1 Introdução
Em 2017, a educação superior catarinense completou o seu primeiro centenário, respondendo hoje pela sétima colocação no país quanto ao número de cursos presenciais de graduação ofertados. De acordo com os dados do INEP, o estado de Santa Catarina possuía, em 2015, 328.683 matrículas em cursos presenciais e a distância, sendo 248.959 estudantes em IES privadas e 79.724 em instituições públicas federais. (MEC/INEP, 2017)
A expansão da educação superior em SC, a despeito de ter se dado sob a influência das políticas e das dinâmicas nacionais, ocorreu em tempos, formas e escalas muito particulares. Há especificidades que cabe reconhecer e analisar a partir dos contextos e realidades locais/regionais. As variáveis tempo e espaço e as dimensões políticas, econômicas, sociais e culturais devem ser consideradas, pois exercem notável influência. A expansão está longe de ser homogênea, especialmente quando a análise recai sobre as especificidades regionais. A interiorização da educação superior em SC começou a ser impulsionada a partir da segunda metade dos anos 60, por meio de políticas públicas voltadas à criação das fundações educacionais de direito privado. Estas, majoritariamente criadas pelos poderes públicos municipais, foram responsáveis pela implantação dos primeiros cursos de graduação nas principais cidades de SC, dando origem, mais tarde, às universidades comunitárias. A partir do início dos anos 2000, ocorre um notável crescimento do número de IES, passando de 22 em 1995, para 94 em 2015, sendo que 88% delas são privadas. Além disso, 73% das IES definem-se como faculdades; 14% como universidades; 11% como centros universitários e 2% como institutos federais (MEC/INEP, 2015)
Tendo como propósito central a análise das principais dinâmicas que caracterizam a educação superior catarinense nos seus cem anos de história, este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa realizada entre agosto de 2015 a julho de 2017, desenvolvida por métodos e técnicas tanto quantitativos quanto qualitativos. Além de uma revisão bibliográfica sobre a temática, tendo como referência Cunha (2007), Saviani (2007, 2010), Romanelli (1989), Freitag (1980), Muniz (2006), Sampaio (2000), Pegoraro (2006, 2013), Gumbowsky (2004), procedeu-se a uma extensa pesquisa documental, tendo como base leis, decretos, documentos, relatórios, sítios institucionais, boletins de balanço, livros, artigos, dissertações e teses, bem como uma sistematização dos indicadores sobre número de IES, unidades/campi/polos, cursos, vagas, matrículas e concluintes, utilizando a base de dados de INEP, IBGE, Plataforma Sucupira e GeoCapes.
2 A gênese da educação superior catarinense: as primeiras faculdades
Em Santa Catarina, assim como na maioria dos estados da federação, a implantação dos primeiros cursos superiores se deu apenas no século XX. A primeira IES criada foi o Instituto Politécnico, em 1917, sediado em Florianópolis, que surgiu da iniciativa de alguns profissionais residentes na capital catarinense como cirurgiões-dentistas, farmacêuticos, médicos, engenheiros, bacharéis em direito, um oficial da marinha e um guarda-livros. Nela funcionavam os cursos de Odontologia, Farmácia, Engenharia e Comércio. Anos mais tarde, professores do próprio Instituto deram origem à Faculdade de Direito, que funcionou por meio de doações até 1934 (PEGORARO, 2006).
No ano seguinte, em 1935, a Constituição Estadual estabeleceu que o governo do estado devia assumir a responsabilidade com a condução dessa instituição, determinando, em seu Art. 129, que competia ao “Estado custear o ensino normal e manter ou subvencionar o ginasial, o ‘superior’ e o profissional de artes e ofícios.” (grifo nosso). No mesmo ano, por meio da Lei nº 19, de 20 de novembro de 1935, a Faculdade de Direito foi estatizada. Três anos depois, o Decreto-Lei nº 120, de 9 de junho de 1938, tornou-o instituto “livre e particular”. Somente em 1956 a faculdade foi federalizada, ano em que o estado volta a ofertar o ensino superior público. O movimento da federalização assumia o viés de responsabilização do Estado sobre questões públicas, embora o acesso à educação superior da época apenas estivesse à disposição de grupos sociais muito restritos.
