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Eccos Revista Científica

versión impresa ISSN 1517-1949versión On-line ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.64 São Paulo  2023  Epub 12-Feb-2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n64.22066 

Artigos

ESCOLA DO CAMPO: É POSSIVEL FALAR DE PERTENCIMENTO E IDENTIDADE DO PROFESSOR?

SCHOOL OF THE FIELD: IS IT POSSIBLE TO TALK ABOUT THE TEACHER'S BELONGING AND IDENTITY?

ESCUELA DE CAMPO: ¿ES POSIBLE HABLAR DE PERTENENCIA E IDENTIDAD DEL DOCENTE?

Taynah de Brito Barra Nova, Doutora em Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-3698-6620

Laêda Bezerra Machado, Doutora em Educação2 
http://orcid.org/0000-0002-9524-0319

1Doutora em Educação, Universidade Federal do Agreste Pernambucano - UFAP. Garanhuns, Pernambuco- Brasil.

2Doutora em Educação, Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Recife, Pernambuco- Brasil.


Resumo

Este artigo, resultado de pesquisa mais abrangente, explora a função identitária e de pertencimento de professores ao representarem a escola do campo. Desenvolvemos um estudo qualitativo delineado como pesquisa de campo e contamos com a participação de 35 docentes de um munícipio no interior do estado de Pernambuco. Como instrumento de coleta, utilizamos a entrevista semiestruturada. A análise dos depoimentos revelou que as representações sociais de Escola do Campo dos professores são marcadas por um conteúdo simbólico que coloca em oposição o campo e a cidade, privilegiando-a em detrimento da cultura campesina. Coerente com as representações identifcadas, constatamos que o professor da Escola do Campo não revela identificação e/ou pertencimento com a realidade em que atua. Esse não pertenciemnto está vinculado a rotatividade docente entre as escolas, modo de designação dos professores para essas instituições, contratação temporária e ainda por serem pessoas radicadas na cidade. Em face dos resultados, sinalizamos a necessidade de reflexões e intervenções conjuntas por parte da gestão da educação municipal e dos povos do campo no sentido do cumprimento dos princípios legais e do ideário da Educação do Campo, para impedir que a Escola do Campo esteja a contribuir para inferiorizar a vida no campo.

Palavras-chave: identidade; representações sociais; escola do campo; professor.

Abstract

This article, the result of a broader research, explores the identity and belonging function of teachers when representing the rural school. We developed a qualitative study designed as a field research and we had the participation of 35 teachers from a municipality in the interior of the state of Pernambuco. As a collection instrument, we used the semi-structured interview. The analysis of the testimonies revealed that the social representations of Escola do Campo of the teachers are marked by a symbolic content that puts the countryside and the city in opposition, privileging it to the detriment of peasant culture. Consistent with the representations identified, we found that the teacher at Escola do Campo does not reveal identification and/or belonging to the reality in which he works. This non-belonging is linked to teacher turnover between schools, the way in which teachers are assigned to schools, temporary employment and also because they are people living in the city. In view of the results, we point out the need for joint reflections and interventions on the part of the municipal education management and the rural peoples in order to comply with the legal principles and ideas of Rural Education, to prevent Escola do Campo from contributing to diminish life in the countryside.

Keywords: identity; social representations; field school; teacher.

Resumen

Este artículo, resultado de una investigación más amplia, explora la función identitaria y de pertenencia de los docentes al representar la escuela rural.Desarrollamos un estudio cualitativo diseñado como investigación de campo y contamos con la participación de 35 docentes de un municipio del interior del estado de Pernambuco. Como instrumento de recolección se utilizó la entrevista semiestructurada. El análisis de los testimonios reveló que las representaciones sociales de la Escola do Campo de los profesores están marcadas por un contenido simbólico que contrapone el campo y la ciudad, privilegiando en detrimento de la cultura campesina. De acuerdo con las representaciones identificadas, encontramos que el docente de la Escola do Campo no revela identificación y/o pertenencia a la realidad en la que actúa. Esta no pertenencia está ligada a la rotación de docentes entre las escuelas, la forma en que los docentes son asignados a las escuelas, el empleo temporal y también por ser personas que viven en la ciudad. En vista de los resultados, señalamos la necesidad de reflexiones e intervenciones conjuntas por parte de la gestión municipal de educación y de los pueblos rurales para cumplir con los principios e ideas legales de la Educación Rural, para evitar que la Escola do Campo contribuya a la disminuir la vida en el campo.

