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Ensino em Re-Vista

versão On-line ISSN 1983-1730

Ensino em Re-Vista vol.29  Uberlândia  2022  Epub 08-Jun-2023

https://doi.org/10.14393/er-v29a2022-41 

DEMANDA CONTÍNUA

Indicadores de avaliação do Ensino Remoto Emergencial em uma escola pública brasileira durante a pandemia de Covid-19

Indicadores de evaluación de la Enseñanza Remota de Emergencia en una escuela pública brasileña durante la pandemia Covid-19

Andreia de Assis Ferreira1 
http://orcid.org/0000-0002-7915-8470

Santer Alvares de Matos2 
http://orcid.org/0000-0002-7890-8655

Guilherme Carvalho Franco da Silveira3 
http://orcid.org/0000-0001-6907-2027

1Doutora. Centro Pedagógico da Escola de Educação Básica e Profissional da UFMG (CP/EBAP/UFMG), Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: andreiaassis@ufmg.br.

2Doutor. CP/EBAP/UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: santer@ufmg.br.

3Doutor. CP/EBAP/UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: gcfs@ufmg.br.


RESUMO

É premente a necessidade de se estabelecer indicadores de avaliação para o Ensino Remoto Emergencial, possibilitando avaliá-lo e aperfeiçoá-lo, potencializando processos de ensino mais qualificados. Assim, a pesquisa se propôs a desenvolver e validar um instrumento com indicadores para avaliar, institucionalmente, a proposta de organização e oferta do Ensino Remoto Emergencial, do ponto de vista dos diferentes sujeitos de uma escola pública brasileira. A pesquisa envolveu a elaboração de indicadores, seguida da realização de grupos focais que os analisaram, sugerindo modificações. Os indicadores modificados foram submetidos, por escrito, aos sujeitos da pesquisa, que validaram as alterações. Inicialmente os indicadores eram constituídos por 58 itens, tendo havido exclusões, inclusões, reestruturações e aglutinações, culminando no instrumento final de 42 itens. Além dos produtos da pesquisa, o processo de criação, especialmente em função da metodologia empregada, se constituiu num significativo momento de reflexão de todos os sujeitos envolvidos no Ensino Remoto Emergencial.

PALAVRAS-CHAVE: Indicadores de avaliação; Ensino Remoto Emergencial; Pandemia; Ensino on-line

RESUMEN

Urge establecer indicadores de evaluación de la Enseñanza Remota de Emergencia, que permitan evaluarla y mejorarla, potenciando procesos de enseñanza más calificados. Así, la investigación propuso desarrollar y validar un instrumento con indicadores para evaluar institucionalmente la propuesta de organización y oferta de Enseñanza Remota de Emergencia, desde diferentes puntos de vista de la comunidad escolar en una escuela pública brasileña. La investigación implicó la elaboración de indicadores, seguida de la realización de grupos focales que los analizaron, sugiriendo modificaciones. Los indicadores modificados fueron remitidos, por escrito, a los sujetos de investigación, quienes validaron los cambios. Inicialmente, los indicadores consistieron en 58 ítemes, con exclusiones, inclusiones, reestructuraciones y aglutinaciones, culminando en el instrumento final de 42 ítems. Además de los productos de investigación, el proceso de creación, especialmente por la metodología empleada, constituyó un importante momento de reflexión para todos los sujetos implicados en la Enseñanza Remota de Emergencia.

PALABRAS CLAVE: Indicadores de evaluación; Enseñanza Remota de Emergencia; Pandemia; Enseñanza en línea

ABSTRACT

It is urgent to establish indicators for Emergency Remote Teaching (ERT), which may allow schools to evaluate and improve this new mode of teaching. Thus, the investigation proposed to develop and validate an instrument (a questionnaire) with indicators to institutionally evaluate the organization and offer the Emergency Remote Teaching (ERT) from different points of view of the school community in a public school in Brazil. The investigation implied the indicators elaboration, followed by focal groups that analyzed the indicators, suggesting some changes. The modified indicators were sent, in writing, to the people who were in charge of the investigation, which validated the adjustments. Initially, the indicators consisted of 58 items, with exclusions, inclusions, restructurings and agglutinations, culminating in 42 items as the final instrument. In addition to the product research, the process creation, especially because of the methodology used, it was constituted an important moment of reflection for all the researchers involved in the Emergency Remote Teaching (ERT) process.

KEYWORDS: Evaluation indicators; Emergency Remote Teaching; Pandemic; E-Learning

Introdução

Em março de 2020, as escolas de Educação Básica brasileiras interromperam o ensino presencial em função da pandemia ocasionada pelo SARS-CoV-2. À época, as autoridades sanitárias acreditavam que os sujeitos das instituições de ensino seriam grandes agentes de transmissão do vírus. Embora os estudantes da Educação Básica não estivessem entre a população de risco e, na maioria das vezes, fossem assintomáticos, no ir e vir para o ambiente escolar, poderiam atuar como vetores do vírus, disseminando-o rapidamente. Assim, acreditou-se que fechar as escolas e adotar o distanciamento social, diminuiria a propagação do vírus.

