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Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências

versión impresa ISSN 1415-2150versión On-line ISSN 1983-2117

Ens. Pesqui. Educ. Ciênc. vol.25  Belo Horizonte  2023  Epub 03-Ene-2023

https://doi.org/10.1590/1983-21172022240133 

Artigos

A RECONTEXTUALIZAÇÃO DO DISCURSO SOBRE BIODIVERSIDADE EM UM CURSO DE FORMAÇÃO PARA PROFESSORES DE CIÊNCIAS

LA RECONTEXTUALIZACIÓN DEL DISCURSO SOBRE BIODIVERSIDAD EN UN CURSO DE FORMACIÓN PARA PROFESORES DE CIENCIAS

THE RECONTEXTUALIZATION OF BIODIVERSITY DISCOURSE IN A TRAINING COURSE FOR SCIENCE TEACHERS

LARISSA AINE DO NASCIMENTO1 
http://orcid.org/0000-0001-8841-8863

MARCELO TADEU MOTOKANE2 
http://orcid.org/0000-0002-8597-6832

1Universidade de São Paulo, Programa de Pós-graduação Interunidades em Ensino de Ciências, São Paulo, SP, Brasil.

2Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil.


RESUMO:

O objetivo deste trabalho é verificar a existência de recontextualização do conceito de biodiversidade no discurso dos elaboradores de um curso de formação de professores. A análise de conteúdo foi utilizada para investigar as características do texto fornecido pela apostila do curso e pela palestra proferida, comparando-as com o texto científico original sobre as dimensões da biodiversidade. Os resultados evidenciam que os conceitos foram modificados de seu sentido original, havendo omissão de termos, adição de sentenças, valores e exemplificações, sendo que a apostila manteve mais características do texto original quando comparado à palestra. Ao mesmo tempo, houve a recontextualização de um texto estritamente científico para uma versão compatível com o contexto do curso de formação. O trabalho defende que a formação de professores de ciências perpasse as dimensões filogenética, genética e funcional da biodiversidade a fim de alcançar a transformação cultural e a superação de situações socioambientais desiguais

Palavras-chave: Formação docente; Discurso Pedagógico; Ecologia

RESUMEN:

El objetivo de este artículo es verificar la existencia de una recontextualización del concepto de biodiversidad en el discurso de los desarrolladores de un curso de formación docente. Se utilizó el análisis de contenido para investigar las características del texto proporcionado por el folleto del curso y la conferencia, comparándolos con el texto científico original sobre las dimensiones de la biodiversidad. Los resultados muestran que se modificaron los conceptos con relación a su significado original, con omisión de términos, adición de oraciones, valores y ejemplificaciones, y el folleto mantuvo más características del texto original en comparación con la conferencia. Al mismo tiempo, un texto estrictamente científico fue recontextualizado en una versión compatible con el contexto del curso de formación. El artículo argumenta que la formación de profesores de ciencias permea las dimensiones filogenética, genética y funcional de la biodiversidad para lograr la transformación cultural y la superación de situaciones socioambientales desiguales.

Palabras clave: Formación docente; Discurso Pedagógico; Ecología

ABSTRACT:

The objective of this study is to determine if there was a recontextualization of the concept of biodiversity in the discourse of the developers of a teacher training course. Content analysis was used to investigate the characteristics of the booklet provided by the course handout and the lecture given, comparing them with the original scientific text about the dimensions of biodiversity. The results show that the concepts were modified from their original meaning, with omission of terms, addition of sentences, values and exemplifications, and the booklet kept more characteristics of the original text when compared to the lecture. At the same time, a strictly scientific text was recontextualized into a version compatible with the context of the training course. We argue that the training of science teachers should encompass the phylogenetic, genetic, and functional dimensions of biodiversity to achieve cultural transformation and overcome unequal socio-environmental situations.

Keywords: Teacher training; Pedagogical Discourse; Ecology

INTRODUÇÃO

A criticidade exigida do cidadão contemporâneo pode ser propiciada por um repertório cultural e social para o qual a ciência pode contribuir muito. Para que isso ocorra, é necessário um modelo de ensino em que a relação dos conceitos com a realidade seja constantemente evidenciada (Chassot, 2003). O ensino de ciências vem como uma possibilidade de se trabalhar importantes habilidades como a tomada de decisão, a análise, a síntese e a avaliação de informação (Pedretti & Nazir, 2011).

Dentre os diversos conceitos da área das ciências biológicas que possuem relação intrínseca com o cotidiano do indivíduo, são de nosso interesse aqueles relacionados à biodiversidade. A justificativa está no fato de que ensinar a conservar a biodiversidade significa ensinar a compreender os conhecimentos científicos e suas relações com a sociedade. Ademais, vinculadas a este conceito existem inúmeras discussões que perpassam os campos científico, cultural e social, de forma que trazê-las para a sala de aula é axiomático, uma vez que se almeja a formação cidadã dos alunos (Cherif, 1992).

Países megadiversos são alvo de interesses econômicos que podem levar à degradação ambiental, a qual afeta especialmente a biodiversidade, podendo provocar um ciclo de problemas socioambientais incontornáveis (Costanza et al., 1998; Layrargues, 2002; Castro, 2012; De Lisio, 2020).

Além disso, reconhecemos que, especialmente, alguns grupos sociais irão sofrer de maneira enfática as consequências dessa fragmentada visão que alinha empresas e governos. Como exemplo do desequilíbrio de poderes envolvendo a megadiversidade brasileira, citamos o acesso à biodiversidade e aos conhecimentos tradicionais por meio da Nova Lei da Biodiversidade (lei n. 13.123, 2015). Dentre os aspectos abordados pela lei, destacam-se a dimensão econômica de exploração do patrimônio genético, os conhecimentos tradicionais associados e a repartição de benefícios dos produtos elaborados no processo.

Em um primeiro momento, a lei parece um passo importante no reconhecimento e repartição de benesses atreladas ao uso da biodiversidade, especialmente considerando que existe um significativo prejuízo relacionado à fuga de conhecimentos e bioprodutos por meio da biopirataria (Pedrini, 2006). Assim, se aparenta balancear forças e buscar uma situação mais justa, preconizando que o lucro gerado a partir da biodiversidade brasileira retorne como renda e melhorias socioeconômicas nas comunidades tradicionais das quais saíram esses conhecimentos (Oliveira et al., 2010). Entretanto, uma análise mais apurada da lei, realizada por Bruno & Mattos (2021), revela que, na realidade, a repartição dos benefícios é injusta e desvantajosa para as comunidades tradicionais, trazendo retrocessos quanto aos seus direitos, não as protegendo da exploração econômico-científica e tornando restrita a punição em caso de descumprimento da normativa.

Assim, apesar da possibilidade de envolvimento legal das comunidades neste processo, o interesse econômico sobre o patrimônio genético da biodiversidade e o conhecimento tradicional associado têm avançado, em detrimento da manutenção e conservação das comunidades que detêm o conhecimento e mantêm a própria biodiversidade, aprofundando, dessa forma, situações de injustiça socioambiental.

