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Ensino em Re-Vista

versión On-line ISSN 1983-1730

Ensino em Re-Vista vol.29  Uberlândia  2022  Epub 08-Jun-2023

https://doi.org/10.14393/er-v29a2022-22 

DEMANDA CONTÍNUA

Os saberes docentes dos coordenadores pedagógicos: fios e miçangas de um colar vistoso

Os saberes docentes de los coordinadores pedagógicos: Hilos e perlas de um collar hermoso

Caroline Vieira de Souza1 
http://orcid.org/0000-0002-4500-5951

Andréa Coelho Lastória2 
http://orcid.org/0000-0002-0060-0116

Filomena Elaine Paiva Assolini3 
http://orcid.org/0000-0002-8433-4862

1Mestre em Educação pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - FFCRRP-SP / Universidade de São Paulo - USP, Brasil. E-mail: k.souza@hotmail.com.

2Livre docente da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - FFCRRP-SP / Universidade de São Paulo - USP, Brasil. E-mail: lastoria@ffclrp.usp.br.

3Livre docente da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - FFCRRP-SP / Universidade de São Paulo - USP, Brasil. E-mail: elainefdoc@ffclrp.usp.br.


RESUMO

O artigo apresenta um estudo sobre os saberes docentes de cinco coordenadores pedagógicos da rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP. Partimos do pressuposto que, assim como os professores em exercício, os coordenadores mobilizam, constroem e reconstroem saberes docente nas ações que realizam. O estudo desenvolveu-se por meio de entrevistas semiestruturadas, em uma abordagem qualitativa. Os resultados revelam que ser articulador, facilitador e formador de professores, são saberes docentes que os coordenadores verbalizam, explicitamente, sobre seu papel. Além disso, ao relatarem suas práticas, adotam ações que promovem o diálogo e a construção de parcerias nas escolas, e, também, identificam entraves encontrados para desempenharem o papel de formadores de professores. A partir das práticas descritas, inferimos que as ações relatas pelos coordenadores revelam saberes profissionais da docência não verbalizados, a priori, por estes profissionais.

PALAVRAS-CHAVE: Coordenador Pedagógico; Saberes docentes; Formação de professores

RESUMEN

El artículo presenta una investigación sobre los saberes docentes de cinco coordinadores pedagógicos de la red pública municipal de Ribeirão Preto - SP. Hemos partido de la idea que, así como el profesorado, los coordinadores pedagógicos movilizan, construyen y reconstruyen saberes docentes en las acciones que realizan. La investigación se ha realizado por medio de encuestas semiestructuradas en un abordaje cualitativo de la investigación educativa. Los resultados señalan que ser articulador, facilitador y formador de profesores se constituye en saberes docentes que los coordinadores verbalizan, explícitamente, sobre su rol profesional. Además, al relataren sus prácticas, adoptan acciones que promueven el diálogo y la construcción de parcerias en las escuelas, y también identifican per calzos para desempeñar el rol de formadores de profesores. A partir de las prácticas descritas señalamos que las acciones traídas a la luz por los coordinadores revelan saberes profesionales de la docencia no verbalizados, a priori, por estos profesionales.

PALABRAS CLAVE: Coordinador Pedagógico; Saberes docentes; Formação de professores

RESUMO

The article presents a study on the teaching knowledge of five Pedagogical Coordinators from the municipal public school in Ribeirão Preto - SP. We assume that, just like teachers exercising their role, coordinators mobilize, build and reconstruct teacher knowledge in the actions they perform. The study was developed through semi-structured interviews, in a qualitative approach. The results reveal that being an articulator, facilitator and teachers' development professional, the coordinators explicitly verbalize teaching knowledge about their role. In addition, when reporting their practices, they adopt actions that promote dialogue and build partnerships in schools, identifying obstacles that might impair their role as teachers’ formers. From the practices described, we infer that the actions reported by the coordinators reveal professional knowledge of teaching not verbalized at first by these professionals, but could be observed in their practice.

KEYWORDS: Pedagogical Coordinator; Teaching knowledge; Teacher development

A missanga, todas a veem. Ninguém nota o fio que,

em colar vistoso, vai compondo as missangas.

Mia Couto

Fios que perpassam as missangas: os saberes e fazeres docentes

Ao longo do desenvolvimento profissional, o professor depara-se com a possibilidade de ampliar seu campo de atuação, sair do espaço da sala de aula e reconstruir os saberes da docência. Assumir a coordenação pedagógica é uma dessas possibilidades.

Tanto professores em exercício quanto coordenadores pedagógicos convivem cotidianamente com a complexidade do espaço escolar, e, para lidar com a realidade vivida, exercitam sua profissionalidade, ancorando-a em conhecimentos e saberes docentes de diversas naturezas.

A bibliografia corrente, reconhece que, no exercício da docência, os professores atuantes em sala de aula ou envolvidos em outras atividades escolares (como o coordenador pedagógico, por exemplo), revelam compreensões sobre seu papel na educação e sobre os mecanismos de constituição de uma profissionalidade, baseando-se em conhecimentos sistematizados, validados e formalizados historicamente pelas instituições de ensino e em conhecimentos/saberes provenientes de sua prática educativa.

