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Eccos Revista Científica

versión impresa ISSN 1517-1949versión On-line ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.64 São Paulo  2023  Epub 12-Feb-2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n64.21869 

Artigos

MAPAS NARRATIVOS SOBRE ESPAÇOS SIGNIFICATIVOS IDENTIFICADOS NO CEU BUTANTÃ.1

NARRATIVE MAPS ABOUT SIGNIFICANT SPACES IDENTIFIED IN CEU BUTANTÃ

MAPAS NARRATIVOS DE LOS ESPACIOS SIGNIFICATIVOS IDENTIFICADOS EN EL CEU BUTANTÃ

Leandro Alves Lopes, Doutorando em Educação Arte e História da Cultura1 
http://orcid.org/0000-0003-2819-2932

Maria Candida Varone de Morais Capecchi, Doutora em Ensino de Ciências2 
http://orcid.org/0000-0003-2614-7206

Adriana de Carvalho Alves Braga, Doutorando em Educação Arte e História da Cultura3 
http://orcid.org/0000-0002-9729-728X

1Doutorando em Educação Arte e História da Cultura. Universidade Presbiteriana Mackenzie _ UMP. São Paulo, SP - Brasil.

2Doutora em Ensino de Ciências, Universidade Federal do ABC - UFABC. São Caetano, SP - Brasil.

3Doutorando em Educação Arte e História da Cultura. Universidade Presbiteriana Mackenzie _ UMP. São Paulo, SP - Brasil.


Resumo

Considerando que a presença de um Centro Educacional Unificado (CEU) impacta de forma direta e indireta toda a comunidade do seu entorno, compreendendo esse equipamento dentro de uma política pública intersecretarial, que atua de forma positiva na transformação da comunidade e na promoção da cidadania, o presente artigo tem como objetivo analisar os relatos de cinco estudantes dos 6º e 7 ano do ensino fundamental II, sobre os locais mais utilizados por elas no CEU Butantã, buscando compreender o processo que transforma e ressignifica esses lugares em espaços significativos. Esses locais foram identificados em mapas desenhados pelas estudantes, que justificaram suas escolhas por meio de entrevistas realizadas na forma de uma roda de conversa. Os mapas e relatos foram analisados a partir dos conceitos de lugar e de espaço de Michel de Certeau, em diálogo com o conceito de território de Milton Santos, e tendo como referência a dimensão da Pedagogia Social. A análise dos mapas e dos relatos sugere a importância da aprendizagem entre pares para crianças e adolescentes e a apropriação das políticas e dos equipamentos públicos de cultura, informática, arte, esporte e lazer como fundamentais neste processo. Nas falas das adolescentes pudemos inferir a utilização dos espaços considerados significativos em conjunto com suas famílias e amigos, importante para convivência para o exercício do direito à Convivência Familiar e Comunitária preconizada no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Palavras-chave: apropriação; convivência familiar; espaço; mapas narrativos; território.

Abstract

Considering that the presence of a Unified Educational Center (CEU) directly and indirectly impacts the entire surrounding community, comprising this equipment within an interdepartmental public policy, which acts positively in the transformation of the community and in the promotion of citizenship, This article aims to analyze the reports of five students from the 6th and 7th grade of elementary school II, about the places most used by them in CEU Butantã, seeking to understand the process that transforms and re-signifies these places into meaningful spaces. These locations were identified on maps drawn by the students, who justified their choices through interviews conducted in the form of a conversation circle. The maps and reports were analyzed based on Michel de Certeau's concepts of place and space, in dialogue with Milton Santos' concept of territory, and with reference to the dimension of Social Pedagogy. The analysis of maps and reports suggests the importance of peer learning for children and adolescents and the appropriation of policies and public facilities for culture, information technology, art, sports and leisure as fundamental in this process. In the adolescents' speeches, we could infer the use of spaces considered significant together with their families and friends, important for coexistence for the exercise of the right to Family and Community Coexistence advocated in the Statute of the Child and Adolescent.

Keywords: appropriation; family living; narrative maps; space; territory.

Resumen

Considerando que la presencia de un Centro Educativo Unificado (CEU) impacta directa e indirectamente a toda la comunidad circundante, integrando este equipamiento dentro de una política pública interdepartamental, que actúa positivamente en la transformación de la comunidad y en la promoción de la ciudadanía, este artículo tiene como objetivo analizar los relatos de cinco alumnos de 6º y 7º grado de la Enseñanza Básica II, sobre los lugares más utilizados por ellos en el CEU Butantã, buscando comprender el proceso que transforma y resignifica estos lugares en espacios significativos. Estos lugares fueron identificados en mapas dibujados por los estudiantes, quienes justificaron sus elecciones a través de entrevistas realizadas en forma de rueda de conversación. Los mapas e informes fueron analizados a partir de los conceptos de lugar y espacio de Michel de Certeau, en diálogo con el concepto de territorio de Milton Santos, y con referencia a la dimensión de la Pedagogía Social. El análisis de mapas e informes sugiere la importancia del aprendizaje entre pares de niños y adolescentes y la apropiación de políticas y equipamientos públicos para la cultura, las tecnologías de la información, el arte, el deporte y el ocio como fundamentales en este proceso. En los discursos de los adolescentes, pudimos inferir el uso de espacios considerados significativos junto a sus familiares y amigos, importantes para la convivencia para el ejercicio del derecho a la Convivencia Familiar y Comunitaria preconizado en el Estatuto del Niño y del Adolescente.

