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Ensino em Re-Vista

versão On-line ISSN 1983-1730

Ensino em Re-Vista vol.29  Uberlândia  2022  Epub 08-Jun-2023

https://doi.org/10.14393/er-v29a2022-59 

DOSSIÊ 3 - A ESCOLA NOS DIAS ATUAIS: E AGORA?

Educação e Tecnologia: perspectivas para diálogos em torno da educação para a emancipação1

Educación y tecnología: perspectivas para diálogos sobre educación para la emancipación

Antônio Charles Santiago de Almeida2 
http://orcid.org/0000-0002-4988-3153

Maria Ivete Basniak3 
http://orcid.org/0000-0001-5172-981X

Rafael Gemin Vidal4 
http://orcid.org/0000-0002-5173-1095

2Doutor em educação. Universidade Estadual do Paraná, União da Vitória, Paraná, Brasil. E-mail: sandiabo@yahoo.com.br.

3Doutora em educação. Universidade Estadual do Paraná, União da Vitória, Paraná, Brasil. E-mail: basniak2000@yahoo.com.br.

4Mestre em desenvolvimento e sociedade. Centro Universitário Vale do Iguaçu, União da Vitória, Paraná, Brasil. E-mail: rafaelgemin@hotmail.com.


RESUMO

Este ensaio teórico, alicerçado em Adorno (2010), Bourdieu (2014) e Vieira Pinto (2005), admite que educação, política e tecnologia possuem uma relação quase simbiótica. A partir desses três autores, é apresentada uma discussão teórica sobre como as tecnologias, neste contexto, podem contribuir para a emancipação política de indivíduos que, quase sempre, não dispõem de uma herança de cultura. Bourdieu (2014) apresenta-nos os impedimentos de assegurar uma educação que seja justa para todos, pois, para ele, a escola é o lugar da desigualdade social. Por outro lado, Adorno (2010) discute que é preciso formar para a emancipação política, ou seja, para evitar o barbarismo cotidiano. A partir desse contexto de reprodução das estruturas dominantes, bem como de formar indivíduos participantes críticos, e de acordo com Vieira Pinto (2005), defendemos a tese de que a apropriação da tecnologia pode configurar-se como instrumento de superação das desigualdades sociais e do encurtamento das distâncias entre os capitais de cultura.

PALAVRAS-CHAVE: Educação; Tecnologia; Emancipação

RESUMEN

Este ensayo teórico, basado en Adorno (2010), Bourdieu (2014) y Vieira Pinto (2005), admite que la educación, la política y la tecnología tienen una relación casi simbiótica. A partir de estos tres autores, se presenta una discusión teórica sobre cómo las tecnologías, en este contexto, pueden contribuir a la emancipación política de individuos que, casi siempre, no cuentan con un acervo cultural. Bourdieu (2014) nos presenta los impedimentos para garantizar una educación justa para todos, pues, para él, la escuela es el lugar de la desigualdad social. Por otro lado, Adorno (2010) sostiene que es necesario formarse para la emancipación política, es decir, para evitar la barbarie cotidiana. Desde este contexto de reproducción de las estructuras dominantes, además de formar actores críticos, y siguiendo a Vieira Pinto (2005), defendemos la tesis de que la apropiación de la tecnología puede configurarse como un instrumento para la superación de las desigualdades sociales y el acortamiento de las distancias entre las capitales de la cultura.

PALABRAS CLAVE: Educación; Tecnología; Emancipación

ABSTRACT

Based on Adorno (2010), Bourdieu (2014) and Vieira Pinto (2005), understanding that education, politics and technology have an almost symbiotic relationship, we established a theoretical discussion on how technologies, in this context, can contribute to political emancipation of individuals, who frequently do not have a cultural heritage. Bourdieu (2014) presents us with the impediments of ensuring an education that is fair for everyone, because for him, the school is the place of social inequality. On the other hand, Adorno (2010) shows us that we need to train for political emancipation, that is, to avoid daily barbarism. In this context of reproduction of dominant structures, as well as of forming critical participant individuals, according to Vieira Pinto (2005), we defend the thesis that the appropriation of technology can be configured as an instrument to overcome social inequalities and to shorten distances between cultural capitals.