Palabras-clave: identidad; representaciones sociales; escuela de campo; maestro.

Introdução

A expressão ‘Educação do Campo’ tem sua gênese na I Conferência Nacional por uma Educação Básica do Campo, realizada em 19981. Durante a referida Conferência, foram definidos eixos de discussão que tinham como proposta situar a importância de uma política de Educação do Campo. O documento defende o desenvolvimento de um processo educativo condizente com as necessidades e especificidades dos habitantes do campo e garantia de uma educação de qualidade orientada pela realidade desses sujeitos. A partir das discussões travadas nesse evento foi afirmada a luta pelo reconhecimento dos povos do campo como sujeitos de direito à educação.

Assim, nas últimas décadas, tem sido notório o reconhecimento aos movimentos sociais do campo, que se tornaram protagonistas desse debate, construindo-se como sujeitos coletivos de direito à garantia de trabalho, à vida, à dignidade e à educação no campo. A modalidade Educação do Campo está referendada na legislação e outros documentos oficiais (Brasil, 2001; 2002; 2008; 2010a; 2010b) e se contrapõe a manutenção de um modelo hegemônico de cultura urbana. A proposta de Educação do Campo2 preconiza o fortalecimento da cultura, os saberes e as crenças dos povos do campo em sua multiplicidade.

A Educação do Campo é uma modalidade de ensino reconhecida pela Resolução do Conselho Nacional de Educação nº 04/2010, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais a Educação Básica (BRASIL, 2010b). Seus princípios e fundamentos foram estabelecidos oficialmente há quase duas décadas, através das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (BRASIL, 2001), que reconhece os valores, cultura e identidade do público ao qual se destina. O estabelecimento dessas diretrizes é considerado um divisor de águas, uma ruptura com a Educação Rural. Como afirma Ribeiro (2012), a Educação Rural tinha como sujeito de destino a população agrícola, constituída por todas as pessoas para as quais a agricultura representava o principal meio de sustento. Na visão de Ribeiro (2012) “aqueles que residem e trabalham nas zonas rurais e recebem os menores rendimentos por seu trabalho” (RIBEIRO, 2012, p. 293). Cabia à escola rural a oferta de uma educação nos mesmos moldes da que é oferecida às populações que residem e trabalham nas áreas urbanas. O campo, na atual proposta de Educação do Campo, ultrapassa o sentido de perímetro não urbano. É um conceito que articula a relação dos que vivem em seu território com a própria produção das condições da existência social e com as realizações da sociedade humana (BRASIL, 2002).

A nossa experiência como docente envolvida com a formação de professores de uma instituição pública de educação superior, situada no interior do Nordeste, nos leva a reconhecer que problemas estruturais ainda persistem quando se trata de Educação do Campo, tais obstáculos constituem um cenário propício para que os sujeitos nela envolvidos passem a lhe atribuir sentidos, um solo fértil para a proliferação de teorias de senso comum. Neste artigo, fruto de uma pesquisa mais abrangente e partindo-se do pressuposto de que as representações sociais dão identidade aos sujeitos e grupos, procuramos responder a seguinte questão: os professores de escola do campo revelam, por meio de suas representações sociais, pertencimento ao universo campesino e suas escolas?

Referencial teórico

O conceito de representação social foi introduzido por Serge Moscovici no livro La psychanalyse, son image et son public, lançado em 1961 com a proposta de explorar como o conhecimento de senso comum, na forma de um conhecimento compartilhado, se relaciona com as práticas sociais e, por sua vez, como estas repercutem na produção do conhecimento. Nessa obra Moscovici (1978) apresenta resultados de um estudo realizado na França que analisa como a sociedade parisiense, em seus diversos estratos sociais, se apropria de conceitos científicos próprios da teoria psicanalítica.

