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Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências

Print version ISSN 1415-2150On-line version ISSN 1983-2117

Ens. Pesqui. Educ. Ciênc. vol.22  Belo Horizonte  2020  Epub Jan 12, 2502

https://doi.org/10.1590/21172020210140 

Artigos

EXCELÊNCIA, EVASÃO E EXPERIÊNCIAS DE INTEGRAÇÃO DOS ESTUDANTES DE GRADUAÇÃO EM FÍSICA

EXCELENCIA, DESERCIÓN Y EXPERIENCIAS DE INTEGRACIÓN DE ESTUDIANTES DE LA CARRERA DE FÍSICA

EXCELLENCE, DROPOUT AND PHYSICS’ UNDERGRADUATE STUDENTS’ INTEGRATION EXPERIENCES

PAULO IMA JUNIOR I  *
http://orcid.org/0000-0002-3382-8387

VANESSA CARVALHO DE ANDRADEI  **
http://orcid.org/0000-0002-5041-9462

JAILTON CORREIA FRAGA JUNIOR I  ***
http://orcid.org/0000-0003-2439-7949

JÚLIA AMARAL E SILVAI  ****
http://orcid.org/0000-0003-3129-4868

FELIPE MARTINS GOULARTI  *****
http://orcid.org/0000-0003-0513-1125

ISRAEL MARINHO ARAÚJOI  ******
http://orcid.org/0000-0003-1678-7461

IUniversidade de Brasília, Instituto de Física, Campus Universitário Darcy Ribeiro, Brasília, DF - Brasil.


RESUMO:

Em que medida a evasão e as experiências discentes nos cursos de graduação em Física estão relacionadas à pressão por excelência acadêmica? Baseados em leituras da sociologia da educação, realizamos uma análise de dados coletados no curso de Física de uma universidade brasileira. As evidências indicam que estudantes de famílias privilegiadas tendem a abandonar o curso, mas os que permanecem costumam ser bem-sucedidos. Ao mesmo tempo, a evasão não se relaciona com o desempenho acadêmico: há estudantes excelentes que desejam sair, bem como estudantes de baixo desempenho que desejam permanecer. A austeridade da organização curricular contribui para que os estudantes tenham lacunas em sua formação. Com algumas exceções, os professores são descritos como figuras opressoras, exigentes e sem empatia. Por outro lado, relações competitivas são percebidas entre os próprios estudantes. Enfim, ainda que a evasão não tenha relação com o desempenho acadêmico, a busca por excelência estrutura as experiências dos estudantes no curso.

Palavras-chave: Evasão; Excelência; Ensino Superior; Graduação em Física

RESUMEN.

¿En qué medida la deserción y las experiencias de los estudiantes de la carrera de Física están relacionadas con la presión por excelencia académica? Basados en lecturas de la sociología de la educación, realizamos un análisis de los datos recogidos en la carrera de Física de una universidad brasileña. Las evidencias apuntan que los estudiantes procedentes de familias privilegiadas se inclinan a dejar la carrera, pero los que permanecen suelen ser exitosos. A la vez, la deserción no se relaciona con el rendimiento académico: hay estudiantes excelentes que desean dejar la carrera, bien como hay estudiantes de bajo rendimiento que desean permanecer. La austeridad de la organización curricular contribuye a que los estudiantes tengan lagunas en su formación. Con algunas excepciones, los profesores son descriptos como figuras opresoras, exigentes y sin empatía. Por otro lado, se perciben relaciones competitivas entre los propios estudiantes. Por fin, aunque la deserción no tenga relación con el rendimiento académico, la búsqueda por excelencia diseña las experiencias de los estudiantes en carrera.

Palabras clave: Deserción; Excelencia; Educación Superior; Carrera de Física

ABSTRACT:

To what extent are dropout and students’ experiences in undergraduate Physics courses related to pressure for academic excellence? Drawing on sociology of education, we performed an analysis of data collected from the Physics course at a Brazilian public university. Evidence indicates that students from privileged families tend to drop out, but those who remain tend to be successful. At the same time, dropout is not related to academic performance: there are excellent students who want to leave, as well as underperforming students who want to stay. Curricular austerity contributes to students having gaps in their education. With few exceptions, teachers are described as oppressive, demanding, and merciless figures. On the other hand, competitive relationships are perceived among the students themselves. Finally, even though dropout is not related to academic performance, the urge for excellence structures students’ experiences in the course.

Keywords: Dropout; Excellence; Higher Education; Undergraduate Physics

INTRODUÇÃO

Apesar da literatura disponível sobre a evasão nos cursos de graduação (GILIOLI, 2016), continua sendo muito difícil determinar as razões que levam os alunos a abandonar sua trajetória acadêmica. Há indícios de que as taxas de evasão estão aumentando na maioria das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) (LIMA JUNIOR et al., 2019), mas a que podemos atribuir esse aumento? Em que medida a evasão pode ser efetivamente interpretada como autoeliminação dos estudantes mais vulneráveis? O aumento da evasão não poderia ser interpretado também como uma consequência da expansão e diversificação da educação superior? Tal diversificação não corresponderia a um aumento das possibilidades de realizar um percurso formativo mais bem ajustado às próprias aspirações? Em que medida as aspirações dos estudantes não são atualizadas pelas dificuldades vividas no curso? Até que ponto a escolha por abandonar o curso é realmente livre e independente daquilo que se vivencia nele?

Considerando todas essas perguntas, percebemos logo a dificuldade (ou impossibilidade) de separar, em uma cadeia causal simples, o tecido dos eventos que culmina com a decisão de abandonar o curso. Entre indivíduos e instituições, não fica claro quem são os responsáveis pela evasão. Por isso, as razões produtoras da interrupção dos percursos acadêmicos só podem ser abordadas sob um tipo de racionalidade reflexiva.

Seria mesmo improdutivo desligar o tema da evasão de toda a complexidade em que ele está envolvido. Não é raro que as representações estudantis interpretem as altas taxas de evasão como resultado de violências e negligências praticadas pela instituição de ensino ao mesmo tempo em que, a despeito das pesquisas atuais (WAINER; MELGUIZO, 2017), é usual encontrar professores que imputam a desistência dos estudantes ao fracasso discente e à abertura da universidade às minorias sociais. Na medida em que é interpretada como eliminação (legítima ou não) dos estudantes, é comum que o tema da evasão levante consigo a questão do sucesso e da excelência acadêmica dos alunos.

O curso de Física, ao lado de poucos, costuma ser considerado um dos mais difíceis de se concluir. Pertencem tradicionalmente aos cursos de Física as taxas de evasão mais elevadas da educação superior (SILVA FILHO et al., 2007). Qualquer analista atento deve ser capaz de perceber que a dificuldade imputada ao curso, mais que uma declaração de fatos irrevogáveis, não deixa de ser uma construção discursiva cuja função ideológica precisa ser especificada. Afinal, qualquer curso pode ser extremamente difícil, mas parece que a declaração reiterada de dificuldade funciona como um certificado de distinção, orientando as práticas e experiências profissionais dos Institutos de Física de forma singular. Em reflexão livre, podemos perceber que o cultivo da dificuldade cumpre uma função de enobrecimento da Física. Os jovens podem sair da educação básica sem saber nada dessa disciplina, mas saberão que “Física é para poucos”. Nesta investigação, desejando acrescentar ao conhecimento disponível sobre as razões que levam os estudantes de Física a abandonar seus cursos, lançamos a seguinte questão de pesquisa: Em que medida a evasão e as experiências discentes nos cursos de graduação em Física estão relacionadas à pressão por excelência acadêmica?