A negligência do Estado na proteção da biodiversidade e o consequente alinhamento a uma perspectiva mercantil são sintomáticos da visão neoliberal que, por sua vez, traz situações incompatíveis com perspectivas de desenvolvimento e manutenção dos saberes tradicionais, os quais, muitas vezes, já se encontram marginalizados e desprivilegiados politicamente (Fuentes-George, 2013).

Nesse contexto, torna-se necessária a mobilização dos cidadãos em prol da justiça. Segundo Cortina (2005), para que isso aconteça, é preciso que se compartilhe o sentimento de pertença, com unidade e em prol de bens e problemáticas comuns - tais como injustiças socioambientais, além da aquisição de um amplo entendimento do exercício cidadão.

Dentro dos conhecimentos valiosos para a constituição do cidadão, vemos como necessários aqueles sobre as dimensões da biodiversidade: genética, filogenética e funcional. Tais conceitos auxiliam na compreensão das consequências de ações decorrentes de atores econômicos e políticos sob a fauna e flora brasileira.

Nessa perspectiva, a relação do ser-humano com a biodiversidade e a luta pela conservação dos ecossistemas se relaciona tanto com o conhecimento científico quanto com a formação cidadã dos sujeitos, isto é, a compreensão dos atores sociais envolvidos e das responsabilidades individuais, coletivas e governamentais atreladas a estas questões. De igual forma, uma compreensão científica desassociada da formação cidadã prejudica a relação da sociedade com o meio-ambiente (Pinhão & Martins, 2016).

Trazer as discussões supracitadas para a sala de aula pode auxiliar na formação de cidadãos críticos, capazes de tomar decisões e agir de forma coerente e responsável diante dos problemas socioambientais contemporâneos, muitos dos quais são relacionados à conservação da biodiversidade, como os previstos na lei 13.123/2015.

Nesse contexto, o professor de ciências possui um papel de especial destaque devido ao seu potencial de propiciar condições para que seus estudantes trabalhem habilidades que lhes permitam exercitar a cidadania em prol da conservação da biodiversidade.

Para tanto, era de nosso interesse aproximar um discurso científico sobre a biodiversidade, contendo pressupostos democráticos da construção do discurso dos professores, a partir de um curso de formação. Conceitos de biodiversidade atrelados a questões sociocientíficas foram abordados durante o curso e, na teoria de Bernstein (1996), buscou-se sustentação teórica para realizar uma análise de como o discurso científico foi recontextualizado.

Assim, foi estabelecido como objetivo geral deste trabalho a caracterização do discurso dos agentes recontextualizadores sobre biodiversidade durante um curso de formação. A fim de atingir tal objetivo, analisou-se a apostila disponibilizada durante o curso, uma vez que nela encontrava-se descrita a compreensão dos elaboradores do curso sobre os conceitos científicos; também foi analisada uma palestra, de cunho expositivo-dialogado, que contemplou a explicação desses mesmos conceitos.

Buscando contemplar o objetivo geral, foram estabelecidos os seguintes objetivos específicos: a) caracterizar o discurso instrucional transmitido pelos organizadores do curso por meio da apostila e da palestra; b) verificar se houve recontextualização no discurso instrucional, caracterizando-o.

Para desenvolver os objetivos propostos, realizou-se uma pesquisa de caráter qualitativo, caracterizada como um estudo de caso (Yin, 2015). Os dados foram coletados por meio da apostila fornecida no curso e da gravação da palestra, que foi transcrita segundo as proposições de Preti (1999). A análise dos dados ocorreu seguindo a Análise de Conteúdo de Bardin (2011), juntamente com a Teoria da Reprodução Cultural.

Após a definição do conceito de biodiversidade, evidenciaremos seu potencial pedagógico dentro do ensino de Ciências e Biologia e finalizaremos a seção descrevendo o dispositivo pedagógico, fundamental para a compreensão deste trabalho. Em seguida, serão apresentados os resultados da pesquisa e a discussão à luz do referencial teórico.

O CONCEITO DE BIODIVERSIDADE

Ao analisar a história do discurso científico relacionado ao termo biodiversidade, observa-se este que foi introduzido em 1986, durante o “National Forum on BioDiversity”, organizado pelas entidades “National Research Council” e “National Academy of Sciences”. Os resultados desse fórum foram publicados em uma coletânea com o título “BioDiversity”, composta por artigos elaborados por mais de 60 especialistas considerados autoridades internacionais no assunto (Motokane, 2015).

Desde então, pesquisadores buscam definir a biodiversidade de acordo com diferentes parâmetros. Uma clássica definição foi empregada por Wilson (2012):

“A variedade de organismos considerada em todos os níveis, desde variações genéticas pertencentes à mesma espécie até as diversas séries de espécies, gêneros, famílias e outros níveis taxionômicos superiores. Inclui a variedade de ecossistemas, que abrange tanto as comunidades de organismos em um ou mais hábitats quanto as condições físicas sob as quais eles vivem (Wilson, 2012. p. 400)”.

Acerca desta definição, Pedrini (2006) faz críticas dizendo ser ela demasiadamente simplista. Motokane, Kawasaki & Oliveira (2010) dizem que a amplitude da definição suscita pouca discordância no meio acadêmico, porém dificulta tanto a compreensão quanto a mensuração dessa biodiversidade. É sabido que definições abrangentes possibilitam múltiplas interpretações e recontextualizações, situação observada com a popularização do termo, em função da ampla divulgação midiática, passando o conceito a compor o vocabulário do senso comum, nem sempre da maneira correta.

Motokane, Kawasaki & Oliveira (2010) consideram que o conceito de biodiversidade é polissêmico e apresenta diferentes significados de acordo com o contexto, podendo conter alguns equívocos e distorções. Os autores relatam ainda que o termo foi apropriado por outras áreas do conhecimento e, nesse processo, diferentes e novos conceitos foram agregados, incluindo valores relacionados à conservação.

Outra possibilidade de compreensão do termo pode ser encontrada nos escritos de Norse & McManus (1980), que usaram o termo biodiversidade para se referir a níveis de organização: genético, espécies e ecológico. Existem outras maneiras de enxergar a biodiversidade, e para Motokane (2005), quando a biodiversidade é vista sob a perspectiva de recursos naturais, ela apresenta outras demandas de análise que tangenciam dimensões éticas, econômicas e estéticas. Incluída nessa visão, encontra-se a definição de Wiegleb (2002), abrangendo questões de conservação a partir de valores. Para Thiemann & Oliveira (2013), a multiplicidade de valores e concepções da biodiversidade tem sua base em diferentes cosmovisões, fazendo-a ser objeto de disputa, de maneira que é mister promover o diálogo entre as diferentes perspectivas para que se desvelem estruturas “subliminares” adjacentes.

