agenda de papel, analógica, e fui inserindo, na máquina digital, os telefones dos conhecidos. Um dia precisei telefonar para um dele e pensei: “Vou consultar a minha agenda eletrônica”. O problema é que levou tanto tempo para que o microcomputador rodasse o software e chegasse ao número de telefone que me interessava, que quando o identifiquei já me esquecera do que tinha que falar com esse conhecido. Eu sabia o nome da pessoa, tinha o número de seu telefone na tela, mas já não mais me lembrava do que falar. O tempo que o microcomputador levou para localizar o número de telefone que eu precisava não se deu apenas porque sua memória RAM era bastante limitada, uma noção que sequer tínhamos naquela época, pois aquilo era o disponível3. O problema estava, também, no fato de que a minha “poderosa” máquina lia os dados, armazenados em uma fita cassete comum, em ordem sequencial. Era como passar, folha a folha, a velha analógica agenda de telefones.

A frustação com a experiência da “agenda eletrônica” em uma máquina que era anunciada como trazendo enormes potenciais não me levou a abandoná-la. Até por conta do dispêndio financeiro que fizera com a sua compra, passei a conjecturar como usar o microcomputador na educação. Se era uma máquina tão poderosa, possivelmente poderia contribuir para novo fazeres na escola.

O primeiro caminho que se abriu foi de programar simulações aplicáveis à educação. Tratei de aprender BASIC4 para criar simulações. Em 1984 publiquei na extinta revista Microsistemas um artigo no qual apresentava uma simulação de sistemas elétricos. (MARINHO, 1984). No ano seguinte propus uma reflexão sobre o uso de microcomputadores na escola com um artigo publicado na revista Ciência e Cultura (MARINHO, 1985). O tema teve o que posso considerar um impacto significativo quando o artigo foi o mote para a capa daquele número da revista. Em 1987 compartilhei algumas reflexões sobre o uso de microcomputadores na escola (MARINHO, 1987) a partir de um congresso do qual participei no México, a convite do National Research Council dos Estados Unidos.

Nesse interim passei a me dedicar a produzir simulações em temas da Biologia. E aí veio uma nova frustração. Desenvolvi uma simulação aplicável à relação predador-presa a partir da equação de Lotka-Volterra. No simulador, o usuário informava um número inicial de predadores e presas em um ecossistema e o computador, um Apple II, rodava, acelerando o tempo, e permitia ver como as populações flutuavam. Ali estava uma demonstração que poderia provocar interessantes debates em uma aula de Ecologia. Entusiasmado com o que desenvolvera, chamei um colega de universidade, professor de Ecologia, para opinar sobre a ideia. Ele veio até minha sala, viu a simulação rodando, disse uma única expressão, “Muito bom”, e se foi. Naquele momento eu vi que a questão da incorporação dos computadores na escola demandaria muito tempo, pois seria necessário contarmos com professores minimamente preparados para ao menos refletirem sobre possibilidades de uso. Na verdade, naquela época microcomputador ainda era coisa estranha para a quase totalidade deles. Portanto, a mim parecia que não se trataria apenas de questão de hardware ou software, mas de “personware”.

A experiência que vinha acumulando e essa nova frustração me levaram a fazer um Doutorado em Educação para estudar especificamente a questão do uso das tecnologias digitais de informação e comunicação, TDIC5, na educação. Mestre em Morfologia, deixei de lado o conforto de um doutorado na mesma área para aventurar-me no campo da Educação. Algum tempo depois, com o título de Doutor em Educação, com uma tese sobre os desafios na incorporação do computador na escola (MARINHO, 1992), mudei meu rumo na PUC Minas. Deixei de lado as disciplinas Citologia e Genética que lecionava na Área de Ciências Biológicas e da Saúde e fui cuidar de informática no ensino de Ciências e Biologia, no curso de Ciências Biológicas. Depois vinculei-me ao quadro de docentes permanentes do Programa de Pós-graduação em Educação da universidade. Ali organizei um grupo de pesquisa, ativo, que integra o Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. Nesse Programa de Pós-graduação desde há quase duas décadas conduzo pesquisas, busco construir uma produção acadêmica, oriento dissertações e teses sobre as TDIC na escola.

Ao longo desse tempo novas questões foram surgindo e sendo tratadas no grupo de pesquisa, nos artigos, trabalhos em congressos, dissertações e teses. Passamos a estudar a nova realidade da Educação a Distância, trazida pela internet na criação da sala de aula virtual, que gosto de chamar de “sala de bits”, em contraponto com a velha sala de tijolos. O surgimento de recursos da Web 2.0 nos trouxeram novas oportunidades de estudo. Mais recentemente são os dispositivos móveis, smartphones e tablets, que me desafiam nos estudos e passam a ser objeto de minhas produções acadêmicas. É interessante ver com algumas pequenas frustrações abriram-me enormes oportunidades, ao me oferecerem um campo amplo para estudo.

Ao longo dessas mais de três décadas as TDIC evoluíram muito. Hoje praticamente cada um de nós carrega consigo um computador embutido no smartphone. A abertura da internet e sua expansão nos permitiram construir novos mundos, transformaram radicalmente as formas como nos comunicamos e buscamos informações. Como afirma Turkle (2001), as TDIC são tão potentes que modificaram no fundo quem nós somos; hoje somos outros, somos diferentes, porque estamos efetivamente envolvidos com essas tecnologias.