Com o fechamento, algumas escolas e redes de ensino suspenderam as aulas no período, enquanto outras, reorganizaram o trabalho escolar, optando pela continuidade do processo educativo e do ano letivo por meio de atividades não presenciais (CUNHA; SILVA; SILVA, 2020), entre as quais algumas instituições de ensino no Brasil adotaram o Ensino Remoto Emergencial (ERE), mediado pelas tecnologias digitais da informação e comunicação. É importante destacar a diferença entre experiências de ensino especificamente planejadas para o ambiente virtual e cursos on-line oferecidos em resposta a situações de crise. O termo ensino remoto se deve ao distanciamento físico entre professores e estudantes, principais atores do processo educativo (DIAS-TRINDADE et al., 2020). Já o termo emergencial, sustenta-se na perspectiva de que a mudança do presencial para o remoto ocorreu sem o tempo para efetiva reflexão e construção pedagógicas (DIAS-TRINDADE et al., 2020). Como afirma Hodges (2020), a expressão ensino remoto emergencial emergiu como uma alternativa para destacar a diferença entre o ensino on-line ofertado em circunstâncias inesperadas que impedem o ensino presencial, como no caso da pandemia, e a Educação a Distância (EAD), que resulta de planejamento e design instrucional originalmente pensados para o ambiente virtual. Para esse autor, o ERE contrastando “com as experiências que são planejadas desde o início e projetadas para serem on-line, é uma mudança temporária do ensino para um modo de oferta alternativo devido a circunstâncias de crise” (HODGES, 2020, n.p.). Em decorrência do longo tempo de duração da pandemia, o ensino remoto emergencial tornou-se a principal alternativa de instituições educacionais impossibilitadas de oferecer o ensino presencial4.

O “novo normal” do ensino remoto emergencial exigiu de servidores docentes e técnicos, estudantes e familiares o acesso e o domínio de tecnologias digitais e da internet, que passaram a desempenhar papel fundamental para promover o acesso aos processos de ensino e de aprendizagem.

Entretanto, a mudança abrupta do presencial para o on-line apresentou desafios para a comunidade escolar. A equidade em relação ao acesso ao recurso tecnológico digital é um desses desafios, principalmente em um país com extensão continental como o Brasil. Nem todos os estudantes têm acesso à conexão de Internet ou a artefatos tecnológicos como smartphones, tablets e computadores. Por exemplo, na região sudeste, onde se realizou a presente pesquisa, 25% dos domicílios não possuem acesso à internet e 54% não contam com computador de mesa, notebook ou tablet (CGI.BR, 2020).

Outra questão é a curva de aprendizagem necessária para se ter o domínio dos artefatos tecnológicos e dos aplicativos voltados para a educação. Embora os estudantes estejam em constante contato com o mundo virtual ubíquo, muitas vezes são apenas consumidores passivos da tecnologia digital e da internet, as utilizam “da mesma forma que muitos da geração mais velha: para absorver informação passivamente” (NATURE, 2017, n.p.) e, frequentemente, não possuem domínio dos aplicativos com propósitos educacionais. Segundo Silveira (2018), em casa e na escola, as práticas digitais de estudo de sujeitos da educação básica ainda são escassas, predominando as práticas digitais de lazer. Para alguns professores, o desafio em relação às tecnologias digitais também é grande.

Paralelamente às questões de acesso e domínio, há, ainda, a questão da gestão do tempo no ensino remoto, talvez uma das mais preocupantes, uma vez que o trabalho/estudo presencial na escola passou a acontecer em casa, em “conflito” com tarefas domésticas, lazer e interação etc. não escolares. Por outro lado, a incerteza dos professores quanto às expectativas de aprendizagem provocou uma ênfase no método de ensino, levando à dificuldade da avaliação do processo de ensino e de aprendizagem tanto para docentes quanto para estudantes (WHITTLE et al., 2020).

Dessa forma, foram muitos os desafios impostos pela repentina implantação do Ensino Remoto Emergencial, não tendo sido possível prever com certeza sua duração ou mesmo a necessidade futura em função de outras pandemias ou crises. O que se pode afirmar é que as tecnologias digitais provavelmente vão ocupar cada vez mais espaço na educação básica, mesmo quando houver o retorno ao ensino presencial.

Assim, é premente a necessidade de se estabelecer indicadores de avaliação para o Ensino Remoto Emergencial, especificamente para o ensino on-line, possibilitando avaliá-lo e aperfeiçoá-lo, potencializando processos de ensino mais efetivos, tendo em vista a possibilidade de novos surtos pandêmico com a interrupção presencial das aulas e um consequente aumento de situações de ERE no futuro (WHITTLE et al., 2020).

Nesse sentido, a presente pesquisa se propôs a desenvolver e validar um instrumento com indicadores para avaliar, institucionalmente, a proposta de organização e oferta do Ensino Remoto Emergencial, do ponto de vista dos diferentes sujeitos da comunidade (docentes, técnicos administrativos em educação, estudantes e familiares) de uma escola pública brasileira.

Ressaltamos que não faz parte dos objetivos avaliar os resultados da aprendizagem de habilidades e competências específicas das áreas de conhecimento disciplinar.

Ensino Remoto Emergencial e as tecnologias digitais

A pandemia de covid-19 trouxe à tona a demanda de novas e antigas reflexões relacionadas aos processos de ensino e de aprendizagem (MARTINS, 2020). Dessa forma, atualmente, vivem-se tempos em que a relação entre tecnologias digitais e educação foi intensificada e ganhou um novo significado (DIAS-TRINDADE et at., 2020).