Essa pergunta é respondida neste artigo a partir de dados coletados entre estudantes regularmente matriculados no curso de graduação em Física (licenciatura e bacharelado) da Universidade de Brasília (UnB). O referencial adotado articula reflexões críticas sobre a racionalidade neoliberal (DARDOT; LAVAL, 2016), sobre a avaliação escolar (PERRENOUD, 1999) e conceitos da sociologia da educação de Bourdieu (2007b). Porém, a referência mais instrumental para a construção do nosso caminho analítico é a teoria da evasão de Vincent Tinto (1987, 2012), já empregada em pesquisas sobre a evasão de cursos de graduação em Física e Química (KUSSUDA, 2017; LIMA JUNIOR; OSTERMANN; REZENDE, 2018; MASSI; VILLANI, 2015). Para isso, foi elaborado e validado um instrumento capaz de quantificar as variáveis que constituem o modelo de Tinto. Antes e depois da análise estatística dos dados coletados, foram realizadas discussões que, envolvendo professores e estudantes de graduação, buscaram delimitar os sentidos que podem ser atribuídos às inferências estatísticas realizadas. Ao final das discussões, optou-se por coletar depoimentos de outros estudantes. Tais depoimentos foram transcritos e submetidos a uma análise categorial temática (BARDIN, 2011). Esperamos que os resultados obtidos permitam expandir nosso entendimento sobre a evasão nos cursos de graduação em Física.

ELEMENTOS PARA UMA TEORIA CRÍTICA DA EXCELÊNCIA

O compromisso fundamental que orienta o referencial teórico deste artigo é a necessidade de articular diferentes escalas de análise (COSTA; LOPES, 2008). Por um lado, a evasão é um fenômeno situado na escala individual e institucional: ela atinge cada estudante de forma singular em função de experiências vividas na instituição de ensino. Porém, dado que a interrupção do curso assume padrões semelhantes em vários contextos da educação superior, não podemos deixar de reconhecer que estamos diante de um fenômeno de escala estrutural, ou seja, que diz respeito a processos e relações que transcendem indivíduos e instituições (tais como relações de classe, políticas públicas e a organização dos sistemas de ensino). Abordar as razões da evasão requer, portanto, desenvolver uma forma de pensamento que articule o indivíduo à estrutura. Reconhecemos, com isso, que a estrutura social não somente limita, mas possibilita a ação individual sem jamais determiná-la de forma rígida (BOURDIEU, 1990).

De fato, seria difícil discordar que transformações estruturais do sistema educacional (tais como novas políticas curriculares e o aumento sistêmico da pressão por excelência) participem, indiretamente, das experiências individuais de ensino e aprendizagem. Novas políticas educacionais podem expandir ou restringir oportunidades de aprendizagem. Por outro lado, nenhuma transformação estrutural da educação superior é capaz de impactar imediatamente as experiências dos estudantes de graduação. A pressão por excelência, geralmente imputada aos órgãos reguladores e de fomento, não se transmite diretamente a professores e estudantes.

Imperativos de excelência

Inicialmente, chamamos imperativos de excelência todos os atos que interpelam os estudantes a competirem por um padrão de desempenho idealizado. Por exemplo, quando um professor pergunta “como é possível vocês ainda não terem aprendido isso?!”, ainda que não se dê conta, ele está participando do processo de imposição da excelência como um valor fundamental a ser perseguido. Afirmações do tipo “seu desempenho ficou abaixo da média” nunca são meramente descritivas, mas criativas, provocadoras; elas contribuem para estabelecer metas idealizadas que devem ser perseguidas de forma imperativa. Dizer “você não conseguiu desenvolver as habilidades esperadas” não pode ser uma mera constatação, pois as habilidades esperadas estão sempre se reafirmando por meio dessas declarações avaliativas. Portanto, podemos considerar que essas avaliações representam enunciados performativos no sentido de Austin (1990): são criativas, produtivas ou destrutivas, mas jamais redutíveis a simples constatações. Por seu caráter interpelador, chamamos essas declarações avaliativas imperativos de excelência.

Geralmente, atos de fala como esses dizem respeito à exigibilidade de algumas capacidades após um tempo definido de trabalho pedagógico, segundo os critérios arbitrários da tradição escolar (PERRENOUD, 1999). Por exemplo, alguns cursos exigem que seus alunos compreendam o sentido da derivada e da integral nas primeiras semanas de aula (NUSSENZVEIG, 2013). Como os cursos de Física costumam adotar livros e sequências de ensino estruturalmente semelhantes, naturaliza-se a exigência de que os alunos aprendam mecânica e derivada no primeiro semestre, séries de Taylor e física térmica no segundo, integrais múltiplas e eletromagnetismo no terceiro. Quanto mais esse for o único percurso formativo que conhecemos, mais vamos perdendo a capacidade de perceber o quanto essas metas de aprendizagem são idealizadas. De fato, elas estabelecem, desde um lugar arbitrário (i.e., injustificável a partir de princípios universais), os alunos que deveríamos ter, e não aqueles que efetivamente temos.

É razoável supor que o hábito de comparar seu próprio desempenho escolar a uma métrica ideal não esteja dado nas pessoas, mas precisa ser incutido nelas por meio de um trabalho pedagógico duradouro. Assim, os imperativos de excelência realizados pelo professor não são somente descritivos, tampouco são uma tomada de posição diante do desempenho dos estudantes. Tais atos não são meras expressões de insatisfação, mas (re)criam o hábito da excelência na medida em que desafiam os alunos a concorrer com os colegas por metas idealizadas.

É verdade que esses imperativos de excelência, realizados individualmente por estudantes e professores, não deixam de refratar uma lógica de excelência perceptível na estrutura do sistema de ensino - e que eventualmente é evocada para justificar os procedimentos locais de avaliação. Entender como os imperativos da excelência se transmitem da estrutura para os indivíduos é, contudo, uma tarefa não-trivial. Alguns agentes institucionais poderão perceber que uma conduta mais austera com os alunos é tão mais legítima e desejável quanto mais o Ministério da Educação for rigoroso em suas classificações. Nesse contexto, alguns professores dirão que “se formos menos rigorosos do que somos, nossa própria nota poderá ser rebaixada”, como se suas ações e avaliações fossem resultado de coerção direta. Porém, as razões pelas quais os imperativos de excelência nos cercam por todos os lados são muito mais sutis e não estão jamais restritas às regulações explicitamente realizadas pelo Estado.

Tendo tudo isso em mente, apresentamos nossa reflexão em dois níveis. O primeiro trata da avaliação do sistema de educação superior (do qual a pós-graduação é considerada aqui uma parte integrante), sua origem e transformações estruturais. Em seguida, refletimos sobre as maneiras como os imperativos de excelência, localizados na estrutura do sistema educacional, podem se transpor para a experiência dos estudantes no curso de Física, com especial atenção ao risco de evasão.

Avaliação de instituições e de docentes no contexto da excelência

Em 1993, para gerir a heterogeneidade do sistema em expansão, o Brasil iniciou a avaliação sistêmica da qualidade nas instituições de educação superior. A despeito da dificuldade de se definir qualidade educacional (noção sempre polêmica e arbitrária), parâmetros de qualidade foram criados de forma pragmática (LAMARRA, 2012). Naquela década, surgiram os primeiros mecanismos de avaliação que, por meio de muitas transformações, chegariam ao sistema de avaliação vigente (TEIXEIRA JUNIOR; RIOS, 2017). Se as implicações desses processos avaliativos não estavam tão evidentes para o grande público, hoje em dia está cada vez mais claro como diversas instituições de ensino se orientam agressivamente por essas avaliações - sejam as instituições privadas de menor porte, que convivem com o risco de fechamento de seus cursos de graduação; sejam as instituições mais consagradas, que disputam liderança em pesquisa e pós-graduação.