Definitivamente o mundo é outro. As transformações digitais, com novos espaços e dispositivos, vão introduzindo novos modos e formas no cotidiano das pessoas e é bastante razoável esperar que isso ocorra na escola, o aparelho da sociedade para a educação formal, até porque as transformações implicam em maneiras diferentes de lidar com o conhecimento.

Porém, o que vemos é uma escola que pouco ou nada mudou, como se fosse uma escola à margem do mundo. Por isso ouso discordar, respeitosamente, do título de um livro que diz que a escola mudou e que, por conta disso, clama para que mudemos a formação de professores (VEIGA, SILVA, 2010). Discordo do título, não da essência do livro, um livro que acredito todos deveriam ler. Concordo, absolutamente, com a necessidade de mudanças na formação de professores. Faço coro com outros autores que têm buscado chamar a atenção para uma insuficiência/deficiência das licenciaturas, que não só desconhecem, de maneira geral, as tecnologias digitais, mas que praticamente restringem a formação a estudos teóricos, deixando de lado o fazer na sala de aula. Uma boa denúncia quanto a uma formação que não prepara adequadamente, formando o que considero um “professor obsoleto”, encontro no livro de Gatti e Barreto (2009).

Por que, ao menos para mim, a escola não mudou? Primeiro, porque continua a escola centrada no professor. É uma escola que permanece como o “reino da aula expositiva”, magister dixit, o lugar onde só fala o professor para um aluno que só escuta. É a escola da monofonia, pois só fala um, o professor. É a escola da monocromia, do quadro. Consequentemente, é a escola da monotonia. Em segundo lugar, porque ainda aplica a metodologia da memória a curto prazo.

Vejo a escola obsoleta na universidade em que trabalho, nas escolas onde meus orientandos de Mestrado e Doutorado lecionam, na escola onde a minha mulher ensina Biologia.

Esta escola tem – como sempre teve - tecnologias e as utiliza, sem dúvida. Mas utilizar basicamente o quadro, a tecnologia que foi inventada exatamente para a escola, coisa que o computador não foi. E conta com mais duas tecnologias, o aparelho fonador do professor e o aparelho auditivo do aluno, “tecnologias” de comunicação criadas pelo processo evolutivo.

Se olharmos pelo prisma das TDIC, ao mesmo tempo em que constatamos as muitas mudanças que provocaram em nossas vidas, veremos que a escola não mudou, exatamente porque não mudaram os professores. Professores não mudaram porque não mudaram as escolas formadoras de professores. Escolas que formam professores não mudaram porque não mudaram seus professores. E se nada disso muda, a escola continuará sendo o que vem sendo desde o século XIX, quando havia o quadro de giz e o professor era essencialmente a única fonte de informação, quando não havia computador e internet e quando novos letramentos ainda não eram demandados (JENKINS, 2009).

Quando se trata das TDIC, não raro identifico o “professor avestruz”, que afunda a cara no chão para fingir que não enxerga tais tecnologias. O “professor avestruz” parece querer evitar uma nova realidade que se impõe, porque não quer ter o trabalho que incorporar as TDIC em práticas pedagógicas inovadoras certamente exige; ele não quer sair de uma zona de conforto que construiu com a adoção de velhas práticas, que são as marcas de um modelo tradicional (MIZUKAMI, 1986) ou conservador de educação LIBÂNEO, 1982). O “professor avestruz” se centra no ensino, como pouca atenção à aprendizagem.

Por outro lado, é interessante notar que o “professor avestruz” não é um “cidadão avestruz”. Ele usa computador, usa smartphone, tablet, se informa e se comunica através destas tecnologias. É possível que durma com elas, que não viva sem elas. Pode ser que tenha “síndrome de abstinência” se ficar sem elas; pode ser que sofra de nomophobia ou outras doenças (ROSEN, 2012) que vêm sendo descritas como afetando pessoas absolutamente envolvidas com as tecnologias.

Vejo a escola fazendo um uso praticamente marginal das TDIC, quando o faz. A razão a mim parece simples, falta a formação de professores para a sua efetiva incorporação nos processos de aprendizagem. De maneira geral os professores não estão preparados para desenhar propostas de formação mais individualizadas, na personalização de conteúdos e no desenvolvimento de habilidades e competências, onde as TDIC poderiam certamente trazer valiosa contribuição, permitindo aos estudantes o acesso a mais fontes de informação e a materiais melhores, mais ricos, o desenvolvimento a criatividade, ensejando a reflexão ao invés da memorização. Fazem um uso pobre das TDIC, caracterizado exatamente por agregar pouco valor à formação, ao invés de promover o uso rico ou inteligente (VALENTE, 1999).

Temos uma escola que proíbe o uso de celulares, porque os vê como estimuladores do desinteresse, quando deveria ver exatamente o contrário, ou seja, o aluno se ocupando com seus celulares porque a aula não o estimula. O celular não dispersa o aluno, permite que o aluno disperso, porque desinteressado, de alguma forma se ocupe.