Nas circunstâncias excepcionais decorrentes do distanciamento social provocado pela pandemia de covid-19, as tecnologias digitais permitiram que milhões de estudantes continuassem os processos educativos, mesmo restritos às suas residências (SANZ; GONZÁLLEZ; CAPILLA, 2020).

Assim, as tecnologias digitais tornaram-se o meio para a continuidade do processo de ensino, sem que houvesse tempo hábil para a devida reflexão sobre a mudança do presencial para o virtual (RONDINI, PEDRO e DUARTE, 2020). Apesar da necessidade de se refletir sobre a interação entre tecnologias digitais e educação, a pandemia evidenciou que a preparação de professores, estudantes e familiares para o uso pedagógico do digital ainda é deficitária (DIAS-TRINDADE et al., 2020).

Mesmo que há muito se discuta sobre a introdução das tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC) na educação, a incorporação das TDIC nas instituições escolares ainda é um desafio na realidade brasileira (BRAGA, 2018). Problemas de infraestrutura, de equidade na acessibilidade aos artefatos tecnológicos e de formação docente são variáveis importantes que interferem diretamente em uma utilização reflexiva, intencional e produtiva das tecnologias digitais na educação (BRAGA, 2018; THADEI, 2018).

Para Tomazinho (2020), “o que está acontecendo é um planejamento pedagógico in real time (em tempo real). Nunca as escolas tiveram que experimentar tanto, e gestores e professores tomarem decisões tão rápidas.” No entanto, pesquisas apontam que, apesar de desafiadora (AVELINO; MENDES, 2020; BARRETO; ROCHA, 2020; MARTINS, 2020), a experiência escolar durante a pandemia de covid-19 deve provocar transformações no pós-pandemia, tendo em vista a intensificação do uso das TDIC na educação básica por docentes, estudantes e familiares.

Barreto e Rocha (2020) destacam o quanto professores têm se reinventado, em uma incansável busca por qualificação e em oferecer o que há de melhor das TDIC no processo de ensino. Entretanto, o acesso a diversificadas tecnologias digitais dificulta o processo de escolha de quais serão mais adequadas a cada situação educativa (MORAN et al., 2015). Para Netto, Almeida e Souza (2020) o que se observa é uma apropriação instrumental dos professores das tecnologias digitais, em decorrência da necessidade de atender à demanda emergencial.

Pesquisa realizada por Leite, Lima e Carvalho (2020) mostrou que a maioria dos professores pesquisados não recebeu qualificação para realização das atividades remotas, tendo buscado o conhecimento por conta própria. Os resultados da pesquisa ressaltaram ainda a importância da formação continuada e o despreparo dos sistemas de ensino em fornecer alternativas de trabalho e o suporte teórico necessário, obrigando o professor a se qualificar em tempo real. A dificuldade de domínio das tecnologias e a necessidade de se investir na formação de professores no que se refere ao uso reflexivo das tecnologias digitais já haviam sido observadas em pesquisas anteriores à pandemia, como apontam Leite, Lima e Carvalho (2020).

Outras pesquisas indicam que os professores pretendem continuar a fazer uso das tecnologias digitais na educação (RONDINI; PEDRO; DUARTE, 2020; NETTO; ALMEIDA; SOUZA, 2020). No entanto, Rondini e colaboradores (2020), observaram que professores que já utilizavam algum recurso tecnológico antes da pandemia de covid-19, mostraram-se mais propensos a continuar fazendo o uso no pós-pandemia. Assim, a experiência do ensino remoto emergencial sugere que é necessário desencadear “[...] processos educativos destinados a melhorar e a desenvolver a qualidade profissional dos professores [...]” (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020, p. 28).

Por outro lado, o uso das tecnologias digitais deve ir além da mera adoção de aplicativos e softwares, proporcionando engajamento, interação e interatividade entre os estudantes e atividades de ensino-aprendizagem (OLIVEIRA; CORRÊA; MORÉS, 2020), bem como uma reflexão crítica sobre as próprias tecnologias digitais no mundo contemporâneo, ou seja, a dimensão crítica do letramento digital (BUCKINGHAM; BURN, 2007).

Nessa perspectiva, pesquisas que objetivem avaliar o ensino remoto emergencial apresentam-se como importantes estudos na compreensão de como ele ocorreu e em que medida precisa ser aprimorado não somente para melhorar os processos de ensino on-line para futuras situações similares à que estamos vivendo, mas para proporcionar o uso reflexivo das tecnologias digitais no pós-pandemia.

Ensino Remoto Emergencial no Centro Pedagógico

A instituição investigada é uma escola pública federal de Ensino Fundamental, situada na região urbana de Belo Horizonte. Fundada em 21 de abril de 1954, a partir de 1958 tornou-se um Colégio de Aplicação, sendo atualmente constituinte da Escola de Educação Básica e Profissional (Ebap), uma unidade especial da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Responsável pelo Ensino Fundamental de nove anos, organizado em três Ciclos de Formação Humana (desde 1995), a instituição adota o sorteio público para ingresso dos alunos, por considerá-lo a forma mais democrática, evitando mecanismos de seletividade que favoreçam quaisquer grupos sociais ou culturais, havendo ainda uma reserva de 5% das vagas para estudantes público-alvo da educação especial.