Pode-se, ainda, compreender que a biodiversidade está para além dos conhecimentos da Biologia e da Ecologia, não se centrando somente na riqueza de seres vivos, suas relações e habitats (Marín, 2017), “mas também e, principalmente, da construção de sentidos coletivos e identidades compartilhadas com significações culturais diversas” (Barzano & Melo, 2019, p. 197). Trata-se da perspectiva cultural, a qual considera as particularidades étnicas e patrimônios de comunidades humanas, especialmente as tradicionais, como base para obter a equidade social (Castro & Romo, 2018)

Além dessas definições, a Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP), por meio do programa BIOTA/FAPESP, propôs compreender a biodiversidade a partir dos resultados de pesquisas nacionais. Para isso, o programa fomentou investigações que visassem um entendimento mais amplo sobre a biodiversidade, concentrando-se na intersecção das dimensões genética, filogenética e funcional, conforme a Figura 1.

Figura 1 As três dimensões da biodiversidade: genética, filogenética e funcional (cinza claro). A intersecção entre cada uma delas (cinza médio) consiste nas lacunas de conhecimento segundo o programa. A intersecção entre todas as dimensões (cinza escuro) é o objetivo do Programa. Adaptado de: NSF (2021). 

A dimensão filogenética agrega as reconstruções das relações evolutivas entre linhagens no nível populacional e acima deste, e o que essas relações nos dizem sobre a taxonomia. A dimensão genética compreende a diversidade de sequências de nucleotídeos em loci neutro ou codificante, bem como a diversidade genômica (proteômica, transcriptômica). Já a dimensão funcional se refere aos papéis que os organismos desempenham dentro das populações, comunidades e ecossistemas, incluindo a interação com processos ecológicos e o papel dessas relações na geração e manutenção da biodiversidade em escalas espaciais e temporais.

A BIODIVERSIDADE COMO EIXO INTEGRADOR DENTRO DO ENSINO DE CIÊNCIAS

Ensinar a conservar a biodiversidade é ensinar a compreender os conhecimentos científicos na sociedade, agregando elementos básicos para a compreensão das relações do ser humano com seu entorno (Manzanal & Jiménez, 1995), incluindo aspectos da conservação e da degradação do meio ambiente, bem como dos aspectos políticos e econômicos que interferem na exploração sustentável dos recursos naturais. Tais discussões tendem a envolver conceitos que entrecruzam áreas do conhecimento como a Geografia, a Química, a Física e a Sociologia (Castro, Motokane & Kato, 2014).

Dessa maneira, o conceito de biodiversidade é um eixo integrador dentro das ciências biológicas, possuindo potencial pedagógico para se trabalhar a intradisciplinaridade e a interdisciplinaridade (Castro, 2017). Tal característica confere ao ensino de biodiversidade um grande potencial pedagógico, auxiliando estudantes na compreensão e apropriação dos conceitos científicos. A interdisciplinaridade também é defendida por Cardoso-Silva & Oliveira (2013), os quais relatam sobre a ausência de temas relevantes para a compreensão da biodiversidade em livros didáticos, como cladogramas, relação entre populações e comunidades, entre outros. Os autores ainda mencionam que o tema, quando abordado, é fragmentado e de difícil compreensão, pouco contribuindo para a formação de um pensamento crítico. Eles sugerem que se privilegiem abordagens interdisciplinares, integrando diversas áreas de estudo.

Se pensamos na formação de um cidadão possuidor de um pensamento crítico, capaz de discutir acerca de temas relevantes para a sociedade, tais como as questões sociocientíficas (Conrado & Nunes-Neto, 2018), é imprescindível que sua formação contemple conceitos relacionados a esse tema. Salientamos a necessidade de se levar às escolas públicas discussões sobre aspectos da biodiversidade devido à importância deste tema para a população em geral, indo além dos interesses da comunidade científica (Motokane, Kawasaki & Oliviera, 2010).

O uso do tema biodiversidade dentro de cursos de formação de professores se faz necessário para que se incentivem abordagens interdisciplinares que ultrapassem os muros da escola. Motokane, Kawasaki & Oliveira (2010) afirmam que mudanças no currículo e nas práticas pedagógicas são necessárias e certos temas e abordagens podem facilitar esse processo, tal como o ensino de biodiversidade. A capacitação profissional contínua é necessária quando existe um assunto em constante atualização, tal como a biodiversidade.

A formação do professor de Ciências deve contemplar os domínios científico, cultural e social, integração crucial para se formar um cidadão crítico capaz de tomar decisões e agir de maneira coerente e responsável diante dos problemas contemporâneos (Cherif, 1992). Assim, espera-se que, a partir dos conhecimentos que o indivíduo possui sobre as relações entre a sociedade e a ciência, haja interesse em pressionar instâncias governamentais e sociais, tendo em vista a melhoria de políticas públicas de conservação e restauração da biodiversidade, além de questionar e propor meios e estratégias para o uso sustentável de seres vivos, atuando, assim, de forma cidadã.

Wals (1996) é favorável à inserção de temáticas ambientais no ensino de Ciências, mencionando que estas dão margem ao estudante para construir, transformar, criticar e emancipar seu próprio mundo. Segundo essa visão, para que um indivíduo se torne parte da mudança de uma determinada sociedade, é necessário que possua entendimento sobre os impactos resultantes das ações humanas em todas as dimensões da biodiversidade, bem como das situações de injustiça atreladas aos impactos, e sobre os responsáveis pelos mesmos.

A RECONTEXTUALIZAÇÃO DO DISCURSO DE BIODIVERSIDADE

A teoria de reprodução e transformação cultural de Bernstein (1996) busca compreender como a constituição e o funcionamento das estruturas educacionais permitem a reprodução das relações de poder existentes na sociedade. De acordo com a macroestrutura hierárquica da sociedade, os sujeitos são posicionados de maneira diferencial - e de acordo com sua classe social - e o posicionamento fornece acesso a diferentes conhecimentos no nível micro das estruturas educacionais. Isso significa que a distribuição de poder e os princípios de controle são traduzidos em princípios de comunicação desigualmente distribuídos entre as classes sociais. No interior do sistema educacional, o modelo que explicita esse fenômeno é o do dispositivo pedagógico (Bernstein, 1996).

As regras intrínsecas do dispositivo pedagógico são relativamente estáveis pelo fato de serem dependentes da ideologia do grupo dominante. Esse grupo controla a manutenção das regras em diferentes instâncias do sistema educacional. Assim, o ideal de manutenção da hegemonia de poder e controle dos grupos dominantes é realizado por meio da distribuição seletiva de conhecimentos às diferentes camadas sociais. No entanto, o dispositivo pedagógico possui, de maneira intrínseca, momentos potenciais de contestação da ordem estabelecida, pois “é possível obter um resultado, uma forma de comunicação, que subverta as regras fundamentais do dispositivo” (Bernstein, 1996).

Galian (2011) diz que o dispositivo pedagógico é uma atividade moral devido a sua capacidade de relacionar poder, conhecimento e consciência. Isto ocorre por meio das regras previamente mencionadas, que agora nomearemos de regras distributivas, regras recontextualizadoras e regras avaliativas para processos de especialização de formas de consciência. As regras distributivas marcam e especializam duas classes de conhecimento, o pensável e o impensável, e as práticas decorrentes desses conhecimentos para grupos diferentes por meio de práticas pedagógicas diferentemente especializadas (Bernstein, 1996). O pensável trata do conhecimento já produzido pela humanidade, presente nos níveis inferiores dos sistemas educacionais. Já o impensável, presente nos níveis superiores dos sistemas educacionais, é o espaço para possibilidades alternativas de reflexões e realizações, ou seja, produção de novos conhecimentos (Galian, 2011).