Vejo uma escola da restrição, na medida em que se restringe o estudante ao papel de ouvinte apenas da informação que o professor selecionou, ainda que nos smartphones e tablets nos ofereçam, nas palmas das nossas mãos, um mundo de informação. Não há lugar e momento para buscar o contraditório, mote essencial para uma formação reflexiva, para o exercício da crítica, inclusive na perspectiva da formação para a cidadania.

Enfim, temos a escola da qual o aluno não gosta, da qual o professor não está gostando dela. A escola está virando um lugar do não-gostar, quando devia ser um dos lugares mais gostosos do mundo.

A escola que faz a formação inicial de professores é também assim; é a escola da monotonia, da cultura do ensino, da memorização da informação limitada. É uma escola cheia da cultura do ensino e vazia da cultura da formação (BARBIER, 2013). E temos aí um enorme desafio: mudar a escola que deve formar formadores, para além de formar professores.

Inovação e mudança na formação de professores

Sou um dos que reconhecem que as TDIC são um bom mote para mudanças na formação dos professores, especialmente na inicial. Não me coloco como um “tecno-deslumbrado” que considera que a simples adoção dessas tecnologias significará mudanças qualitativas substanciais na escola, não vejo as tecnologias digitais como atalhos para a boa educação. Mas, por certo, não sou um cético que guarda resistências porque muitos estudos mostram que de fato a presença das TDIC, em alguns países de forma massiva, não vem assegurando avanços na qualidade da educação (CUBAN, 2001; ALBUQUERQUE, 2006). Razões para que os resultados não coincidam com as expectativas postas possivelmente repousam no fato de que integrar tecnologias na escola não é uma questão de tecnologia, mas primariamente uma questão de conteúdos e práticas efetivas de aprendizagem (EARLE, 2002).

Uma mudança na formação de formadores exigirá que sejamos cada docente de licenciatura seja um formador, ou seja, “mais um organizador de situações de aprendizagem do que um detentor ou transmissor de saberes” (BARBIER, 2013, p.23). A mudança nas licenciaturas virá, assim penso, com um processo que incorpora vários R.

O primeiro é o R da ruptura. Temos que romper com uma forma tradicional de ensinar e aprender. A escola ainda adota um modelo que cada vez mais se revela esgotado, exigindo que se avance para romper com ele.

A ruptura implicará, de alguma forma, no segundo R, o de reconfigurar. Se consideramos que ensinar deve ir além de transmitir conteúdos e que que aprender deve significar muito mais do que os memorizar, precisaremos reconfigurar as práticas pedagógicas.

O terceiro R é de ressignificar. Precisamos dar outro sentido ao que seja conhecimento, considerando inclusive habilidades e capacidades.

Um outro R é o de reorganizar a relação teoria-prática. Ainda se nota um distanciamento notório entre esses dois elementos na formação de professores, como vem sendo de alguma forma denunciado por renomados estudiosos quando apontam as insuficiências das nossas literaturas (GATTI, 2010; 2013-2014; GATTI, NUNES, 2009).

Será essencial, ainda, um quinto R nesta lista que elaboro, o R de reconhecer saberes de alunos. Trabalhando, na licenciatura, com tecnologias digitais – e isso se aplicaria em outros campos do saber – não posso partir do pressuposto de que meus alunos nada sabem sobre elas, que são “tabula rasa”. Eles não estão vazios de conhecimento. Quanto às TIDC, têm saberes sobre coisas que desconheço; então, busco aprender com eles. Mas muitas coisas eu sei, apesar de ser um “imigrante digital” (PRENSKY, 2001) e e eles (ainda) não sabem. Enfrento sem receio o desafio ensinar a “nativos digitais”6. Afinal, eu tenho os usos educacionais das TDIC como campo de pesquisa, como campo de estudo, o tempo todo. Parece-me natural que eu tenha saberes que meus alunos de licenciatura ainda tiveram a oportunidade de construir. É minha tarefa compartilhar esses saberes, desenhando atividades de aprendizagem para que construam seus próprios saberes.

Quando falo da ruptura, entendo que hoje ela necessariamente significa incorporar as TDIC. Desconhecer, no espaço da formação, bem como nas demais escolas, tais tecnologias que tanto mudam a própria sociedade, que afetam profundamente as vidas das pessoas, é fechar os olhos para o mundo. Não cabe à escola ser um mundo fora do mundo.

Alguém dirá que as TDIC estão presentes na formação inicial de professores. Não é possível discordar da afirmação em um sentido mais amplo que ela traz. Mas o que a escola tem feito? Lançar mão das TDIC para apoiar o professor na tarefa de ensinar, daquilo que ele tem como sendo ensinar. Ou seja, são TDIC para os professores continuarem informando. É a tecnologia para ensino, não para aprendizagem. É tecnologia para o professor, não para o estudante. Resumindo, é tecnologia nova para pedagogia velha, são tecnologias novas em velhos currículos (MARINHO, 2006).