KEYWORDS: Education; Technology; Emancipation

Introdução

A filosofia política tem despertado inquietações ao problematizar o espaço educacional, quer dizer, discutir filosoficamente a questão - o chão da escola e seu papel político. Este lugar político é tomado a partir de questionamentos que a humanidade ainda não respondeu, entre as quais se destaca o seguinte: É possível emancipar humana e politicamente os indivíduos? A questão pode parecer sem grande importância, mas que faz sentido para as políticas educacionais e seu desdobramento no cenário educacional. Uma das alternativas construídas pelos operadores da educação é a formação do cidadão, ou seja, educar para formar o sujeito-cidadão. Esta tem sido a pecha da educação, principalmente, da educação pública. A fim de promover discussões em torno da educação, e mais especificamente, educação e política, cuja perspectiva é o diálogo em torno da emancipação, optamos pelo ensaio teórico a partir dos autores Theodor Adorno (2010), Pierre Bourdieu (2014) e Álvaro Vieira Pinto (2005). O ensaio teórico (ADORNO, 1954) caracteriza-se por sua capacidade de expressar novas formas de pensamento, reconhecer o movimento da vida e distanciar-se do movimento finalista do pensamento, que almeja um conhecimento definitivo, o qual está determinado a cristalizar-se. Assim, não pretendemos com este trabalho, apresentar, se é que há, uma solução para a problemática entre educação e emancipação, mas, suscitar questões para novos debates e embates.

Pressupomos a tecnologia como ferramenta para a emancipação, sobretudo, no encurtamento das distâncias entre capitais de cultura e arbítrio cultural, conceitos bourdieusianos que, segundo este autor, impossibilita a formação crítica e consciente do indivíduo como ser emancipado. Compreendendo que a tecnologia possui uma relação quase simbiótica com a educação, estabelecemos uma discussão teórica partindo de Adorno (2010), Bourdieu (2014) e Vieira Pinto (2005), sobre como as tecnologias, neste contexto, podem contribuir para a emancipação de indivíduos que, quase sempre, não dispõem de uma herança de cultura. Buscamos estruturar, de forma plural, o que compreende o papel da educação e as formas para responder as adversidades do cotidiano, e essa compreensão resulta em, segundo Adorno (2010), a formação para a emancipação política e, de acordo com Vieira Pinto (2005), observar a tecnologia como instrumento educacional que permeia a emancipação dos indivíduos a partir da ressignificação dos capitais de cultura, especificamente no que concerne à política.

Nesse sentido, partimos da seguinte inquietação: é possível, na sociedade contemporânea, emancipar, politicamente os indivíduos? E para responder ao problema proposto, utilizaremos a compreensão da técnica/tecnologia como ferramenta mediadora de cultura, nesse processo investigativo. A saber, é possível, no chão da escola, a emancipação política? Ainda, perseguimos, metodologicamente, autores de diversas vertentes para ajudar nessa empreitada de pesquisa, dos quais destacamos Adorno, Vieira Pinto e Bourdieu. Assim, em linhas gerais, podemos dizer que a tecnologia é, como ferramenta, de grande valia para formação, em diferentes contextos, política dos indivíduos e, como assegura Milton Santos (2005), o elemento nodal na globalização para encurtar as desigualdades sociais e políticas à luz de um uso político da tecnologia.

Organização teórico metodológica

O trabalho de pesquisa foi elaborado em três seções. Na primeira, buscou-se leituras dos autores Adorno, Vieira Pinto e Bourdieu, bem como de comentadores. Este primeiro momento teve como objetivo sistematizar o pensamento dos autores já citados, estabelecendo um debate em torno de determinados conceitos e sua formulação teórica no que compreende uma educação política.

Na segunda seção, faz-se um mapeamento das biografias, bem como das produções bibliográficas no que circunscrevem educação, política e tecnologia. A terceira seção foi parte singular desse trabalho, em que se fez, após uma leitura cuidadosa dos autores mencionados, apontamentos de como é possível emancipar, a partir desses autores, politicamente os indivíduos no chão da escola.

A leitura que fizemos dos autores Adorno, Bourdieu e Vieira Pinto visou analisar as suas principais obras dentro de um contexto metodológico que trata a questão da universalidade conceitual no que tange à educação política e tecnológica. Tudo isso com vistas a uma configuração histórica e dialógica no âmbito do debate conceitual, cuja finalidade fora fazer um levantamento de discussões conceituais à luz de uma análise estrutural.

Iniciando o debate

Nos dias atuais, tem-se fomentado longos debates em torno da educação e sua dimensão na formação social e política dos indivíduos. Decerto que este é um debate que já faz parte da realidade brasileira mas, vale destacar que agigantou-se e ganhou corpo nos mais diversos setores da sociedade. Uma das hipóteses para que isso ocorra é o resultado da crise econômica, bem como da crise política, que assolam o cenário brasileiro. Basta observar, do ponto de vista político, como orientações ideológicas são atravessadas quando se pensa ou se debate a educação e seu papel na sociedade atual em que, equivocadamente, são usadas as expressões direita e esquerda para demarcação dos discursos educacionais. O fato é que, nos dias atuais, a educação ganhou espaço nas pautas e agendas políticas, sobretudo nas políticas partidárias.