É possível situar as políticas de avaliação iniciadas nos países da América Latina durante a década de 1990 no contexto da racionalidade neoliberal, marcada não somente pela privatização de empresas públicas, mas pela transposição da lógica competitiva e empresarial para outras esferas da vida (DARDOT; LAVAL, 2016). Assim, a reforma neoliberal da ciência e da educação consistiria em substituir progressivamente os mecanismos internos de concorrência e autorregulação desses campos (BOURDIEU, 2004) por mecanismos geridos diretamente pelo Estado. É nesse sentido mais sutil, de ordenar e regular externamente a luta cultural (e não somente por meio da precarização e privatização stricto sensu das instituições de pesquisa e ensino), que a política neoliberal tem induzido mudanças sociais (DARDOT; LAVAL, 2016).

Enquanto campos da atividade humana, a ciência e o sistema de educação superior são espaços de luta e disputa, caracterizados por suas próprias relações de concorrência (BOURDIEU, 1984). A despeito de qualquer sistema de avaliação instituído pelo Estado, tudo o que se produz nesses espaços já vinha sendo avaliado internamente. A percepção pública (sempre aproximada) de que algumas instituições de ensino são superiores às outras é muito anterior aos rankings nacionais e internacionais. Afinal, as avaliações da qualidade não criaram as lutas do campo acadêmico, mas as reenquadraram.

Quanto mais ativamente o Estado intervém na autorregulação do campo acadêmico, mais esse campo perde sua autonomia relativa (i.e., sua capacidade de estabelecer, por meio de regras próprias, quais produções e produtores devem ser consagrados). Por exemplo, desde a década de 1990, professores universitários de diversas áreas têm sido interpelados a publicar artigos em periódicos de impacto. Antes dessa exigência, a avaliação da produção científica demandava uma análise atenta das obras propriamente ditas - e essa análise só poderia ser feita por outro especialista qualificado. Com a instituição das métricas de produtividade, a análise do especialista continua sendo feita, ainda que de forma anônima e difusa, na revisão pelos pares. A partir do número de citações, tenta-se inferir o prestígio da obra e do periódico diante da comunidade científica. O resultado dessas manifestações de reconhecimento é finalmente condensado em índices de produção que, em princípio, permitem a comparação de quaisquer pesquisadores por qualquer pessoa. Não é preciso ser cientista para chegar à conclusão de que Maria, física teórica, tem produção científica inferior a Joana, bióloga molecular. De fato, a universalidade da comparação é condição necessária para universalizar a concorrência.

Antes da instituição das métricas da ciência, um físico teórico só poderia ter sua competência comparada a de outro que pesquisasse um tema semelhante. Agora, todos podem ser comparados entre si (físicos teóricos, experimentais, astrônomos, sociólogos, antropólogos), pois a avaliação da qualidade da produção científica de cada um, feita de forma difusa e anônima, é sintetizada em alguns indicadores “universais” (artigos publicados, citações, índice H). Ano após ano, o limiar da excelência acadêmica se desloca de tal maneira que todos são constantemente desafiados a expandir sua capacidade produtiva. De fato, os imperativos de excelência das políticas da avaliação científica não se transmitem tanto por punições, mas por meio da regulação pelo Estado de um sistema de recompensas simbólicas que já estava operando no campo acadêmico muito antes da década de 1990, passando a funcionar segundo a ordem técnico-gerencial do capital econômico (cf., ROCHA; ROCHA, 2004).

É evidente que a pesquisa não é (ou não deveria ser) a principal atividade das instituições de educação superior. De fato, o SINAES (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior), criado em 2004 para avaliar os cursos de graduação do Brasil e suas respectivas instituições de ensino, não está tão baseado nos indicadores de produção intelectual que citamos aqui. No entanto, mesmo considerando as particularidades estruturais e históricas do SINAES (TEIXEIRA JUNIOR; RIOS, 2017), ele também pode ser interpretado atualmente como um indutor de relações de concorrência. Por exemplo, um curso de Física que receba nota 4 passa a ser considerado pior que um curso de Direito com nota 5 (ainda que, para gerar essas notas, cursos de áreas diferentes jamais tenham sido comparados entre si). Além disso, nos casos das instituições de excelência, saber como os professores são interpelados (à produção intelectual) poderá nos ajudar a perceber as razões que orientam esses professores na relação com seus alunos.

Excelência e avaliação dos estudantes

Segundo Perrenoud (1999), os estudantes são considerados exitosos ou fracassados porque são classificados nos processos de avaliação. Assim, a noção contemporânea de sucesso e fracasso aparece novamente fundamentada na universalização da comparação e da concorrência. A rigor, a formulação superlativa típica (“este aluno é excelente”) dissimula o fato de que todo juízo de excelência resulta da comparação que se faz entre cada estudante e uma norma ideal. Essa norma especifica o que cada estudante deve ter aprendido ao final de cada período formativo, sendo regulada pela tradição e pelas possibilidades de sucesso dos estudantes. No que diz respeito à tradição, cada curso (Física, Química ou Biologia) tem suas disciplinas fundamentais e suas formas típicas de organização curricular. É por tradição que se estabelecem algumas expectativas tácitas como ponto de partida para o desenho curricular (por exemplo, que se aprenda limite, derivada, integral e mecânica no primeiro semestre; séries de Taylor e física térmica no segundo semestre; integrais triplas e eletrodinâmica no terceiro). Em alguns casos, as expectativas tradicionais podem ser relaxadas em favor de um desenho simplificado, ajustando-se aos estudantes presumivelmente menos capazes. Esses ajustes dos ideais de excelência aos contextos periféricos podem criar a sensação (ilusória) de que a única saída para um curso manter seu prestígio é impor-se aos alunos. São raros os cursos que efetivamente reinventam seus percursos formativos para além da antinomia “exigente e prestigiado” versus “fácil e periférico” e mesmo os cursos mais criativos podem ser pressionados a retornar aos modelos tradicionais (cf., XAVIER; STEIL, 2018).

De qualquer maneira, o fracasso e o sucesso são sempre relativos, dependendo de normas, programas e exigências que jamais se justificam completamente. Porém, o caráter arbitrário das avaliações de excelência precisa ser dissimulado para que o (in)sucesso dos estudantes seja naturalizado, separando invariavelmente aqueles que têm êxito dos que não o têm. De fato, o resultado de uma prova tradicional nunca é simples reflexo das desigualdades de conhecimentos e competências, mas as dramatiza, amplia e desvia, colocando os critérios de excelência a serviço das relações de força que os produziram (PERRENOUD, 1999).

Também podemos perceber que as avaliações típicas são freios às inovações e obstáculos aos próprios objetivos pedagógicos declarados pelas instituições, favorecendo uma relação utilitarista com o saber. O estudante é encorajado a trabalhar pela nota. Os professores, absorvidos pela necessidade de tornar as avaliações cada vez mais “objetivas”, tendem a adotar práticas de ensino conservadoras. O trabalho de professores e alunos tende a se limitar a problemas isolados e cifráveis. Afinal, os problemas complexos e da vida real dificilmente serão incorporados às avaliações de larga escala. A universalização da comparação tende a induzir a concorrência e o individualismo em vez de proporcionar integração e cooperação (PERRENOUD, 1999). Por parecerem precisas e confiáveis, as avaliações tradicionais dissimulam o arbitrário da tradição curricular que as fundamenta.