Quando olhamos as práticas com TDIC na escola da formação de professores, encontramos um uso que não passa de simples substituição de velhos artefatos, o nível mais baixo, ou simples, no modelo de Puentedura (s.d.). O computador serve para editar textos, incluindo as provas, serve para registro de notas. Mas isso é notadamente atividade na coxia, por trás do “palco”. No palco, a sala de aula, temos o que venho denominando de powerpoint-based education. O que se fez foi pegar o que estaria em um retroprojetor e transpor para o PowerPoint. O software instalado em um computador acoplado em um projetor multimídia constitui o novo retroprojetor. É interessante notar que muitos professores elaboram slides no PowerPoint da mesma forma que criavam as lâminas para retroprojetor. Como as lâminas, que eram “queimadas”, custavam algum dinheiro, o usual era lançar de letras pequenas de modo a poder inserir muito texto em uma única lâmina. Hoje se a pessoa fizer uma tela de Power Point, dez ou cem, custará a mesma coisa. Porém muitos professores ainda insistem em ter no PowerPoint uma tela, duas telas, inundadas de texto, como se ainda fosse necessário economizar a lâmina.

Tenho comigo preocupação, que é muito forte, no problema que eu chamo da “clonagem das práticas pedagógicas”. Como é que ao menos se iniciam, na prática, os professores? Geralmente repetindo seus professores, copiando aqueles que julgam melhores. Portanto, se o “modelo” que os licenciandos terão para copiar é um professor que não adota as TDIC, ou não consegue ir além de uma utilização que serve de suporte para o ensino, será cada vez mais difícil que abordagens inovadoras, novas práticas surjam nas salas de aula da Educação Básica, principalmente para dar conta dos cinco C, capacidades que precisamos promover na educação básica contemporânea, aliados ao domínio de conteúdos (Fig. 1).

Fig. 1 Os cinco C as Educação no Século XXI 

Ações na formação inicial de professores de Ciências e Biologia

Enquanto docente de licenciatura, trago comigo o convencimento de que as TDIC podem ser uma chave para transformar a escola. Se falamos de tecnologia na escola, mas sem romper com os paradigmas que aí estão de ensino e de aprendizagem, empiristas, sem abandonar a educação bancária (FREIRE, 1987), as teremos apenas para transferir informação. Será fazer ainda que utilizando as TDIC aquilo que a escola sempre fez, em uma inovação conservadora (CYSNEIROS, 1999) ou modernização conservadora (STRECK, 2012), que acaba por não contribuir para uma melhoria da educação. Por certo será muito investimento, de toda ordem, para parcos resultados.

Mas podemos, ou devemos, e aí vai enorme desafio, pensar nas TDIC como estratégia para uma inovação disruptiva na sala de aula (CHRISTENSEN, HORN, JOHNSON, 2008), convencidos de que inclusive a separação on-line e off-line tende rapidamente a se esvanecer, o que nos leva a pensar em uma educação on-life (FLORIDI, 2015). Nessa nova educação, de um modelo disruptivo, as salas de aulas virtuais e as de tijolo como que se fundem, encerrando uma demarcação, física e temporal, que ainda impera. Da mesma forma que ser humano na Era Hiperconectada é ser diferente, fazer escola nessa Era exigirá fazer diferente.

A escola a ser construída é a da aprendizagem significativa, com aprendizes ativos e a mediação pelo professo. É praticar, no século XXI, as ideias de John Dewey, postuladas há quase um século. É importante lembrar que ponto de vista da teoria, isso será novidade nenhuma. A novidade estará em, de fato, praticar-se isso na escola. Essa escola a ser construída exige a construção de uma nova escola que forma professores.

Na formação inicial de professores de Ciências e Biologia na PUC Minas estamos atentos ao alerta de Paulo Freire - alerta para todo e qualquer professor - com o qual chamava a atenção para a necessidade, fundamental, de diminuirmos a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que, num dado momento, a nossa fala seja a nossa prática.

Temos, na PUC Minas, uma proposta sólida para a formação de professor no contexto de um mundo imerso em tecnologia, em uma sociedade da tecnologia, como queiram chamar. Na nossa tarefa de formar professor de Ciências e Biologia, temos que que lidar com dois aspectos. Existem os conteúdos que são próprios da Biologia, é necessário ao licenciando aprender Zoologia, Botânica, Bioquímica, Biofísica, Citologia, Histologia, Anatomia, Fisiologia, Genética, Evolução e outros temas. Além deles temos os conteúdos que são próprios da formação pedagógica. O grande desafio é fazer com que a formação pedagógica se faça também em perfeita articulação com as disciplinas do conteúdo. Por isso, no nosso curso, todo docente do chamado “conteúdo específico” precisa ter, em seu plano de ensino, ao menos uma unidade que trata do ensino de conteúdos da sua disciplina. Então, o professor de Bioquímica tem que cuidar do como se ensina Bioquímica, da mesma forma o professor de Zoologia, o de Botânica e os demais, o que, contudo, não dispensa a matriz disciplinar da formação pedagógica