3 A criação da primeira Universidade Pública
Do ponto de vista da ampliação das oportunidades de acesso à educação superior, a década de 1960 foi marcante para a sociedade catarinense. Até então, as faculdades isoladas predominavam, não só em Santa Catarina, mas em todos os estados, embora já existissem no cenário nacional destacadas instituições públicas e privadas como a UFPR, USP, UFRJ, UFRGS, UFMG, UFBA, as PUCs, dentre outras. Essas universidades nasceram a partir da aglutinação de cursos superiores isolados já existentes na época, especialmente as públicas, e se localizavam nas capitais.
Somente a partir da década de 1960 a política de expansão começa a ser delineada, momento em que Santa Catarina institui a sua primeira universidade pública e gratuita, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Sancionada no dia 18 de dezembro de 1960, a Lei nº 3.849/60 que deu origem à UFSC introduz no estado um modelo completamente novo de IES (a universidade), rompendo assim com a tradição de faculdades isoladas no estado. Sendo uma organização acadêmica universitária pública e gratuita, a instituição passa a ofertar, além do ensino, também pesquisa e extensão. Similarmente às demais universidades existentes, a UFSC foi criada a partir da aglutinação de diferentes faculdades e cursos isolados existentes em Florianópolis.
A criação da UFSC, ocorrida 43 anos após a implantação dos primeiros cursos superiores em Florianópolis, teve forte repercussão, particularmente entre as lideranças políticas e educacionais das principais cidades de SC, que já vinham demandando ao governo estadual a interiorização da educação superior. Os municípios de maior porte econômico passam a pleitear a criação de instituições que viabilizassem a implantação e expansão da educação superior no Estado.
4 A interiorização e a criação da segunda Universidade Pública
Os anos de 1960 e 1970 marcaram a primeira fase de expansão da educação superior em diversas regiões catarinenses, seguindo uma política orientada pelo I Plano de Metas do Governo (I PLAMEG),1 que, ao determinar a reorganização da Secretaria da Educação e Cultura (Lei nº 2.975, de 18/12/61), criou o Conselho Estadual de Educação (CEE/SC), que teve decisiva importância no desenvolvimento da educação superior no interior nos anos seguintes. O CEE passa a incentivar e orientar a criação de instituições na direção da interiorização e a administração pública estadual a adotar políticas específicas direcionadas à expansão.
Quando falamos da expansão, interiorização ou regionalização da educação superior em Santa Catarina, necessariamente precisamos nos referir ao sistema fundacional. As administrações públicas municipais e as lideranças empresariais e comunitárias das diferentes regiões passaram a requisitar a implantação de cursos superiores nas principais cidades do interior. A despeito das mobilizações que defendiam a criação de mais IES públicas (federais e estaduais), não havia naquele momento condições políticas e orçamentárias para promover a expansão do ensino superior público e gratuito pelo interior do estado. Face à pressão proveniente das lideranças políticas, empresariais, religiosas, sociais e educacionais dos principais municípios, o governo estadual decide, por meio de inúmeras políticas e ações, apoiar a expansão por meio da criação de fundações educacionais de direito privado. Foram elas que viabilizaram, naquele momento histórico, a criação de muitos cursos no interior e que, com o seu crescimento e fortalecimento, vieram a integrar um sistema de educação superior.