A escola conta com dois laboratórios de informática com 15 computadores ligados à internet cada. A maioria das salas de aula conta com um data show, mas sem acesso à internet. Apesar de pertencer a uma Universidade federal, que disponibiliza o acesso a rede wifi a seus estudantes de graduação e pós-graduação, em função da idade (6 a 15 anos), os estudantes da escola investigada ainda não têm acesso a rede sem fio.

A escola conta com 64 professores de cargo efetivos e de dedicação exclusiva, da carreira de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT). A maioria dos docentes possuem doutorado e uma carga horária semanal média de 12 horas-aulas (8 horas relógio). As demais 32 horas semanais de trabalho dedicadas ao planejamento das aulas e correções das atividades, à administração da escola e a projetos de ensino, extensão e pesquisa (relacionados, especialmente, à formação de professores, aos processos de ensino e de aprendizagem etc.).

Dos 440 estudantes da escola, 52% são do sexo masculino e 48% do sexo feminino, sendo 40% autoidentificados como pardos, 38% como brancos. 11% como pretos, além de 3% de amarelos e menos de 1% de indígenas. A renda de 8% das famílias de estudantes é de até um salário-mínimo; de 24% entre um e três salários-mínimos; de 28% entre três e cinco salários-mínimos; de 20% entre cinco e dez salários-mínimos e de 6% das famílias acima de dez salários-mínimos (SALGADO, 2021).

Em 18 de março de 2020, por meio do Decreto nº 17.304, da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, as aulas presenciais das escolas do município foram suspensas. Dois meses após a suspensão das aulas presenciais, e sem perspectiva de retorno presencial, a escola optou por utilizar o ambiente de aprendizagem virtual Moodle. Destaca-se que o Moodle era pouco utilizado como ferramenta de apoio ao ensino presencial por docentes da escola, antes da pandemia. Uma comissão composta por docentes e técnicos administrativos em educação (TAE) responsabilizou-se pela organização do Moodle como um espaço virtual de ensino e vivências educacionais mediadas pelas tecnologias digitais.

Para garantir o acesso de qualidade de todos os estudantes ao Moodle e ao ensino remoto emergencial, após um levantamento que indicou a necessidade de apoio para algumas famílias, foram lançados editais de auxílio internet e computador. 42 famílias (cerca de 9,5% dos estudantes da escola) se inscreveram e foram contempladas com um auxílio mensal para pagamento de internet em seus domicílios, enquanto 100 famílias (22,6%) foram contempladas com o empréstimo de notebooks (SALGADO, 2021). Entre os servidores da escola, não houve solicitações de auxílio internet, mas cinco docentes e dois TAE solicitaram à escola e tiveram concedido empréstimo de computador para o trabalho remoto. A ausência do computador ou notebook pode se tornar um empecilho para o desempenho dos estudantes, uma vez que há atividades que podem não ser compatíveis ou que são dificultadas quando feitas nos smartphones (CUNHA; SILVA; SILVA, 2020).

Nesse contexto, cinco meses após a interrupção das aulas presenciais, em agosto de 2020, iniciou-se o ensino remoto emergencial na escola, para todos os estudantes do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental.

Procedimentos metodológicos

A pesquisa, de cunho qualitativo, envolveu inicialmente a elaboração de indicadores, pelos três autores, seguida de grupos focais que analisaram tais indicadores e provocaram a sua reconstrução. Os indicadores reconstruídos foram, por fim, submetidos por escrito aos sujeitos da pesquisa, que validaram as alterações.

O processo de elaboração de indicadores

Como afirma Minayo (2009), os indicadores podem ser compreendidos como parâmetros quantificados ou qualitativos que servem como sinalizadores da realidade, dando ênfase, entre outros, ao balizamento de processos de elaboração de investigações avaliativas. Assim, eles são correlatos empíricos das variáveis que tentamos medir; expressões concretas e mensuráveis de um fenômeno que não é diretamente observável.

Para a criação dos indicadores para o ERE, é importante também perseguir os atributos clássicos de um bom indicador, apesar de, como apontam Torres, Ferreira e Dini (2003, p. 82), ser difícil reunir todos os atributos considerados “indispensáveis a um bom indicador, como: credibilidade, simplicidade, desagregação espacial, reprodutibilidade, comparabilidade, periodicidade, acurácia, baixo custo e sensibilidade”.

Com relação à avaliação do ERE, Oliveira et al. (2020) organizaram um instrumento com seis dimensões de indicadores, utilizando uma escala Likert de 4 pontos (1 = nunca, 2 = raramente, 3 = frequentemente e 4 = sempre): questões educacionais e organizacionais; condições tecnológicas e de trabalho, questões sociais, questões relacionadas à família, questões psicológicas, questões financeiras.

Cunha, Silva e Silva (2020) apresentam uma séries de questões que inspiram a construção de indicadores de avaliação do ERE, entre as quais podemos destacar: a situação de estudantes que não tem acesso à internet, nem conseguem ir à escola retirar materiais de estudo; estudantes que, tendo acesso ao ERE, não têm acompanhamento ou orientação das famílias em suas casas; estudantes que, tendo acesso à internet, não possuem os equipamentos tecnológicos para acesso ao ERE; dificuldades de docentes de desenvolverem adequadamente o processo de ensino com as tecnologias digitais disponíveis; a qualidade e o direito e a igualdade de acesso à educação para todos os estudantes no ERE.