Em síntese, o imperativo da excelência é, também, o da concorrência: não basta saber, é preciso distinguir-se. Nesse sentido, as avaliações unificadas, cada vez mais populares nas disciplinas de Física (MELLO, 2015), são exemplares do estímulo à competitividade e ao individualismo pela universalização das comparações: a partir do momento em que todos os indivíduos são postos na mesma escala, é perfeitamente legítimo compará-los e ordená-los segundo os critérios “objetivos” da prova.

Participar da vida em uma instituição de ensino como estudante implica estar engajado nas classificações culturais operadas por ela - seja, explicitamente, nos exames de aprendizagem ou, mais subjetivamente, no juízo professoral independente (BOURDIEU, 2007b). De qualquer maneira, o reconhecimento escolar tem sempre um valor relativo: o apreço do professor e a certificação só são capazes de garantir vantagens objetivas enquanto possuírem alguma raridade. Assim, é usual que os estudantes não sejam somente alvos dos imperativos de excelência, mas seus próprios autores. É esperado que alguns estudantes se acumulem em torno dos professores mais austeros e seletivos como forma de distinção. Também haverá aqueles que, justamente por estarem muito próximos ao desempenho acadêmico ideal, encontram-se em condição de afirmar sua distinção intelectual pela recusa da austeridade ao mesmo tempo em que se conformam a ela. Compreender as maneiras dos alunos participarem da inculcação da excelência nos ajudará a superar a ideia ingênua de que o corpo discente pode ser considerado um bloco coeso e vulnerável que se opõe ao bloco, também coeso, de docentes poderosos.

A análise atenta das experiências dos estudantes no curso também deve mostrar que, sendo a racionalidade neoliberal um fenômeno que nos atinge em diversos contextos da vida, não é somente pela interpelação dos professores que os nossos estudantes são convencidos a perseguir excelência. A excelência, enquanto disposição de distinção, requer um longo trabalho pedagógico (BOURDIEU; PASSERON, 2009) para ser inculcada e provavelmente não se limita às fronteiras espaciais e temporais da vida em um Instituto de Física.

METODOLOGIA

Esta pesquisa foi realizada em duas etapas. Inicialmente, foi aplicado um questionário em papel a 160 estudantes dos cursos de bacharelado e licenciatura em Física da UnB (cobrindo 37,2% dos estudantes matriculados no curso). A participação de homens e mulheres, estudantes do bacharelado e da licenciatura, calouros e veteranos entre os respondentes foi considerada proporcional à presença desses segmentos na população de estudantes. Em seguida, a necessidade de interpretar os dados a partir das experiências vividas pelos alunos motivou uma coleta de depoimentos de nove participantes em situações diferentes no curso. Tais depoimentos foram gravados, transcritos e submetidos à análise com o propósito de responder à questão de pesquisa.

VALIDAÇÃO DO QUESTIONÁRIO E MÉTODOS ESTATÍSTICOS

Tomando suas experiências como ponto de partida, um grupo de estudantes de graduação foi orientado a desenvolver o questionário a ser aplicado em papel. Como parte do processo de validação desse instrumento, ele foi submetido a especialistas da área e pré-aplicado a um grupo menor de respondentes (LIMA JUNIOR et al., 2020). Os resultados da pré-aplicação e as críticas recebidas foram cruciais para que o instrumento chegasse à sua forma final. Todo o processo de construção do instrumento, aplicação e interpretação dos resultados foi amplamente debatido com um grupo de professores e estudantes de graduação.

A primeira parte do questionário, composta de perguntas de múltipla escolha, pretendia localizar os respondentes no espaço das relações de classe (BOURDIEU, 2007a) e no espaço das experiências acadêmicas (reprovações, semestres cursados e participação em projetos). A segunda parte do questionário era composta de itens tipo Likert para avaliar os construtos do modelo de Tinto (1987, 2012), segundo o qual as experiências de integração social e acadêmica atualizam as motivações que os estudantes apresentam ao ingressar no curso, produzindo aspirações de futuro mais ou menos favoráveis à permanência no curso. Em outras palavras, os itens tipo Likert compõem as seguintes escalas:

  • Motivações de ingresso avaliam a congruência entre os interesses que levaram os estudantes a entrar no curso de Física e as experiências que esse curso pode proporcionar. Está dividida em motivação para a pesquisa, docência e desistência.

  • A escala de integração acadêmica avalia o grau de integração do estudante ao sistema acadêmico da instituição. Ela contém itens que designam a autopercepção de competência do estudante na área do curso (cf., EVANS, 2015).

  • A escala de integração social, por sua vez, avalia o grau de integração do estudante ao sistema social do curso. Ela indica identificação, proximidade e convivência dos estudantes com seus colegas.

  • A escala de aspirações de futuro estima o quanto as aspirações atualmente apresentadas pelos estudantes são favoráveis à sua permanência no curso.

Os dados foram tabulados e carregados na plataforma R (software livre que opera como ambiente para computação estatística e gráfica). Os itens da primeira parte do questionário (múltipla escolha) foram submetidos à Análise de Correspondência Ajustada (GREENACRE, 2007) com funções da biblioteca ca. Os itens da segunda parte do questionário (escalas tipo Likert) foram submetidos à análise fatorial exploratória e de consistência interna (CRAWLEY, 2005) com funções das bibliotecas stats e psych.

Entrevistas e análise do conteúdo

Após discussão das sínteses e inferências estatísticas, optou-se por expandir a análise com depoimentos de estudantes com o propósito de alcançar um entendimento mais profundo sobre suas experiências no curso. Ainda baseados no modelo de Tinto (1987, 2012), elaborou-se um roteiro para orientar entrevistas semiestruturadas que seriam conduzidas pelos próprios estudantes de graduação com seus colegas de curso. Para a entrevista, foram escolhidos participantes diferentes em termos de gênero, cor, forma de ingresso, curso e rendimento acadêmico. De forma voluntária, nove estudantes do Instituto de Física da UnB foram entrevistados.

O objetivo das entrevistas foi, por meio das opiniões dos alunos, averiguar o quanto os imperativos de excelência afetam sua vida acadêmica. Cada entrevista durou, em média, 20 minutos. Elas foram gravadas, transcritas e submetidas a uma análise categorial temática (BARDIN, 2011), por meio da qual temas recorrentes foram codificados, agrupados e interpretados. Para apresentação, os depoimentos foram agrupados em três grandes temas: (1) o currículo; (2) os professores e (3) os colegas.

ANÁLISE

Análise de Correspondência

Todas as informações da primeira parte do questionário (questões de múltipla escolha) foram submetidas a uma análise de correspondência ajustada (GREENACRE, 2007). O objetivo desta análise foi reconstruir o espaço das experiências acadêmicas, levando em consideração variáveis como reprovações, semestres cursados, participação em projetos e horas dedicadas ao curso. A ideia de fundo é que os estudantes se distinguem uns dos outros pelas experiências acadêmicas que viveram. A análise de correspondência dessas variáveis colocou de um lado os estudantes que são reprovados e de outro aqueles que são sempre aprovados; de um lado, os que participam dos programas institucionais e, de outro, os que participam pouco. Trata-se de uma ferramenta de análise que coloca as principais diferenças em destaque. As variáveis de origem social (escolaridade e ocupação dos pais, renda, moradia) foram tratadas como suplementares (i.e., variáveis que não determinam as dimensões da análise, mas podem se correlacionar com elas), ajudando a interpretar as experiências acadêmicas quando elas se mostram marcadas por diferenças de classe. O mapa gerado por essa análise encontra-se na Figura 1.