Na época, o acelerado processo de industrialização e de urbanização do país passou a demandar fortemente a expansão dos cursos de graduação e pós-graduação. No início da década, após treze anos de tramitação e debates, o Congresso Nacional aprovou as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), sancionando a Lei nº 4.024/61 em 20 de dezembro. A LDB regulamentou uma modalidade institucional que viria a ser amplamente apoiada e expandida em Santa Catarina: trata-se das fundações educacionais de direito privado sem fins lucrativos. Em seu Art. 107, a Lei assim se refere:
Art. 107. O poder público estimulará a colaboração popular em favor das fundações e instituições culturais e educativas de qualquer espécie, grau ou nível sem finalidades lucrativas, e facultará aos contribuintes do imposto de renda a redução dos auxílios ou doações comprovadamente feitas a tais entidades. (Lei nº 4.024/61)
Anos depois, em 1968, a Reforma Universitária também contribuiu para o fortalecimento do sistema fundacional ao estabelecer, em seu Art. 2º, que “o ensino superior indissociável da pesquisa será ministrado em universidades e, excepcionalmente, em estabelecimentos isolados, organizados como instituições de direito público ou privado” (Lei nº 5.540/68). A interiorização passou a ser concebida e implementada por meio das fundações educacionais, também regulamentadas pelo Decreto-Lei nº 200, de 1967. Em seu inciso IV, do Art. 5º, o Decreto assim define fundação pública:
IV - Fundação Pública - a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por recursos da União e de outras fontes. (Incluído pela Lei nº 7.596, de 1987)
Conforme descreve Pegoraro (2006), nos anos de 1960 começa a surgir, em municípios de médio e pequeno porte, um conjunto de instituições privadas sem fins lucrativos. Trata-se de uma modalidade específica de fundações educacionais, criadas pelo poder público municipal, porém de direito privado, definidas como IES filantrópicas e sem fins lucrativos (FRANTZ, 2004; PEGORARO, 2006; TREVISOL, 2015). Inserem-se no arco das entidades do “terceiro setor” na medida em que são públicas não-estatais, cuja finalidade principal é promover atividades de interesse público sem fins lucrativos. Na definição de Pegoraro (2006, p. 195) “[…] o Terceiro Setor é composto de organizações privadas sem fins lucrativos, que atuam nas lacunas deixadas pelos setores públicos e privados, mas são atividades de interesse público, buscam o bem-estar social […]”.
As fundações municipais passaram a ser o ente jurídico por meio do qual tornava-se possível solicitar ao Conselho Estadual de Educação a autorização dos primeiros cursos de graduação, cuja implantação se deu em estruturas alugadas e com limitadas condições de infraestrutura de pessoal, bibliotecas e laboratórios. Por serem entidades públicas de direito privado, a cobrança de mensalidades tornou-se possível, constituindo-se, ao longo do tempo, como a principal fonte de financiamento das IES catarinenses. De forma lenta e progressiva, o Conselho Estadual de Educação passou a autorizar os primeiros cursos, voltados, na sua grande maioria, para o atendimento das necessidades do campo educacional e da administração pública e de empresas. Priorizou-se, na fase inicial, a implantação dos cursos de Administração, Contabilidade, Pedagogia, Letras, Ciências (Licenciatura Curta), Estudos Sociais e Direito.
Para demonstrar a pertinência desse período, apresentamos, no Quadro 1, a relação das instituições criadas no período de 1964 a 1986.
