Ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem aprender a fazer o caminho caminhando, refazendo e retocando o sonho pelo qual se pôs a caminhar. (FREIRE, 1997, p.79)1.
A Educação é um caminho que nos possibilita sonhar, criar, experimentar-se, ousar, aprender e enquanto caminhantes podemos encontrar novos percursos em um devir que não se detém na dinâmica ontológica do real que o configura e que se realiza através dos processos históricos e mediação com o mundo.
A realidade constitui-se do caminho que cada um percorre a partir de sua formação, de sua vivência familiar, de sua prática profissional, das especificidades de sua caminhada e de seus sonhos. E é sobre esse caminhar, pensado no sentido da formação e atuação docente, que apresentamos esse dossiê, organizado com diversas experiências de pesquisadores e pesquisadoras em âmbito nacional, que indicam elementos para a compreensão dos constituintes da formação e atuação docente.
A leitura atenta dos artigos nos permitiu compreender que é preciso assumirmos a docência como profissão e isso nos exige o aprendizado de conhecimentos necessários à prática docente e implica em considerarmos que os saberes profissionais são conhecimentos elaborados, incorporados no processo do fazer docente, que só têm sentido quando se desvela o campo em que essas práticas se constituem e são constituídas.
A docência não é tarefa simples. A docência é ação complexa, contudo, na sua singularidade podemos apreender a sua complexidade. A condição de tornar-se professor, professora implica, além de assumir os deveres profissionais inerentes à docência, saber que ela se instaura na relação social e histórica entre docente e discentes, porque um não existe sem o outro “não há docência sem discência, pois quem forma se forma e re-forma ao formar, e quem é formado forma-se e forma ao ser”. (FREIRE, 1996, p. 23-25)2.
A docência exige formação e por conseguinte, a requer reflexão do próprio ato de existir, de formar-se. O trabalho formativo - no sentido de constituir-se, de tomar forma, para atuar, refletir e aperfeiçoar - será expressão da consciência crítica, orientada para a práxis enquanto atividade social transformadora. A formação, nesse sentido, deve ser pensada de uma forma integral e contínua, de tal modo que não esteja restrita a uma formação, mas múltiplas formações que exigem a condição permanente de aprender, desaprender e tornar a aprender para interpretar a realidade, ampliar visão de mundo e alcançar a práxis (CAMPOS, 2017)3.
A ação de (re)aprender os saberes específicos da docência para (trans)formar, com a perspectiva de alcançar a práxis é constante, ou seja, trata-se de um processo em contínuo desenvolvimento. Evidentemente o conceito de práxis não é aquele que evoca a pura e simples prática, antes, porém, constitui-se em atividade pensada, organizada que produz historicamente a unidade entre o homem e o mundo, entre a matéria e o espírito, entre a teoria e a prática, entre o sujeito e o objeto. Trata-se de atividade humana e social que se manifesta e se realiza na e a partir da realidade, conforme Konder (1992, p. 115)4 nos apresenta:
[...] a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e, para poderem alterá-la, transformando-se a si mesmos. É a ação que, para se aprofundar de maneira mais consequente, precisa da reflexão, do autoquestionamento, da teoria; e é a teoria que remete à ação, que enfrenta o desafio de verificar seus acertos e desacertos, cotejando-os com a prática.
Na práxis, a intencionalidade orienta os processos. O trabalho docente, porquanto, será expressão de uma educação crítica, orientada para a tomada de decisões e o exercício da práxis pedagógica comprometida social e politicamente para promover a autonomia e a emancipação. Para tanto, é preciso conceber a prática indissociada da teoria; opção autêntica e difícil porque implica na recusa de visões fragmentadas da realidade e exige dos/as professores/as compreenderem o significado e o sentido de suas ações, mas requer, sobretudo, a incansável busca da práxis, pautada na inconclusão humana, na rigorosidade metódica e principalmente a consciência de que, se a Educação é uma ação intencional, deverá estar direcionada segundo princípios éticos em favor da dignidade humana.
A aprendizagem profissional da docência deve ser compreendida na perspectiva de processo, ou seja, uma aprendizagem que se dá durante a trajetória de vida docente e não apenas como uma etapa isolada de seu processo formativo, pois a apropriação dos conceitos científicos referentes ao desenvolvimento do trabalho docente é essencial para que se possa avançar na compreensão da subjetividade da ação docente, isto é, na compreensão do significado de sua ação e, necessariamente, contribuir para a constituição da autonomia e (trans)formação das concepções docentes sobre “o que pensam” e “o que realizam”.
A leitura do conjunto dos textos que compõe esse dossiê nos oferece elementos para desvelar determinantes de quem é o professor, a professora, a partir de conceitos que envolvem pressupostos políticos e pedagógicos abarcando contextos e movimentos presentes na educação básica e superior. Nesse sentido, desejamos que a reunião dos textos nesse dossiê desencadeie diálogos produtivos entre os pesquisadores e pesquisadoras, mobilize os leitores e leitoras para novos questionamentos e para o desvelamento de elementos constituintes da formação, dos saberes necessários a constituição da identidade e do desenvolvimento profissional docente.