Palabras clave: apropiación; convivencia familiar; espacio; mapas narrativos; territorio.

Introdução

Pensar o desenvolvimento humano exige reflexões e compromisso de todos os setores da sociedade, conjugando esforços éticos para construir políticas intersetoriais e interdisciplinares que concebam a aprendizagem, a convivência e a cidadania como eixos de conscientização sobre e de transformação das injustiças sociais. Neste sentido, uma experiência se materializou na gestão municipal da cidade de São Paulo nos anos de 2001 a 2004, com perspectiva garantir o acesso a equipamentos culturais, esportivos e educacionais, especialmente nos extremos da cidade, contidos em um mesmo complexo arquitetônico e social, denominado Centro de Educação Unificado (CEU).

Os parâmetros que nortearam nosso trabalho, na gestão Marta Suplicy, foram, em primeiro lugar, o compromisso ético de todos com a promoção da cidadania plena, que compreende liberdade, participação e igualdade de oportunidades para todos(as) e, por fim, a compreensão do papel e lugar estratégico que a educação pública de qualidade para todos e todas ocupou em nossas ações. O antigo governo municipal assumiu com o compromisso de promover a inclusão social; combater a pobreza, em todas as suas expressões: econômicas, educacionais, culturais, informação etc., e as desigualdades sociais; gerar trabalho e renda; estimular e promover formas inovadoras de democracia participativa -representativa e direta- e de gestão da cidade. (PEREZ, 2007, p. 130)

A escolha de levar o projeto CEU as franjas periféricas da cidade de São Paulo levaram em consideração o Mapa da Exclusão/Inclusão social da cidade de São Paulo (1995, 1996, 2001), a pesquisa que possibilitou mapear e identificar a carência ou ausência de equipamentos públicos, de trabalho, de moradia, de saneamento, entre outros direitos sociais nos bairros periféricos da cidade de São Paulo. Também foi possível identificar a concentração de empregos, espaços de lazer e de cultura na região central da cidade, o que implica, que para moradores da periferia acessarem alguns destes equipamentos culturais, viagens de 30, 40 ou até 50 quilômetros, com uma média de três horas e meia de locomoção em transporte público.

Bairros distantes da região central da cidade de São Paulo surgiram e se desenvolveram sem o necessário planejamento urbanístico do Estado. Diante desta omissão, demandas por moradia, condições mínimas de infraestrutura, entre outros direitos sociais decorrem diretamente da mobilização popular nos respectivos movimentos sociais.

A esses dados soma-se o estigma, ou aporofobia que envolve de forma mais expressiva as populações pobres dos bairros periféricos vulnerabilizados desde sua origem e caracterizados por altos índices de violências. Não e ao acaso a diferença na expectativa de vida entre os distritos da cidade de São Paulo de cerca de 14 anos, que segundo dados de 2017, demonstram que, no bairro Alto de Pinheiros, a expectativa de vida ao nascer era de 85,33 anos, enquanto em São Miguel Paulista, era de 71,28 anos.2

Com base nesses e em outros indicadores que identificam as desigualdades sociais na cidade de São Paulo, a gestão municipal constituiu o projeto CEU numa perspectiva se se constituir como uma política pública educacional, intersecretarial, que tinha como objetivos a transformação da comunidade e a promoção da cidadania, conforme descreve Perez: “Tínhamos como principal diretriz combater à pobreza e a exclusão a partir da nossa prática, relacionados com o Projeto Político Pedagógico - PPP - da escola respeitando a relação escola-comunidade.” (PEREZ, 2007, p. 128)

O CEU tem como antecedentes e referencias teóricas projetos educacionais progressistas como as escolas-parque, os Centros Integrados de Educação Pública -CIEPS -, e pensadores como Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, Maria Nilde Mascellani e Paulo Freire, compreendendo a educação a partir da inclusão social e do desenvolvimento integral do ser humano.

Diante do exposto, consideramos que a presença de uma escola do projeto CEU pode impactar de forma direta e indireta a comunidade do seu entorno, indo muito além da comunidade escolar. Pois, no momento em que se insere nesses territórios, além das unidades escolares (Centros de Educação Infantil, Escola Municipal de Educação Infantil e Escola Municipal de Ensino Fundamental), traz consigo equipamentos de cultura, lazer e esporte como piscinas, teatro, ateliês, ginásio, quadras poliesportivas, pista de skate, equipamentos que disponibilizam acesso à internet como os telecentros e equipamentos que possibilitam formação comunitária como a cozinha panificadora. A presença destes equipamentos congrega diversos grupos, potencializando outros tipos de sociabilidade e apropriações.