Quadro 1: Relação das Fundações educacionais de ensino superior no estado de Santa Catarina criadas no período de 1964 a 1986
Instituição | Sigla | Ano de criação | Cidade | Região |
Fundação Educacional da Região de Blumenau | FURB | 1964 | Blumenau | Vale |
Fundação Educacional do Sul de Santa Catarina | FESSC | 1964 | Tubarão | Sul |
Fundação Joinvillense de Ensino | FURJ | 1965 | Joinville | Norte |
Fundação das Escolas Unidas do Planalto Catarinense | UNIPLAC | 1965 | Lages | Serrana |
Fundação do Estado de Santa Catarina | FESC | 1965 | Florianópolis | Grande Florianópolis |
Faculdade de Administração de Empresas do Alto Vale do Itajaí | FEDAVI | 1966 | Rio do Sul | Vale |
Fundação Educacional de Criciúma | FUCRI | 1968 | Criciúma | Sul |
Fundação Universitária do Oeste Catarinense | FUOC | 1968 | Joaçaba | Oeste |
Fundação Educacional do Planalto Norte Catarinense | FUNPLOC | 1970 | Canoinhas | Planalto Norte |
Fundação de Ensino do Polo Geoeducacional do Vale do Itajaí | FEPEVI | 1970 | Itajaí | Vale |
Fundação de Ensino do Desenvolvimento do Oeste | FUNDESTE | 1971 | Chapecó | Oeste |
Fundação Educacional e Empresarial do Alto Vale do Rio do Peixe | FEMARP | 1971 | Videira | Oeste |
Fundação Educacional do Alto Vale do Rio do Peixe | FEARPE | 1971 | Caçador | Oeste |
Fundação Educacional do Norte Catarinense | FUNORTE | 1971 | Mafra | Planalto Norte |
Fundação Educacional de Brusque | FEBE | 1973 | Brusque | Vale |
Fundação Educacional Barriga Verde | FEBAVE | 1974 | Orleans | Sul |
Fundação Educacional do Alto Uruguai Catarinense | FEAUC | 1976 | Concórdia | Oeste |
Fundação Educacional do Planalto Catarinense | FEPLAC | 1976 | Curitibanos | Serrana |
Fundação Educacional Regional Jaguaraense | FERJ | 1976 | Jaraguá do Sul | Norte |
Fundação Educacional do Extremo Oeste de Santa Catarina | FENESC | 1978 | São Miguel do Oeste | Oeste |
Fundação Educacional dos Municípios do Alto Irani | FEMAI | 1986 | Xanxerê | Oeste |
Fonte: Pegoraro (2006, p. 207-208); Trevisol (2015, p. 515). Elaboração dos autores.
Analisando o Quadro 1, é possível identificar, pelo número de fundações criadas, que Santa Catarina assume uma política diferenciada dos demais estados ao criar um sistema de educação superior basicamente organizado a partir de fundações. Num período de 22 anos, entre 1964 a 1986, foram criadas 21, sendo 8 delas na década de 1960, 12 nos anos de 1970 e uma apenas na década de 1980. Desse total, 20 foram ciadas num período de 14 anos; entretanto, de 1968 a 1976, num período de 8 anos, foram criadas 13 fundações.
É importante destacar que todas as fundações foram criadas pelo poder público, 20 delas pelos legislativos municipais e uma apenas pelo legislativo estadual, a Fundação Educacional de Santa Catarina (FESC), instituição que, na sequência, por iniciativa do governo do Estado, por meio do Decreto nº 2.802, de 20 de maio de 1965, criou a segunda universidade catarinense, a Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Essa universidade estadual surgiu da aglutinação da Faculdade de Educação (FAED), do Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais (CEPE), da Fundação Educacional de Santa Catarina (FESC) e da Faculdade de Engenharia de Joinville, as demais fundações continuaram atuando como faculdades isoladas.
Conforme destaca Mathias (2015, s/p), a UDESC constava do Plano de Metas (1961-1966) do então Governador Celso Ramos. Cabe destacar que em 1966 o então governador Ivo Silveira assumiu com o compromisso de implementar o Plano de Metas, que previa interiorizar a educação superior. Ao longo do seu mandato foi aprovado o Plano Estadual de Educação (PEE 1969-1980) que estabelecia o
Entrosamento entre a Universidade para o Desenvolvimento do Estado de Santa Catarina, UDESC, e a Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC, para que estas, através da formação de grupo interuniversitário, liderem o desenvolvimento do ensino superior no Estado, vinculem ou assistam as diversas unidades isoladas do interior e fixem, através de plano específico a ser coordenado com o Conselho Estadual de Educação, a política de expansão desse ramo de ensino. (UDESC, 1969, p. I. 14)
Foi o que ocorreu em 1968 quando a UDESC foi designada para desenvolver um estudo de viabilidade técnica e financeira para a instalação dos primeiros cursos de nível superior no Oeste catarinense. Até então os cursos superiores ficavam localizados na Região Serrana (em Lages) e na região litorânea. O estudo desenvolvido destacou a população de 285.961 habitantes, indicou ainda a existência de 12.076 alunos matriculados no 1º ciclo dos diversos cursos de Ensino Médio e de 2.143, no 2º ciclo. Enfatizou que a região não possuía cursos técnicos e que, além dos estabelecimentos de ensino comercial, havia apenas um ginásio agrícola no município de Concórdia. Apontou, em conclusão, que Joaçaba era a cidade adequada para a implantação de curso superior (UDESC, 2009). Dessa forma, em 1972, iniciam-se as aulas do primeiro curso superior na região Oeste, a única do estado que ainda não contava com cursos superiores.