Temos, na PUC Minas, o forte convencimento de que a licenciatura é o lugar para que futuros professores aprendam a utilizar as TDIC nos processos de aprendizagem, que saiam da graduação capazes de desenhar propostas de aprendizagem que incorporem tais tecnologias. Quando olhamos como inserir as TDIC nessa formação, vamos reconhece-las ocupando dois espaços/momentos. Um é o da aprendizagem de conteúdos próprios da Biologia. Assim, os estudantes usam simuladores, modelos moleculares tridimensionais, além de ferramentas tradicionais, se assim podemos dizer, como as de produtividade do pacote Office. O outro espaço é para que os licenciados aprendam como incorporar as TDIC em futuras práticas pedagógicas, com seus próprios alunos. Sem desconsiderar que práticas que incorporam as TDIC já podem ser adotadas nos estágios curriculares, nas ações do PIBID. Na tarefa que me cabe nessa formação, preciso aliar diversos saberes: os dos conteúdos, o de práticas pedagógicas e os sobre as tecnologias, proponho uma formação que atende a proposta do TPACK (), considerando um “framework” para que os licenciados construam competência em TDIC (UNESCO, 2011).

Os recursos da Web 2.0 são de uso frequente na formação que oferecemos. A Web 2.0 é identificada pelo software social, sempre em versões beta-teste. O que isso significa? Software que está, permanentemente, em aprimoramento, sempre sendo revisto e que, praticamente, nunca chegará à sua versão final. Tendo essa referência, me pus a pensar: “Por que não adotar práticas pedagógicas beta-teste na escola? ”, “Por que não experimentar alternativas? ”. Se dão errado, as corrijo; se funcionam, reforço-as. Preciso, enquanto formador, ter a ousadia de experimentar alternativas, até para que meu aluno possa criar suas experimentações no futuro, quando professor. Estou convencido de que falta ousadia à escola. Nós, professores, de maneira geral temos medo de errar. Se elaboramos uma aula diferente, pode ser que algo saia errado e tenhamos problemas, até mesmo pelo risco de questionamento do nosso saber. Ainda temos forte na escola o sentimento de que saber é poder. Assim, o professor não pode permitir que venham a saber que ele não sabe tudo, sob o risco de perda do poder. Tendo que lidar com uma “pedagogia da certeza”, o professor se prende às práticas que já desenvolve há tempos. Elas lhe dão a segurança que ele precisa. Por isso, para arriscar-se em alternativas, o professor deve estar convencido de que, pior que o erro que possa cometer quando tenta mudar é o erro de não tentar fazer diferente.

Certamente o fato de atuar na educação superior favorece minha ousadia. E nessa ousadia, comecei a incorporar o uso dos dispositivos móveis na minha sala de aula. A ousadia se inicia em um afrontamento: em Minas Gerais existe uma lei que proíbe a utilização de telefones celulares nas salas de aula.7

O que fundamenta esta lei? O reconhecimento de que o celular, é a “tecnologia da perturbação” ou “da distração”. O convencimento é o de que o dispositivo distrai o aluno e que acaba perturbando o professor. Tenho comigo um convencimento diferente. O professor, com uma aula na qual seus alunos não veem sentido, os perturba e eles, para se distraírem da perturbação, se ocupam com seus celulares, em comunicação com suas redes sociais ou fazendo outras coisas. Já que, ao menos para mim, parece restar provado que não adianta proibir o uso de tais dispositivos, vamos, então, transformá-los em tecnologia para a aprendizagem. E essa possibilidade fica muito mais interessante quando olhamos meta-análises que apontam que o uso de dispositivos móveis é mais efetivo na performance de aprendizagem de estudantes do que o de desktops ou do que o não uso da tecnologia (SUNG, CHANG, LIU, 2016).

Por que não estamos conseguimos transformar a realidade do “problema dos celulares na sala de aula”? Porque os professores não sabem como fazer dos dispositivos móveis uma tecnologia da/para a aprendizagem. A UNESCO elencou diretrizes para o uso das tecnologias móveis na escola (UNESCO, 2014a, 2014b), para as quais educadores, professores, gestores e formuladores de políticas públicas em educação deveriam voltar uma atenção, até por conta da necessidade de que os alunos construam sua cidadania digital (KURNABOGLU, 2014; RIBBLE, 2015), que se integra na cidadania global (UNESCO, 2015). Para formar crianças e jovens cidadãos digitais, precisamos contar com professores que sejam cidadãos digitais.

No início os dispositivos móveis serão, na sala de aula, uma tecnologia emergente. Ela vai aparecer, vai se destacar. Entretanto, a minha expectativa é a de que tempo os dispositivos móveis se tornem uma “tecnologia invisível”. Tecnologias invisíveis na sala de aula são aquelas que já não nos chamam mais atenção, um quadro de giz, um quadro branco, elementos naturais no cenário da sala de aula. Quando os dispositivos móveis se tornarem tecnologias invisíveis, os estudantes dele lançarão mão quando preciso, no decorrer da aula, e os guardarão no momento em que não forem necessários.8 Isso já acontece na minha sala de aula. Os celulares são utilizados pelos meus alunos em atividades de aprendizagem, servem para, com auxílio de leitor de QRCode, permitir que leiam textos, vejam vídeos e apresentações. Podem, se for o caso, fazer isso na sala de aula, usando os dispositivos móveis e fones de ouvido, em casa ou no trajeto para ela. Na minha sala de aula o celular deixou de ser o perturbador da aprendizagem para ser um recurso na promoção dela. Se nas viagens aéreas estamos obrigados a colocar nossos dispositivos no “modo avião”, na minha sala de aula peço aos alunos que os coloquem no “modo educação”.