O processo de apropriação deste equipamento por parte das pessoas que o frequentam pode potencializar grupos invisibilizados e cujos saberes destoam da educação escolar, como exemplo podemos citar os praticantes da capoeira, do hip hop, do rap, da dança, do esporte coletivo, das artes plásticas etc. Numa política educacional que dialoga com o território onde está inserida, “[...] tornando-se um equipamento além da sala de aula e o espaço escolar, pressupondo a melhoria dos espaços do entorno.” (DÓRIA, 2007, p. 11)

Por meio desta política a cidade de São Paulo ingressa em 2004 na Rede Brasileira de Cidades Educadoras, pois a concepção de cidade educadora pressupõe um conjunto de ações conectadas em prol dos habitantes, isto é o direito a cidade para seus habitantes. Uma cidade que se propõe ser educadora deve intervir de forma a eliminar ou dirimir as desigualdades sociais traduzidas nos indicadores sociais de violência, evasão escolar, trabalho infantil, gravidez precoce, abuso sexual, mortalidade, moradia e trabalhos precários entre outros. “Para uma cidade ser considerada educadora, ela precisa promover e desenvolver o protagonismo de todos - crianças, jovens, adultos, idosos - na busca de um novo direito, o direito à cidade educadora enquanto educadora, a Cidade é também educanda [...].” (GADOTTI, 2006, p. 134)

Cidade educadora é uma abordagem pedagógica e política que buscam romper com a escola fechada em si mesma para viabilizar uma educação voltada à cidadania. Uma pedagogia da cidade serve também para a escola construir o projeto político-pedagógico de uma “educação na cidade”. (GADOTTI, 2006, p. 139)

Nesse sentido, a cidade deve integrar atividades sociais e culturais visando a capacidade educativa, na perspectiva social, comunitária e popular, numa perspectiva de Educação Integral que vincula a escola e território onde está inserida., promovendo conceito de Território Educativo que parte do princípio de que todos os espaços de convivência podem ser educativos, ao mesmo tempo que dialogicamente constrói novos horizontes para a convivência humana.

A política do CEU se aproxima das aspirações das Carta das Cidades Educadoras, que assevera a cidade de forma intrínseca como uma instituição educadora, onde os equipamentos públicos e sujeitos que dele se utilizam, bem como a política pública e social que os constituem tornem-se educadoras. Nesta perspectiva a participação ativa dos usuários destes equipamentos é fomentada por meio de ações de gestão participativa e controle social das políticas públicas.

Após duas décadas do decreto municipal que instituiu a política dos CEUs, e diversas mudanças na administração da cidade de São Paulo que promoveram alterações no projeto original, nas prioridades e na gestão deste espaço educativo, consideramos importante questionar: quais as percepções de seus frequentadores sobre os espaços do CEU? Nesta política permanecem os pressupostos da concepção de cidade educadora aos quais estava alinhada?

Para responder tal problemática neste artigo nos propomos a identificar e analisar as percepções de um grupo específico de frequentadores deste espaço, no caso, cinco estudantes do ensino fundamental que atuam diretamente no Grêmio Estudantil da unidade escolar do CEU Butantã. A escolha deste grupo levou em consideração a sua participação em instância representativa democrática dos estudantes na comunidade escolar, a faixa etária e a disposição em participar da pesquisa.

Produção dos dados: a elaboração de mapas e os relatos das estudantes

No processo de desenvolvimento deste artigo foram consultados profissionais da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, gestores e professores das unidades escolares do CEU, e os adolescentes estudantes da EMEF que integra o CEU Butantã.

Numa abordagem ética e dialógica foi desenvolvido um processo de aproximação com os estudantes envolvidos no grêmio estudantil e com a professora mediadora durante o período de aula deles, com autorização da direção da escola, onde a proposta da pesquisa que resulta neste artigo foi apresentada e disponibilizada a possibilidade de adesão voluntária a este projeto.

O processo de apresentação do projeto de pesquisa gerou uma certa resistência decorrente da presença do pesquisador na sala de aula e no grupo, já que este não fazia parte do convívio dos estudantes. Diante da situação foi realizada uma dinâmica de apresentação, interação e aquecimento, e. após esse momento foram esclarecidas dúvidas dos participantes e entregue uma autorização para ciência e consentimento dos responsáveis, com dia e horário para participação da pesquisa daqueles que assim o desejassem. Foram disponibilizados dois momentos distintos, fora do horário escolar, em uma das salas disponível da EMEF.

Em dia, local e horário pré-estabelecidos, cinco adolescentes aderiram ao convite, todas do sexo feminino, com idade entre 12 e 14 anos, moradoras do entorno do CEU Butantã, participaram da oficina de construção de mapas narrativo, em uma sala de aula, ambientada com diversos tipos de mapas fixados na lousa da sala, as cadeiras foram dispostas em forma de círculo e ao centro os materiais necessários para a oficina (papéis, lápis de cor, giz de cera, canetinhas, revistas para recorte, tesoura e cola). Na sequência, o pesquisador apresentou os procedimentos para elaboração dos mapas narrativos e combinando o horário para conclusão da atividade.