Entendemos que, assim como o professor, o coordenador

não é um trabalhador que se contenta em aplicar meios e que se comporta como um agente de uma organização: ele é sujeito de seu próprio trabalho e ator de sua pedagogia, pois é ele quem modela, quem lhe dá corpo e sentido no contato com os alunos (negociando, improvisando, adaptando). (TARDIF, 2012, p. 149)

Nesse processo de negociação, interação e adaptação ao contexto de atuação, o coordenador constitui-se profissional do ensino, capaz de construir seu próprio espaço pedagógico de trabalho, sem desconsiderar as complexidades cotidianamente, especialmente se o considerarmos como um “sujeito do conhecimento, um ator que desenvolve e possui sempre teorias, conhecimentos e saberes de sua própria ação” (TARDIF, 2012, p. 235).

Inspiramo-nos na obra “Os fios das missangas”, de Mia Couto 4 (2009) e nas provocações sobre essa obra, feitas por Gouveia e Placco (2013), para identificar quais são os saberes docentes dos coordenadores pedagógicos atuantes na rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP e discutir os mesmos à luz do referencial teórico da área educacional. Partimos do pressuposto que os saberes dos coordenadores pedagógicos podem ser explícitos, declarados, reconhecidos facilmente por eles, ou podem assumir aspecto de “fios” que perpassam as missangas do seu trabalho, os quais, como bem diz Couto, muitas vezes não são vistos facilmente, nem tampouco formalizados e valorizados.

No intuito de desvelar “os fios” que perpassam as missangas do trabalho do coordenador pedagógico, apoiamo-nos em Tardif (2012, p. 11), para quem “o saber não é uma coisa que flutua no espaço: o saber dos professores é o saber deles e está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com a sua experiência de vida e com a sua história profissional”.

A história profissional dos coordenadores revela saberes específicos da formação profissional, impressos pelas instituições de ensino e declarados verbalmente por estes profissionais, enquanto outros podem ser identificados em seu fazer, permitindo-nos, enfim, compreender o que este profissional faz, como faz e porque faz do jeito que faz, para assim, formalizar e sistematizar seus saberes docentes.

Reconhecemos que os saberes profissionais docentes não são construídos com a ascensão ao cargo, mas sim ao longo de um percurso muito maior que o exercício laboral de modo progressivo na escola, ou seja, ao mesmo tempo em que se insere nestes espaços, o coordenador, “o interioriza por meio de regras de ação que se tornem parte integrante de sua ‘consciência prática’ (TARDIF, 2012, p. 14).

Entendemos que os saberes dos coordenadores possuem um caráter muito particular, especialmente, quando consideramos tais saberes inacabados, que se constituem na exterioridade, na coletividade e na particularidade da prática na qual são revelados, ressignificados e reconstruídos.

Para Souza (2012, p. 95), coordenador pedagógico “é aquele que organiza, orienta e harmoniza o trabalho em grupo, por intermédio de determinados métodos, de acordo com o sistema ou contexto em que se insere”, de forma que, ao mesmo tempo em que desenvolve suas funções, amplia saberes profissionais e tem a oportunidade de aprender a ser coordenador.

Na rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP, lugar onde a pesquisa que subsidia o texto foi desenvolvida, a criação do cargo de coordenador pedagógico aconteceu para implementar o previsto nos documentos oficiais5 da referida rede. Para tal, investiu-se no processo de seleção e contração de coordenadores pedagógicos, por meio de concurso público para o provimento de cargos. De acordo com o edital nº 43 / 9837, de 13 de novembro do ano de 2016, os candidatos deveriam apresentar “Licenciatura Plena em Pedagogia ou Pós-Graduação em Gestão Escolar com carga horária mínima de 360 horas” e “ter no mínimo 03 (três) anos de efetivo exercício no magistério da Educação Básica”.

No intuito de identificar quais são os saberes docentes dos coordenadores pedagógicos atuantes na rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP e discuti-los à luz do referencial teórico da área educacional, optamos por desenvolver a pesquisa em uma abordagem qualitativa, que, segundo Bogdan e Biklen (1994, p. 49), “exige que o mundo seja examinado com a ideia de que nada é trivial, que tudo tem potencial para constituir uma pista que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora no nosso objeto de estudo”.

A investigação em questão, foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa e contou com a participação de cinco coordenadores pedagógicos da rede pública municipal de ensino de Ribeirão Preto/SP, a qual computava, em 2020, com 31 profissionais no cargo. A rede contava, na data da investigação, com 108 escolas que atendem à Educação Infantil, Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos.

Para formarem o “colar vistoso” da investigação que subsidia esse texto, convidamos por e-mail, cinco coordenadores a se tornarem nossas “missangas”, os quais aceitaram participar da pesquisa. Esses profissionais atuam no Ensino Fundamental e na Educação de Jovens e Adultos e possuem entre 5 e 21 anos de exercício da docência, ambos com aproximadamente dois anos no referido cargo.

Em uma entrevista semiestruturada realizada na escola onde atuam, os coordenadores foram convidados a escolher um codinome que representasse “missangas de um colar vistoso” cujo fio seria revelado a partir dos saberes que declaram verbalmente e dos saberes indicados por nós a partir da análise de práticas que compartilham durante a entrevista. Por esse motivo, os mesmos são chamados pelos nomes de quatro minerais e uma resina fóssil, a saber: Esmeralda, Diamante, Ágata, Rubi e Âmbar.