Mais de seis décadas após sua publicação La psychanalyse, son image et son public persiste como fecunda. Na visão de Lahlou (2014) a atualmente consolidada Teoria das Representações Sociais é um instrumento concreto “[...] a serviço daqueles que querem entender o mundo real e agir sobre ele, particularmente nas áreas de educação e saúde” (LAHLOU, 2014, p. 85).

Para Moscovici, a representação social é “[...] uma modalidade de conhecimento particular que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação entre indivíduos” (MOSCOVICI, 1978, p. 26). Assim, tratar de representações sociais é remeter-se ao conhecimento produzido no senso comum, entretanto, não a todo e qualquer conhecimento, mas ao partilhado acerca de determinados objetos sociais.

A partir de Jodelet (2001) podemos definir representações sociais como sistemas de interpretação que orientam nossas relações com o mundo e com as pessoas. As representações direcionam as condutas e as comunicações sociais, além de interferir em diversos processos, como na transmissão, apropriação de conhecimentos e construção de identidades pessoais e expressões grupais.

Conforme Moscovici (1978), a função das representações sociais é tornar familiar o que é estranho. Como conjunto de conceitos articulados, que tem origem nas práticas sociais, sua principal função seria dar sentido à realidade social, proporcionar a comunicação, guiar as práticas e produzir identidades. Abric (1994) indica quatro funções das representações sociais, quais sejam: função de saber, de orientação, justificadora e identitária.

A função de saber se ampara na ação de comunicar, para compreender e atribuir sentido à realidade social. A partir das nossas representações sociais, podemos explicar fatos e fenômenos, compreendê-los e torná-los familiares no campo do senso comum. A função de orientação atribui às representações o caráter de guia das práticas, de norteadora das ações. A função justificadora confirma o comportamento do sujeito ou grupo para com determinado objeto. Por fim, a função identitária reforça o caráter social da representação, pois, ao ser partilhada por um grupo, a representação de um dado objeto social pode diferenciá-lo de demais, atribuindo uma identidade social aos que o representam. Em contrapartida, o indivíduo que compartilha da representação com um grupo, se insere como pertencente àquele coletivo e não a outro. Tendo em vista o caráter funcional das representações sociais, neste artigo explicitamos a função identitária dos professores ao representarem a escola do campo.

Salientamos que este artigo resulta de pesquisa, mais abrangente, com a qual constatamos representações sociais de professores sobre a escola do campo pautadas na dicotomia ou oposição campo/cidade. Tais representações enfatizam o campo como espaço geográfico/cultural atrasado, cuja finalidade da escola campensina é preparar crianças, adolescentes e jovens para terem acesso à vida urbana. Segundo Abric (1994), as representações sociais situam os grupos sociais no interior de sua cultura e protegem seus significados, ou seja, elas dão identidade aos sujeitos que representam. Nessa perspectiva, exploramos o sentido de pertencimento, a identidade dos professores com a escola do campo.

Metodologia

Para responder à questão proposta neste artigo, desenvolvemos um estudo de abordagem qualitativa do tipo estudo de campo e contamos com a participação de 35 professores.

O estudo foi realizado em escolas do campo do município de Garanhuns-PE. Esse municipio está localizado na mesorregião do Agreste pernambucano e distante 230 km da capital do estado, Recife. A escolha de Garanhuns como locus para realização do estudo relaciona-se ao fato de ser o local de atuação docente de uma das autoras deste texto, bem como devido ao municipio apresentar o maior número de Escolas do Campo no estado de Pernambuco.

Participaram da pesquisa 35 professores que atuavam em Escolas do Campo de Garanhuns-PE. O grupo é formado predominantemente por mulheres (29) na faixa etária de 31 a 40 anos, com formação em cursos de graduação (11) e pós-graduação (24) e a maior parte desses docentes (27) reside na área urbana do município. Dos entrevistados, 21 eram professores com contrato temporário e os demais eram efetivos daquela Rede Municipal de Educação.