O processo de pesquisa e produção dos dados junto às adolescentes foi pensado de maneira que permitisse a elas liberdade para apresentar as suas percepções dos espaços do CEU, daí a escolha da cartografia como uma das ferramentas metodológicas para produção de dados da pesquisa e deste artigo, Considerou-se que a produção dos mapas permitiria aos participantes a possibilidade de comunicar-se por outra linguagem que não a escrita, incorporando novas formas de expressar suas percepções sobre o CEU.

Já para a realização da análise sobre os espaços significativos destacados por estas jovens foi feito a partir do cruzamento desses mapas com os relatos permitindo uma visão mais abrangente do processo de significação dos lugares apontados.

O processo teve início com as participantes desenhando, individualmente, os espaços por elas considerados significativos, que gostam e utilizam com maior frequência no CEU. Este processo teve a duração de cerca de trinta minutos e, após sua realização, as produções foram apresentadas para o grupo participante formato de roda de conversa, as apresentações dos desenhos foram gravadas em áudio e posteriormente as falas foram transcritas.

Para garantir o sigilo das participantes, utilizamos nomes fictícios, escolhidos por elas a partir de encartes de lideranças dos movimentos sociais, que, de um lado, têm a foto da liderança e, do outro, uma breve biografia. As lideranças escolhidas pelas estudantes foram: Daiane dos Santos, Angela Davis, Cora Coralina, Greta Thunberg e Tarsila do Amaral.

Desse processo resultaram oito mapas, sendo três destacando a área da piscina, dois a área da piscina e quiosques, um somente o teatro, outro a pista de skate e o teatro e um contendo diversos espaços (teatro, gestão, refeitório, biblioteca, pista de skate e quiosque).

Diante das produções, algumas questões se colocam: Por que alguns locais do CEU são evidenciados e outros não? Quais apropriações se dão nesses locais? O que as adolescentes fazem neles? O local é o que está posto, visível ou ele pode ser subvertido, ressignificado? A partir dessas e outras indagações escolhemos como referencial teórico para avaliar as produções dos participantes os conceitos de espaço e lugar de Michel de Certau.

De lugares a espaços praticados: a emergência do direito à convivência familiar e comunitária

Dialogando com CERTAU (2014), é possível perceber que existe uma diferença primordial entre os conceitos de lugar e de espaço, sendo que o primeiro carrega uma determinação quase estática de sua posição; o lugar é onde a ordem, qualquer ordem prevalece sobre o sujeito.

Um lugar é a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuem elementos nas relações de coexistência. Aí se acha, portanto, excluída a possibilidade, para duas coisas, de ocuparem o mesmo lugar. Aí impera a lei do “próprio”: os elementos considerados se acham uns ao lado dos outros, cada um situado num lugar “próprio” e distinto que define. Um lugar é, portanto, uma configuração instantânea de posições. Implica uma indicação e estabilidade. (CERTEAU, 2014, p. 184)

Assim, podemos inferir que a escola se enquadraria como um lugar, sendo regida por vários ordenamentos, hierarquias, poderes e posicionamentos institucionais, referendados por ela escola enquanto instituição, seja por meio do Regimento Escolar, o Plano Político Pedagógico, os horários das disciplinas escolares, as atribuições de estudantes, funcionários, professores e gestores, que têm, cada qual ocupando, um lugar pré-determinado dentro da estrutura institucional. Porém, para além das predeterminações institucionais, cada grupo social, cada sujeito vai constituindo seu espaço na relação com este lugar.

O espaço é um cruzamento de móveis. É de certo modo animado pelo conjunto dos movimentos que aí se desdobram. Espaço é o efeito produzido pelas operações que o orientam, o circunstanciam, o temporalizam e o levam a funcionar em unidade polivalente de programas conflituais ou de proximidades contratuais. [...] Em suma, o espaço é um lugar praticado. (CERTEAU, 2014, p. 184)

De maneira poética, Certau define o processo que transforma lugares em espaços, a partir de uma analogia com a rua, que se torna espaço a partir das diversas maneiras com que os pedestres a utilizam. Partindo desta observação de Certau, podemos compreender que as adolescentes vão construindo seus espaços dentro do lugar CEU a partir da sua utilização; os ordenamentos da escola vão sendo significados, disputados cotidianamente e transformados, por meio da ação dos estudantes, professores em uma relação dialética, em espaços, muitos espaços, significativos para a comunidade que os ocupa.

Assim, ao observarmos a ocupação da piscina, do bosque, da pista de skate, do teatro é possível identificar que grupos são formados e a partir deste processo de apropriação, sendo possível observar maneiras distintas de sociabilidade, convivência familiar e utilização destes locais. Neste sentido, o processo de transformação destes locais em espaços envolve as diversas formas de apropriação que os sujeitos que estes ambientes por meio das ações, conflitos e saberes compartilhados transformando-os em um território educativo para além da educação escolar.