Missangas que se juntam: os coordenadores pedagógicos, a formação continuada e a base de conhecimentos

No processo de construção do fazer, o coordenador pedagógico assume, de forma compartilhada com outros profissionais, um dos seus papeis principais: o de formador de professores.

Quando trata da formação continuada, Borba (2017, p. 21-22 apud ZABALZA, 2013), entende que a mesma é

um conjunto de atitudes, conhecimentos, habilidades e padrões de condutas que efetivamente afetam muitas dimensões sobre o indivíduo e a organização onde está inserido, sendo assim um recurso essencial para o desenvolvimento pessoal e social do ser humano.

Ao atuar em processos formativos, os coordenadores têm a oportunidade de promover mudanças no processo de ensino-aprendizagem a partir do investimento na ampliação e valorização dos saberes docentes, uma forma potente de promoção do desenvolvimento profissional em diferentes âmbitos, desde o pessoal até, e especialmente, o profissional.

Para desenvolver suas atividades e atuar na formação docente, o coordenador utiliza um conjunto de conhecimento como alicerces de sua prática, o que pode ser entendido como sendo a sua “base de conhecimento”6, que, para Shulman (2005) e Backes et al (2017), pode ser organizada segundo as categorias:

QUADRO 1 Categorias da base de conhecimentos para o ensino segundo Shulman (2005) e Backes et al (2017

Base de conhecimentos Principais características
Conhecimento do conteúdo Aborda os conhecimentos que o professor compreende que deve ser ensinado e aprendido, o que impacta na ampliação das possibilidades de intervenção docente.
Conhecimento didático geral Compreende princípios e estratégias de manejo que influenciam na aplicação de metodologias de ensino-aprendizagem que favoreçam a construção do conhecimento.
Conhecimento do currículo Revela a compreensão do docente sobre as contribuições dos conhecimentos para a formação humana e profissional dos sujeitos.
Conhecimento didático do conteúdo Revela a compreensão dos conteúdos pelo professor, que lhe atribui significados e o ressignifica em seu fazer. É responsável pela mobilização das outras categorias da base de conhecimentos, revelando, em sua prática, as concepções particulares do professor sobre o que é ensinado.
Conhecimento dos alunos Trata do conhecimento acerca dos alunos com os quais atua, dos contextos onde vivem, do que sabem e sobre como aprendem.
Conhecimento dos contextos educativos Revela a consciência docente dos aspectos macro e micro relacionados à Educação e favorece a construção de maior compromisso com a instituição, com a comunidade e com a sociedade.
Conhecimento dos objetivos, finalidades e valores educativos Revela a compreensão do papel social assumido pela Educação e pelo professor em sua ação educativa, tendo por base, os fundamentos filosóficos e históricos.

Fonte: Adaptado de SHULMAN (2005) e BACKES et al (2017).

Ao analisar as categorias apresentadas anteriormente, Mizukami (2004) organiza uma outra proposta de categorização da base de conhecimentos para o ensino. Tal organização não é, sob a nossa ótica, distante do que é apresentado anteriormente, pelo contrário, ambas seguem numa mesma direção e compõem, na mesma medida que para os professores, os conhecimentos necessários à atuação do coordenador pedagógico, mesmo estando ele em cargos de gestão. De acordo com a proposição da autora, a base de conhecimentos para o ensino pode ser categorizada da seguinte forma:

QUADRO 2 Categorias da base de conhecimentos para o ensino segundo Mizukami (2004

Categoria Características
Conhecimento do conteúdo específico Diz respeito ao conteúdo do componente curricular lecionado pelo professor, inclusive as compreensões de fatos, conceitos, processos, procedimentos etc. de uma área específica do conhecimento quanto àquelas relativas à construção dessa área.
Conhecimento pedagógico geral Envolve conhecimentos de teorias e princípios do processo de ensino-aprendizagem e conhecimentos dos alunos, dos contextos educacionais, de outras disciplinas e conhecimentos de fins, metas e propósitos educacionais.
Conhecimento pedagógico do conteúdo É uma forma de conhecimento do conteúdo, que é construído, enriquecido e melhorado pelo professor quando mesclado com outros tipos de conhecimento em sua prática de ensino.

Fonte: Adaptado de MIZUKAMI (2004).

Além do que é apresentado no quadro 2, Mizukami (2004,) assevera que, ao desempenhar seu papel, o professor, assim como o coordenador pedagógico, desenvolve, ressignifica e constrói saberes que emergem da prática e para ela volta em outras situações de ensino-aprendizagem, num movimento de retroalimentação constante de seu fazer. Tal aspecto, sob nossa ótica, também se aproxima do contexto de atuação do coordenador pedagógico e podem ser observados no detalhamento da prática dos coordenadores ao compartilharem seu fazer.