Retomando a análise dos dados do Quadro 1, é possível constatar que num período muito curto as fundações são instaladas nas diferentes regiões do estado. Praticamente todos os municípios de médio e grande porte passaram a ter instituições de educação superior. Os municípios, de um modo geral, empreenderam esforços nessa direção, pois a presença de cursos superiores era tida como vantagem competitiva e forma de atrair estudantes e professores mais qualificados. A expansão trouxe consigo a necessidade de criar uma entidade responsável pela coordenação das ações e iniciativas das diferentes fundações. Assim, em 1974 foi criada a Associação Catarinense das Fundações Educacionais (ACAFE).
A partir da segunda metade da década de 1980, inicia-se em Santa Catarina um amplo movimento que visava transformar as fundações educacionais em universidades. Diversos fatores estão na raiz desse processo, cabendo destaque para o fato de que as fundações haviam crescido significativamente, tanto do ponto de vista acadêmico (número de cursos, professores e funcionários) quanto de infraestrutura. Além disso, começava a se fazer presente um forte apelo das comunidades regionais por mais oportunidades de formação aos jovens, principalmente os oriundos das famílias que não possuíam condições de manter seus filhos estudando em centros urbanos. A questão de organizar uma IES no modelo de universidade também conferiria mais autonomia ao ente, por exemplo na proposição de novos cursos.
Para melhor acompanharmos desse processo, apresentamos o Quadro 2, que mostra a transformação das instituições em universidades, acompanhadas dos respectivos anos de reconhecimento.
Quadro 2: Criação das Universidades a partir das Fundações Educacionais no estado de Santa Catarina
Fundação | Instituição | Ano de reconhecimento | Cidade |
UDESC | Universidade do Estado de Santa Catarina | 1965 | Florianópolis |
FURB | Universidade Regional de Blumenau - FURB | 1986 | Blumenau |
FEPEVI | Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALLI | 1989 | Itajaí |
FESSC | Universidade do Sul de Santa Catarina - UNISUL | 1989 | Tubarão |
FUOC, FEMARP, FUNDESTE, FENESC, FEMAI | Universidade do Oeste de Santa Catarina - UNOESC | 1995 | Joaçaba |
FURJ | Universidade da Região de Joinville | 1996 | Joinville |
FEARPE, FUNPLOC, FUNORTE, FEAUC, FEPLACI | Universidade do Contestado - UnC | 1997 | Caçador |
FUCRI | Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC | 1997 | Criciúma |
UNIPLAC | Universidade do Planalto Catarinense - UNIPLAC | 1999 | Lages |
FERJ | Centro Universitário de Jaraguá do Sul - UNERJ | 2000 | Jaraguá do Sul |
FEDAVI | Universidade da Região do Alto Vale do Itajaí - UNIDAVI | 2001 | Rio do Sul |
FUNDESTE | Universidade Comunitária Regional de Chapecó - UNOCHAPECÓ | 2002 | Chapecó |
FEBE | Centro Universitário de Brusque - UNIFEBE | 2003 | Brusque |
FEARPE | Universidade Alto Vale do Rio do Peixe | 2009 | Caçador |
Fonte: Pegoraro (2006, p. 120 e 123); Trevisol (2015, p. 515). Elaboração dos autores.