A entrevista semiestruturada foi procedimento de coleta de dados utilizado. Esse tipo de entrevista permite a interação entre pesquisador e participante, além de esclarecimentos e adaptações, que a tornam mais eficaz o diálogo e obtenção das informações. Recorremos a este recurso, considerando que nas conversações são veiculados valores que permitem ao pesquisador maior aproximação dos objetos simbólicos, por exemplo, representações sociais (MOSCOVICI, 2003).

A Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2004) subsidiou a organização e análise dos dados. A técnica consiste na manipulação de mensagens para identificar os indicadores, que permitam inferir sobre outra realidade, que não a da mensagem explícita.

Resultados e discussão

A análise dos depoimentos vinculados à relação entre o professor e a Escola do Campo, nos permitiu fazer inferências e, a partir delas, chegar a duas categorias: a) A entrada do professor no universo da Educação do Campo; e b) A relação entre os professores e a comunidade da Escola do Campo. A análise destas categorias permite indicar a relação de pertencimento dos docentes entrevistados ao universo campesino e suas escolas.

A entrada do professor no universo da Educação do Campo

Como já afirmamos desde a primeira Conferência Nacional de Educação do Campo (1998) tem se defendido que os professores das Escolas do Campo possuam vínculos com a identidade local. As diretrizes oficiais que orientam a Educação do Campo (BRASIL, 2001, 2002, 2008) preconizam esse vínculo e reconhecem a relevância de trabalhar, no espaço da Escola do Campo, as questões culturais e identitárias dos povos do campo.

Nessa perspectiva, autores como Kolling; Nery; Molina (1999); Caldart (2000, 2002, 2004), Arroyo (2012b), defendem que professores vinculados ao ideário da Educação do Campo3 são conscientes de sua capacidade de luta, com base na realidade vivenciada, e corroboram a importância que a Escola do Campo assume, também, na formação do professor para atuar nestas instituições. Os referidos autores reforçam a necessidade de investimento no professor dessas escolas, principalmente, através de uma formação alicerçada nos seus fundamentos filosóficos. Para a Caldart (2002), essa compreensão contribui para que o professor reconheça a existência do campo (sua realidade histórica e dos seus sujeitos), perceba a educação como uma ação para o desenvolvimento humano, deixe-se educar pelos sujeitos do campo e entenda a Escola do Campo como um lugar de formação dos sujeitos do campo.

Esse tipo de relacionamento, com o campo4 e com os seus sujeitos não é construído pelos professores no imediato, ele exige dedicação e partilha. O relacionamento implica na familiaridade com a realidade do campo35, as especificidades da comunidade e a partilha dos sentidos atribuídos ao campo, que ainda se apresenta como um espaço luta pela afirmação e valorização de suas identidades, modos de vida, suas lutas e reivindicações para a implantação efetiva da Educação do Campo.

Ressaltamos que o desejo de exercício profissional dos sujeitos é um fator que os leva a se tornarem “professores do campo” no município. As entrevistas evidenciam o anseio destes profissionais em exercer a profissão e as escolas surgem como essa possibilidade. Em geral, ao concorrerem às vagas para docente em seleções municipais, os professores ao terem a informação de que serão docentes de escolas do campo, prevalece o desejo, de ser lotado em uma instituição que mais próxima à cidade. Essa intenção justifica a alta rotatividade dos profissionais nas escolas investigadas.

O desejo de trabalhar próximo à sua residência - mesmo em um universo em que grande parcela dos professores das Escolas do Campo reside no centro urbano de Garanhuns (62%) não é o único fator que impulsiona a rotatividade entre os profissionais; também ganha destaque o alto índice de vínculos provisórios com as escolas. Muitos dos dessas escolas possuem contratos temporários com a Rede Municipal de Educação. Do grupo pesquisado, 21 estão em seu primeiro ano de exercício docente nas instituições. Considerando que os contratos têm validade de seis meses e podem ser prorrogados por igual período, fica claro que, no ano letivo seguinte, haverá nova seleção pública e, provavelmente, as escolas passarão a contar novos professores.