Por essa razão, é premente considerar, no que toca a realidade educacional brasileira, a urgência de se pensar semelhante a Theodor Adorno (2010), em educação e política, mais precisamente, em educação para a emancipação política. Destacamos que não se trata de pensar uma compreensão estrita de política, ou seja, tomada no sentido sociológico, mas, antes disso, no sentido amplo do termo, sentido aristotélico, na política como atividade humana, prática de cidadania, realização da existência humana no espaço público organizado. Noutros termos, a felicidade no sentido ético. Para Bodéüs, estudioso do pensamento aristotélico, “a política é definitivamente a maneira pela qual os indivíduos, reunidos na cidade pretendem dar sentido a sua existência” (BODÉÜS, 2003, p. 14).

Decerto que, na tentativa de ressignificar o debate no entorno da educação e sua função política, na década de setenta, é organizada a obra Educação e Emancipação, que reúne artigos de Adorno, textos que são frutos de um tempo, e que pretendem responder a seguinte questão: qual é o papel da educação na sociedade contemporânea?

Na sociedade moderna, é muito comum requerer da educação o caráter de formação para o mercado de trabalho, ou seja, a formação do polivalente - homem dinâmico que consegue se adequar às necessidades do mercado cotidiano. Porém, esta parece uma visão estreita, unilateral e mecanicista. Decerto que, no mundo globalizado, demarcado pelo desemprego e pelo subemprego, como alternativa do capitalismo, resta educação como mudança, uma investida retórica. A educação é e deve ser para além de tudo isso. Todavia, é comum que governos, sejam a níveis federal, estadual e municipal, atinem para esta prática de políticas para a educação, pois acreditam que formando para o mercado se resolve o problema que é mais urgente na sociedade contemporânea, a saber, o desemprego e o subemprego em larga escala. Mas como fora dito, esta é uma visão limitada, especialmente para o que se conceitua e que se espera da educação, elemento de transformação e de asseguramento de vida autêntica.

Para Bourdieu (2014), a escola funciona, quase sempre, na produção de uma cultura educacional, como reprodutora das estruturas de uma classe dominante. Para este autor, não existe, no interior da escola, forjada pelo sistema capitalista, qualquer possibilidade de emancipação, pois, sua tônica é, justamente, a reprodução dessa estrutura econômica e social. Decerto que este conceito, reprodução social, não é muito prestigiado no debate educacional, sobretudo, levando em consideração o expediente bourdieusiano, a escola como aparelho de reprodução de estruturas sociais, especialmente porque, espera-se da escola um lugar de mudança, de transformação social, noutros termos, um lugar de emancipação política.

Todavia, há de se considerar “discutir certas questões que teria preferido deixar por conta da filosofia porque me convenci de que ela mesma, aliás, tão questionadora, não as abordava” (BOURDIEU, 2007, p.8). Nesse contexto, acredita o autor que a filosofia se desinteressou da educação e que por isso, ainda segundo Bourdieu, faz-se premente perguntar, no interior da sociedade contemporânea, qual é o papel da educação? Outrossim, é preciso pensar e repensar o modelo educacional para que este, de fato, possa comtemplar o que se denomina de emancipação/transformação e, não simplesmente, de reprodução de estruturas sociais. Ainda segundo este autor, é preciso mudar severamente, quer dizer, mudar não só a estrutura social, mas o modelo de escola, sobretudo, o modelo discursivo de escola libertadora.

É provavelmente por efeito de inércia cultural que continuamos tomando o sistema escolar como um fator de mobilidade social, segundo a ideologia da ‘escola libertadora’, quando, ao contrário, tudo tende a mostrar que ele é um dos fatores mais eficazes de conservação social, pois fornece a aparência de legitimidade às desigualdades sociais, e sanciona a herança cultural e o dom social tratado como dom natural (BOURDIEU, 2014, p. 45).

A defesa de uma educação emancipatória se faz em razão da realidade educacional que acomete o Brasil, em que boa parte da população, sobretudo jovens e adultos buscam formação e qualificação para adentrar no mercado de trabalho e, por esta razão, reduzem a função da educação à formação técnica. A fim de superar esta lógica mercadológica, Viera Pinto (2005) nos chama a atenção para que a educação desperte o maravilhar-se, quer dizer, no sentido filosófico, fazer com que o estudante supere a lógica da formação para o mercado de trabalho e possa construir significados para sua vida e sua circunstância5, à luz de um novo fazer educacional que possibilite avanços tecnológicos e científicos que favoreçam o melhoramento de suas condições cotidianas. Uma educação que seja capaz de ultrapassar os limites da formação para o trabalho, bem como, retoricamente, garantir, sem qualquer base material, mobilidade social. Nesse mesmo entendimento de Vieira Pinto (2005), Mészáros (2005), na obra A educação para além do capital, faz um diagnóstico da educação e aponta para os riscos de atrelamento entre educação e mercado, sobretudo, no sistema capitalista, alegando a impossibilidade de se emancipar indivíduos quando, neste modelo do capital, a educação serve, estritamente, como base para formar mão de obra.