Considerando o Quadro 1 comparativamente ao Quadro 2, podemos observar redução no número de IES com a criação das universidades, visto que houve aglutinação de instituições (fundações) que, para cumprir legalmente as condições necessárias para o encaminhamento dos processos e obtenção de reconhecimento como universidade, deveriam apresentar um maior número de cursos e/ou áreas de conhecimento.2 Como isoladamente não era possível atender tais exigências, a saída foi criar uma nova instituição que congregasse as fundações pretendentes ao reconhecimento.
Com exceção da UDESC, as demais universidades são reconhecidas a partir da segunda metade da década de 1980, período em que as políticas neoliberais começam a influenciar as decisões dos governos federal e estaduais. De forma mais acentuada, deliberadamente favorece a aglutinação de instituições privadas, especialmente do terceiro setor, fortalecendo o argumento de Fernandes (2002) de que elas não são instituições particulares, mas públicas, porém administradas de forma privada.
A UDESC é a única instituição pertencente ao sistema que oferece educação superior gratuita. Ela assumiu a característica de instituição de direto público somente em 1989, com a nova Constituição do Estado de Santa Catarina. Até então, era mantida como as demais, cobrando mensalidades. A partir da Constituição, atendendo ao que determina o Art. 169, que trata do ensino superior, e o Art. 39 das disposições transitórias, e por pressões dos estudantes que cobravam do Estado maior participação com investimentos na educação pública superior, a UDESC passou à forma de fundação pública mantida pelo Estado.
A partir dos anos 1990, com a nova reestruturação econômica mundial, a denominada globalização neoliberal, o sistema de educação superior catarinense também será modificado. Com a ideia de que a educação passa a ser também um produto de mercado, o sistema privado de natureza particular senso estrito, empresarial e com fins lucrativos, começa a competir com o modelo fundacional até então predominante. É uma nova fase da educação superior catarinense.
5 A expansão das IES particulares
O ano de 1997 marca o vertiginoso crescimento do número de IES em Santa Catarina, sobretudo de instituições privadas com fins lucrativos. Como se pode observar no Gráfico 1, entre 1990 e 2015 o número de IES cresceu 370% (de 20 em 1990, para 94, em 2015). A maior expansão se deu entre 2000 e 2005, um crescimento de 135,7%, crescimento alavancado, sobretudo, pelas IES privadas com fins lucrativos, especialmente as que passaram a ofertar a modalidade a distância.

Fonte: INEP/MEC (2015). Elaboração dos autores.
Gráfico 1: Evolução do número de IES em Santa Catarina (1990-2015)

Fonte: INEP/MEC (2015). Elaboração dos autores.
Gráfico 2: Distribuição das IES em Santa Catarina por dependência administrativa (2015)
A expansão observada tem relação direta com a mudança do marco regulatório das políticas de educação superior introduzidas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (Lei nº 9.394/96). A nova LDB desencadeou um processo de profunda reformulação do sistema de educação superior brasileiro.
Além da LDB, algumas outras leis sancionadas nos anos seguintes foram decisivas para reforçar a perspectiva privatizante do ensino superior. O legislativo brasileiro, por meio da Lei n. 9.870/99, ratificou a possibilidade de as IES operarem com fins lucrativos. O governo, por meio da Lei n. 9.649/98, obstruiu o caminho da expansão da educação pública federal e impediu a União de expandir a oferta da educação profissional e tecnológica (RISTOFF; GIOLO, 2006). Por fim, o então Presidente da República vetou as metas do Plano Nacional de Educação, Lei n. 10.172/2001, itens 4.3,2 e 4.4,24, que previam a expansão da educação superior pública. Em virtude disso, as instituições privadas tiveram um enorme crescimento, passando de 893, em 1990, para 2.416 IES, em 2012. O setor privado capitaneou a expansão: 87,5% das IES são privadas, respondendo por 73% das matrículas do país. (MEC/INEP, 2014)
Em Santa Catarina o setor privado (com e sem fins lucrativos) respondia, em 2015, por 88% das IES e cerca de 69% do total das matrículas.