Estamos em 2016. Chegará em breve à universidade quem nasceu no século XXI, no terceiro milênio. Por isso, definitivamente não me parece mais ser possível fazer a escola do século XIX.

No meu trabalho tenho preocupação com “verbos” e não com “substantivos”. O que quero dizer com isso? Eu não estou muito preocupado com a ferramenta que o aluno vai usar, se será um software ou aquele outro, este ou aquele site. Software, ferramenta, site são o que chamo, neste caso, de substantivo. E por que não me preocupo muito com isso. Porque software, ferramentas, sites se vão com o tempo, da mesma forma que novos chegam. Estou preocupado com os verbos: criar, criticar, interpretar, apresentar. Para que os alunos façam isso, lançaremos mãos do software mais adequado, da melhor ferramenta, do site mais indicado.

O claro propósito é o de formar professor reflexivo, com capacidade crítica inclusive sobre a incorporação das TDIC na escola. Não quero simplesmente instrumentar para a tecnologia, eu quero que meu estudante se prepare para fazer escolhas de tecnologia na realidade da escola que trabalhará. Será ele, na sua prática, quem definirá quais tecnologias usar, quando e como fazê-lo. O que procuro fazer é uma formação para a prática, mas não uma formação domesticadora, que diga “você tem que usar esse recurso”. Não se trata disso. O objetivo é mostrar possibilidades e estimular a construção de uma capacidade crítica para fazer escolhas. Para isso meus alunos criam e avaliam recursos. Elaboram recursos de TDIC para ensino de Ciências e Biologia, no exercício da autoria. Criam WebQuest, tutorial multimídia, quiz online, infográficos, lidam com aplicativos de realidade aumentada. Fazem narrativa digital, que passaram a substituir o tradicional relatório do trabalho integrado do semestre, com os vídeos armazenados no YouTube. Avaliam jogos, objetos de aprendizagem, simulações, recursos de realidade aumentada. Mas, principalmente, avaliam situações e contextos de aprendizagem, no que é muito mais importante do que a ferramenta em si. Em síntese, lidamos, na prática, com uma taxonomia de objetivos educacionais de Bloom revista para os novos tempos da educação (ANDERSON, KRATHWOHL, 2001), na perspectiva de utilizar pensamentos de ordem superior (Fig. 2).

Adaptado de Anderson, Krathwohl (2001)

Fig. 2 Taxonomia dos domínios cognitivos revista 

Estamos promovendo inovação, rompendo com um modelo de aula, de escola no qual não mais encontramos sentido. É um desafio, não só aos estudantes, mas a mim mesmo, enquanto professor.

Uma prática concreta na formação inicial de professores

Nesta parte relato uma experiência na formação inicial de professores de Ciências e Biologia que envolveu novas alfabetizações, linguagens múltiplas e tecnologias móveis.

Tomamos como tema gerador de uma atividade de formação a encíclica “Laudato siI”, do Papa Francisco.9 Ela tratou do cuidado da casa comum. A cada comum é planeta Terra, para com o qual todos nós temos responsabilidade. O tema da encíclica é o meio ambiente, um assunto no ensino de Biologia, na parte referente à Ecologia.

Como provocação no início da atividade, indaguei aos estudantes: Quais cuidados com a casa comum têm os seus amigos nas suas redes sociais? Afinal, o que pensa sobre a responsabilidade o pessoal com que eles tanto conversam nas redes sociais. Estarão seus amigos nas redes sociais cuidando dessa casa que também é sua, é nossa? Os estudantes não souberam responder-me, é claro, eles não conversavam sobre isso.

Então desafiei os alunos a saberem sobre isso. Para encontrar as respostas, cada estudante elaborou um survey on-line, em um recorte da questão ambiental à sua escolha, para ser respondido por seus amigos e seguidores nas redes sociais. Dessa forma, quem sempre foi acostumado a responder perguntas na escola, passou a ter que as formular. Os alunos tiveram que saber como perguntar essas questões para os amigos de redes sociais. Para criarem o survey, os estudantes utilizaram o Typeform10. O link do survey elaborado no Typeform11 foi passado para os amigos e seguidores nas redes sociais de cada estudante.12

Mas seria importante que mostrassem de forma compartilhada os resultados do survey. Coletados os resultados do survey, um novo desafio foi posto aos estudantes, além é claro da leitura e interpretação dos dados. Eles teriam que divulgar os resultados do survey na forma de infográfico. Foram, portanto, desafiados a lidar com novo gênero textual (MANFRÉ, SAITO, 2007; PAIVA, COSCARELLI, 2009) ainda que haja quem assim não considere (DIONÍSIO, 2006). Estimular os estudantes a tomarem informações e torna-las visíveis é uma maneira interessante de fazer com que eles promovam habilidades de pensamento e de visualização (PEACHEY, 2016), promovendo a criatividade e envolvendo, inclusive, o senso estético.