A partir disso, vislumbramos uma encruzilhada em que, de um lado, no entendimento de Bourdieu (2014), a educação, com o discurso da escola libertadora, conserva e reproduz um modelo de sociedade e, por outro lado, para Mészáros (2005), o modelo educacional, além de reproduzir a lógica de uma classe dominante, tende a formar o indivíduo para o mercado de trabalho. Mercado, inclusive, que não absorve todo mundo. Isto culmina de forma trágica de acordo com estes autores, primeiro porque nem sempre os indivíduos com tal formação são absorvidos pelo mercado e, segundo, não são formados politicamente, no sentido emancipatório, para responder as adversidades da vida em sociedade.

Adorno (2010) insiste e reclama da educação o caráter político, pois, segundo com ele, de nada importa pensar ou debater educação se esta não estiver conectada com sua dimensão capital de emancipar os indivíduos, quer dizer, fazê-los participantes críticos na sociedade. Nas palavras de Adorno (2010, p, 121): “a educação tem sentido unicamente como educação dirigida a uma autorreflexão crítica”. Esta leitura de educação é tomada no sentido marxista. Como membro da Escola de Frankfurt, Adorno absorve de Karl Marx a seguinte compreensão, “a emancipação do alemão é a emancipação do homem. A cabeça dessa emancipação é a filosofia, o proletariado é seu coração” (MARX, 2005, p. 157).

Nesse entendimento, educação e política estão imbricadas no sentido de formar o cidadão crítico. Esta formação, pensada por Adorno (2010), significa, no seu arcabouço teórico, emancipar os indivíduos, sobretudo, contra a barbárie do cotidiano. É fato que a grande preocupação adorniana era que Auschwitz não se repetisse, e desse modo, o autor alerta que somente à luz de uma educação filosófica e política, dirigida a uma autorreflexão crítica, seria possível evitar a barbárie cotidiana. Segundo Adorno (2010, p,19): “Qualquer debate acerca das metas educacionais carece de significado e importância frente a essa meta: que Auschwitz não se repita. Ela foi a barbárie contra a qual se dirige toda a educação”.

Percebemos no interior do pensamento adorniano a preocupação com o cotidiano, quer dizer, com a vida e sua circunstância, em que a educação filosófica é base para perspectivas de vida autêntica, noutros termos, vida emancipada. Para o autor, é neste contexto que a escola deve operar, pois é da escola, como instituição política, o dever de formar o agente crítico que deve evitar a barbárie. Mas, ainda segundo Adorno (2010), para que isso ocorra, faz-se premente considerar a escola como lugar político, capaz de produzir tecnologia, produzir ciência e imbricá-las com o cotidiano dos indivíduos no sentido de que essa seja a meta educacional, emancipar politicamente os indivíduos para evitar o barbarismo cotidiano. Aqui reside um ideal de educação: a educação filosófica.

Não se pretende um certo endeusamento da filosofia como ciência, mas pensá-la como modelo de reflexão, isto é, como lócus epistêmico da interpretação da realidade, sua compreensão dialética, acastelada na realidade material. De acordo com o professor Pucci, estudioso do pensamento político de Adorno:

para Adorno, a especificidade da filosofia é a interpretação. E enquanto interpretação vive o tempo todo um enervante paradoxo: de um lado, para continuar a ser filosofia é conclamada, permanentemente, a proceder interpretando os dados do real, com a pretensão de atingir a verdade; de outro lado, ela não possui a priori nenhuma chave segura de interpretação; tem de construir suas chaves, e as deve construir a partir de indícios evanescentes que as figuras enigmáticas do ente e em seus admiráveis entrelaçamentos lhe apresentam. (PUCCI, 2000, p. 6-7)

Nesse sentido, a relação entre educação e filosofia é preponderante para a emancipação política dos indivíduos. Todavia, o problema até aqui apresentado tem duplo caráter. De um lado, Bourdieu (2014) nos apresenta os impedimentos de assegurar uma educação que seja, no sentido filosófico, justa para todos, porque para ele, a escola é o lugar da desigualdade social, isto é, os indivíduos não acessam à educação de forma igual, pois conceitos como capitais de cultura e herança de cultura são determinantes no processo de aprendizagem para a formação de um indivíduo emancipado. Nas palavras de Bourdieu (2014, p, 46), “a influência do capital cultural se deixa apreender sob a forma de relação, muitas vezes constatada entre o nível cultural global da família e o êxito escolar da criança”. Para Ana Maria Fonseca de Almeida:

Essa análise foi o que permitiu a Bourdieu revelar a importância que o sistema de ensino e, logo, o capital cultural, havia assumido nas estratégias de reprodução dos grupos dominantes nas sociedades altamente diferenciadas onde se desenvolveu essa instituição particular, o Estado burocratizado[...]. Por conseguinte, o sistema escolar só pode desempenhar suas funções de reprodução enquanto essa função for dissimulada. Vê-se, dessa maneira, como afirma mais explicitamente Passeron (1986) que o modo de reprodução como componente escolar só pode funcionar enquanto a ilusão meritocrática estiver produzindo plenamente seus efeitos sociais e simbólicos. (CATANI, 2017, p, 315).

É fato que não devemos esquecer que a reflexão que faz Bourdieu é de um determinado contexto francês, mas que nos ajuda a pensar e debater o problema proposto, o lugar da educação na emancipação política dos indivíduos. E no contexto de reprodução das estruturas dominantes, bem como de formar indivíduos participantes críticos, compete pensar, de acordo com Vieira Pinto (2005), qual é o papel das tecnologias no ambiente escolar, mais precisamente na educação política?

Defendemos a tese da apropriação da tecnologia como instrumento de superação das desigualdades sociais e do encurtamento das distâncias entre os capitais de cultura e de aproximação dos alunos. Podemos usar como exemplo a cultura do ensino de matemática que deve ser historicamente construída e não apenas reproduzida por meio de algoritmos, fórmulas prontas e demonstrações. De acordo com D’Ambrosio (1999, p,1), compreendemos que:

A matemática é validada pelo rigor do processo de prova. Matemática que "funciona", como se diz no jargão científico, isto é, um conjunto de resultados comprovados empiricamente, não tem seu reconhecimento enquanto não fundamentada com rigor. Isso exclui todo o corpo de conhecimentos que se denomina Etnomatemática, que é parte integrante da cultura praticada. (D’AMBROSIO,1999, p.1).

Para D’Ambrosio (1999), a cultura praticada na matemática incorpora os avanços tecnológicos e, em contrapartida, são favorecidos avanços na matemática e tecnologia, formando um ciclo que as relaciona, explicitando que “ao longo da evolução da humanidade, matemática e tecnologia se desenvolveram em íntima associação, numa relação que poderíamos dizer simbiótica” (D’AMBROSIO, 1999, p.1). Esta questão aqui assinalada pode ser pensada a partir de determinados pressupostos, em outros ramos de saberes, uma vez que, de acordo com Vieira Pinto (2005), a tecnologia não pode ser dissociada da e na produção das ciências.

Por outro lado, Vieira Pinto (2005) lembra que, quase sempre, a compreensão da tecnologia se reduz ao uso de determinados aparelhos, reificando tecnologias em máquinas e equipamentos, esquecendo-se até mesmo que a tecnologia não pode ser desvinculada da técnica. O autor distingue que técnica e tecnologia não devem ser tomadas como sinônimos, ainda que em várias situações seja esse o significado que a palavra tecnologia acabe por assumir. Vieira Pinto (2005, p. 219-220) discute outras três acepções do termo, sendo uma delas seu significado etimológico: “a teoria, a ciência, o estudo, a discussão da técnica”; outra concebida como “o conjunto de todas as técnicas de que dispõe uma determinada sociedade”, e por último, ao qual dedica maior atenção ao discutir o conceito de tecnologia, como a “ideologização da técnica”.

Todavia, o autor nos alerta que, embora fazendo confusão conceitual em relação à tecnologia e tendo limitações para operar com recursos tecnológicos mais atuais, o homem é bastante deslumbrado com o discurso no entorno da tecnologia, esquecendo-se que esta é uma criação humana e que, portanto, sua evolução e desenvolvimento dependem da ação do homem (VIEIRA PINTO, 2005). Por isso, no entendimento desse autor, deve existir familiaridade entre homem e tecnologia, a qual deve estar a serviço do homem no melhoramento das circunstâncias cotidianas. E, especialmente, se bem utilizada nos espaços educacionais, possibilita diminuir o fosso existente entre os indivíduos que portam e os que não portam, no entendimento bourdieusiano, heranças e capitais de cultura.