Os conceitos de lugar e espaço aqui escolhidos nos permitem dialogar com o conceito de território de Milton Santos, para quem o território em si não é uma categoria de análise, mas sim o território usado, o espaço das trocas e dos valores que nele estão inseridos.

Essa ideia de território usado, a meu ver, pode ser mais adequada à noção de um território em mudança, de um território em processo. Se o tomarmos a partir de seu conteúdo, uma forma-conteúdo o território tem de ser visto como algo que está em processo. E ele é muito importante, ele é o quadro da vida de todos nós, na sua dimensão global, na sua dimensão nacional, nas suas dimensões intermediárias e na sua dimensão local. (SANTOS, 1999, p. 19)

Nesse sentido, não basta habitar, é necessário habitar-convivendo, de modo consciente, apropriando-se dos bens públicos de direito, como já apontava Certeau que descrevia a cidade como “um lugar a ser apropriado pelo uso” (CERTEAU, 2014, p. 117). E ainda, complementa: “A cidade está aí. Ela é nosso espaço e não temos nenhum outro. Crescemos nestas cidades. É nas cidades que respiramos. Quando tomamos o trem, é para ir de uma cidade à outra. Não há nada de desumano em uma cidade, senão nossa própria humanidade”. (CERTEAU, 2014, pp. 85-86)

A cidade revela em sua dinâmica nosso jeito de estar no mundo, em que o sistema de caça e caçador, onde se cria estratégias de sobrevivência desumanizadoras, logo a cidade como território sociopedagógico, visa desconstruir essa perspectiva individualista egóica, construindo políticas e espaços públicos que privilegiam o cuidado às pessoas como condição democrática. Reconhecer a cidade como lócus educativo é apenas o primeiro passo de uma cidade que educa.

A cidade se faz educativa pela necessidade de educar, de aprender, de ensinar, de conhecer, de criar, de sonhar, de imaginar que todos nós, mulheres e homens, impregnamos seus campos, suas montanhas, seus vales, seus rios, impregnamos suas casas, seus edifícios, deixando em tudo o selo de certo tempo, o estilo, o gosto de certa época. A cidade é cultura, é criação, não só pelo que fazemos nela e dela, mas pelo que criamos nela e com ela, mas também é cultura pela própria mirada estética ou de espanto, gratuita, que lhe damos. (FREIRE, 1991, pp. 22-23)

E com base nesse diálogo, nesta intersecção entre Certau e Santos que vamos analisar a singularidade do processo de apropriação do espaço do CEU Butantã por algumas das adolescentes que o frequentam a partir de mapas e relatos sobre os espaços do complexo educacional que consideram mais significativos.

O CEU, de lugar a espaço significativo

Consideramos que a observação dos locais destacados nos mapas e o cruzamento dessas imagens com as falas das estudantes nos permitem ter um panorama desse processo de apropriação, que inclui aspectos sociais, éticos, políticos e afetivos.

Como podemos observar na figura 1 abaixo que é composta por três mapas, que têm em comum a escolha da área da piscina como o local mais significativo para as estudantes que os desenharam. A imagem da piscina se repetirá também na figura 2, porém integrada a outros espaços.

Fonte: Leandro Alves Lopes.

Figura 1 Três Mapas da área da piscina 

Era esperado e porque não dizer quase óbvio que a piscina fosse um destaque para os jovens, porém, o que está para além do óbvio da piscina como um espaço de lazer. Vejamos algumas justificativas e comentários de duas adolescentes para a escolha da área da piscina:

Daiane dos Santos: “[...] a piscina é nosso espaço de relaxar, vamos com os amigos ficamos de boa, [...] lá eu aprendi até a nadar.”

Cora Coralina acrescenta: “Eu gosto porque vou com a minha família e nos divertimos. Ninguém que eu conheça tem piscina em casa, pra nós, o CEU é a única oportunidade.”

Nas falas destacadas das adolescentes é possível inferir alguns dos impactos da presença de um CEU nas comunidades que o recebem. Comecemos pela presença destacada da piscina. A piscina no Brasil é um bem de consumo de luxo, restrito às classes médias e altas, e a sua presença em regiões periféricas é uma nova maneira de considerar este equipamento de lazer, inserindo-o numa lógica de direitos, e colocando em xeque alguns privilégios de classe.

Daí que a escolha da piscina como um local significativo para as adolescentes não chega a ser espantosa, mas reafirma o acerto na democratização do acesso a bens culturais como parte integrante de um processo que assegurando o direito de todos, como um bem comum da sociedade na garantia de lazer, à saúde e à prática esportiva.

Na paisagem urbanista periférica, de forma geral, as piscinas presentes no CEU, assim como todos os espaços que o compõe se impõe e se contrapõem a precariedade do entorno. Estudar em um CEU, acessar outros equipamentos de cultura é um privilégio dentro das diversas comunidades onde nem saneamento básico é garantido.