O conhecimento que chega até a escola, chamado por Bernstein (1996) de “pensável”, é selecionado tanto em seu conteúdo quanto em sua forma pelas agências que detêm o controle do sistema educacional. O autor fala então do processo de recontextualização. As regras desse processo visam explicitar o processo da transformação do texto científico - produzido nos níveis superiores do sistema educacional - em um texto pronto para ser transmitido em sala de aula. Nas instâncias superiores, como a universidade e centros de pesquisa, “é produzido um conjunto de significados relacionados à ciência que tratam de um conhecimento que, em seu local de produção [...] é autoexplicativo, mas que, ao ser tratado na escola, terá de ser mediado para fins de transmissão” (Galian, 2011, p. 768). Assim, chega-se na definição do discurso pedagógico: “um princípio para apropriar outros discursos e colocá-los numa relação mútua especial, com vistas à sua transmissão e aquisição seletivas” (Bernstein, 1996, p. 259).

Ao ser deslocado de sua origem e posicionado dentro de um discurso pedagógico, o texto original sofre mudanças. Uma mudança característica é o distanciamento deste com a base social de sua prática, que elimina as condições sociais e de poder que permitiram a existência do próprio texto (Bernstein, 1996). Em outras palavras, oculta-se a ideologia por detrás do conhecimento produzido pela ciência, substituindo-a por uma outra, segundo interesses da classe dominante. Assim, por meio de uma falsa neutralidade, os princípios dominantes da sociedade regulam o conteúdo e a forma de transmissão do conhecimento científico de acordo com o “que” e “como” deve ser transmitida esta ciência “pedagogizada” nos níveis inferiores do sistema educacional.

A produção do discurso pedagógico possui dois níveis. O primeiro é da geração do discurso regulador geral (DRG), no qual encontra-se o campo do Estado. Este campo recebe influências do campo da economia (recursos físicos), do campo do controle simbólico (recursos discursivos) e do campo internacional. De maneira geral, o Estado incorpora e legitima os princípios dominantes da sociedade e, assim, a distribuição social de poder e controle. Esse nível influencia diretamente o segundo nível de produção do discurso pedagógico, no qual ocorre a primeira recontextualização, que é realizada por agentes recontextualizadores oficiais, também sob certa influência dos campos econômico e de controle simbólico. Sob tais influências, forma-se o discurso pedagógico oficial (DPO). A recontextualização ocorre outra vez nesse nível, mas sob a ação de agentes do campo de recontextualização pedagógica, que elaboram o discurso pedagógico de reprodução (DPR). A reprodução do discurso pedagógico ocorre no nível da transmissão. Neste há nova recontextualização do discurso de acordo com as especificidades da escola, do nível educacional e da prática docente, que realiza, por fim, um discurso pedagógico local - DPL (Bernstein, 1996; Morais & Neves, 2007; Galian, 2008; 2011).

Vemos, nesse modelo, o conjunto de regras que regulam a comunicação pedagógica, desde as esferas de produção até sua transmissão em esferas de reprodução. A consequência desse procedimento é uma série de significados transmitidos na escola de maneira diferenciada entre os grupos. Trata-se do controle exercido pela ideologia dominante do Estado, traduzido para a esfera educacional por meio de agências especializadas na recontextualização do discurso original advindo das ciências.

É esse o propósito da agência de controle Ministério da Educação (MEC), que atua no campo de recontextualização oficial e produz o DPO. Este se materializa em documentos oficiais, como a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) (MEC, 2017), sob a qual estrutura-se a formulação de currículos. A BNCC dita o “que” deve ser ensinado na escola e fornece algumas sugestões de “como” isso deve ocorrer.

No próximo nível de recontextualização, que consiste no campo de recontextualização pedagógica, temos a atuação de outras agências especializadas que formulam o DPR por meio de currículos, apostilas e livros didáticos. Estes, ao entrarem na sala de aula, sofrem nova recontextualização no DPL do professor.

O discurso pedagógico encerra uma mensagem sociológica em cada etapa do modelo, com o potencial de originar diversas formas de discurso pedagógico de acordo com os vieses ideológicos daqueles que realizam a recontextualização. Isso ocorre em função dos múltiplos contextos sociais em que esse conteúdo pedagógico chega, assim como da distribuição de poder e princípios de controle. Assim, abre-se espaço para o questionamento da ordem vigente. No entanto, critica-se a extensão argumentativa de Bernstein ao propor a mudança cultural, pois, para o autor, a resistência é concebida dentro do contexto de funcionamento das regras do dispositivo pedagógico “sem que haja a investigação do processo de implodir tais regras [...] levando à conclusão de que há transformações impossíveis no contexto dessa dada estrutura” (Lopes, 2005, p. 54-55).

É relevante mencionar que o processo de recontextualização, ao produzir um texto diferente de acordo com a ideologia dos agentes recontextualizadores, não resulta em um discurso ao qual deve-se atribuir imediatamente um valor negativo. Enquanto um produto da recontextualização, o texto não deve ser considerado uma deturpação, antes, um texto diferente. Pode-se, em pesquisas, verificar a adequação desse texto ao contexto no qual está inserido, ou a complexidade conceitual adquirida ou perdida ao longo do processo, indagando as razões pelas quais ocorre a seleção diferencial de alguns termos em detrimento de outros. Para Galian (2008), o processo de recontextualização pode tanto enriquecer como empobrecer o texto do DPR em comparação com o texto do DPO.

Castro (2017), ao analisar o processo de recontextualização do conceito de biodiversidade nos níveis do dispositivo pedagógico, concluiu que o tema aparece de maneira superficial e fragmentada. O autor menciona a existência de lacunas na explicitação desse conceito em documentos oficiais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a Proposta Curricular do Estado de São Paulo, o que possibilita a recontextualização do tema de acordo com o - sempre presente - viés ideológico dos agentes. Essa fragmentação torna o DPL dependente, em grande medida, de sua formação e do seu viés ideológico, de maneira que o mesmo documento pode resultar em práticas pedagógicas que seguem uma agenda neoliberal, enxergando a natureza como recurso a ser explorado, ou em uma perspectiva conservacionista e progressista, reconhecendo a importância das populações tradicionais para a manutenção dos ecossistemas terrestres.

Assim, vê-se a necessidade de trazer definições claras e integradas do conceito, com o objetivo de tornar transparentes alvos como a justiça socioambiental e o respeito à biodiversidade em suas múltiplas possibilidades, ao se abordar o tema nos diferentes níveis do dispositivo pedagógico.

METODOLOGIA

A pesquisa qualitativa pode ser identificada pelo esforço em propor questões relevantes para a análise, utilizando um conjunto sistematizado de critérios de observação do fenômeno, bem como formas de registo e análise dos dados coletados. Para além disso, são tornados explícitos os procedimentos planejados e busca-se, então, encontrar relações entre a pesquisa social e a teoria social subjacente, por meio da interpretação dos dados e da construção de significados (May, 2004; Flick, 2013). No caso deste estudo, a pesquisa fundamenta-se na Teoria da Reprodução e Transformação Cultural de Bernstein (1996), que explicita o mecanismo por detrás da formação do discurso pedagógico.