O mapa da Figura 1 é formado por duas dimensões que, juntas, explicam mais de 84% da inércia (medida de dispersão) dos dados. As informações em vermelho são categorias dos descritores acadêmicos dos estudantes e determinam a estrutura do mapa. As variáveis suplementares estão em verde e representam os descritores de origem social.

A dimensão horizontal da Figura 1 divide o mapa em dois lados (esquerdo e direito) e explica 71,9% da inércia total dos dados. Que sentido pode ser dado a essa dimensão? À esquerda acumulam-se os respondentes que não cursaram semestre algum (SmCur_(-Inf,0]) e, consequentemente, não foram reprovados em nenhuma disciplina (DscRep_(-Inf,0]), não trancaram disciplinas (DscTr_(-Inf,0]), não concluíram disciplina alguma (DscSem_(-Inf,0]) nem participaram de eventos científicos (pEvn_FALSE). À direita temos os respondentes que cursaram mais de quatro semestres (SmCur_(4,Inf]), foram reprovados mais de três vezes (DscRep_(3,Inf]) e têm cursado mais de quatro disciplinas por semestre (DscSem_(4,Inf]). Concluímos, portanto, que, à esquerda, estão os calouros e, à direita, os veteranos.

Fonte: autores.

Figura 1 Mapa Simétrico da Análise de Correspondência Múltipla Ajustada das experiências acadêmicas dos estudantes de graduação em Física da UnB 

Com menos destaque, encontramos à esquerda os filhos de pais e mães com ocupações que exigem educação superior (OcupM_Tipo4 e OcupP_Tipo3). Também estão desse lado do diagrama, os jovens que não trabalham (Trab_NAO) e leem mais que 10 livros por ano (>10). A presença maior, entre os calouros, de famílias com ocupações que exigem diploma de educação superior (professores, médicos, engenheiros, juízes, advogados, cientistas…) sugere que os filhos de pais altamente escolarizados tenham menor chance de se tornarem veteranos no curso de Física. A presença de leitores frequentes entre os calouros pode indicar que o curso de Física seleciona pessoas que leem menos livros ou mesmo que o curso transforma os hábitos de leitura dos seus alunos ao longo do tempo, contribuindo para que eles leiam menos. À direita, no espaço dos veteranos, estão pessoas com ocupação de meio expediente (Trab_Ate20h) e que têm alguma renda, mas não o suficiente para se sustentar (RndParc). É, de fato, usual encontrar veteranos de curso que realizam algum tipo de atividade remunerada.

A dimensão vertical da Figura 1 explica 12,2% da inércia total dos dados, dividindo o mapa em dois lados: superior e inferior. Podemos observar que, na parte superior, acumulam-se os estudantes que dedicam mais de 5 horas semanais aos programas acadêmicos oferecidos pela instituição (HProg_TRUE), com destaque para a participação no programa de iniciação científica (pPesq_TRUE), no qual só são admitidos estudantes com índice de desempenho acadêmico superior à média do Instituto. Também estão na parte superior do mapa os estudantes que têm cursado quatro ou mais disciplinas por semestre (DscSem_(4,Inf]). Na parte baixa do mapa, acumulam-se os estudantes que têm três ou mais reprovações em disciplinas obrigatórias do curso (DscRep_(3,Inf]), que estão há mais de quatro semestres no curso (SmCur_(4,Inf]), que ingressaram há mais de três anos ((-Inf,2015]) e que não participam dos programas acadêmicos (HProg_FALSE). Como é possível perceber, na parte superior do mapa acumulam-se os alunos mais bem-sucedidos enquanto, abaixo, encontramos os alunos menos bem-sucedidos. Em vista de tudo o que foi dito até aqui, podemos interpretar a dimensão vertical do mapa como grau de excelência. Ou seja, a posição dos estudantes com respeito à segunda dimensão do mapa (Figura 1) será interpretada como a capacidade competitiva de cada estudante no espaço do Instituto de Física.

Observando as variáveis suplementares, percebemos que, na parte superior do mapa, encontram-se as famílias cujas mães têm ocupações prestigiadas de formação superior (médicas, advogadas, engenheiras, juízas) (OcpM_Tipo4), sugerindo que os filhos dessas famílias, quando não desistem do curso (cf. dimensão horizontal) tendem a ser bem-sucedidos nele. Também estão na parte superior do mapa os estudantes que não trabalham (Trab_NAO), dedicando-se integralmente ao curso, e não têm renda própria (SRenda), provavelmente sustentados pelas suas famílias. Abaixo do mapa, acumulam-se os estudantes que trabalham em jornadas integrais (Trab_Aprox40h) e, com pais desempregados (OcupM_Dsmp, OcupP_Dsmp), têm renda própria suficiente para se sustentar (RndTot). Observe que os estudantes menos excelentes são também os que leem mais de 10 livros por ano (>10L) e vão mais de três vezes ao museu (>3M), reforçando a ideia de que leitura e visitas a museus, medidas típicas de capital cultural (BOURDIEU, 2007a), não identificam estudantes de alto desempenho em cursos como o de Física, para o qual um tipo específico de capital precisa ser considerado (ARCHER et al., 2015).

Enfim, a análise de correspondência permite chegar a duas conclusões importantes. Primeiramente, ela reafirma que a excelência acadêmica é uma questão de classe (BOURDIEU, 2007a). Por outro lado, mostra a necessidade de observar as particularidades do capital cultural da ciência - também chamado capital científico (ARCHER et al., 2015) - na medida em que marcadores de cultura geral (eg., leitura de livros e visitas a museus) não se correlacionam bem com o desempenho dos estudantes no curso de Física.

DE VOLTA AO MODELO DE TINTO

Os itens tipo Likert do questionário (ver apêndice) foram agrupados, por análise fatorial exploratória (STREINER, 2003) nos seguintes fatores: (1) motivação para a docência; (2) para a pesquisa; (3) para a desistência; (4) integração acadêmica; (5) integração social e (6) aspirações de futuro. Como resultado da análise fatorial, cada estudante ganhou uma posição/pontuação com respeito aos fatores do modelo de Tinto. Estudantes que ingressaram no curso altamente motivados à docência e à pesquisa têm valores altos nos primeiros fatores. Aqueles que já ingressaram motivados a desistir do curso têm pontuação elevada no terceiro fator. Estudantes mais integrados ao curso e ao convívio com os colegas têm pontuação elevada nos fatores de integração. Enfim, estudantes que aspiram concluir o curso e permanecer na carreira têm posição elevada no último fator. De acordo com o modelo de Tinto, é esperado que as experiências de integração atualizem as motivações, produzindo aspirações de futuro.

Passamos, agora, aos testes do modelo de Tinto com as dimensões da análise de correspondência (Figura 1) para investigar quais resultados tais testes poderiam produzir. Da análise de correspondência múltipla ajustada reportada na Figura 1, surgiram duas dimensões que, assim como os fatores da análise fatorial, funcionam como se fossem uma medida de posição relativa entre os participantes da pesquisa. Lembramos que a primeira dimensão (horizontal) distingue calouros e veteranos. Quanto mais o estudante tem perfil de veterano (várias disciplinas cursadas, algumas reprovações…) mais avançada será a posição do estudante com respeito à dimensão 1.