Sob essa perspectiva, consideramos que é no fazer e no “provar-se”, que o coordenador pedagógico se constitui profissionalmente, e, nesse movimento, tem a oportunidade de avaliar os saberes produzidos, acumulados e acessados ao longo de sua jornada formativa, reconstruindo-os e ressignificando-os em sua ação. Isso inclui reconhecer que, assim como para o professor, “não é suficiente somente conhecer bem sua disciplina, mas também ter conhecimentos inerentes ao ato de ensinar” (Backers et al, 2017, p. 3), ou, por melhor dizer, o ato de “formar”, seu principal papel.

O colar vistoso: os saberes revelados

A montagem do “colar vistoso” dos saberes dos cinco participantes7 desta investigação parte do conjunto de dados coletados nas entrevistas semiestruturadas.

Em suas falas, os entrevistados trazem à tona conhecimentos que são claramente reconhecidos por eles, especialmente quando abordam o que entendem ser o papel do coordenador pedagógico.

As proposições apresentadas pelos participantes da investigação que subsidia esse texto, permitem-nos discutir duas grandes características dos saberes profissionais dos coordenadores pedagógicos da rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP, a saber:

  • parte dos saberes sobre seu papel são verbalizados, explicitamente, pelos coordenadores e funcionam como balizadores de sua prática profissional;

  • alguns saberes são revelados quando descrevem suas atuações práticas, portanto, eles são indicados, por nós, como sendo saberes não verbalizados explicitamente.

Para nós, a verbalização explícita dos saberes docentes dos coordenadores pedagógicos da rede investigada e a abordagem de suas práticas, permitem identificar saberes docentes com características diversas, ou seja, o saberes que tem como aspectos estrutural o fato de ser “plural, compósito, heterogêneo, porque envolve, no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e um saber-fazer bastante diversos, provenientes de fontes variadas e, provavelmente, de natureza diferente” (TARDIF, 2012, p. 18).

Por esse motivo, concordamos com o autor, os saberes docentes dos professores, em exercício ou em outros cargos, são produzidos ao longo do processo de formação e de trabalho reincidem sobre a aprendizagem profissional da docência, o que, somente o próprio sujeito, é capaz de revelar em seu fazer.

Desse modo, consideramos importante ouvir a “voz” dos coordenadores participantes da pesquisa e explicitar suas próprias visões sobre a profissão, ou seja, que possam colocar, com suas próprias palavras ou relatos de seu fazer, os saberes que possuem sobre o que consideram ser seu papel.

A seguir, é possível verificar o que o coordenador entende sobre seu papel:

“Ser coordenador é ser um articulador, ser um facilitador das ações pedagógicas da escola [...]. O coordenador é um facilitador, ele articula as ações de modo que a aprendizagem aconteça.” (Coordenadora Esmeralda)

“Um ponto fundamental para a coordenação é a formação dos professores” (Coordenador Diamante)

“[...] O coordenador tem que atuar na formação continuada do professor.” (Coordenador Rubi)

A partir dos excertos é possível notar que os coordenadores colaboradres da pesquisa reconhecem parte daquilo que entendemos ser seu saber profissional acerca do papel que desempenham, os quais podem ser agrupados em três aspectos fundamentais. Para eles, ser coordenador pedagógico é ser um facilitador, um articulador e um formador de professores.

Ao reconhecerem-se como facilitadores do processo de ensino e aprendizagem, os coordenadores, detalham os saberes profissionais mobilizados em seu fazer nas escolas onde atuam. Revelam o que Domingues (2009) afirma quanto à consolidação do trabalho desse profissional ao longo dos anos, o qual deixou de ser um fiscal do trabalho pedagógico, para ser aquele com o qual o professor e a comunidade escolar podem contar para desenvolver as práticas pedagógicas.

Entretanto, ao dedicar tempo para o desenvolvimento de ações de facilitação do trabalho na escola, o coordenador deixa de destinar “tempo de seu trabalho na escola para o desenvolvimento de ações pedagógicas planejadas intencionalmente tendo em vista a formação docente.” (CAMPOS; ARAGÃO, 2012, p. 38), função prioritária desse profissional.

A preocupação que ora apresentamos advém da reflexão sobre a atuação imediatista desse profissional em muitas das atividades que desenvolve, especialmente quanto à oferta de materiais e suporte ao professor, que pouco pode impactar na reflexão sobre a prática e na consequente mudança no fazer docente, na consolidação do papel de formador de professores e na legitimação de seu cargo na rede onde atua.

Sobre o destaque dado ao papel de “articulador”, entendemos que esses profissionais reconhecem que se trata de um papel orientado para um fim, como, por exemplo, a consolidação do Projeto Político Pedagógico (PPP) das unidades escolares onde atuam.

Para André e Vieira (2012, p. 23):

Ter clareza do papel de articulador do projeto político pedagógico da escola, num processo contínuo de formação de professores, é de fundamental importância para que o coordenador não se perca nas emergências e nas rotinas do dia a dia escolar.

O papel de articulador, nesse caso, vai além de agir a serviço do cumprimento das ações planejadas pela comunidade escolar e reveladas no PPP da unidade escolar. Na verdade, a consciência desse papel permite, a esses profissionais, definir, inclusive, quais sujeitos da escola devem ser envolvidos nos processos que desenvolvem e em quais momentos, ou seja, ser articulador não significa ser apenas articulador de projetos, mas, também, articulador de pessoas e de processos educativos.