Vieira Pinto afirma também que, para passarmos do subdesenvolvimento ao desenvolvimento, é necessário aprendermos a manipular o mundo de forma mais sofisticada, desvencilhando-nos do conceito de era tecnológica que, segundo o autor: “[...] encobre, ao lado de um sentido razoável e sério, outro, tipicamente ideológico, graças ao qual, os interessados procuram embriagar a consciência das massas, fazendo-as crer que têm a felicidade de viver nos melhores tempos jamais desfrutados pela humanidade” (VIEIRA PINTO, 2005, p.41).

Isso porque, para o autor, somos consumidores vorazes de tecnologia, importando produtos muitas vezes obsoletos e, assim, iludidos de que estamos inseridos na era tecnológica. Para Vieira Pinto (2005), para superarmos essa lógica de que apenas importando tecnologia podemos acender ao desenvolvimento, precisamos pensar estratégias para desenvolvermos nossa própria tecnologia.

É importante considerar, neste debate, a reflexão que fez Milton Santos (2005) a respeito da globalização, por um outro mundo globalizado.Segundo ele, as condições materiais e técnicas já estão dadas e que, por isso, é preciso apropriar-se desse universo de forma articulada, quer dizer, fazer da tecnologia um instrumento de luta e de libertação para além da manipulação da lógica capitalista que reduz, em alguns setores, a tecnologia a um procedimento técnico. Assim, ainda de acordo com este pensador, o estudante pode, no contexto tecnológico, ultrapassar os limites da técnica. Noutros termos, diz Milton Santos (2005) que, um computador pode, manipulado por uma empresa, servir como instrumento tecnológico, ou seja, estabelecer conexões com o mundo de forma ideológica e, esse mesmo computador, na mão de um educando, servir como instrumento técnico, visto e encerrado em si mesmo, aparelho que desempenha funções meramente técnicas.

Resultados

De posse de uma leitura estrutural de textos, bem como incursões filosóficas, chegamos aos seguintes resultados: primeiro, defendemos a tese de que, a partir da tecnologia aqui pensada nos moldes de Vieira Pinto e Milton Santos, podemos minimizar distâncias entre os diferentes grupos sociais. Isso porque, de acordo com Tardif (2000), o professor é um agente que opera, por meio de sua formação técnica e científica, transformando e ressignificando lugares, isto é, os professores são atores que garantem olhares diferenciados para a multiplicidade que perpassa o interior das escolas, sendo central na mediação cultural entre indivíduos e sociedade. Desse modo, a técnica e a tecnologia são aliadas nesse processo de mediação de cultura - o maravilhar-se com o mundo circundante e, a partir disso, a manipulação política dos instrumentos tecnológicos.

Como segundo resultado, a escola tem um papel preponderante, pois como dito anteriormente, o professor é o agente mediador da cultura, mas a escola é o lugar que deve oportunizar capitais de cultura, noutros termos, garantir, democraticamente acesso aos bens objetivados da cultura. Para Almeida, Ferrasa e Vidal:

por meio de uma prática pedagógica justaposta a uma práxis, os bens de cultura podem e devem ser manuseados subjetivamente, com perspectiva a uma incorporação de sentidos e valores. Devemos salientar que essa prática pedagógica não deve ser pensada como violência simbólica, mas como estratégia de frenagem dos mecanismos de perpetuação das desigualdades sociais. (ALMEIDA; FERRASA; VIDAL; 2019, p.332).

Decerto que, para Bourdieu (2014), o capital cultural pode ser compreendido a partir de três estados, a saber, o incorporado, o subjetivado e o institucionalizado. E quando inferimos que a escola é o lugar de oportunidades do capital de cultura, não discordamos da compreensão bourdieusiana, pelo contrário, tomamos como referência teórica parte de seu expediente sociológico, pois, a partir dessa compreensão de capital, insistimos na tese de que é possível que a escola exerça sua força, estrutura escolar, para promoção de cultura, evitando incorrer numa violência simbólica, o que significa dizer, imbricar prática e práxis no exercício de uma cidadania política e educacional.

Terceiro e último resultado: a validação de nossa hipótese - a imbricação entre educação e tecnologia pode perspectivar diálogos emancipatórios no chão da escola. Pois bem, de acordo com Adorno, é possível emancipar os indivíduos, torná-los esclarecidos, aqui pensado em termos kantianos6, “ousa fazer uso do teu próprio entendimento! Eis o lema do Esclarecimento” (KANT. 2009, p.407). Todavia, é preciso considerar o papel da filosofia, isto é, da educação para a emancipação, formação crítica do sujeito. Nas palavras de Adorno (2007, P. 6), “A autêntica interpretação filosófica não aceita o sentido que já se encontra pronto e permanente por detrás da questão, e sim, a ilumina repentina e instantaneamente e, ao mesmo tempo, a consome.”.