Para Bernstein (1996), pode-se analisar o dispositivo pedagógico a partir de diferentes unidades, como “um nível do sistema educacional, uma agência, um currículo, uma unidade do currículo ou um contexto de transmissão” (Bernstein, 1996, p. 279). O curso de formação encontra-se neste último. Assim, buscou-se descrever um fenômeno particular de ensino que ocorreu durante a execução de um curso de formação e, a partir disso, analisar e interpretar esses resultados à luz dos referenciais teóricos da teoria social. A análise deve, portanto, identificar e caracterizar como ocorrem as recontextualizações do texto científico oficial durante a aplicação do curso.

A estratégia de investigação adotada foi o estudo de caso, passando pelas etapas de recolha, análise e intensa interpretação da informação, muitas vezes por triangulação (Flick, 2013). Para Yin (2015), a realização de estudos de caso advém da necessidade de estudar fenômenos sociais complexos nos quais o contexto possui um papel importante.

O estudo de caso foi conduzido por meio de uma observação não participante, pois os autores não aplicaram o curso de formação de professores, permanecendo como observadores (Flick, 2013). Além disso, o estudo não foi conduzido em condições naturais, mas consistiu em uma intervenção sistematizada, isto é, o ambiente, os fenômenos documentados e as atividades executadas pelos sujeitos de pesquisa foram planejados. A seguir são descritos os sujeitos de pesquisa e detalhado o curso de formação.

OS ELABORADORES DO CURSO

O conteúdo e o formato do curso de formação de professores foram elaborados pelos participantes de um grupo de pesquisa que atua a há mais de 15 anos em uma universidade pública estadual, formando professores de maneira inicial e continuada. Do grupo fazem parte professores doutores, professores da rede pública e privada, doutores, mestres, pós-graduandos, graduados e graduandos. A maior parte dos participantes possui formação básica em Ciências Biológicas, usualmente em universidade pública. As reuniões são semanais e nelas são discutidos os assuntos relativos às pesquisas encaminhadas, abordando temas como: formação de professores; ensino de biodiversidade; recontextualização do discurso pedagógico; produção de Sequências Didáticas (SD); argumentação dentro do Ensino de Ciências. Defende-se no grupo os pressupostos teóricos de Sasseron & Carvalho (2011), Carvalho (2013), Zabala (1998) e Aleixandre (2010) para alfabetização científica, ensino de ciências por investigação, produção de SD e argumentação. As ideias de Bernstein (1996) e Morais e Neves (2007) são base para pesquisas sobre a recontextualização do discurso pedagógico. Em época mais recente, foram inseridas pesquisas e discussões sobre cidadania e questões sociocientíficas atreladas ao ensino de Ciências (Cortina, 2005).

Os indivíduos que elaboraram o curso possuem em comum o arcabouço teórico supracitado. Atuaram também como monitores do curso de formação. A apostila analisada no presente trabalho foi também planejada e escrita pelos membros do grupo de pesquisa. Para fins analíticos, isso significa que esses indivíduos atuaram como agentes recontextualizadores durante a escrita da apostila, uma vez que tiveram acesso aos textos científicos e, em discussões coletivas, recontextualizaram conceitos, elaborando um texto diferente do original e adaptado para o curso.

O CURSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O curso de formação de professores de Ciências ocorreu em 2019 e teve duração de 30 horas, distribuídas em 5 dias com aproximadamente 6 horas de atividades, considerando manhã e tarde. A presença efetiva foi de 29 cursistas. O público-alvo foram alunas e alunos cursando graduação e graduados em Ciências Biológicas. A coleta de dados para a descrição do curso ocorreu por meio de registro em caderno de campo e as atividades ocorridas são descritas no Quadro 1.

Quadro 1 Cronograma de atividades do curso de formação 

O curso contou com palestras, oficinas e atividades práticas. São oficinas os momentos em que os cursistas trabalham na elaboração de uma SD cujo tema foi escolhido por eles. As palestras e atividades práticas eram conduzidas pelos elaboradores do curso e abordavam temáticas que eles julgaram relevantes para a reflexão dos cursistas durante o planejamento de aulas de ciências. Assim, após estas os cursistas eram convidados a se reunirem em grupos para continuar o planejamento da SD e inserir nela o que foi discutido durante a palestra ou atividade prática.

O objetivo do curso foi o oferecimento de conteúdos relativos à elaboração de uma atividade didática investigativa de ecologia cujo conteúdo era focado na conservação da biodiversidade. Os aspectos teórico-metodológicos que basearam as palestras e oficinas do curso incluem: as dimensões da biodiversidade (NSF, 2021); alfabetização científica (Sasseron & Carvalho, 2011); o ensino de ciências por investigação (Carvalho, 2013); a proposição de SD e a inserção de questões sociocientíficas (Conrado & Nunes-Neto, 2018) que propiciem momentos de reflexão sobre as dimensões da cidadania (Cortina, 2005); práticas e movimentos epistêmicos (Kelly, 2008; Silva, 2015).

O fornecimento de repertório conceitual e técnico teve por fim ampliar a profissionalização do futuro docente em relação a temas de sua área de atuação específica. Além desses aspectos, foram levantadas questões de naturezas ética e social, destacando a importância da autoformação e da reflexão no exercício da profissão docente, trazendo discussões e modelos pautados na homologia do processo (Schön, 1983) - práticas dos dias 3 e 4 - para que o professor se colocasse no lugar de seus estudantes no momento de planejar as aulas e atividades.

É importante mencionar que a coleta de dados durante o curso, bem como seu armazenamento no banco de dados do Laboratório de Ensino de Biologia passou pela aprovação do comitê de ética em pesquisa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, obtendo o número de CAAE 13804519.5.0000.5407. A utilização desses dados para a pesquisa aqui descrita também passou pela apreciação do Comitê de Ética e obteve o número de CAAE 39077420.0.0000.5407.

A PALESTRA

No segundo dia do curso, uma das elaboradoras do curso dirigiu uma atividade, utilizando o problema sociocientífico do desaparecimento de abelhas para iniciar uma discussão sobre as consequências dessa situação para a sociedade e para o meio ambiente - fazendo referência, de maneira implícita, a aspectos da biodiversidade genética, filogenética e funcional e, em seguida, o debate sobre como a ciência poderia colaborar para resolver essa situação (Freitas et al., 2021).

Na sequência, a palestrante se utilizou das falas que surgiram durante a discussão para explicitar, explicar e exemplificar cada uma das dimensões da biodiversidade e sua fundamentação teórica no campo da ciência. Dessa maneira, foi defendido o uso dessa perspectiva dentro das aulas de ciências para que as aulas que abordam este tema ocorram de maneira integrada e com uma perspectiva democrática e de justiça ambiental.