Outra compreensão sobre seu papel, diz respeito à atuação dos coordenadores como formadores de professores. Sobre isso, Placco (2012, p. 57) reafirma que “uma função fundamental do Coordenador Pedagógico é cuidar da formação e do desenvolvimento profissional dos professores”. Tal aspecto, como vimos, é verbalizado, explicitamente, pelos coordenadores, os quais indicam ter clareza sobre esse papel, revelando, assim, seus saberes profissionais docentes.

Nas entrevistas, ao compartilharem práticas que desenvolvem, os coordenadores revelam saberes não verbalizados, explicitamente, quando questionados. Nessas ações, revelam, também, conhecimentos cuja fonte afina-se ao que Schulman (2005) chama de sabedoria proveniente da própria prática. Apesar de não explicitarem “como atuam” e “por que” atuam de determinado modo, inferimos que as estratégias adotadas pelos coordenadores, configura-se como princípio basilar em seu trabalho. Em suas falas, os coordenadores revelam que ancoram seus saberes no investimento dialógico, como pode ser observado nos excertos a seguir:

[...] o coordenador tem que sentar e ouvir as dificuldades dos professores entre os professores, dos professores com alunos, professores com a família. (Coordenador Diamante)

[...] Há uma necessidade que os professores têm muito forte aqui, a de ser ouvido. Porque o professor na Rede não é ouvido. (Coordenadora Âmbar)

[...] Formar não é ir lá na frente e falar, falar, falar, falar. É propor uma reflexão e deixar que os professores falem. (Coordenadora Ágata)

Eu não posso deixar de conversar com o professor. Isso é algo que eu preciso cultivar sempre, é um aprendizado contínuo. (Coordenador Rubi)

As falas apresentadas indicam a preocupação dos coordenadores pedagógicos da rede investigada em estabelecer relações dialógicas com as pessoas inseridas no cotidiano escolar, revelando, assim, um saber profissional. Seus dizeres indicam que esses profissionais compreendem que “o coordenador pedagógico precisa conhecer e valorizar a trama das relações interpessoais nas quais ele, coordenador, e seus professores interagem” (ALMEIDA, 2001, p. 70), o que justifica o fomento ao diálogo não somente com professores, mas também com os estudantes, familiares e toda a equipe escolar, atividade relatada pelo Coordenador Diamante.

Ao construir uma relação dialógica com os professores, o coordenador pedagógico tem a oportunidade de estabelecer, com eles, um percurso formativo pautado em decisões partilhadas e em informações concretas, ou melhor, em necessidades formativas explícitas do professor.

Diante do exposto, identificamos que investir no diálogo é, verdadeiramente, um saber docente do coordenador pedagógico.

Acreditamos que atuando dessa forma, o coordenador permite que o professor se envolva nos processos formativos dos quais participa, ao mesmo tempo em que tem a oportunidade de discernir suas dificuldades e anseios sendo contempladas em situações de aprendizagem, assumindo, assim, um papel ativo em seu desenvolvimento profissional e, ao mesmo tempo, distancia-se do papel de “um mero instrumento nas mãos de outros” (IMBERNÓN, 2010, p. 78).

Outro saber identificado nas práticas relatadas pelos coordenadores trata do estabelecimento de parcerias objetivando construir o sentido de coletividade na escola. A construção de um fazer pautado na coletividade, afina-se à Imbernón (2010, p. 64), para quem “o ensino se converteu em um trabalho coletivo necessário e imprescindível para melhorar o processo de trabalho dos professores, a organização das instituições educacionais e a aprendizagem dos alunos”.

Tal aspecto faz coro nas falas de três coordenadores, que legitimam em sua prática elementos da coletividade, especialmente quando buscam parcerias que colaborem com a formação dos professores e com o processo de ensino e aprendizagem. Observe a seguir:

[...] nós identificamos junto com a orientadora da escola, as necessidades que estão acontecendo naquele momento. A partir daí buscamos subsídios teóricos para trabalhar com os professores. (Coordenadora Esmeralda)

O estatuto da escola não pode ser dividido entre administrativo e pedagógico. (Coordenadora Âmbar)

Precisamos caminhar unidos com os professores. Em uma prática desenvolvida por um docente eu falei: - eu nunca mexi num microscópio. Posso participar? Participei junto. Fui mexendo, aprendendo a mexer... A partir desse processo eu entendi que tínhamos que caminhar juntos para fazer uma oficina. Compreendi que não faria sentido tratar de assuntos apenas teoricamente. (Coordenador Rubi)

Em seus dizeres, os participantes indicam que atuar na construção de parcerias com professores, diretores e demais sujeitos da comunidade escolar é um dos papeis que assumem, de modo que inferimos ser este um saber profissional não verbalizado, de modo explícito, pelos coordenadores quando questionados.

Entendemos que o sentimento de coletividade/parceria é construído a medida em que a atuação dos coordenadores tende a fortalecer as relações entre todos os envolvidos com a escola e com o processo de ensino-aprendizagem, ampliando, assim, o impacto de suas ações, as quais não mais se destinarão à escola e seus processos, mas sim aos lugares, aos pais, alunos e comunidade em seu entorno.

Além disso, nas práticas relatadas, os coordenadores também demonstram compreender que, para desempenhar seus papeis, é preciso que se compreenda onde está, aspecto que, para nós, configura-se em mais um dos saberes docentes do coordenador.