A segunda dimensão (vertical), mais importante para nossa análise, distingue os alunos segundo sua capacidade competitiva no espaço do Instituto de Física. Quanto maior for a aderência do estudante ao perfil de excelência do curso (dedicando mais de 5 horas por semana aos programas acadêmicos, participando em projetos de pesquisa que exigem elevado índice de rendimento, cursando quatro ou mais disciplinas por semestre sem acumular reprovações), maior será sua posição com respeito à segunda dimensão.

Enfim, para testar a relação entre o grau de excelência dos estudantes (segunda dimensão da análise de correspondência) e seu risco de evasão (descrito nas variáveis do modelo de Tinto), calculamos a correlação de Pearson para todas as escalas disponíveis. Talvez os resultados indiquem que a integração acadêmica e social evolui ao longo do curso. Seriam os veteranos mais ou menos integrados que os calouros? Os estudantes que têm aspirações favoráveis à permanência no curso são os mais bem-sucedidos no curso? Quais motivações e experiências de integração distinguem os estudantes com respeito à excelência?

O resultado dos testes de correlação de Pearson (CRAWLEY, 2005) entre as variáveis de modelo de Tinto e da análise de correspondência (Figura 1) podem ser visualizados na Tabela 1. Em destaque (*), encontram-se os valores estatisticamente significativos - i.e., os valores que representam correlações elevadas o suficiente para descartarmos a hipótese de que essas correlações sejam nulas na população de estudantes representada pela nossa amostra. Os valores que não chegam a ser estatisticamente significativos (sem destaque) devem ser ignorados ou interpretados como aproximadamente nulos.

Tabela 1 Correlações entre os fatores do modelo de Tinto e as dimensões da análise de correspondência. Em destaque (*), correlações estatisticamente significativas (p<0,05). 

Dimensão 1 (calouros e veteranos) Dimensão 2 (fracasso e excelência)
Motivação para a Pesquisa -0,001 0,271*
Motivação para a Desistência -0,069 -0,189*
Motivação para a Docência 0,002 -0,029
Integração Social 0,078 0,342*
Integração Acadêmica -0,006 0,242*
Aspirações 0,129 0,100

Fonte: autores.

Da Tabela 1 é possível inferir que:

  • Não há relação estatisticamente significativa das motivações, integrações e aspirações com a Dimensão 1 da análise de correspondência, i.e., a evidência disponível não permite afirmar que veteranos sejam mais motivados, integrados ou que tenham aspirações mais positivas (ou negativas) se comparados aos calouros.

  • Os estudantes mais bem-sucedidos ingressaram no curso mais motivados para fazer pesquisa (r = 0,271) e menos motivados a desistir (r = -0,189). Reciprocamente, é possível inferir que estudantes que ingressam mais motivados para pesquisa e menos motivados a desistir tendem a ser mais bem-sucedidos.

  • A motivação para docência não se relaciona com o grau de excelência dos estudantes. Ou seja, entre os que ingressam motivados a ensinar, há tanto estudantes que se tornarão malsucedidos quanto excelentes.

  • Os estudantes mais bem-sucedidos no curso tendem a apresentar maior grau de integração social (r = 0,342) e acadêmica (r = 0,242). Conforme esperado, os estudantes mais bem-sucedidos no curso são mais integrados academicamente. Em que pese a imagem pública de que a vida nos espaços de convívio social na universidade atrapalha os estudos, os alunos ditos excelentes são também os mais integrados socialmente.

Finalmente, observamos que a excelência (descrita em termos de sucesso nas disciplinas do curso e participação nos programas acadêmicos) não produz aspirações favoráveis à permanência. É usual ser bem-sucedido e querer mudar de curso, bem como é possível ser malsucedido desejando permanecer.

Após concluir que a excelência no curso de Física é uma questão de classe que mobiliza um tipo específico de capital (cf., Figura 1), percebemos que a excelência não está tão relacionada às aspirações de conclusão do curso, mas às experiências (de integração social e acadêmica) que os estudantes têm em sua instituição (cf. Tabela 1). Colocar essas experiências de integração no centro da pauta (mais que a própria evasão) produziu um reenquadramento importante do debate e conduziu os estudantes e professores envolvidos nesta pesquisa a olhar de forma mais crítica para o curso propriamente dito e para as relações interpessoais que se estabelecem nele. Os imperativos de excelência, que não nos tinham surgido inicialmente como principal objeto de pesquisa, estavam se mostrando cada vez mais estruturantes das experiências dos alunos no curso. Por essa razão, nossa análise não poderia ser concluída sem retornar aos relatos desses alunos.

O currículo na visão dos estudantes

O currículo (entendido, na voz dos alunos, como síntese dos dispositivos de regulação do curso) emergiu nas entrevistas como um tema recorrente revestido de um mal-estar que parece surgir da distância entre os estudantes reais e os estudantes idealizados segundo a lógica da excelência:

Eu acho que o currículo tá um pouco avançando demais… Correndo enquanto os alunos têm que correr atrás e rolar na ladeira para alcançar. Eu acho que a gente podia fazer uma coisa mais devagar e conseguir a mesma excelência que todos querem com uma base, uma base de Física e Matemática bem melhor no início do curso num nível que as pessoas consigam chegar sem se sentir horríveis… (Estudante 1).

É praticamente um consenso entre os entrevistados que o curso de Física da UnB seja capaz de formar profissionais competentes nas diversas áreas da Física. Porém, também parece consensual que os percursos formativos previstos no currículo são problemáticos e pouco eficientes. Para os entrevistados, a evasão é também um problema de desenho curricular. Todos, por exemplo, relatam dificuldades no início do curso (sua e dos colegas), atribuindo essas dificuldades ao fato de o currículo pressupor dos alunos pré-requisitos que não estão disponíveis. O resultado é uma reprovação em massa no primeiro semestre. Essa reprovação é tão regular que já costuma ser considerada “natural”, sem, contudo, deixar de apresentar efeitos desintegradores para os alunos:

Quando você começa ficando para trás, reprovando matéria, seus colegas vão saindo. Eles vão indo pra frente enquanto você fica pra trás. Já é um peso na sua consciência. Você começa a ter a pressão de estar reprovando e isso dificulta ter uma convivência saudável com outras pessoas. Dificulta você ter autoconfiança para conhecer pessoas novas em outros cursos ou continuar tendo amizade com outros colegas. […] Todos os amigos tão vivendo outro ritmo, outra matéria. Não tem mais encontro. Não tem mais conversa (Estudante 2).

Os entrevistados apontam que a reprovação nas disciplinas de primeiro semestre produz isolamento e constrangimento, prejudicando as experiências de integração social. As dificuldades de início do curso estariam relacionadas também à antecipação de conteúdos avançados. Os entrevistados argumentam que a antecipação de conteúdos, feita em nome dos imperativos de excelência, produz lacunas de aprendizado até mesmo nos estudantes que conseguem atender a todas as demandas:

Das pessoas que eu já vi se formarem e que foram para a pós-graduação, é usual falarem que chegam lá e têm que rever várias coisas que já sabiam da graduação. Dizem que é até cansativo e repetitivo ter que fazer tudo de novo. […] Também pode existir uma realidade de perda de conteúdos da própria graduação, porque as coisas são colocadas rapidamente para os alunos de modo a chegar logo na física avançada. Assim, vão deixando lacunas de conhecimento que, quando a pessoa já está na física avançada, não importa. […] O importante é a gente estar aqui na ponta (Estudante 3).

A retórica de excelência dos docentes

Analisando a questão desde a origem, os professores são os primeiros a inculcar a necessidade da excelência. É, portanto, na voz dos professores que os imperativos de excelência aparecem claramente relacionados a uma disposição à distinção:

Vários professores meus fizeram questão de ressaltar que eram professores difíceis e um bom aluno só se formaria em Física se conseguisse passar por professores como ele. Para ele, ser professor não se tratava, por exemplo, de direcionar o aluno a conseguir adquirir a quantidade de conhecimentos que ele precisa pra passar no curso (Estudante 4).