Outro aspecto que pode ser observado nas falas das adolescentes, em relação a transformação da piscina em lugar, é como acontece na prática o direito à ‘Convivência Familiar e Comunitária’, previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Este direito é por vezes relegado a segundo plano nas políticas públicas voltadas para crianças e adolescentes. É interessante considerar que ao garantir o acesso à piscina para comunidade do entorno do CEU, os gestores desses espaços públicos estão promovendo direta e indiretamente a garantia ao direito à convivência familiar e comunitária, ao mesmo tempo em que sinalizam novas formas de participação da família no cotidiano das adolescentes e da própria escola.

Ainda analisando mapas com destaque a presença da piscina observa-se que em três mapas (figuras 1 - a e na figura 2 - e), as adolescentes fizeram questão de desenhar as grades de divisória que cerca a piscina. Ao explicar seu mapa (figura 2 - e), uma delas relata:

Tarsila do Amaral: “Desenhei a piscina porque eu curto muito, esses traços são as grades, onde fica o povo olhando, separado de nós ou esperando para entrar.”

Pesquisador: “Na sua opinião para que serve essa grade?”

Tarsila do Amaral: “Eu acho que serve para não deixar as pessoas invadirem ou para não deixar os pequenos entrarem, sei lá.”

Nas afirmações acima, chama a atenção a forma como a estudante percebe as grades que separam a piscina do restante do CEU. Ao responder à pergunta do entrevistador, parece reconhecer uma função de segurança para este artefato, denotando certa naturalização de uma incapacidade coletiva de cuidar do que é público, do que é comum, das observâncias das regras ou acordo de convivência, sendo necessário o cerceamento desse lugar para “não deixar as pessoas invadirem”. Não é comum se observar grades em piscinas nos espaços privados, a menos que sejam para a segurança de crianças.

Ainda sobre o trecho de fala destacado acima, se o relacionarmos à descrição que a estudante faz de seu mapa, em que a grade é apresentada como local onde “o povo fica olhando”, a adolescente parece demonstrar uma necessidade de “ostentar” o uso da piscina, quase como a reafirmação de um privilégio ou do exercício de um direito há muito desejado, pelos que não podem, ao menos naquele momento, acessar, seja por estarem frequentando os outros espaços, seja por estarem nas unidades de educação.

Cabe destacar que o projeto arquitetônico do CEU favorece que os frequentadores do CEU mantenham contato visual, inclusive em algumas salas de aula são possíveis observar as pessoas utilizando a piscina.

Já nos dois mapas que compõe a figura 2, além das piscinas, podemos identificar outro elemento, os quiosques, que, segundo a estudante Tarsila do Amaral: “[...] é o lugar de se reunir, ficar com os meninos (neste momento houve risadas de todas), tem sombra lugar para ficar sossegada”.

Fonte: Leandro Alves Lopes.

Figura 2 Dois Mapas da área da piscina e quiosque 

O projeto arquitetônico propiciou poucos lugares de convivência ociosa, e/ou arborizado, que na periferia são espaços escassos. Mesmo com as instâncias participativas da sociedade, só após o uso pela população dos lugares e sua apropriação em espaço constatou-se as ausências. O segundo local do CEU que mais foi identificado e reconhecido pelas estudantes como significativo foi o teatro/SPCine, conforme sinalizado nas figuras 3, 4 e 5. Ao explicar os mapas que destacam este espaço, as estudantes afirmam:

Angela Davis: “É lugar de ir com a família assistir filme, peça e show. Nossa é muito bom!”

Greta Thunberg: “Eu e minha família só conseguimos ir no cinema no CEU porque é de graça. Meu pai não ia conseguir pagar ingresso para levar eu e meus irmão.”

Fonte: Leandro Alves Lopes.

Figura 3 Mapa do Teatro 

Os relatos e desenhos que indicam o teatro e o cinema como espaços significativos seguem reafirmando a observação anterior da importância do acesso ao lazer e a forte presença das famílias nesses momentos. O teatro e o cinema são ainda considerados elitizados, mesmo com as políticas de popularização, além da centralização desses espaços nas áreas centrais da cidade. Levar para periferia peças, show, filmes é criar um conviver nas periferias, ampliando o direito a cidadania cultural.

O terceiro espaço mais citado nos mapas é a pista de skate, presente nas figuras 4 e 5. Sobre esse espaço, a estudante Greta Thunberg diz: “É onde tem uns meninos gatinhos (momento de risadas), tem bastante meninos e algumas meninas também. É um ponto de encontro do pessoal que já terminou a escola.”

Fonte: Leandro Alves Lopes.

Figura 4 Mapa pista de skate e teatro 

É possível identificar no relato das adolescentes sobre a pista de skate um fato novo relevante sobre a forma de utilização do CEU. A pista de skate não é somente um local de prática esportiva, é um espaço de encontro para os adolescentes e jovens da comunidade, espaço de trocas, de namoro, de aprendizagem entre pares, um lócus de socialização onde a referência aos adultos não aparece.

No mapa da figura 5, dentre os lugares já citados, três outros aparecem como significativos. Para a estudante Cora Coralina, a biblioteca, o bloco da gestão (ateliês, ginásio, teatro e administração) e o refeitório da EMEF.