Tal saber é detalhado em suas falas, especialmente quando abordam a busca por informações sobre os estudantes, a instituição onde atuam e a comunidade onde a escola está inserida, conforme pode ser observado a seguir:

Eu tenho que pensar que estou dentro de uma rede. É fundamental conhecer o trabalho pedagógico dentro da escola para poder fazer a formação e o acompanhamento das experiências docentes. (Coordenadora Âmbar)

[...] Precisamos ter o entendimento sobre o lugar que a gente está, a comunidade que a gente está, conhecer a comunidade, conhecer as famílias, conhecer os alunos, isso é muito importante. (Coordenador Rubi)

As ações relatadas por Âmbar e Rubi, mostram-se importantes para a construção do diagnóstico da escola, e, além disso, configura-se como elemento fundamental para a regulação do trabalho do coordenador, influindo, em grande medida, na atuação desse formador.

Para Mizukami (2004), conhecer os contextos educacionais e seus propósitos faz parte de um conjunto de conhecimentos que compõem a base de conhecimento pedagógico geral para o ensino, que envolve conhecimentos sobre o espaço de atuação e sobre todos os sujeitos que compõem tal espaço.

Diante do exposto, reconhecemos que, conhecer a escola, de forma a compreender melhor o contexto social onde se insere, é um saber verbalizado pelos coordenadores. Compreendemos, inclusive, que tal saber é um dos balizadores da prática dos participantes dessa investigação. Os coordenadores revelam a importância de conhecer a escola a partir de diferentes escalas, contextos e pontos de vista para definir sua forma de atuação e estabelecer as prioridades formativas a serem tratadas.

Os saberes que permeiam as práticas formativas do coordenador pedagógico

As práticas formativas desenvolvidas pelos coordenadores pedagógicos colaboradores da pesquisa que atuam na rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP que aqui retratamos, dizem respeito às horas destinadas às formações coletivas e individuais dedicadas a jornada de trabalho do professor, prevista na Lei Municipal Complementar nº 2.524 de 05 de abril de 2012.

Os fazeres relatados por Esmeralda, Âmbar e Ágata revelam o uso de estratégias formativas que se atentam às necessidades formativas identificadas na escola e a favor da aprendizagem de todos, atribuindo à escola, o caráter de lócus das formações ofertadas, ou seja, o ponto de partida para as ações relatadas a seguir:

[...] Fizemos várias discussões sobre o ensino como tem que acontecer, na prática, e depois nós entramos em sala de aula. (Coordenadora Esmeralda)

Eu utilizei um momento do planejamento, montei uma apresentação para eles com slides no PowerPoint, demonstrei para os docentes alguns conceitos, elucidei como montar a tabela. (Coordenadora Âmbar)

Fomos destrinchando as questões para que as professoras me dissessem qual a dificuldade para responder àquela questão. (...) Questionei quais dificuldades e facilidades você notou (na criança) para responder essa questão? (...) O que isso significa? (...) Qual o significado dela ter feito uma conta de menos e não uma conta de mais? (Coordenadora Ágata)

Nas colocações apresentadas, os coordenadores relatam práticas formativas que ajudam a identificar seus saberes, dentre os quais podemos destacar que concebem o uso de informações sobre as práticas docentes “reais” e uso das problemáticas dos professores e da escola como objetos de análise nas formações, para problematizar e ressignificar as práticas docentes.

As práticas formativas evidenciam conhecimento quanto à importância de, numa formação centrada na escola, “instigar os conhecimentos que os professores dominam e intervir para reorganizar tais conhecimentos, elevando-os a outros patamares” (PLACCO e SOUZA, 2012, p. 51).

Os relatos demonstram a preocupação dos coordenadores, formadores de professores, em selecionar e planejar estratégias que auxiliem o professor a refletir e elucidar seus fazeres, reconhecendo os conceitos que os sustentam, de modo que consigam “examinar suas teorias implícitas, seus esquemas de funcionamento, suas atitudes, etc., estabelecendo de forma firme um processo constante de autoavaliação de que se faz e por que se faz” (IMBERNÓN, 2010, p. 47).

Em outra medida, os coordenadores, retratam as dificuldades enfrentadas para desempenhar o papel de formadores de professores na rede pública municipal, conforme observa-se nas falas de três coordenadores:

(...) precisamos ser mais coesos, fazer algo em rede, pelo menos um formato em rede e aí poderíamos considerar as especificidades de cada escola. (Coordenadora Âmbar)

Às vezes é preciso falar sobre recreio, sobre horário, sobre isso, sobre aquilo, então é um espaço que é menos pedagógico e mais administrativo no geral. (Coordenador Rubi)

[...] o fato de o professor não ter um tempo para ficar trabalhando coletivamente na escola, com os seus pares, dificulta a formação e o trabalho pedagógico. (Coordenador Diamante)

Nesses dizeres, os coordenadores demonstram conhecimentos acerca das variáveis que impactam a atuação como formadores de professores e retratam dificuldades associadas à estrutura organizacional da rede investigada, sobretudo quanto ao estabelecimento de tempo para encontros coletivos na escola, ao uso inapropriado do tempo dedicado às formações, à falta de parâmetros comuns de atuação nas unidades escolares, ao uso inapropriado dos recursos disponibilizados pela rede e à falta de articulação entre os processos formativos locais (que ocorrem na escola) e dos processos formativos institucionais mais amplos.