Esses dados indicam como o contexto institucional favorece o estabelecimento de uma frágil e transitória relação do professor do campo com a escola e trabalho docente. Além disso, o professor assume a sala de aula da Escola do Campo, por meio de indicação/imposição da Secretaria de Educação Municipal, ou seja, ele não escolhe a escola do campo em que vai atuar, mas, é designado pelo sistema. A classificção no processo seletivo é o critério para distribuição dos professores nas escolas.

Os depoimentos, a seguir, revelam como a rotatividade é comum na experiência profissional do professor da Escola do Campo no município e indicam o desafio de um maior pertencimento do docente à instituição e comunidade.

Eu trabalho nesta escola há três meses. Participei da seleção ano passado. Minha colocação foi 144 e eu estava na licença maternidade, que terminou em setembro, e eu não voltei. Então, em abril desse ano, me chamaram pra cá porque surgiu a vaga pra educação infantil. Peguei a primeira turma agora e estou com a Educação Infantil com alunos com idades de 4 e 5 anos, em que uma parte deles já irá pro 1º ano do ensino fundamental no ano que vem. (P.2)5

Renovaram meu contrato, mas eu saí da escola que eu trabalahava e agora estou nesse distrito que fica mais perto de minha casa, levo menos tempo vindo aqui para a escola... Estou gostando. Mas, quero mesmo ficar trabalhando lá em Garanhuns. Espero conseguir.... . (P-18)

Veja... Eu trabalho, basicamente, há sete anos - entre estágio e contrato - para o município; e seis, basicamente, desses sete anos, foram em outras do campo, Aí, esse ano, devido a uma seleção que fizemos ano passado, que ainda estava em vigência, e ai nós fomos chamados novamente pra continuar. E, aí, fui localizada aqui. (P-14)

Sou professor responsável pela escola, mas vim para cá por indicação da Secretaria. Eu estava em outra Escola do Campo bem mais distante, ai agora fui designada para vir pra cá. (P.15)

O que depreendemos dessas falas é que o professor está na escola do campo de passagem, é um “visitante” na comunidade. Destacamos que o vínculo transitório não é peculiaridade dos professores temporariamente contratados, pois, mesmo quando é efetivo, o professor, também, fica à mercê de redistribuições e transferências para outras escolas.

Ao lotar os professores nas Escolas do Campo, a Secretaria Municipal de Educação de Garanhuns procura responder às demandas surgidas da Rede Municipal, ou seja, assegurar que as escolas disponham de professores. Nenhum depoimento registrou que a lotação dos professores nas Escolas do Campo tenha ocorrido por desejo ou indicação dos próprios professores de atuar na Escola do Campo, devido a vinculos pessoais com o campo, especificidades dessa educação, público atendido etc.

Salientamos que a Educação do Campo exige uma atuação ativa do professor nas Escolas do Campo. Como nos esclarece Caldart (2002), cabe ao professor ocupar-se da Escola do Campo, como um lugar de formação dos sujeitos, de reconhecer o campo e o seu povo em sua realidade histórica/cultural:

É preciso olhar para o campo como lugar de sujeitos; seres humanos, sujeitos sociais; olhar para a infância, a juventude e os idosos do campo; como vivem, como se constituem como pessoas, como sujeitos coletivos, como povo; compreender cada realidade, e olhar para o processo histórico mais amplo que condiciona as questões e os sujeitos de cada lugar, de cada tempo. Compreender que no campo existem diferentes agentes, como diferentes identidades, mas também uma identidade comum; saber que as diferentes famílias cultivadoras da terra, trabalhadoras do campo são, afinal, o seu povo mais legítimo... Compreender que estes diferentes grupos humanos que vivem no campo têm história, cultura, identidade, lutas comuns e lutas específicas; que parte deles se organiza em movimentos sociais para fazer estas lutas, mas que todos têm direitos sociais e humanos que devem ser, respeitados, legitimados, atendidos... (CALDART, 2002, p.88).