Esse momento é de interesse para a presente pesquisa pois aqui é explicitada pela palestrante sua compreensão particular dos conceitos de biodiversidade em suas dimensões genética, filogenética e funcional. Existe, potencialmente, a possibilidade de a perspectiva da palestrante ser distinta daquela que se encontra na apostila do curso, uma vez que não se podem desconsiderar questões pessoais na interpretação da palestrante sobre os conceitos.

COLETA E ANÁLISE DE DADOS

Além do caderno de campo, os dados utilizados para esta pesquisa foram provenientes de duas fontes: 1) a análise da apostila do curso de formação e 2) gravação da palestra na qual, explicitamente, as dimensões da biodiversidade foram abordadas. A coleta dos dados ocorreu com a gravação de vídeos e áudios. Os dados foram transcritos de acordo com as proposições de Preti (1999) e estruturados em episódios. Consideramos episódio como uma parcela do discurso com limitações claras em relação ao tema abordado, tarefa realizada ou fase didática.

Assim, para fins de análise, o curso de formação possui dois episódios: o primeiro ocorre na oficina 1 (dia 01), fase didática na qual se encontram as concepções prévias dos cursistas sobre a biodiversidade; o segundo episódio, nos demais dias do curso, foi a fase didática, após a palestra, na qual foram explicitados os conceitos de biodiversidade.

Quanto à análise da gravação da palestra, os episódios foram subdivididos em turnos de fala (TF), unidades menores de análise que contêm as falas sequenciais dos interlocutores - palestra e comentários dos cursistas. Considerou-se um TF o período em que cada interlocutor marca as mudanças de fala ao longo do diálogo.

Complementarmente, recorreu-se à análise de conteúdo descrita por Bardin (2011) para analisar a recontextualização do conceito de biodiversidade. Foi realizada a pré-análise do material por meio da leitura flutuante de todos os documentos que continham os dados, isto é, a apostila e a transcrição da palestra subdivididos em episódios e TF.

Após essa etapa, foi desenhada a codificação por meio da escolha das unidades de contexto (UC) e registo (UR). Assim, em cada episódio, os TF adjacentes e relacionados foram agrupados segundo determinado contexto de fala, compondo as UC. Nestas, os temas que surgiram do diálogo compuseram as UR. Optou-se pela UR temática porque ela extrapola um único TF, e como os sujeitos muitas vezes interrompem as falas uns dos outros, era necessária uma unidade que considerasse mais o tema da fala do que sua sequencialidade.

Transpondo estes conceitos para a presente pesquisa, os episódios anteriormente mencionados foram subdivididos de acordo com os contextos de fala (UC), os quais agrupam TF adjacentes e relacionados. Dentro de cada UC foram extraídos temas das falas dos sujeitos, que poderiam estar dentro de um único TF ou mais, de acordo com a maneira como seguiu a discussão; e esses temas compõem as UR.

A apostila não foi separada em episódios e em TF, uma vez que se tratava de um documento escrito. Para sua análise, houve a identificação dos contextos nos quais surgiam os diferentes tópicos abordados, formando as UC; e dentro destas se identificaram os temas, compondo as UR dentro do texto.

A pesquisa é do tipo dedutiva por partir de categorias e códigos pré-estabelecidos. Por isso, no momento de codificação, optou-se pela seleção de URs que contivessem relações com o tema “biodiversidade”. O critério de inclusão foi: o tópico principal diz respeito à biodiversidade. Os demais tópicos foram excluídos da análise.

As UR foram categorizadas e, para tanto, isoladas e classificadas, almejando determinada organização. Essa organização ocorreu de acordo com as dimensões da biodiversidade. O sistema de categorias foi previamente fornecido e buscou-se repartir as URs nesse sistema.

Foram estabelecidos novos critérios de inclusão e exclusão para as dimensões. Biodiversidade funcional: i) trata do papel do organismo em população, comunidade ou ecossistema; ii) menciona a interação com processos ecológicos (bióticos e abióticos); iii) menciona o papel das relações na geração e manutenção da biodiversidade (podendo ser em escala espacial e/ou temporal). Biodiversidade filogenética: i) Fala sobre relações evolutivas entre linhagens (nível populacional ou acima); ii) menciona um ou mais organismos sem vínculo com seu papel no ambiente, sendo esta considerada uma menção ao táxon. Biodiversidade genética: i) fala sobre a diversidade de sequências de nucleotídeos; ii) fala sobre a diversidade genômica, proteômica ou transcriptômica.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta seção são apresentadas as características do discurso instrucional relativo às dimensões da biodiversidade elaborado pelos agentes recontextualizadores atuantes no curso. Para tanto, foram analisados os textos da apostila e a palestra, segundo as categorias de dimensões da biodiversidade cujos critérios foram explicitados anteriormente.

Na apostila foram encontradas 9 UC e 88 UR, das quais 10 cumpriram os critérios de inclusão para compor as categorias das dimensões da biodiversidade. Na palestra houve 3 UC e 26 UR e, destas, 6 compuseram as categorias de interesse.

A fim de analisar a ocorrência da recontextualização do conceito de biodiversidade, foram elaborados os quadros 2, 3 e 4. Neles são apresentados o texto científico original, isto é, aquele retirado diretamente de sua fonte e o texto produzido pelos elaboradores do curso.

Para a dimensão filogenética da biodiversidade foram encontradas duas (2) UR na apostila e uma (1) na fala da palestrante. O Quadro 2 apresenta o texto original e as UR categorizadas nesta dimensão. Entre parêntesis está a codificação na ordem em que aparece na apostila e na fala.

Quadro 2 Unidades de registro categorizadas dentro da dimensão filogenética da biodiversidade. Entre parêntesis está sua codificação 

Qualitativamente, a UR 3 da apostila traz uma definição da dimensão filogenética próxima ao texto científico, alterando a sentença final de “como essas relações agregam na compreensão taxonômica” para “o que essas relações nos dizem sobre a taxonomia”. A UR 9 traz outras alterações, modificando o termo “relações evolutivas” para “processos evolutivos na manutenção da biodiversidade”, além de trazer acréscimo de exemplificação: “abarca eventos de surgimento e extinção de seres vivos”.

Bernstein (1996) diz que o texto recontextualizado, enquanto é deslocado e relocado por diferentes agentes no campo recontextualizador, passa por um processo de seleção, simplificação, condensação e elaboração que leva ao seu reposicionamento. Portanto, as modificações observadas, mesmo que singelas, caracterizam a existência de recontextualização na dimensão filogenética.

No caso da situação analisada, a apostila traz a manutenção dos principais conceitos da dimensão filogenética, resultando em um texto que, apesar de diferente, possui características que se aproximam do texto original.

A palestra resume toda a definição da dimensão na sentença: “relações evolutivas das relações filogenéticas”; além de trazer características próprias da fala, incluindo exemplificações sobre o conceito em “como a história de vida de uma população, de uma espécie”; também acrescenta um valor na importância da dimensão: “é importante para a manutenção da biodiversidade”.