Com o advento da modernidade, pode-se dizer que houve, sobretudo com Comte, a fragmentação dos saberes; mais do que isso, uma classificação/hierarquização das ciências e, nesse sentido, a educação apartou-se da filosofia e vice-versa. Adorno reivindica, da educação, o seu caráter filosófico. Por essa razão, segundo Adorno, a formação do sujeito deve contemplar o espirito filosófico, formação para interpretação e transformação.

Assim, partindo do pressuposto formação para interpretação, é preciso assegurar que os agentes da escola, os educandos, incorporem capitais. É sabido que, para Bourdieu (2014), a incorporação funciona como inculcação, assimilação, mas isso não acontece como mágica, carece de tempo. Por isso, diz Bourdieu (2014, p. 82), “custa tempo, deve ser investido pessoalmente pelo investidor (tal como o bronzeamento, essa incorporação não pode efetuar-se por procuração)”. Outrossim, somente o educando deve, a partir de uma dada realidade, incorporar capitais. Por isso, acreditamos que a escola, juntamente com os professores, possam manipular estratégias para a configuração de espaços de assimilação e inculcação de capitais. Destarte, à luz de Milton Santos (2005), a tecnologia, no mundo contemporâneo, mais precisamente na realidade brasileira, que encontra-se conectada à ideia de aldeia global, pode e deve constituir o que ele chamou de por uma outra globalização, a tecnologia como instrumento e mediação de um mundo melhor, por meio do seu uso político e educacional.

Ao final

A tese aqui desenvolvida parte do pressuposto que emancipar, segundo Adorno (2010), perpassa pela possibilidade da apropriação da tecnologia, no sentido de compreender seu potencial e suas limitações e de que é uma produção humana. E nesse sentido, Vieira Pinto (2005), contribui para pensarmos nessa relação entre educação e tecnologia, com vistas ao processo de emancipação política e científica. Isto porque, Vieira Pinto (2005) e Bourdieu (2014), em contextos diferentes, possibilitam instrumentos teóricos capazes de auxiliar na configuração de novos espaços educacionais, sobretudo, na realidade aqui tematizada, a realidade brasileira, em que a educação é pensada, quase que no seu conjunto, como formação para o mercado de trabalho. E também, de que não há, por parte da comunidade escolar, uma compreensão da tecnologia como processo de não só melhoramento na produção do saber, como também de emancipação dos indivíduos.

Desse modo, por meio do debate apresentado a respeito do papel da educação na emancipação política e científica do indivíduo, podemos fazer as seguintes inferências: primeiro, na esteira do pensamento adorniano, a escola deve emancipar politicamente os indivíduos para evitar a barbárie do cotidiano. E vale destacar que por barbárie se compreende a violação dos direitos humanos, a criminalização da pobreza, o esgotamento irresponsável dos recursos naturais, a homofobia, a xenofobia e tantos outros males que são frequentes na sociedade e que são, segundo Adorno (2010), tangenciados pela escola. Por isso, para esse autor, a escola tem o papel preponderante de emancipar politicamente os seus indivíduos. E nesse contexto, por política se entende a compreensão do homem como um ser circunstancial, capaz de não só compreender o mundo em que se encontra, mas a partir dos aparatos ofertados pelo mundo, transformá-lo. Esta emancipação se faz também no sentido de assegurar o direito de não só adentrar na escola, mas de permanecer e atingir seus objetivos, já que a sua entrada não significa emancipação.

Nessa mesma perspectiva, ainda que em outro contexto, os aparatos são, de acordo com Vieira Pinto (2005), técnicas e tecnologias que são produtos humanos e que devem servir ao homem para melhorar sua circunstância. Mas para que isso ocorra, é preciso saber fazer uso desse instrumento, manipulá-lo como produto humano, a serviço do homem, como recurso de melhoramento de sua vida. Isto porque, para Vieira Pinto (2005) o homem acaba por deslumbrar-se em tal medida por suas criações, que começa esquecendo-se que são suas obras:

O homem maravilha-se diante do que é seu produto porque, em virtude do distanciamento do mundo, causado pela perda habitual da prática de transformação material da realidade, e da impossibilidade de usar os resultados do trabalho executado, perdeu a noção de ser o autor de suas obras, as quais por isso lhe parecem estranhas (VIEIRA PINTO, 2005, p.35).

E ainda nesse sentido, Vieira Pinto (2005) afirma que, para que possamos evoluir do subdesenvolvimento ao desenvolvimento, precisamos aprender a manipular o mundo de forma mais sofisticada, compreendendo que o desenvolvimento tecnológico faz parte da história da humanidade e, portanto, do desenvolvimento e evolução do homem. E no contexto da educação matemática, D’Ambrosio (1990, p. 14), ao discutir a matemática como parte integrante de nossas raízes culturais, adverte que “ao falarmos de raízes socioculturais, essas considerações não podem ser esquecidas, e a matemática, como conhecimento de base para a tecnologia e para o modelo organizacional da sociedade moderna está presente de maneira muito intensa em tudo isso”.