Cora Coralina: Eu gosto de muitos espaços no CEU, eu e a minha família usamos quase todos (risada), [...] tem a biblioteca que eu gosto para ir ler, ficar sozinha, faço trabalhos da escola. Ah, a gestão eu faço as oficinas, antes na época da minha irmã tinha bastante. E o refeitório porque é onde a gente come (risadas do grupo).

Fonte: Leandro Alves Lopes.

Figura 5 Mapa com diversos espaços: teatro, pista de skate, quiosque, biblioteca, bloco da gestão e refeitório da EMEF 

Uma análise dos mapas nos permite destacar que os espaços apontados pelas adolescentes trazem de forma inequívoca os eixos convivência familiar, lazer, esportes e cultura como muito importantes na estrutura do CEU. O acesso a estes equipamentos (piscina e teatro/cinema), até então distantes do cotidiano de muitos estudantes e de suas famílias, torna-se uma realidade, pois, costumam estar disponíveis nas regiões periféricas em quantidade e qualidade inferiores às regiões centrais da cidade de São Paulo

Assim, pode se inferir que, para o grupo de adolescentes pesquisados, a implantação dos CEUs impactou diretamente o acesso destas meninas a políticas e equipamentos de arte, cultura, esportes e lazer e a partir deste acesso são estabelecidas novas formas de sociabilidade na comunidade escolar e com a comunidade do entorno da escola.

Ainda é possível destacar que ao analisarmos os mapas e os relatos sobre a escolha de locais significativos para as adolescentes se configura um processo de apropriação e constituição do lugar escola em um espaço potencializador, onde se são discutidos, pensados as contradições, conflitos, tensões e dramas, que afetam crianças e adolescentes que os ocupam e, assim, na relação entre pares, possibilitam a constituição de saberes e maneiras muito específicas de lidar com as questões inerentes a seus processos de desenvolvimento.

Estes lugares que foram transformados em espaços significativos pelos estudantes a partir de sua utilização, mesmo que fisicamente inseridos dentro de uma instituição escolar, mantém certa independência em relação a instituição, nestes espaços existem regras e códigos próprios compartilhados e sustentados pelos grupos que os nas relações por eles estabelecidas.

Uma ausência nos mapas e relatos que merece uma reflexão é a do prédio da EMEF como sendo um espaço significativo, sendo que a única referência a ele aparece na indicação do refeitório em um dos mapas. Uma das possibilidades para esta ausência é de que as entrevistadas tenham observado uma certa rigidez na EMEF, uma identificação dela com a ordem, com a educação escolar, um local onde as regras para existir estão limitadas a aulas e notas.

Isto necessariamente não significa que a EMEF seja autoritária ou que as entrevistadas não reconheçam sua importância para suas vidas ou existências, mas que simplesmente existem normas e regras nas quais pouco ou nada conseguem mudar, diferente dos outros espaços apontados como significativos, cujos usos e formas de ocupação são mais flexíveis e, por vezes, construídos na relação entre os pares.

O mesmo ocorre com as outras unidades educacionais (CEI e EMEI), cuja ausência está ligada diretamente ao fato das adolescentes não utilizarem o espaço de forma regular, mas também configuram a ausência e a necessidade de se pensar uma educação que permita o desenvolvimento de projetos e ações de forma integradora, favorecendo a apropriação dos diversos equipamentos do complexo educacional pelos diversos públicos.

Além das questões analisadas anteriormente neste artigo e que envolvem a predileção das adolescentes pelos espaços de lazer, esporte e cultura, as análises dos mapas produzidos pelas adolescentes, nos permitem tecer algumas considerações pertinentes à função social da escola, a relação entre educação escolar e educação entre pares e de que maneira a pedagogia social pode nos ajudar a refletir sobre elas.

A escola e sua função social são objeto de discussões teóricas desde meados do século XX e não esperamos esgotá-las neste artigo. Porém, observando os mapas analisados, é visível a forma distinta como estas jovens percebem a escola e sua função social. Sem a mediação direta de adultos, vão ocupando lugares na escola, se apropriando dela e a transformando, por meio das mais diversas práticas, em espaço de socialização, de trocas de saberes e aprendizagem entre pares,

A indicação como espaços significativos os lugares onde ocorrem atividades de esporte, lazer e cultura não pode ser resumida apenas ao acesso e fruição de esporte, artes que por si é relevante. Estes lugares, observando-se os relatos das jovens, nos permitem inferir que eles vão se constituindo em espaços de trocas e aprendizagens entre pares e tensionando o caráter pedagógico escolar do complexo educacional imprimindo ao mesmo uma dimensão comunitária. Existe um recorte geracional muito forte nas falas das entrevistadas, como se afirmassem ser este o seu “espaço”, no qual podem existir livres, um local da aprendizagem, mas não um local pedagógico, um local onde experiência e aprendizagem coexistem.

Neste sentido, nos cabe perguntar qual a responsabilidade da comunidade escolar com estes espaços para que esta dicotomia entre escolar e não escolar não se acentue? Compreendemos que um caminho possível é a possibilidade de gestores, professores, educadores constituírem novas formas de escuta para as adolescentes no espaço escolar, fomentarem a organização estudantil e reconhecer as relações estabelecidas nestes outros lugares, transformados em espaços pelas estudantes como saberes a serem integrados ao cotidiano da comunidade escolar.