Na mesma direção de Caldart (2002), Arroyo (2012b) destaca a importância do professor da Escola do Campo se autorreconhecer como sujeito ativo, afirmativo e se contrapor às concepções dominantes na cultura social e pedagógica, por serem inspiradoras de propostas curriculares e didáticas de diretrizes e políticas curriculares compensatórias e moralizadoras. Entretanto, na realidade investigada, torna-se desafiante desenvolver tal reconhecimento, se o próprio professor não consegue construir os laços necessários de identificação e de relacionamento mais efetivo com essa comunidade.

Torna-se um desafio para o corpo docente das Escolas do Campo a identidade ou pertencimento às comunidades do campo de Garanhuns, porque suas experiências nessas instituições têm sido momentâneas e encaradas como transitórias.

Ressaltamos que a rotatividade tem sido comum na literatura que aborda as políticas públicas para a Educação do Campo. Por exemplo, Andrade e Di Pierro (2004) ao pesquisarem o perfil do professor da Educação do Campo no Brasil, salientam o vínculo transitório desses docentes com as Escolas do Campo. As análises apresentadas nessa pesquisa revelam a instabilidade/rotatividade do docente, sobretudo, devido às condições de trabalho docente no campo, que não costumam ser atrativas porque predominam a falta de pessoal de apoio, precariedade das instituições escolares e classes multisseriadas. Características e condições de trabalho semelhantes foram identificadas, nos estudos desenvolvidos por Araújo (2014) e Marques (2014).

Nas entrevistas, ao se referirem à experiência de trabalho na Escola do Campo, foram comuns as referências dos professores à distância das suas residências para os seus locais de trabalho (as Escolas do Campo). Esse distanciamento, também, reforça a rotatividade dos docentes nessas escolas. Como demonstram os depoimentos, a seguir, a rotatividade, também, é comum porque, devido ao longo tempo de deslocamento e qualidade dos transportes, os professores sempre almejam trabalhar em escolas próximas aos seus domicílios. Afirmam:

Passei sete anos na cidade de Manoel Correia e fui convidado para migrar para uma escola do distrito de Miracica, onde passei dois anos. De lá, fui convidado para a Secretaria de Educação, onde fiquei um ano e meio. Depois do processo de mudança para a área de gestão, eu preferi sair e vir para cá, pois tinha vaga e era um lugar mais próximo para mim, pois moro numa cidade vizinha, que é Paranatama. (P. 07)

Os alunos e a escola são tranquilos. Não tenho o que dizer do pessoal, muito acolhedor. O que torna dificil trabalhar aqui é porque é muito longe, o transporte não é muito bom. Passo muito tempo esperando e chego muito tarde em casa. (P. 22)

Eu escolhi vir para esta escola por conta do acesso, quer dizer, é difícil chegar até aqui, mas eu moro em Paranatama e como venho de transporte particular, fica mais próximo de onde moro. (P. 03)

Essa passagem transitória pela escola do campo, bem como a ausência de uma identidade campesina são desafiantes para esses docentes e dificultam a elaboração de uma proposta pedagógica realmente identificada com as necessidades de aprendizagem e cultura dos estudantes.

Frisamos que, conforme as políticas de Educação do Campo e, também, da literatura, o professor é, sobretudo, um sujeito que reconhece os saberes vinculados ao mundo do trabalho do campo, da terra, das vivências e ações coletivas sociais, tratando-os como legítimos de ser trabalhados no espaço escolar. Essa identidade e/ou pertencimento não estão presentes nos depoimentos dos entrevistados.

De acordo com Arroyo (2007; 2012b) e Caldart (2002, 2012), transportar para as Escolas do Campo professores sem vínculos com a cultura e com os saberes das comunidades, pode deturpar sua forma de compreender e se relacionar com esse lugar, seus sujeitos e saberes.