Por sua vez, Hodges et al. (2020) apresentaram uma avaliação de ERE para universidades que o implantaram, baseada em quatro variáveis: contexto, interação, processo e produto. Para eles, a avaliação do ERE deve ser mais focada no contexto, nas interações e nos processos do que nos produtos. Com relação aos aspectos contextuais (institucionais, sociais, governamentais), os autores destacam: a efetividade da transição do ensino presencial para o ERE; a necessidade de avaliação da interação da escola com estudantes e famílias e o impacto dessa interação na resposta à mudança para o ERE; a infraestrutura para lidar com o ERE; a capacidade do apoio da escola a estudantes e famílias para lidar com as demandas do ERE (HODGES et al., 2020).

Numa reflexão sobre o design do ERE, Whittle et al. (2020) destacam a importância das interações virtuais entre os sujeitos da comunidade escolar, algo óbvio nas atividades presenciais da escola, e que se apresentam como um desafio para o ERE, uma vez que há evidências de que as diferentes interações (professor, estudante, estudante-estudante, família-escola) parecem influenciar a aprendizagem. Nesse sentido, as interações possibilitadas ou dificultadas pelo ERE também assumem um lugar de destaque na construção de um instrumento de avaliação desse ensino.

Assim, a partir das reflexões acadêmicas disponíveis, foram criadas inicialmente, para o presente estudo, quatro categorias de indicadores de avaliação do ERE da escola investigada: a) acesso; b) organização do ensino remoto emergencial; c) qualidade e alcance de estratégias de ensino/estudo; d) habilidade técnica e interações no ensino remoto emergencial. Entretanto, o diálogo com os sujeitos da pesquisa, em especial os grupos focais, levaram a uma alteração nessas categorias, como veremos.

A análise dos dados, produzidos a partir das transcrições de gravações em áudio e vídeo e de registros de observação nos encontros de grupos focais, foi de natureza essencialmente descritiva e interpretativa.

Os grupos focais

A temática investigada é um assunto ainda pouco conhecido e explorado academicamente. Assim, a pesquisa buscou investigar de forma exploratória a experiência do Ensino Remoto Emergencial durante a pandemia, utilizando o grupo focal como instrumento de investigação. Esse recurso metodológico, também designado como grupo de discussão, é uma técnica de coleta de dados que pode ser utilizada em diferentes momentos do processo de investigação. Como técnica, ocupa uma posição intermediária entre a observação participante e as entrevistas em profundidade (MORGAN, 1997). Pode ser caracterizada também como um recurso para compreender o processo de construção das percepções, atitudes e representações sociais de grupos humanos (VEIGA; GODIM, 2001).

Segundo Gatti (2005), os grupos focais podem ser utilizados em processos de pesquisa social ou em processos de avaliação, especialmente nas avaliações de impacto, sendo o procedimento mais usual utilizar mais de um grupo focal em uma mesma investigação, buscando cobrir variados fatores que podem ser intervenientes na questão a ser examinada. A utilização do grupo focal também vai ao encontro da ideia de Minayo (2009) de que um “bom sistema de indicadores para avaliação deve sempre surgir do processo de diálogo e de negociação entre todos os atores”, que, no caso da escola, são os professores, técnicos em educação, estudantes e familiares.

Com o intuito de garantir uma amostra qualitativamente representativa da diversidade de sujeitos da escola investigada, para a seleção dos sujeitos da pesquisa, foram convidados por e-mail todos os docentes (64), técnicos administrativos (32) e representantes dos responsáveis pelos estudantes (9). Responderam ao convite 15 docentes, 4 técnicos administrativos e 3 responsáveis pelos estudantes.

Foram realizados 3 grupos focais, o primeiro deles com 6 docentes, o segundo com 5 docentes e o terceiro com 3 técnicos administrativos em educação, cada um deles com cerca de 90 minutos de duração. Em cada grupo focal, foi apresentado o questionário com os indicadores propostos pelos autores da pesquisa, sendo solicitado aos participantes do grupo focal que avaliassem como percebiam5 cada questão em relação a relevância, clareza e simplicidade do item; pertinência do item ao indicador (categoria); necessidade de troca do item de posição no questionário; necessidade de eliminação do item em decorrência de redundância, não relevância etc.; necessidade de inclusão de novos itens que não foram previstos inicialmente. Além disso, também foi solicitado aos sujeitos da pesquisa que avaliassem a pertinência de cada questão dos indicadores para cada grupo da comunidade escolar (servidores docentes ou técnicos, estudantes e familiares).

Não foi possível realizar o grupo focal com os responsáveis pelos estudantes, motivo pelo qual foi enviado a eles o questionário para ser comentado e, então, devolvido aos pesquisadores. Inicialmente, os responsáveis pelos estudantes entenderam que deveriam responder ao questionário apresentado, mas, após nova explicação dos pesquisadores, compreenderam seu papel como colaboradores da pesquisa.