Falas como essa não deixam muita dúvida de que a imposição da excelência aos estudantes (junto com o rigorismo e a austeridade que acompanham essa imposição) cumpre também a função de distinguir os docentes. Em um só movimento discursivo, o professor desafia os estudantes e se coloca num lugar superior ao de seus pares. É até possível conjecturar que, enquanto operação de distinção, alguns imperativos de excelência tenham pouca relação com o aluno propriamente dito, estabelecendo uma relação entre professores. Não é sem razão que essas falas são geralmente percebidas como manifestações de arrogância e vaidade. Nesse sentido, os entrevistados reclamam da falta de empatia dos professores com os calouros, produzindo, em nome da excelência, situações que envolvem humilhação e discriminação:

Os professores se sentem em outro nível. Eles não têm nenhum grau de empatia com os estudantes, pelo menos os que eu tive até então. O que me traumatizou muito foi o choque muito grande de sair do ensino médio. Sei lá. Talvez os professores do meu ensino médio tenham sido mais receptivos (Estudante 5).

Sobre a evasão, os entrevistados acreditam em duas coisas: (1) que a maioria dos alunos que evadiram o fizeram logo no começo do curso e (2) que os evadidos não aguentaram a pressão gerada pelos professores. Seguindo a lógica da responsabilização, que constitui a racionalidade neoliberal (DARDOT; LAVAL, 2016), a figura do professor é apresentada como protagonista da evasão e do fracasso escolar. Também observamos que os egressos atribuem aos professores a exigência de abdicar da vida social em favor de uma intensificação do trabalho acadêmico. Em alguns momentos, notamos que os entrevistados se queixam da exigência de dedicação exclusiva ao curso em detrimento da vida social:

Porque, desde o começo, eu sempre encontro dificuldades. Todo mundo está falando “é difícil, é difícil”, e todos os professores parecem estar falando “ah, você não pode ter vida pra estudar na Física”. Eu vi que isso desmotivou muita gente. Muita gente que entrou comigo e saiu (Estudante 6).

Os resultados indicam que as integrações social e acadêmica estão igualmente relacionadas à excelência e que, na verdade, são os estudantes menos bem-sucedidos que terão mais dificuldades de se integrar socialmente ao curso. É verdade que a integração social eficaz para a permanência talvez não seja tão hedonista quanto a imagem que se faz do universitário bon vivant. Porém, os resultados mostram que tampouco é verdadeira a imagem segundo a qual o aluno bem-sucedido academicamente não possui uma vida social agradável com seus colegas.

O que os estudantes internalizam?

As entrevistas mostram que, a partir de algum momento, os estudantes passam a ser progressivamente compreensivos com os docentes. É mesmo usual que o processo educativo reduza a distância simbólica entre educando e educador e que a violência simbólica (BOURDIEU; PASSERON, 2009) passe a não ser mais vivida como violência. Nos primeiros passos dessa caminhada, ainda que movidos por profunda insatisfação, os estudantes chegam a supor razões que quase justificam os constrangimentos vividos em nome da excelência.

Eu não sei se foi porque os professores que a gente tem foram formados desse jeito. Não sei se eles mantêm as manias dos mestres antigos ou se é mesmo sem querer. Acontece. Eles fazem coisas sem querer porque, como ninguém reclama, as pessoas acabam se acostumando a ficar mais relaxadas e… eu não sei (Estudante 7).

Mais tarde, os estudantes passam a se preocupar com a maneira que os professores os percebem. Sabem que a experiência no curso é muito diferente quando se tem professores como aliados. Tendo boas relações com os professores, oportunidades surgem, a chance de ser bem-sucedido na graduação aumenta assim como o reconhecimento por parte dos colegas.

Eu acredito que a comunidade científica tem muito a ver com a impressão que você causa, as pessoas que você conhece, as relações que você cria. Então, por exemplo, você tem uma relação de trabalho junto com um professor bem creditado. Inevitavelmente alguns professores levarão isso em consideração, outros não. Mas, em alguma escala, essa proximidade afeta a forma como que te enxergam (Estudante 8).

Os estudantes rapidamente percebem que os professores selecionam os alunos que consideram mais excelentes e que essa seleção perturba suas trajetórias, colocando os preferidos em vantagem.

A experiência na Física é mais uma coisa de selecionar os alunos que conseguem trilhar um caminho difícil e não ensinar os alunos a conseguirem se desenvolver dentro da academia (Estudante 9).

O processo por meio do qual os imperativos de excelência vão sendo incorporados pelos estudantes é, sem dúvida, muito mais longo do que poderíamos descrever aqui. É certamente por meio desse processo reprodutor-transformador que a lógica da excelência se perpetua e se atualiza de uma geração a outra.

Existem alunos aqui dentro que fazem questão de mostrar que: “ah, eu sou melhor do que você, a minha menção é maior que a sua, meu IRA é maior que o seu…”. Alguns professores colocam essa competitividade dentro de sala, e aí tem alunos que levam aquilo para si. Há alunos que sabem que aquilo não representa nada. Eu mesma já tive aquela visão de competitividade, de que você tem que ser o melhor, que você tem que estudar 24h por dia. […] Muitos alunos levam isso para eles e aí esses alunos tornam o ambiente competitivo. […] Então, você tem que ter a maturidade para estar num meio em que você vai ter tanto o aluno escroto quanto o professor arrogante (Estudante 1).

Não é raro que os estudantes se queixem de que os colegas (e não somente os professores) tornam o ambiente competitivo. Eventualmente os entrevistados (como transcrito acima) reconhecem que eles mesmos se apropriaram da lógica competitiva que caracteriza a excelência.

É verdade que os professores nem sempre são representados como cruéis e opressores, tampouco os colegas são todos competitivos. Os estudantes são frequentemente gratos aos professores e colegas que não se encaixam em tudo o que foi descrito aqui. Nosso diálogo com os entrevistados mostra também que há um tipo de compaixão combativa que mobiliza professores e estudantes contra os imperativos de excelência. Essa compaixão precisa ser investigada mais detalhadamente. Para os propósitos desta análise, os depoimentos que trouxemos ilustram quanta vida (e quanta luta) há por trás do reconhecimento de que os imperativos de excelência estruturam as experiências de integração social e acadêmica nos Institutos de Física, ainda que não estejam diretamente relacionados à evasão nesses cursos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A excelência é uma questão importante tanto na vida dos estudantes quanto das instituições de ensino. Chamamos imperativos de excelência todos os atos que interpelam os estudantes a competirem por um padrão de desempenho idealizado. Tais atos estimulam a competitividade e o individualismo à maneira da racionalidade neoliberal (DARDOT; LAVAL, 2016) sem terem sido jamais criados por ela. A racionalidade neoliberal potencializa e transforma os imperativos de excelência na medida em que, universalizando os mecanismos de comparação, universaliza a competição.

Em discursos progressistas e conservadores, a evasão costuma ser relacionada ao tema da excelência: evadir é quase equivalente a fracassar. Os estudantes que abandonam a graduação são, portanto, considerados mais sensíveis aos obstáculos que precisam ser superados para a conclusão do curso. Para avaliar e polemizar esse ponto de vista, perguntamos: “Em que medida a evasão e as experiências discentes nos cursos de graduação em Física estão relacionadas à pressão por excelência acadêmica?”