A respeito da formação do professor para a Educação do Campo, Caldart (2002) destaca a necessidade de se educar o olhar. Segundo a autora, se a grande finalidade da ação educativa é o desenvolvimento pleno do ser humano, sua humanização e inserção crítica na dinâmica da social, é fundamental garantir ao professor a experiência de educar o seu olhar, a fim de que possa enxergar o campo como um lugar de sujeitos, cuja cultura deve ser definidora das práticas educativas nas escolas campesinas.

Marques (2014), ao discutir as condições de trabalho e formação dos professores de Escolas do Campo, reitera que esses profissionais costumam permanecer por pouco tempo nas instituições e, que este aspecto, acarreta no afastamento docente das relações que permeiam a Escola do Campo. Para a autora, a rotatividade docente na Educação do Campo traz como consequências a desconsideração (por desconhecimento e/ou desvalorização) dos elementos que constituem a identidade dos estudantes com os quais trabalham.

Pimenta (2015) corrobora que quando questões que envolvem o tempo, a vivência e as lutas (vitoriosas ou não) das comunidades rurais são consideradas o trabalho do professor da Escola do Campo tem um diferencial. Segundo a autora quando o professor está “imerso no contato com as comunidades ele passa a ter um papel social naquele espaço, sendo não só um formador, mas como emancipador na escola e na comunidade” (Pimenta, 2015, p.91) A referida autora, também, registra que o vínculo empregatício temporário de muitos professores, constitui-se como um desafio para a aproximação da realidade campesina, e, por conseguinte, à construção de pertencimento com a comunidade. No âmbito das políticas educacionais, o desenvolvimento de ações para minimizar a rotatividade de docentes nas Escolas do Campo deve ser um dos objetivos dessa modalidade de educação.

Os avanços legais, que orientam a proposta de Educação do Campo e as pautas defendidas pelos movimentos sociais, principalmente em relação ao professor são visíveis, entretanto a materialização de tais determinações constitui, ainda, um grande desafio, por parte dos poderes públicos. Os depoimentos de alguns dos entrevistados reforçam isso.

Percebemos uma preocupação da Secretaria Municipal em garantir a não interrupção das aulas por falta de professor e rotatividade docente tem sido uma resposta do município para a situação. A significativa quantidade de contratos temporários pela Secretaria Municipal de Educação não favorece a permanência dos profissionais nas instituições e implica, de forma negativa, para a possibilidade de construção de um sentimento de pertença por parte desses professores em relação à comunidade, como propõem as diretrizes para as Escolas do Campo.

O recrutamento e a lotação do docente na Educação do Campo do município são feitos, exclusivamente, pela Secretaria Municipal. Os professores em geral aguardam ansiosos para trabalhar mais próximos às suas residências e ganham relevo, nesse cenário, a ausência de estímulos à criação de vínculos do professor com a comunidade onde atua e a falta de ações que incentivem o sentimento de pertença desse professor à realidade do campo, na qual a escola está inserida, a fim de torná-lo mais ativo e identificado com a formação dos povos do campo.

A relação entre os professores e a comunidade da Escola do Campo

Com base nos depoimentos dos entrevistados, foi possível analisar a relação estabelecida entre os professores do município de Garanhuns com as Escolas do Campo em que atuam. Seus relatos indicam que não há o estabelecimento de vínculos mais próximos entre os professores e as comunidades que as escolas recebem.

Quando questionados sobre a importância da escola para a comunidade, os professores demonstraram, em seus depoimentos, que para a família, a Escola do Campo é relevante, diante do fácil acesso e da proximidade de suas residências. Eis o que mostram os trechos das falas:

Os pais valorizam a escola, porque é através dela que os filhos deles podem ter o conhecimento e, se não houvesse a escola, eles teriam que se deslocar pra outra escola mais distante ou pra cidade, que é mais difícil ainda pra crianças desse tamanho. (P.2)

Sim, acho que a escola é importante para a comunidade. Segundo eles mesmos dizem, aqui eles têm mais acesso para trazerem os filhos, mais contato com a responsável da escola que dá muita atenção para eles. (P.12)

Essa escola é importante, porque sem ela os meninos precisam estar indo todo dia pra cidade, o transporte não é dos melhores e os pais ficam proximos e podem educar os filhos .... Acho que isto é o mais importante ter uma escola pertinho de casa. Eles ficam tranquilos (P.22).