Vê-se a existência de palavras-chave na compreensão da dimensão, tais como “relações evolutivas”, “taxonomia” e “relações entre linhagens”, mas o vínculo entre os termos é frágil e são utilizadas de repetições da palavra “relações”. Percebe-se que a fala busca apoio na exemplificação e no uso de valores para justificar a relevância da dimensão nas aulas de ciências.

Segundo Smith & colaboradores (2020), estudos filogenéticos possuem relação intrínseca com o estudo da evolução biológica das espécies, tema este que pode gerar conflitos nas aulas de ciências (Sharman & Harris, 1992). Historicamente podem ser apontados muitos motivos que distanciam a compreensão desse tema em sala de aula, tais como: má compreensão de termos e conceitos básicos (Bybee, 2001), sua alocação marginal e secundária em currículos e livros didáticos (Bizzo & El-Hani, 2009), além da influência de cosmovisões individuais e formação docente (Plutzer, Branch & Reid, 2020).

Essas situações geram, potencialmente, lacunas no entendimento da biodiversidade filogenética, que por sua vez dificultam a compreensão da origem da diversidade biológica por meio dos processos evolutivos. Assim, vemos como necessária a abordagem desta dimensão na formação de professores. Nesse contexto, a apostila apresenta um texto recontextualizado com menos lacunas, possivelmente auxiliando na compreensão desta dimensão, enquanto a recontextualização da fala criou ruídos entre os conceitos.

Para a dimensão funcional da biodiversidade, foram encontradas duas (2) UR na apostila e, na palestra, quatro (4). O quadro 3 apresenta as UR categorizadas.

Quadro 3 Unidades de registro categorizadas dentro da dimensão funcional da biodiversidade. Entre parêntesis está sua codificação 

Novamente as UR da apostila trazem uma definição da dimensão funcional muito próxima ao texto científico original, sendo verificadas majoritariamente adaptações de estilo linguístico. Ademais, tanto na UR 3 como na UR 9 verifica-se a alteração do termo “regulação de processos ecológicos” para “interação com processos ecológicos”.

A UR 17 da palestra parece trazer uma definição da dimensão, ao mesmo tempo que faz substituição de palavras como “organismo” para “seres vivos”, “processos ecológicos” por “relações ecológicas”; supressões, como ocorre com a palavra “comunidade”, com os temos “relações espaciais e temporais” e “interação com processos ecológicos”; e acréscimos, como no caso de “relações tróficas”. As UR 10, 25 e 26 são exemplificações da dimensão aplicadas à importância das abelhas para as questões ambientais, reprodução vegetal e cadeia alimentar.

As modificações supracitadas, tanto para a apostila como para a palestra são suficientes para caracterizar a recontextualização, tal como previamente discutido. No entanto, mais uma vez percebe-se que o texto escrito mantém características mais próximas do original quando comparado com a fala, situação que será discutida posteriormente.

Para a dimensão genética da biodiversidade foram encontradas duas (2) UR na apostila e uma (1) na fala da palestrante. O quadro 4 apresenta estes dados.

Quadro 4 Unidades de registro categorizadas dentro da dimensão genética da biodiversidade. Entre parêntesis está sua codificação. 

A UR 2 da apostila traz um texto similar à definição original, embora haja supressão do trecho “inclui (mas não está limitada)”. Já a UR 11, além de trazer a mesma supressão da UR 2, aparenta ser uma interpretação da definição. Nela, dá-se um valor e importância para a dimensão com a frase “considera componentes genéticos na manutenção da biodiversidade”; suprime-se o trecho “diversidade genômica (proteômica, transcriptômica)” ao substituir estes termos por “aspectos relacionados a variabilidade de genes dentro de espécies ou população”. A UR 11 apresenta características diferentes de recontextualização em comparação ao texto científico original e também à UR 2.

Na palestra há, novamente, a supressão do trecho “inclui (mas não está limitada)”, além da substituição da frase “diversidade de sequências de nucleotídeos em loci neutro ou codificante, bem como a diversidade genômica” pelo termo “variabilidade genética”.

Dentre os motivos que podem justificar a escolha deliberada da palestrante por simplificar os termos que definem a dimensão genética da biodiversidade, exploraremos dois: a complexidade dos conceitos e a natureza do curso de formação.

É possível que, em sua exposição, a palestrante tenha identificado a complexidade dos conceitos para o público-alvo em questão, uma vez que a dimensão se aproxima conceitualmente do nível genético da biodiversidade (Levéque, 1999). Autores como Castro (2017), Stern & Kampourakis (2017), Campos, Menezes & Araújo (2018) revelam que tópicos relacionados a este nível requerem elevado grau de abstração devido à profundidade de seus conceitos, tais como a função e natureza do material genético e o potencial de tecnologias genéticas. Os autores mencionam ainda que tais dificuldades ocorrem tanto no público geral quanto em estudantes de graduação. Dessa forma, na palestra pode ter ocorrido uma simplificação dos termos da dimensão para que a compreensão fosse facilitada. No entanto, os cursistas eram graduados e graduandos em Ciências Biológicas, isto é, um público especializado e provavelmente capacitado a compreender questões de genética molecular tal como designa a dimensão.

Além do público-alvo, um segundo ponto a se considerar é a natureza da palestra, pois tratava-se de um curso para a formação de professores. Loreto & Sepel (2006) afirmam que assuntos relativos à genômica possuem grande dificuldade de compreensão também para esse grupo. Os autores relatam a existência de um distanciamento entre a formação de professores e assuntos como a Biologia Molecular, Genética e Biotecnologia. Nesse contexto, a seleção dos termos utilizados pode ter ocorrido em decorrência de se enxergar o público-alvo como professores de ciências que não necessitam de demasiado aprofundamento teórico em sua formação.

No entanto, para quaisquer justificativas apontadas, tem-se como resultado a produção de um texto recontextualizado que difere em grande medida do original, podendo acarretar prejuízos na compreensão e utilização dessa dimensão nas aulas de ciências elaboradas futuramente pelos cursistas.

Essa situação é preocupante pois contribui para o distanciamento dos professores e estudantes de discussões sobre avanços biotecnológicos, como a pesquisa genômica, e da compreensão de aspectos genéticos da conservação da biodiversidade e da própria interpretação da Nova Lei da Biodiversidade. Para Leite (2000) e Stern & Kampourakis (2017), isso se deve, em grande medida, à forma como tais conceitos se encontram nos livros didáticos. Foi possível constatar que a palestra do curso não colaborou para sanar esta lacuna.

Ademais, o conhecimento da diversidade genética, como a interação entre genes e o ambiente, o impacto da deriva gênica ou da endogamia no pool genético de populações e a relação com a perda da diversidade genética é primordial para as ações de conservação e manejo em áreas de proteção ambiental (Fajardo, Vieira & Molina, 2016; Ouborg, 2010).

Nesse contexto, a compreensão sobre as dimensões da biodiversidade e, especialmente, a dimensão genética seria positiva para o apoio da população nas ações de conservação da biodiversidade em áreas de proteção ambiental, além da interpretação e cobrança para o cumprimento de normativas de proteção ambiental e fiscalização de órgãos reguladores. Para isso, é necessário ter acesso à informação de qualidade, de maneira democrática, a fim de se posicionar de modo crítico, discutindo e questionando, por exemplo, aspectos da implementação da Nova Lei da Biodiversidade.