Não se trata de pedagogizar a relação dos estudantes com estes espaços significativos e assim capturar estes espaços pela pedagogia, mas, ao contrário, deve-se partir do reconhecimento da existência de uma produção de saberes, de constituição de novas formas de aprendizagem nestes espaços e compreender as relações neles estabelecidas, possibilitando um aprofundamento do diálogo com estas adolescentes, permitindo-se aprender com a educação entre pares e se permitir novas experiências na educação escolar aproximando-a das necessidades dos estudantes.

Estes espaços de arte, lazer, cultura e esportes precisam ser incorporados e geridos pela comunidade escolar democraticamente para que se mude a relação de seu uso por todos os interessados. Estes locais precisam ser efetivamente comuns, a escola precisa ser parte do território e não um enclave no território.

Para Freire (1996) o espaço educacional é lugar de resgate da cultura popular (sociocultural), da organização política das classes populares (sociopolítico), dos afetos e dos encontros e para isso há “[...] uma pedagogicidade indiscutível na materialidade do espaço” (FREIRE, 1996, p. 50). Um espaço se torna educacional, na concepção freireana, quando educador e educando conscientes desse processo passam a concebê-lo espaço por meio das dimensões ética e estética. Compreendendo estética como um espaço de liberdade, de intervenção, de crítica e de ressignificação. Em outras palavras, a estética é uma forma sensível de estar e enxergar o cotidiano, as pessoas e as estruturas, o que implica uma consciência da realidade. Segundo Freire (1991, p. 79 e 80),

É preciso reenfatizar que a multiculturalidade como fenômeno que implica a convivência num mesmo espaço de diferentes culturas não é algo natural e espontâneo. É uma criação histórica que implica decisão, vontade política, mobilização, organização de cada grupo cultural com vistas a fins comuns - e demanda, portanto, certa prática educativa coerente com esses objetivos - e uma nova ética no respeito às diferenças.

Algumas considerações

A política educacional prevista no projeto CEU se propõe a transformar-se em um espaço-território educativo na medida em que desigualdades vão sendo combatidas e os índices de desenvolvimento humano vão aumentando, logo sua proposta se torna mais factível quando o os administradores públicos assumem o movimento da cidade educadora, constituiu-se como um novo paradigma para pensar a cidade e a educação integral.

Isso é possível ser constatado como possível nas falas das adolescentes que apontam a utilização dos espaços considerados significativos em conjunto com suas famílias e amigos e a importância desta convivência para o exercício do direito à Convivência Familiar e comunitária preconizada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Porém é sugerido intensificar a participação popular e a apropriação dos espaços pelos frequentadores do CEU que permita o surgimento de mudanças socioculturais e sociopolítica numa relação mais próxima da escola com o território, com a cultura local e com a comunidade/famílias.

Reafirmamos aqui que o direito à convivência familiar é por vezes relevado ou restrito a crianças e jovens acolhidos institucionalmente e serviços específicos para este fim. Porém, numa perspectiva de educação integral, de uma cidade educadora, garantir a qualidade de convivência entre as famílias perpassa a escola e outros espaços de socialização.

Uma das contribuições da pesquisa em Pedagogia Social, na qual este artigo se insere, é refletir sobre e de que forma as políticas públicas podem garantir e ou promover o bem-estar social, a convivência e o exercício da cidadania. Em sua dimensão sociopolítica, sociopedagógica e sociocultural (C. Lopes, 2020) a pedagogia social e o educador social, de maneira singular, podem contribuir na relação da comunidade escolar com o território onde está inserida.

Finalizamos considerando que os relatos e mapas aqui apresentados nos remetem a uma reflexão fundamental sobre o processo educacional e a vida como um todo. A possibilidade de questionar sempre se os “lugares” onde estamos inseridos são significativos para nós como estudantes, professores, cidadãos. Pois, se estes lugares não nos permitem existir de forma digna é necessário agir para transformá-los em espaços.

Referências

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Recebido: 23 de Março de 2022; Aceito: 17 de Março de 2023

Editor Chefe: Prof. Dr. José Eustáquio Romão

Editora Científica: Profa. Dra. Ana Maria Haddad Baptista

Editora Científica: Profa. Dra. Marcia Fusaro

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Este artigo é um subproduto do Projeto “Lidando com novos espaços: crianças e adolescentes na apropriação do complexo arquitetônico do CEU Butantã (São Paulo, Brasil)”, financiado pelo Mackpesquisa. Vinculado aos Grupos de Pesquisa em Pedagogia Social e de Estudos de História da Cultura, Sociedades e Mídias, do Programa de Pós-Graduação em Educação, Arte e História da Cultura, da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em parceria com as Universidades de Singer e Alanus, da Alemanha, e a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. Conta, também, com a colaboração de pesquisadores de outras Universidades nacionais e internacionais.

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