Partindo da análise de correspondência múltipla ajustada, percebemos primeiramente que a excelência é uma questão de classe: os estudantes de origem social privilegiada também são propensos a abandonar o curso; porém, quando permanecem, tendem a ser bem-sucedidos. Percebemos ainda que o conceito de capital cultural precisa ser mais bem delineado para dar conta das particularidades do curso de Física. Conclusões semelhantes podem ser encontradas, respectivamente, em Lima Junior et al. (2012, 2013) e Archer et al. (2015).

O grau de excelência dos estudantes no curso está relacionado às motivações que eles apresentam ao ingressar. Ingressantes motivados à pesquisa tendem a se tornar estudantes excelentes. A motivação à docência, contudo, é indiferente à excelência. Finalmente, como primeira resposta à questão de pesquisa, as aspirações relacionadas à permanência (e à evasão) não guardam relação estatisticamente significativa com o grau de excelência dos estudantes. Há estudantes excelentes que desejam sair do curso, bem como estudantes de baixo desempenho que desejam permanecer nele. Percebemos, no entanto, que os estudantes reprovados nas disciplinas tendem a ser menos integrados social e academicamente. Esse resultado sugere olhar para o papel da pressão por excelência nas experiências de integração dos estudantes.

Quanto à organização curricular, os estudantes entrevistados apontam que as reprovações (muito usuais no início do curso) afastam os colegas e contribuem para a falta de integração social. A austeridade e a necessidade de antecipar conteúdos futuros contribui para que os estudantes sejam formados com lacunas básicas que raramente são percebidas, visto que os imperativos de excelência colocam todos mais preocupados com os tópicos avançados.

Os professores, em sua maioria, são representados como figuras opressoras e exigentes, desumanos e sem empatia. Os imperativos de excelência proferidos pelos professores, na visão dos estudantes, foram interpretados como operações de distinção: cumprem a função de, pela construção de uma imagem de austeridade, enobrecer alguns professores diante de outros. Finalmente, percebemos que os estudantes desenvolvem formas próprias de participar dos imperativos de excelência - pela crítica ou pela adesão.

Enfim, é esperado que as reflexões apresentadas aqui nos permitam tratar a questão da evasão dos cursos de graduação em geral, e da Física, em particular, com o mínimo de complexidade, superando a tendência simplificadora de abordar a evasão como resultado da falta de sucesso do estudante ou da instituição. A evasão da educação superior não está imediatamente relacionada ao fracasso escolar. Porém, deslocando nossa atenção para as experiências de integração, fomos capazes de desenvolver um olhar crítico sobre a vida em um Instituto de Física. Que possamos, sem tratar os estudantes como vítimas de seus professores, encontrar formas mais empáticas de nos relacionarmos uns com os outros.

APÊNDICE

Ao lado de cada fator, encontra-se seu alfa de Cronbach, uma medida da confiabilidade do fator (TABER, 2018). Ao lado de cada item, foi publicada a carga desse item no referido fator (as cargas indicam o quanto o item é relevante para o referido fator). Cargas negativas indicam que o item se opõe ao sentido central do fator. Uma discussão mais detalhada dessas escalas pode ser encontrada em Lima Junior et al. (2020).

Motivação para a pesquisa (alfa = 0,80): Ao ingressar no curso de Física, eu já desejava trabalhar na área (0,56); Quando eu ingressei na Física, eu queria ser pesquisador (0,80); Quando eu ingressei na graduação em Física, eu já planejava fazer pós-graduação na área do curso (0,61); Eu não ingressei no curso de Física para ser cientista (-0,74); Ao ingressar no curso, eu pretendia contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico do país (0,53); Ingressei no curso de Física para me tornar um pesquisador prestigiado (0,83); Desde o ingresso no curso, eu tinha interesse em investigar alguns temas atuais da Física (0,61)

Motivação para a docência (alfa = 0,80): Ingressei no curso de Física acreditando que a carreira de professor me traria satisfação profissional (0,92); Quando eu ingressei na Física, eu tinha interesse em ser professor de Física (0,91); Na época em que entrei no curso de Física, eu não tinha interesse em ministrar aulas da educação básica (-0,56); Ingressar no curso de Física esperando salário e empregabilidade (0,49)

Motivações dissonantes (alfa = 0,83): A baixa concorrência foi um elemento importante na minha escolha pelo curso de Física (0,67); Quando eu entrei na Física eu já estava interessado em mudar de curso (0,64); Ingressei no curso de Física apenas para ter um diploma de ensino superior, independente do curso (0,51); Minha escolha pela Física levou em consideração a nota de corte para ingresso no curso (0,75); Ao ingressar na Física eu não fazia questão de trabalhar na área do curso (0,57); Tenho interesse apenas no conteúdo deste curso mas não necessariamente em seguir carreira na Física (0,47).

Integração social (alfa = 0,76): Não tenho tempo de lazer com meus colegas de curso (-0,43); Desenvolvi amizades no curso de Física (0,76); Não sinto pertencimento com relação aos meus colegas de curso (-0,63); Gosto do tempo que passo junto com meus colegas de curso (0,81); O curso de Física me ajudou a me relacionar com outras pessoas (0,54); Eu me sinto discriminado ou sofro algum tipo de preconceito (-0,31); Acho desgastante o convívio com alguns colegas de curso (-0,19)

Integração acadêmica (alfa = 0,85): Eu me sinto desmoralizado pela dificuldade do curso (0,69); Estou satisfeito com meu desempenho no curso (-0,60); Tenho sensação de não pertencimento à comunidade do IF (0,46); Meu desempenho no curso me estimula a seguir em frente (-0,72); Tenho me sentido incapaz de prosseguir com o curso de Física (0,75); Eu me sinto pouco inteligente diante da comunidade do IF (0,72); Apesar dos meus esforços, não consigo melhorar meu rendimento acadêmico (0,73)

Aspirações futuras (alfa = 0,88): Estou considerando a possibilidade de trancar temporariamente o curso de Física (0,56); Pretendo concluir o curso de Física apesar de quaisquer dificuldades (-0,83); Estou considerando a possibilidade de abandonar o curso de Física (0,87); Desejo mudar da Física para outro curso de graduação (0,80); Desejo trabalhar na área do curso de Física assim que concluir minha formação (-0,54); Não tenho expectativas reais de concluir o curso de Física (0,77); Pretendo cursar mestrado na área de Física ou Ensino de Física (-0,59)

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem o apoio do Conselho Nacional de Pesquisa, CNPq (processo 436910/2018-7); Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal, FAPDF (processo 00193.00002099/2018-65) e Decanato de Pesquisa e Graduação da Universidade de Brasília (processo 23106.108908/2017-34).

REFERÊNCIAS

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Recebido: 11 de Março de 2019; Aceito: 24 de Março de 2020

Contato: Universidade de Brasília Instituto de Física. Sala ICC B1 382/66 - Campus Universitário Darcy Ribeiro CEP 73.345-010 - Brasília, DF - Brasil

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Doutor em Ensino de Física (UFRGS). Professor Adjunto do Instituto de Física (IF/UnB), membro permanente do PPG Educação em Ciências, (UnB) e líder do grupo Perspectivas Críticas da Educação em Ciências. E-mail: paulolimajr@unb.br.

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Doutora em Física (IFT/UNESP). Professora Associada do Instituto de Física (IF/UnB). E-mail: vcandrade@unb.br.

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Estudante de graduação (IF/UnB).

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Estudante de graduação (IF/UnB).

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Estudante de graduação (IF/UnB).

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Estudante de graduação (IF/UnB).

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