De posse do debate teórico, obtivemos elementos que nos permitiram concluir que emancipar, sobretudo politicamente, é a tônica da escola contemporânea, mais precisamente, da escola contemporânea brasileira, e que ela precisa ultrapassar a concepção de formação para o mercado de trabalho e assumir, também, o caráter de transformação política da realidade. A escola tem sido, no Brasil, quase sempre o lugar que prepara o sujeito para o mercado de trabalho, uma espécie de adequação do homem às necessidades do mercado, concepção bastante criticada por Mészáros (2005) de que educação é para a vida e não necessariamente para atender a lógica do capital.

Já no que corresponde ao uso das tecnologias no ambiente educacional e sua relação com a emancipação, Vieira Pinto (2005) em relação à tecnologia como possibilidade de transformação da realidade, noutros termos, reclama das tecnologias, numa relação direta com a educação, a emancipação dos indivíduos. Nesse sentido, pode-se dizer que há necessidade de se reconhecer o caráter político da tecnologia, quer dizer, seu caráter emancipatório, uma vez que a relação entre educação e tecnologia aparece de forma fragmentada. Há também a necessidade de pensá-la como instrumento humano que deve contribuir, no ambiente escolar, como ferramenta capaz de auxiliar na produção de saberes e, consequentemente, na mudança da realidade circunstancial. E no que compreende a educação matemática, verificamos aportada em D’Ambrosio (1990) estreita relação entre a tecnologia e a matemática, o que nos permite compreender ambas como produto da história e da cultura humana, e, que se assim compreendidas, podem se tornar ferramentas de empoderamento dos menos favorecidos e, consequentemente, de emancipação.

Desse modo, concluímos que emancipar politicamente é mais do que formar para um fim específico; pelo contrário, é criar condições para que o indivíduo se reconheça e conheça o mundo circunstancial em que se encontra. Emancipar é armar o homem com palavras e procedimentos técnicos e tecnológicos para suportar a faina da vida, ou seja, lidar com as adversidades, com as paixões e com tudo que impede o transcorrer político e social da vida humana. Esta é ou deveria ser, desde os tempos antigos aos dias atuais, a tarefa laboriosa da educação - servir como instrumento para melhorar a vida e sua finitude circunstancial. A questão que parece urgente na discussão aqui desenvolvida é compreender em que medida se pode falar de educação política como artifício de melhoramento da vida humana e de como a tecnologia é um instrumento poderoso de auxílio nessa labuta. A vida política, nos termos aristotélicos, é realização existencial da vida em sociedade.

Referências

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1Agradecemos ao PRPGEM e a Capes pelo auxílio recebido.

5Usaremos o conceito de circunstância no sentido orteguiano, isto é, do filósofo José Ortega y Gasset. É certo que a discussão de circunstância é problemática e abre margem para diversas interpretações. Assim, eis a assertiva a seguir de Ortega y Gasset (1987, p. 93): “em princípio somos aquilo que nosso mundo nos convida a ser, e as partes fundamentais de nossa alma são imprimidas nela de acordo com o perfil de seu contorno, como se fosse um molde. Naturalmente: viver não é mais do que lidar com o mundo”. Circunstância como realidade em que cada sujeito se encontra inserido - o mundo de cada sujeito.

6Segundo Kant (2009, p. 413), no texto O que é o esclarecimento?, existe uma tipologia de homem, a saber, homem menor e homem maior, ou seja, o que usa de seu próprio entendimento, racionalidade e o que é tutelado. Por isso, para esse autor, Se então for perguntado: vivemos numa época esclarecida? A resposta será: não, mas em uma época de esclarecimento. No atual estado de coisas, falta ainda muito para que os homens, tomados em seu conjunto, estejam em condições, ou possam vir a dispor de condições, de servirem-se de seu próprio entendimento sem a direção alheia de modo seguro e desejável em matéria de religião. Mas dispomos de sinais claros de que agora se encontra aberto para eles o campo em que podem trabalhar nisto livremente e de que diminuem paulatinamente os obstáculos do esclarecimento geral ou da saída da menoridade pela qual eles próprios são culpados. Desse ponto de vista, esta época é a época do esclarecimento, ou o século de Frederico. É importante destacar que Adorno parte desse esclarecimento kantiano, possibilidade de emancipação do homem, mas acrescenta que não em termos de uma razão instrumental, mas de uma educação crítica.

Recebido: 01 de Abril de 2021; Aceito: 01 de Janeiro de 2022

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