A análise aqui descrita se deu entre agentes do mesmo campo recontextualizador pedagógico que, neste caso, é a universidade com suas pesquisas representada pelos elaboradores do curso e palestrante (Bernstein, 1996). No entanto, apesar de a quantidade de URs ser semelhante entre a apostila e a palestra, vê-se que qualitativamente esses discursos se distanciam e que cada UR possui características próprias.

A apostila normalmente possui uma UR com termos semelhantes aos usados no texto científico original, mas há acréscimos de termos provavelmente em uma tentativa de exemplificar a dimensão e aproximar do leitor. A recontextualização da palestra traz supressão de frases completas e/ou simplificação de termos, além do acréscimo de exemplos e a implementação de valores para justificar a importância das dimensões.

Historicamente existiu uma dicotomia entre textos orais e escritos, com os primeiros adquirindo um status inferior devido ao seu potencial de informalidade: sentenças curtas, redundância, entre outros (Marcuschi, 2001). No entanto, ao se considerar o processo de produção do texto mais do que seu produto, percebeu-se que ambos possuem graus de formalidade, organização e planejamento, permitindo o advento de uma nova perspectiva: “um continuum em cujas extremidades estão, de um lado, os textos orais, espontâneos e informais e, de outro, os textos escritos, planejados e formais” (Narzetti & Nobre, 2016, p. 295).

Assim, não é de nosso interesse discutir a superioridade ou inferioridade nos textos produzidos pelos agentes recontextualizadores, mas sim evidenciar as características da recontextualização sofrida em cada instância. A simplificação de termos, a exemplificação e a atribuição de valores não devem ser encaradas como evidências de pouca elaboração do texto, antes, como um tipo diversificado de elaboração da mensagem produzida durante a interação comunicativa (Narzetti & Nobre, 2016).

As definições fornecidas pela NSF possuem descrições estritamente científicas direcionadas a determinados focos de pesquisa, com pouco ou nenhum espaço para relações com o ensino. Na perspectiva dos agentes do campo de recontextualização pedagógica/DPR houve a adequação do texto científico ao contexto do curso, isto é, a modificação do discurso científico original para um texto “pedagogizado”: uma possibilidade de discurso pedagógico a ser utilizado em sala de aula. Esse movimento de recontextualização aproxima a apostila do DPL (cursistas) e a palestra, que ocorre em detrimento da fidedignidade ao discurso científico original.

Dentro do dispositivo pedagógico, a recontextualização sempre ocorrerá quando o texto original sair de seu campo de produção, pois “o princípio recontextualizador regula o novo posicionamento ideológico do texto em seu processo de relocação em um ou mais níveis do campo da reprodução” (Bernstein, 1996, p. 270-271, grifo nosso). Sendo assim, cabe à escolha ideológica dos agentes recontextualizadores a manutenção ou a inserção de perspectivas democráticas na reconfiguração desses textos e em sua transmissão. Isso ocorre por meio de uma intervenção do DPR que, motivado por suas ideologias de transformação cultural, busca fornecer ao DPL um discurso democrático.

Ademais, partindo do princípio de que as atividades do campo recontextualizador podem criar, manter, legitimar ou mudar o discurso que regula o ordenamento do dispositivo pedagógico, tem-se que o curso de formação almejou uma atividade de mudança, segundo sua perspectiva ideológica. Esta decorre de uma fonte potencial de conflito e resistência entre o campo recontextualizador pedagógico, no qual se incluem o DPR e o campo recontextualizador oficial, detentor do DPO.

Nesta visão, o curso de formação de professores proposto vem como uma possibilidade real de utilização das “brechas” presentes na estrutura do dispositivo pedagógico para a transformação cultural, pois “a mudança é uma consequência do potencial interior do dispositivo [pedagógico]” (Bernstein, 1996, p. 295). Ao se posicionar entre o DPO e o DPL, o curso tem o potencial de oferecer aos cursistas o enriquecimento de sua prática pedagógica durante a utilização de materiais didáticos advindos do DPR.

No entanto, não se pode desconsiderar a influência das idiossincrasias dos indivíduos no DPL, entre elas sua perspectiva ideológica, o saber-fazer docente, sua formação inicial e as experiências em sala de aula. Essas formam novas “brechas” para a recontextualização, podendo gerar um texto mais próximo ou mais distante do original. Portanto, defendemos a necessidade de o professor de Ciências ter consciência do processo de recontextualização, entendendo o micro contexto da sala de aula como um local de potencialidades para a transformação do macro contexto.

Reiteramos que a recontextualização não possui intrinsecamente um caráter negativo, pois é necessário que o conhecimento formulado na academia adentre em outras esferas, incluindo a escola. Neste sentido, a presente pesquisa torna-se relevante para compreender as reinterpretações adjacentes aos processos de circulação dos textos, isto é, sua incorporação pelo DPL, bem como o contexto nos qual isso ocorre. Para Lopes (2005) e Mainardes & Stremel (2010), o conceito de recontextualização pode auxiliar nas pesquisas das políticas educacionais e de currículo. O desvelamento das regras relativas aos processos educacionais no âmbito local (micro) e sua relação com condições estruturais (macro), tal como realizado neste trabalho, podem auxiliar na compreensão de um contexto mais amplo, o que inclui as questões políticas e educacionais (macro), contribuindo para a identificação de relações entre os processos de reprodução, recontextualização, resistência e transformação em diferentes níveis.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste trabalho foi descrita a recontextualização do texto científico por agentes em um curso de formação de professores. Para tanto, foi caracterizado e analisado o discurso instrucional transmitido pelos organizadores do curso. Utilizou-se uma abordagem metodológica qualitativa, com construção de uma ferramenta de análise que pode ser utilizada em pesquisas posteriores. Os resultados evidenciaram que o texto original assumiu características diferentes ao passar pelos agentes recontextualizadores, sendo que os textos produzidos possuíram características próprias.

Reiteramos a necessidade de uma formação docente que inclua as dimensões da biodiversidade. O docente formado com tais perspectivas poderá planejar atividades que despertem nos estudantes uma consciência crítica em relação ao mundo, fornecendo condições para que eles sejam capazes de discutir assuntos relacionados às questões socioambientais, alinhando-se a perspectivas ideológicas democráticas e manifestando a esperança da transformação do macro contexto.

Para prosseguimento deste trabalho, propõe-se a análise do discurso dos cursistas ao longo do curso, verificando se houve, nessa instância, a recontextualização das dimensões da biodiversidade e, se sim, quais são suas características. Em caso positivo, pode-se ainda analisar se a recontextualização aproximou-se mais do texto da apostila ou da palestra, investigando a influência da mediação na construção do DPL.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior- Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

Agradecimentos

O CECIMIG agradece ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico) e à FAPEMIG , (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais) pela verba para editoração deste artigo.

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Recebido: 06 de Dezembro de 2021; Aceito: 15 de Novembro de 2022

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Editor responsável: - Rosana Louro Ferreira Silva

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