Para criar os infográficos, os estudantes utilizaram o Infogr.am.13

Encerrada a atividade, os estudantes compartilharam, em sala de aula, a experiência. Mostraram os infográficos que criaram, disponíveis on-line. Justificaram o recorte que fizeram no tema para o survey. Depois, responderam a uma enquete,14 que buscava opiniões desde a usabilidade dos recursos da Web 2.0 até a aplicabilidade pedagógica da atividade, passando por aspectos inovadores que ela teria. Todas as atividades, da criação do survey à resposta na enquete final, passando pela elaboração do infográfico, puderam ser realizadas com o concurso de dispositivos móveis.15

A seguir são apresentados alguns resultados da enquete.

A atividade foi considerada inovadora pela quase totalidade dos alunos (95,8%), tanto por mobilizar a criação de um survey quanto por demandar o uso de infográficos. Ainda que de maneira geral tida como inovadora, a atividade foi considerada interessante por 87,5% dos alunos. Solicitados a aplicarem à atividade uma nota, em uma escala de 1 a 5, a maioria dos estudantes a aprovou (Graf. 1). Evidentemente que nas notas acabou, de alguma forma, expressa as dificuldades encontradas para realizar a atividade.

Fonte dos dados: o autor.

Graf. 1 Grau de dificuldade para lidar com os discursos (em %). N: 24. 

A dificuldade para trabalhar com os recursos, Typeform e Infogr.am, em uma escala que varioude 0 (nenhuma) a 5 (máxima), ficou mais ou menos dentro do esperado (Graf. 2). Ainda que houvessem dificuldades, a usabilidade, entendida como características da interface entre o ser humano e um software ou uma máquina, de ambos os recursos foi reconhecida (Graf. 3).

Fonte de dados: o autor.

Graf. 2 Grau de dificuldade para lidar com os recursos (em %). N=24. 

Fonte de dados: o autor

Graf. 3 Usabilidade dos recursos (em %). N=24 

O grau de dificuldade para trabalhar com o Infogram foi mais elevado. O fato de os estudantes estarem lidando com um novo gênero textual, do qual pouco ou nada sabiam, principalmente em como os elaborar, certamente contribuiu para essa maior dificuldade que foi identificada. A tarefa de elaborar o survey no Typeform não foi um maior problema. Há de se destacar que, atuando na ZDP, elaborei previamente manuais (tutoriais), nos quais, com imagens de telas capturadas, mostrei, passo a passo como operar com cada recurso.

Duas questões foram tidas como estratégicas na enquete. Era importante saber de os estudantes estariam dispostos a utilizar uma atividade dessa com seus próprios alunos, amanhã, quando professores. Da mesma forma, era importante sabe r se eles poderiam vir a utilizá la no estágio curricular ao qual estão obrigados. Vejo o estágio curricular como estratégico para que estudantes de licenciatura possam compartilhar com professores das escolas da Educação Básica práticas inovadoras, como q ue contribuindo para com esses professores. Seria um efeito multiplicador, com a clonagem pedagógica” da qual já falamos acontecendo em uma cadeia: docente da licenciatura licenciando (estagiário) professor da Educação Básica.

Os resultados foram, coincidentemente, os mesmos (Graf. 4, Graf. 5). Nenhum licenciando deixou de considerar a possibilidade de vir a desenvolver uma atividade semelhante, seja quando do cumprimento do estágio, seja em sua futura prática profissional.

Fonte de dados: o autor

Graf. 4 Possibilidade de usar a atividade no estágio (em %). N=24 

Fonte de dados: o autor

Graf. 5 Possibilidade de usar a atividade na profissão (em %). N=24 

O cruzamento de variáveis apontou que, de maneira quase absoluta, os estudantes que declararam ainda não saber se utilizarem uma atividade como esta com alunos da Educação Básica, seja, no estágio curricular, seja no futuro exercício profissional, eram os que encontraram maior dificuldade em lidar com os recursos utilizados para criação do survey e geração o infográfico. Essa posição é coerente, pois o desenvolvimento de práticas pedagógicas, e mais especificamente naquela que traz uma perspectiva inovadora, exige ao professor o conforto do domínio de como fazer, especialmente quando se trata de utilização de recursos da TDIC.

A GUISA DE CONCLUSÃO

A dificuldade para a incorporação das tecnologias digitais não existe só no Brasil e tem várias razões. Relatos em diferentes países revelam o problema, ainda que naqueles mais desenvolvidos a questão da ausência ou inadequação da infraestrutura em geral não se faça notar. No que diz respeito à dificuldade de os professores lidarem, pedagógica e educativamente, com a TDIC, estamos mais ou menos iguais aos outros países do mundo. Portanto, o desafio, tanto aqui, como lá, é mudar a prática dos professores na Educação Básica ou dos níveis equivalentes nos diversos países. Mas para isso teremos, especialmente no Brasil, que enfrentar um outro desafio: alterar, na perspectiva de inovação, as práticas dos professores que formam os professores. Se não mexermos nas licenciaturas não conseguiremos promover a cadeia de inovação. Para que a nossa escola chegue, finalmente, ao Século XXI, teremos que mudar aquela que forma os professores. Até porque, não podemos nos esquecer, nas licenciaturas estamos formando aqueles que um dia ali serão professores. Mais tempo, menos tempo, nossos ex-alunos estarão em nossos lugares, vivendo, em um novo tempo, o desafio de formar professores.