Outra decorrência importante do marco regulatório que se esboça a partir da LDB é a expansão das faculdades. O crescimento se dá, portanto, na modalidade de IES que exige menor investimento em infraestrutura, qualificação docente e pesquisa.
As instituições privadas com fins lucrativos (for profit3) são, em geral, instituídas e mantidas por uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas de direito privado que não apresentem as características de filantropia. Às faculdades não é requisitada a oferta de cursos em diversas áreas de conhecimento, assim como não é exigida a pesquisa e a existência de programas de pós-graduação stricto sensu. Como se pode observar no Gráfico 3, 73% das IES catarinenses em 2015 definiam-se como faculdades.

Fonte: INEP/MEC (2015). Elaboração dos autores.
Gráfico 3: Distribuição das IES em Santa Catarina por organização acadêmica (2015)
6 A interiorização das IES públicas
Uma das características marcantes da educação superior catarinense, a exemplo do que ocorre em todo o território nacional, é a concentração da oferta de cursos no setor privado. Até 1989 a UFSC era a única IES a ofertar ensino público e gratuito no estado, ano em que a UDESC, atendendo ao estabelecido no Art. 169 da nova Constituição do Estado, interrompe a cobrança de mensalidades e passa a assegurar o princípio da gratuidade.
A expansão das IES públicas, especialmente para as cidades do interior, é muito recente. Nesse sentido, a UDESC4 (única universidade estadual) é pioneira por ter iniciado o movimento nessa direção em 2003, quando aprovou a implantação do Centro de Educação Superior do Oeste (Diário Oficial do Estado, nº 17.086, de 31 de janeiro de 2003), autorizando a oferta dos cursos de Zootecnia (Chapecó), Enfermagem (Palmitos) e Engenharia de Alimentos (Pinhalzinho). A UFSC, por sua vez, manteve-se até 2009 como a única universidade federal sediada na capital do estado e estruturada em um único campus, ano em que aprovou a criação de seus três primeiros campi fora de Florianópolis nas cidades Araranguá, Joinville e Curitibanos. Em 2009 ocorreu também a criação da segunda universidade federal no estado, a Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), com sede na cidade de Chapecó5 e campi espalhados pelos 3 estados da região Sul. A interiorização foi impulsionada pelas políticas de expansão do governo federal, particularmente o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI)6, o Programa Universidade Aberta do Brasil (UAB) e o Programa de Reestruturação da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
A interiorização da educação superior também foi impulsionada pelo programa de expansão dos institutos federais. No bojo dessa política, o estado de Santa Catarina foi contemplado com dois institutos: o primeiro, com sede em Florianópolis (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina - IFSC), e o segundo, em Blumenau (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Catarinense - IFC). Resultantes da aglutinação de escolas agrotécnicas e CEFETs já existentes, os institutos implantam campi7 e cursos superiores em várias cidades do estado.
As instituições públicas federais correspondem a 4% do total das IES catarinense. Do total de estudantes matriculados em cursos presenciais e a distância em SC, em 2015 (328.683 ao todo), as públicas respondiam por 79.724 matrículas. (MEC/INEP, 2017)
7 A expansão da Educação a Distância
A modalidade a distância vem, desde o início dos anos 2000, liderando o último e o mais recente ciclo de expansão da educação superior em SC. Como é possível observar no Gráfico 4, as matrículas em cursos de graduação (presencial e a distância) cresceram 419% no período entre 1995 a 2015, passando de 64.201 para 333.308 matrículas (239.957 presenciais e 93.351 a distância).

Fonte: INEP/MEC (1995-2015). Elaboração dos autores.
Gráfico 4: Distribuição das matrículas em cursos de graduação presencial e a distância em Santa Catarina (1995-2015)
Em 2015, a modalidade a distância já respondia por 28% do total de matrículas no estado. O ritmo anual de crescimento é bastante superior ao verificado na modalidade presencial. Enquanto o crescimento das matrículas presenciais no último decênio (2005-2015) foi de 23,5%, passando de 194.130 para 239.957, o da educação a distância foi de 446%, passando de 16.492 em 2005 para 93.351 em 2015.