As afirmações indicam que os coordenadores reconhecem que, a não promoção de espaços coletivos de formação impactam negativamente no desenvolvimento de sua atribuição de formador, evidenciando, assim um significativo saber profissional.

Por meio de suas falas, podemos inferir que esses profissionais compreendem que “professores que refletem junto com seus pares, nas escolas, ajudam a própria escola (entendida como um grupo de pessoas com objetivos educacionais comuns) a refletir sobre si mesma e a mudar” (TANCREDI, 2009, p. 19).

Na prática escolar os coordenadores encontram dificuldades para efetivar seu papel de formador de professores. Tal constatação demonstra que há uma contradição entre o que prevê as atribuições do cargo, as práticas relatadas pelos coordenadores e a estrutura organizacional oferecida pela rede investigada.

A formação do formador: o que sabem os coordenadores pedagógicos sobre isso?

Para lidar com a diversidade de seu universo de atuação e ajustar seus conhecimentos ao vivido nas escolas, os coordenadores convivem com a latente necessidade de reconstrução de seus saberes e fazeres e com o desejo de legitimar uma das atribuições reconhecidas: a de formador de professores, função essa que partilham com os demais gestores da instituição de ensino onde atuam. Sobre a necessidade de formação, quatro coordenadores afirmam:

Eu tive dificuldade com o trabalho de alfabetização na escola porque eu sou professora de Biologia, então eu fui fazer um curso a distância sobre práticas de alfabetização e letramento, justamente para entender o que estava acontecendo na escola. (Coordenadora Esmeralda)

Tivemos que montar um grupo de estudos fora do horário de trabalho para começar a pensar sobre questões do cotidiano escolar. (Coordenadora Âmbar)

Pessoalmente eu invisto em formação, por exemplo, eu estou fazendo um MBA em Gestão Escolar, pois considerei que seria interessante para a minha atuação. (Coordenadora Âmbar)

Eu continuo participando de grupo de pesquisa. Aconteceu o Encontro do Bienal do grupo na Universidade de Campinas - UNICAMP recentemente e eu estive presente. Tento fomentar a pesquisa. (Coordenador Rubi)

As falas revelam que os coordenadores investem, por si mesmos em sua formação (autoformação), ora em cursos de especialização, ora na manutenção de contato com universidades, em estudos individualizados, em grupos de estudos e, ainda, em participações em eventos acadêmicos-científicos. Além disso, demonstram disponibilidade em participar das formações oferecidas pela instituição de ensino onde atuam, e, em outras situações, buscando legitimar espaço e tempo para desenvolverem-se, profissionalmente, a partir do princípio de formação centrada na escola.

A iniciativa de constituição de um grupo de estudos, expressa em suas falas, revela a percepção dos coordenadores sobre a importância da construção de um espaço de trocas entre profissionais que atuam em uma mesma atividade profissional, possibilitando, assim, o acesso a novos conhecimentos e a revisão de saberes que subsidiam seus fazeres.

Essa iniciativa se mostra potencializadora da aprendizagem dos formadores, haja vista que lhes permite definir objetivos próprios de aprendizagem e os objetos de análise, oriundo de sua prática, que podem ser utilizados e tematizados nos momentos de encontro de saberes e de experiências. Tal experiência permite, efetivamente, que os coordenadores assumam o lugar de sujeitos dos processos formativos dos quais participa.

Entretanto, cabe destacar que, a formação do formador, é uma responsabilidade que deve ser partilhada com a instituição de ensino, ou seja, cabe, também, à rede pública municipal de Ribeirão Preto, estabelecer políticas públicas que garantam condições institucionais que favoreçam o desenvolvimento profissional dos coordenadores, não cabendo, portanto, apenas ações individualizadas dos profissionais.

Criar condições institucionais favoráveis à formação do formador e, também, a oferta de tempo para a formação do formador em sua rotina semanal de trabalho, são exemplos de ações que possibilitam a formação do coordenador em serviço, cabendo, portanto, à referida rede, estabelecer programas que assegurem a formação do formador.

Os coordenadores indicam que a rede investe em sua formação, entretanto, destacam a desarticulação e a falta de planejamento das mesmas, conforme podemos observar a seguir:

[...] Tivemos algumas formações sobre projetos, que são jogados na rede Na verdade, é uma formação de informação. Sobre como será o projeto, de como vai ser trabalhado... (Diamante)

O que existe sobre formação, às vezes aparece do nada, aparece no sentido de aparecer mesmo, magicamente. (Âmbar)

Você vai para a reunião e eles (Secretaria da Educação) falam: a gente fez uma parceria com a Fundação X que está oferecendo uma formação sobre gestão de sala de aula, ou sobre qualquer coisa que seja... (Âmbar)

Em suas falas, quatro coordenadores revelam que há o estabelecimento de parcerias entre a rede de ensino e as instituições privadas, não há frequência das formações institucionais, que não enxergam que exista o planejamento de um percurso formativo para os coordenadores e, notadamente, que as formações são descontextualização. Suas indicações evidenciam a desarticulação entre as formações ofertadas e as necessidades formativas dos coordenadores, o que nos levam a questionar a pertinência da oferta de tais formações diante das necessidades desses profissionais.