Esses procedimentos de investigação foram importantes para a investigação, uma vez que promoveram o envolvimento de representantes de toda a comunidade escolar, a aproximação dos sujeitos da pesquisa no que diz respeito aos interesses de pesquisa (uma vez que é do interesse de todos a qualificação bem como a investigação do ERE), a reflexão e o diálogo sobre o ensino remoto emergencial. Os dados fundamentais produzidos foram as transcrições das discussões em grupo, os comentários dos representantes das famílias e as reflexões e anotações dos moderadores dos grupos focais.

Descrição do processo de validação do questionário

A validação semântica é uma etapa posterior à validação teórica, realizada por meio dos grupos focais, e busca verificar se os itens são compreensíveis para os respondentes, sujeitos da própria população à qual se deseja aplicar o instrumento no caso, e se abarcam tudo aquilo que é importante avaliar.

A etapa de validação teve por objetivo avaliar cada assertiva do questionário em relação a: relevância, clareza e simplicidade do item; pertinência do item ao indicador (categoria); necessidade de troca do item de posição; necessidade de eliminação do item em decorrência de redundância, não relevância etc.; necessidade de inclusão de itens que não foram previstos pelos pesquisadores.

Inicialmente foram criados, pelos pesquisadores, 58 itens a serem revistos, posteriormente, por meio do grupo focal. Essas 58 assertivas estavam distribuídas em quatro indicadores, a saber: acesso; organização do ensino remoto emergencial; qualidade e alcance de estratégias de ensino/estudo; habilidade técnica e interações no ensino remoto emergencial. Além disso, foram incluídas questões abertas, para permitir que os respondentes pudessem explorar questões, do seu ponto de vista, que não foram abordadas no questionário ou que tenham deixado margem para explicação.

Apresentamos a seguir, as principais considerações dos sujeitos da pesquisa sobre cada uma das categorias de indicadores, que significaram a alteração (reescrita, inclusão, exclusão, mudança de ordem ou de categoria) das questões originais do questionário construído inicialmente pelos pesquisadores.

Categoria de indicadores “Acesso”

Com relação à frequência de uso da internet, foi sugerido que, além do inicialmente proposto pelos pesquisadores, fosse incluído um item que mensurasse o tipo de dados utilizados pelo respondente. Segundo os sujeitos da pesquisa, seria importante qualificar o tipo de internet (wifi, pública, plano de dados, cabo etc.), assim como o local de uso (em casa, no trabalho, na escola ou em outro lugar).

Sobre os principais motivos de uso da internet antes do ERE, foi indicada a necessidade de inclusão de um item para qualificar tal uso, de elaboração de uma escala para o uso de forma que os respondentes determinem uma ordem de importância e a relevância de haver as alternativas de respostas diferenciadas de acordo com o público respondente (docentes; TAE; familiares e estudantes).

No que se refere ao equipamento utilizado, de forma predominante, para acessar a internet antes do ERE, sugeriu-se apenas o uso de imagens, no questionário, uma vez que algumas pessoas poderiam não identificar ou diferenciar termos como desktop, notebook, computador, smartphone, celular etc.

Na questão sobre utilização do Moodle antes do ERE, foi indicada a inclusão de um item para qualificar o uso das ferramentas disponíveis, as situações e os contextos de uso e as possibilidades de customização da plataforma.

Sobre o domínio do uso de computador/notebook e do smartphone, foi proposta a indicação de três níveis, isto é, básico, intermediário e avançado, com distinções desde ligar/desligar, escolher navegador e enviar e-mail, até usar redes sociais, editar textos, apresentações e vídeos etc.

Em relação à posse de equipamentos necessários ao ERE, foi apontada a necessidade de reformulação do enunciado, explicando ou detalhando o que se entende por infraestrutura (internet, computador, smartphone etc.)

Quanto à participação da escola na resolução de dificuldades técnicas relacionadas ao uso do Moodle, propôs-se a troca da palavra apoio por suporte.

Além dessas alterações, foi sugerida pelos sujeitos da pesquisa a inclusão dos seguintes itens na categoria acesso:

  • Antes do ERE, qual era o principal local para acessar a internet?

  • Numere os principais aplicativos do uso da internet por você antes do ERE. O primeiro deve ser o principal motivo e assim por diante.

  • Em caso positivo, em quais situações o Moodle foi utilizado por você antes?

  • Em caso positivo, quais ferramentas do Moodle você conhecia?

Além disso, os sujeitos da pesquisa indicaram a necessidade de exclusão de dois itens, em função da possibilidade de diferentes interpretações do significado da questão e do risco de indução de uma resposta socialmente desejável, o que invalidaria as respostas:

  • Na sua percepção, o Centro Pedagógico estava preparado para ofertar o ERE do ponto de vista de infraestrutura tecnológica?

  • As ações iniciais da escola favoreceram a implantação do ERE?

Categoria de indicadores “Organização do ensino remoto emergencial”

O título da categoria de indicadores “Qualidade e alcance da estratégia de ensino”, foi reformulado para “Organização do ensino remoto emergencial”, em função de consideração de alguns participantes da pesquisa de que qualidade e alcance são construtos que não seriam alvo da avaliação no instrumento avaliativo, uma vez que estão mais relacionados à aprendizagem e aos resultados do ERE.

Os sujeitos da pesquisa sugeriram que a questão sobre a avaliação da organização do ensino remoto em aulas síncronas e assíncronas tivesse seu enunciado alterado, para explicitar que se desejava compreender a avaliação dos respondentes quanto à organização do ERE em dois distintos momentos: síncronos e assíncronos.