Então, porque não mudaram as licenciaturas? Porque os formadores de formadores mantêm uma “pedagogia da rotina”, que nada mais é do que a “prática da acomodação”. Fazer com que novas práticas, inovadoras, venham a acontecer nas licenciaturas exige que seus docentes mudem. Mudar os docentes das licenciaturas é, certamente, maior desafio a ser enfrentado, até porque significa lidar com a soberba da universidade. Enfrentamos este desafio ou continuaremos perpetuando, já no quase terceiro decênio do século XXI e daí para a frente, a escola do Século XIX. A escolha é nossa.

1Este artigo foi elaborado a partir da transcrição da palestra “Tecnologias digitais na formação docente: aprender para promover a aprendizagem” proferida no II Fórum Internacional de Educação, promovido pela Universidade de Santa Cruz do Sul, UNISC, no período de 27 a 30 de abril de 2016.

3Hoje, quando usamos notebooks pessoais com 8 Gigabytes de memória RAM, temos a verdadeira noção da limitação de uma máquina como esta.

4BASIC é o acrônimo para Beginers’ All Purpose Symbolic Instruction Code. Esta linguagem de programação foi desenvolvida em 1963 no Dartmouth College, New Hampshire, Estados Unidos da América, como uma linguagem de ensino. A ideia que conduziu a sua criação foi a de que todo mundo poderia programar, mesmo sem domínio de Matemática.

5Não uso a sigla TIC, nem NTIC. Entendo que tratar computadores como “novas” tecnologias informação e comunicação (NTIC) parece-me absolutamente inadequado; esse tempo passou. TIC é bastante genérico. Trabalho com tecnologias digitais, não com analógicas, or isso prefiro usar a sigla TDIC. Quando falo em tecnologias digitais de informação e comunicação demarco um território de usos, estudos e pesquisas.

6A propósito, não comungo a “categorização” que Prensky estabelece. A mim ela parece conter um equívoco de fundo: categorizar com base na idade, considerando que isto é limite para a aprendizagem.

7Lei proibindo o uso de celulares e outros dispositivos móveis na escola existem em outras unidades da Federação e no Distrito Federal. Algumas dessas leis foram promulgadas nos anos 1990, outras são mais. recentes. Tramita na Câmara dos Deputados um projeto de lei que tornará possível utilizar esses dispositivos na escola desde que seja autorizado pela escola e pelo professor em contexto de aprendizagem.

8O que eu chamaria de uso apenas sob demanda ficou claro na experiência do Projeto Um Computador por Aluno, UCA, ainda que ele o dispositivo móvel fosse o laptop educacional.

9A encíclica do Papa Francisco, na sua versão em português, está disponível em http://www.pucsp.br/sites/default/files/download/editais/texto_integral_enciclica_laudato_si.pdf.

10Temos, na disciplina, uma cultura de utilização de software gratuito e recursos da Web 2.0 que permitem acesso sem custo, ainda que possam ter alguma limitação de uso. Não levamos o estudante a comprar software ou a gastar dinheiro com recursos on-line. Até porque amanhã estarão atuando em escolas que, de maneira geral, não dispendem recursos financeiros com esse tipo de recurso; quando o fazem, é na aquisição e manutenção de hardware.

11O Typeform está em http://www.typeform.com.

12Os alunos tiveram a liberdade de utilizar a mídia social que quisessem, dentre aquelas nas quais construíram redes sociais. Alguns deles informaram ter utilizado mais do que uma. O WhatsApp foi o certamente o mais usado.

13Disponível em https://www.infogr.am .

14O instrumento para a enquete foi elaborado no Google Drive, o que permitiu a estudantes conhecerem um outro recurso que podem vir a utilizar, sem custo.

15Na indicação dos recursos, temos a preocupação constante em selecionar aqueles que podem ser executado, em qualquer plataforma (iOS, Android e Windows Phone) de dispositivos móveis. Temos na disciplina uma prática que observa a cultura do BYOD (Bring Your Own Device), ainda que para ela sejam apontados alguns contras (Ver http://www.securedgenetworks.com/blog/20-Pros-and-Cons-of-implementing-BYOD-in-schools).

Como citar este documento: MARINHO, Simão Pedro P. MÍDIAS E TECNOLOGIAS DIGITAIS NA LICENCIATURA. NOVAS REALIDADES, NOVAS FORMAÇÕES. Reflexão e Ação, Santa Cruz do Sul, v. 26, n. 2, ago. 2018. ISSN 1982-9949. Disponível em: <https://online.unisc.br/seer/index.php/reflex/article/view/8400>. Acesso em: ______. doi: http://dx.doi.org/10.17058/rea.v26i2.8400.

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Recebido: 10 de Outubro de 2016; Aceito: 19 de Março de 2018

Autor para contato: marinhos@pucminas.br

Simão Pedro P. Marinho: Doutor em Educação. Programa de Pós-graduação em Educação e Curso de Ciências Biológicas, PUC Minas.

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