Considerações finais
Ao celebrarmos o 1º centenário da educação superior catarinense, é necessário afirmar que se trata de um período, embora iniciado tardiamente, com destacadas conquistas e, por vezes, contradições. Os diferentes períodos de evolução da educação superior catarinense revelam que os avanços, numa perspectiva de desenvolvimento social, eram mais contundentes em alguns tempos e espaços, enquanto em outros apenas atendiam a grupos estratificados da sociedade. Essa evolução decorre dos desafios políticos, econômicos, sociais e culturais que se apresentaram nos diferentes tempos e espaços.
Na gênese do sistema de educação superior catarinense, o que era próprio do tempo e do espaço, o acesso à educação superior por meio de faculdades isoladas criadas pelo Instituto Politécnico era restrito a grupos muito seletos de pessoas situadas, principalmente, na capital. A criação da primeira universidade pública gratuita foi, com certeza, um marco importante, pois colocou o estado numa outra perspectiva de desenvolvimento, agora não mais só com o ensino, mas também com a pesquisa e a extensão. Embora tenha ampliado o acesso à educação superior, a educação superior ainda continuava mais vinculada ao litoral catarinense.
Os anos de 1960 são marcantes do ponto de vista da expansão da educação superior para outras regiões do estado. Nesse período começa uma relação de pertinência entre governos e sociedade civil. Por mais de 2 décadas, por incapacidade financeira para ampliar o sistema público gratuito e por direcionamento político, o estado incentivou a criação de fundações educacionais isoladas que irão articular a expansão da educação superior para todas as regiões. É a primeira fase da expansão do acesso a cursos superiores. É nessa primeira fase da expansão que foi criada a UDESC, seguindo os mesmos moldes das demais fundações cuja viabilização econômica estava lastreada na cobrança de mensalidades. Em 1989, quando da reestruturação da Constituição Estadual, a UDESC só se tornou totalmente pública e gratuita por causa dos movimentos da sociedade civil, especialmente os de estudantes e professores. A UDESC também desempenhou um papel importante na expansão da educação superior no Estado.
O segundo período da expansão foi marcado pela transformação das faculdades isoladas em universidades. Algumas instituições conseguem com mais facilidade essa ascensão; entretanto, outras precisam se juntar para alcançar esse objetivo. O que vemos também é uma política de conveniência, pois as rivalidades regionais que eram muito presentes e causavam divisões agora se enfraquecem, dando espaço à adesão.
De certa forma, é possível considerar que, embora existisse o incentivo do Estado para a expansão da educação superior para outras regiões, a responsabilidade de manutenção financeira ficava sob a responsabilidade dos municípios, entes criadores das fundações, num primeiro momento, e, na sequência, da própria instituição que era obrigada a cobrar mensalidades para a sua manutenção. Há aqui uma política de conivência do estado ou até mesmo do país com relação ao oferecimento da educação superior.
A segunda metade da década de 1990 é marcada pela ampliação do sistema privado particular. Muitas instituições privadas, até então presentes na capital e nos grandes centros do País, migram para as diferentes regiões do estado, desestabilizando, de certa forma, o sistema existente. A concorrência aumenta e a política de diplomação sem compromisso social com o processo de aprendizagem e a pesquisa se torna mais evidente.
Na contrapartida do sistema privado particular, mercantil, outra luz se acende: a ampliação do sistema público gratuito, com três novos campi da UFSC, extensões da UDESC e o campus da UFFS, além dos institutos federais em grande parte dos municípios do estado. Esse fenômeno com certeza produziu novas expectativas de desenvolvimento para toda Santa Catarina.
Na atualidade, embora ainda com uma participação muito pequena do setor público gratuito e mesmo considerando suas dimensões e realidades espaciais socioeconômicas contraditórias, Santa Catarina é o terceiro estado em desenvolvimento humano no país. E para isso pode contar, certamente, com a participação dos profissionais formados pelas instituições de educação superior ao longo desses 100 anos.