Em relação à realização das atividades assíncronas pelos estudantes dentro do prazo estipulado pelos professores, foi proposta a substituição da palavra ‘adequado’ por uma escala com a sua qualificação e o acréscimo de novo item, qualificando os tempos síncronos e assíncronos.

Na questão sobre as dificuldades técnicas de realização das atividades assíncronas no Moodle, indicou-se o detalhamento das possibilidades de dificuldade, ou seja, postar foto, baixar PDF, postar vídeo, postar áudio, transformar vídeo em link etc., assim como a inclusão das respostas “nenhuma dificuldade” e “outras”, para que dificuldades não imaginadas pelos pesquisadores pudessem ser apresentadas pelas famílias.

Na pergunta sobre a contribuição da escola para a superação dessas dificuldades, além das opções sim e não, sugeriu-se a inclusão de “às vezes” e da possibilidade de justificar a escolha.

Quanto às perguntas relacionadas às dificuldades de postagem, recebimento, correção (para docentes), navegação no Moodle, realização e postagem de atividades, além das dificuldades nas aulas síncronas (para estudantes), indicou-se a necessidade de modificar a formulação, que questionava quais eram essas dificuldades, para perguntar se havia (sim ou não) dificuldades, havendo a qualificação (sempre, quase sempre, às vezes, quase nunca, nunca) em caso de resposta afirmativa.

Na categoria “Organização do ensino remoto emergencial”, os sujeitos da pesquisa sugeriram adicionar os seguintes itens, relacionados à quantidade e duração das atividades síncronas:

  • Em sua percepção, a quantidade de aulas síncronas semanais foi adequada às necessidades de aprendizagem dos/as estudantes?

  • Em sua percepção, a duração das aulas síncronas foi adequada às necessidades de aprendizagem dos/as estudantes?

Por outro lado, foi proposta a exclusão de duas questões dessa categoria de indicadores, cujos conteúdos já estavam contemplados, de forma mais qualificada, em outras questões:

  • A organização do ERE (horários, aulas síncronas e assíncronas) contribuiu para que o/a estudante acessasse as atividades de forma autônoma?

  • A organização do ERE favoreceu a navegação na plataforma Moodle?

Categoria de indicadores “Habilidade técnica”

Para todas as questões relacionadas às habilidades técnicas e aos conhecimentos desenvolvidos (sobre tecnologia, internet, navegação em AVA etc.), à repercussão das ações formativas e do apoio da escola para o desenvolvimento de tais habilidades, e à adequação das do ERE às habilidades dos estudantes, foi apontada a importância da criação uma escala dessas habilidades, para os respondentes marcarem com mais detalhes o que foi desenvolvido no ERE.

Categoria de indicadores “Interações no ERE”

Nessa categoria, a sugestão de alteração se concentrou no detalhamento das possibilidades de interação (chat do Moodle, WhatsApp, redes sociais, chat da aula síncrona, por meio do Setor Multiprofissional da escola, por meio do Conselho Comunitário etc.). Também foi sugerido a inclusão de cada um dos setores da escola (e não apenas a opção “escola” como um todo uniforme) como possibilidades de interação entre escola e famílias (Multiprofissional, Setor de Apoio Educacional, Direção, Coordenação Pedagógica, Setor de Informática, Comissão de ERE, Biblioteca etc.).

Questões abertas

No questionário originalmente proposto pelos pesquisadores, havia apenas duas questões abertas, a saber:

  • Para você, quais foram os maiores limites e vantagens de implantação do ERE pelo Centro Pedagógico?

  • O que você sugeriria para a melhoria do ERE do Centro Pedagógico?

A partir das considerações dos sujeitos da pesquisa, a primeira questão aberta sofreu um desmembramento de forma a possibilitar obter, separadamente, os limites/desafios das vantagens do ERE.

A segunda questão foi reescrita, substituindo-se a palavra “melhoria” por “aprimoramento”, e foram incluídas as três questões apresentadas a seguir, com o intuito de permitir aos respondentes que apresentassem eventuais pontos de vista sobre o ERE não incluídos nas possibilidades de resposta às questões fechadas das quatro categorias de indicadores.

  • Quais experiências vividas durante o Ensino Remoto Emergencial do Centro Pedagógico podem ser apropriadas pela escola quando voltarmos para o ensino presencial?

  • Quais recursos e/ou ferramentas do ERE do Centro Pedagógico você continuaria a fazer uso com os estudantes quando voltarmos ao ensino presencial?

  • Na sua percepção, o Centro Pedagógico estava preparado para ofertar o ERE do ponto de vista de tecnologias digitais (Moodle, Website, Facebook, WhatsApp etc.)? Justifique sua resposta.

O instrumento final de avaliação do ERE

No total, ao final da pesquisa, oito itens foram excluídos por não estarem suficientemente compreensíveis, por induzirem a respostas socialmente aceitáveis ou por estarem inespecíficos e não fornecerem elementos para a análise.

Quatorze itens sofreram alterações na escrita, na primeira revisão do grupo focal, principalmente, com a finalidade de melhorar as possibilidades de resposta ou a compreensão do próprio item.

Nove itens foram adicionados, pois os participantes dos grupos focais sugeriram questões que o instrumento inicial não continha.