Além disso, indicamos a necessidade de se repensar as ações formativas para os coordenadores, tornando-as mais coerentes com suas atribuições e com os desafios encarados por esses profissionais em seus espaços de atuação, e, além disso, que incidam sobre a legitimação do papel desse profissional na escola e atribua, a eles, o lugar de sujeitos no processo de formação do qual fazem parte.

Entre missangas, fios e colar vistoso: considerações finais

Este artigo teve como objetivo analisar os saberes identificados em uma investigação com coordenadores pedagógicos atuantes na rede pública municipal de Ribeirão Preto - SP e discutir os mesmos à luz do referencial teórico da área educacional.

Partimos do pressuposto que, apesar de não atuarem diretamente no processo de ensino-aprendizagem, os coordenadores, a partir sua formação acadêmica e sua história profissional, são docentes dotados de um conjunto de saberes, de naturezas distintas, que se complementam.

Os coordenadores verbalizaram explicitamente, de forma não hierárquica, que ser “facilitadores”, “articuladores” e “formadores de professores” faz parte de seu papel profissional. Além desses atributos, manifestam que investir no diálogo, estabelecer parcerias e terem consciência quanto a “onde se está” representa saberes legitimados em seus fazeres.

Ao compartilharem as práticas formativas que desenvolvem, os coordenadores revelam saberes quanto à importância de se desenvolver uma formação centrada na escola, para que a mesma possa assumir um papel central na construção de percursos contextualizados, coerentes com a realidade vivida no espaço escolar. Ao mesmo tempo os coordenadores demonstram saber quais são os empecilhos em relação a serem efetivamente formadores de professores: a) a consolidação de espaço e tempo para a formação de professores nas unidades escolares; b) a ausência de professores especialistas nos “poucos” momentos formativos da escola; c) a quantidade de coordenadores nas unidades escolares com elevado número de estudantes e professores; d) a desarticulação entre os processos formativos intra e extraescolares, promovidos pela Secretaria Municipal de Educação de Ribeirão Preto - SP.

Para lidar com a complexidade com a qual se deparam nas escolas e com a consequente mutação de seus próprios saberes no exercício de seus papeis, os coordenadores reconhecem a relevância do investimento na formação do formador, que abarque conhecimentos específicos para o exercício da coordenação pedagógica. Nesse sentido, reclamam por espaços institucionais onde os coordenadores possam se encontrar para trocar experiências, compartilhar práticas exitosas e discutir as situações problemáticas das unidades escolares onde atuam.

Apesar da oferta de formações institucionais, as mesmas se mostram descoladas da realidade vivida nas escolas e, ao mesmo tempo, não prezam pela construção de percursos formativos dialógicos, que envolvam os participantes desde a definição dos temas, planejamento e desenvolvimento dos encontros formativos.

Diante do que apresentamos é possível findar com uma inquietação: por que ainda nos deparamos com tantos “fios” de saberes docentes escondidos entre as miçangas? Por que poucos são os saberes da profissionalidade docente, compreendidos como tal, a ponto de serem verbalizados? E o que deve ser feito para legitimar a profissionalidade do docente formador de professores, que é o coordenador pedagógico das muitas instituições de ensino de nosso país? São questões que podem lançar luz sobre o complexo campo da atuação de coordenadores nas escolas e a proficuidade de seu papel como construtor da qualidade da educação pública.

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4Mia Couto é o pseudônimo de Antônio Emílio Leite Couto. Nascido em Beira, Moçambique, em 05 de julho de 1955. Escritor, poeta e jornalista, além de biólogo, é considerado um dos grandes escritores.

5Para saber mais, acesse Lei Complementar nº 2.524/12, que versa sobre o Estatuto do Magistério, Cargo, Secretaria Municipal da Educação, Remuneração, Carreira. Disponível in: http://www.ribeiraopreto.sp.gov.br/J321/pesquisa.xhtml?lei=34102. Acesso em 10/12/2020.

6A base de conhecimentos para o ensino “consiste de um corpo de compreensões, conhecimentos, habilidades e disposições que são necessários para que o professor propiciar processos de ensinar e de aprender, em diferentes áreas de conhecimento, níveis, contextos e modalidades de ensino” (MIZUKAMI, 2004). Apesar de não atuar diretamente no processo de ensino, consideramos o coordenador um professor que atua em outras dimensões do processo educativo, como, no caso, em cargos de gestão, os quais, requerem do mesmo, um conjunto de conhecimentos específicos da docência, como os indicados por Shulman (2005).

7Na data da coleta de dados, a rede pública municipal de Educação do município de Ribeirão Preto - SP contava com 31 coordenadores pedagógicos atuantes no Ensino Infantil, no Ensino Fundamental e na Educação de Jovens e Adultos, os quais foram convidados via correio eletrônico institucional a participarem da investigação. Deste total, cinco coordenadores manifestaram interesse em participar.

Recebido: 01 de Setembro de 2021; Aceito: 01 de Fevereiro de 2022

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