Após análise, quatro itens mudaram de categoria de indicadores, principalmente pela mudança da categoria de indicadores “Qualidade e alcance da estratégia de ensino” para “Organização do ensino remoto emergencial”.

Na elaboração da versão final, 17 itens foram fundidos com outros por serem compreendidos como subitens, pois se relacionavam ou dependiam da resposta em um outro item.

Após a realização de todas as alterações apontadas pelos três grupos focais, pelas respostas escritas dos familiares dos estudantes e pelo retorno dos sujeitos de pesquisa validando as alterações efetuadas pelos pesquisadores, o instrumento de avaliação do ERE com as quatro categorias de indicadores e as seis questões abertas encontra-se disponível em: https://drive.google.com/file/d/11wQoKSzneBVdU7mK9Fu-TYpsOwMhvK4R/view?usp=sharing (acesso em 29 de ago. 2021).

Considerações finais

A criação de instrumentos para avaliação do ERE é um importante movimento na construção de um corpo de reflexões e conhecimentos acadêmicos que alimentem a investigação de potencialidades, desafios e limites do ensino em tempos de crise, quando não é possível frequentar a escola. É possível que, por eventos adversos, seja necessário lançar mão do ensino remoto emergencial outras vezes. Nessas situações, o aprimoramento do ERE pode se valer de avaliações de usos anteriores do ERE, uma vez que, nesse primeiro momento, não havia, para as escolas de educação básica, instrumentos, literatura acadêmica, recursos ou infraestrutura pré-planejados, o que caracterizou o aspecto emergencial do ensino após o fechamento das escolas (WHITTLE et al., 2020)

Dentre as considerações dos diferentes sujeitos da pesquisa, destacam-se as diversas sugestões de adequação da linguagem do questionário, uma vez que há diferentes situações de vida e de formação na comunidade escolar que poderiam significar a dificuldade, em especial de algumas famílias, de compreender uma formulação de questões que utilizasse de linguagem do mundo acadêmico, como inicialmente foi o caso de algumas frases e expressões.

Outras alterações frequentemente sugeridas se referiam à alteração da ordem ou da colocação de questões em função da categoria de indicador a que deveria pertencer e à exclusão de questões que se aproximavam, de alguma forma, da avaliação da aprendizagem (uma vez que a proposta da pesquisa é de avaliação da oferta, do contexto, dos processos e das interações, e não dos resultados do ERE).

Por outro lado, compreendemos que além do produto (questionário; indicadores), o próprio processo de criação desse instrumento, especialmente em função da metodologia empregada, se constituiu num significativo momento de reflexão dos envolvidos nos grupos focais (docentes, estudantes, técnicos, famílias) sobre o ERE, sobre as diferentes responsabilidades de políticas públicas, escola e família nesse ensino, bem como sobre a possibilidade de alguns elementos da infraestrutura e da organização o ERE continuarem a ser utilizados quando do retorno às atividades escolares presenciais, como apoio para o ensino, a aprendizagem e a comunicação escola-famílias, aspecto destacado por alguns dos sujeitos da pesquisa.

Existem algumas limitações desse estudo e do instrumento desenvolvido. Devido às características peculiares da escola (infraestrutura, servidores docente e técnicos, estudantes e famílias) e da metodologia de pesquisa, o instrumento não pode ser generalizado para escolas de redes estaduais, municipais ou particulares, apesar de que é possível imaginar que várias questões do presente instrumento podem ser apropriadas para avaliação do ERE em outras escolas. O instrumento criado também não permite avaliar as aprendizagens efetivamente construídas pelos estudantes, assim como o grande número de questões é algo que pode desmotivar a realização do questionário pelos sujeitos da comunidade escolar. Outra possível limitação do instrumento é a ausência de questões especificamente pensadas para estudantes público-alvo da educação especial, embora aspectos relacionados a esse público possam ser apresentados pelos respondentes, especialmente nas questões abertas.

Apesar dos desafios apresentados pela criação do questionário e das categorias de indicadores, compreendemos que a abordagem qualitativa utilizada foi adequada para estabelecer indicadores específicos para a escola investigada, que permitem uma avaliação qualificada do ERE realizado. O questionário e os indicadores, ainda que não devam ser reproduzidos literalmente para outras comunidades escolares em outros contextos, podem, aliados à reflexão acadêmica aqui apresentada, servir de inspiração para a criação de indicadores de avaliação do ERE em outras escolas e redes de ensino.

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4No mês de abril de 2020, o Conselho Nacional de Educação (CNE) publicou o Parecer Nº 5/2020 autorizando o cômputo de atividades não presenciais para fins de cumprimento da carga horária mínima anual (BRASIL, 2020).

5A percepção é uma manifestação pessoal que revela a visão de mundo de uma pessoa, uma visão influenciada pelos múltiplos aspectos do contexto sociocultural dessa pessoa" (MCDONALD, 2012, p. 8). Compreendendo que a percepção é individual, processual e está em constante reconstrução, de acordo com o contexto histórico, cultural e social em que se está inserido, a participação de diferentes sujeitos da comunidade escolar foi considerada central para a construção de um instrumento de avaliação que incorporasse essa multiplicidade de olhares para com o ensino remoto emergencial.

Recebido: 01 de Setembro de 2021; Aceito: 01 de Maio de 2022

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