A escola permite um acesso maior para os alunos, para os pais, que eles possam estar visitando essa escola, que eles possam saber, acompanhar a rotina de seus filhos. Seria diferente se seu filho estudasse em uma escola mais distante. Se você precisa do pai, ele vai ter mais dificuldade... Nem todos têm como chegar até a escola. Acredito que a escola dentro da comunidade, ela tem essa facilidade, tanto para que o aluno chegue até a escola, tanto para que as famílias possam estar participando dela. (P.15)

Estudos que focam na relação das comunidades campesinas com as Escolas do Campo e seus territórios (Peripolli; Zoia, 2014; Araújo, 2014) indicam, que mesmo diante de um cenário de abandono do poder público e de precarização das condições inerentes à Escola do Campo, famílias moradoras do campo defendem a instituição como um espaço necessário para a formação das novas gerações, conscientes de sua identidade.

Nos resultados da pesquisa que deu origem a este artigo os elementos que ganham destaque entre os entrevistados, restringem-se à localização geográfica da Escola do Campo, os estudantes não precisarem fazer o deslocamento para a Sede do município. Conforme evidenciam os professores, a Escola do Campo desempenharia o seu papel apenas por ter garantida a sua oferta próxima à residência das famílias.

Também foi possível perceber que os professores não compreendem que, para além do núcleo familiar, a escola deveria trabalhar próxima aos membros das populações do campo, à comunidade local. Sempre que convidados a falar da participação da comunidade no espaço escolar, os professores restringem suas referências à família de seus alunos. Salientamos que em muitos depoimentos docentes revelam certa decepção com a pequena participação dos pais, que pouco acompanham as atividades e ações escolares.

Os depoimentos sugerem refletir sobre como os professores compreendem a comunidade em que atuam:

Bom, a comunidade? Eu não tenho muito conhecimento. A gente só teve duas reuniões com os pais, teve uma festinha das mães... Eu não tenho muito contato, a não ser pelo telefone quando alguns ligam. (P.12, E7/C/M)

Eles são mais participativos em reuniões de pais e mestres, em alguma outra reunião, mas que seja uma reunião de festividade. Mas a parte de planejamento da proposta pedagógica da escola, eles não participam. (P.09, E9, C/M)

Eles tendem um pouco a abandonar a escola e deixar por nossa conta. Nas reuniões de pais aqui, quando tem, vem pouquíssimos pais, e quando tem, são ‘dos bons’. A presença da comunidade é muito pequena. (P. 35, E.11, E/S)

Sabemos que a Educação do Campo se faz mediante um trabalho conjunto de escola e comunidade do campo. Caldart (2002) enfatiza essa relação de parceria ao se referir a Escola do Campo como uma instituição de formação dos sujeitos do campo. Acrescenta que o professor dessas escolas deve deixar-se educar pelos sujeitos do campo e seus processos de formação.

Depreendemos que, embora existam avanços legais para a oferta da Educação do Campo, pautados nos direitos das populações ao acesso e à escolarização vinculada às suas identidades, os depoimentos sugerem que os docentes permanecem alheios aos referenciais da Educação do Campo, suas políticas, desafios e princípios.

Certamente, a ausência de uma formação específica para a atuação docente na modalidade, constitui um agravante para Educação do Campo em Garanhuns. Essa ausência , também, contribui para favorecer o não pertencimento e identificação do professor com a realidade do campo.

Na visão de Fernandes, Cerioli, Caldart (2011), que estudam o ingresso do professor na Educação do Campo, muitas vezes, não parte desse profissional o interesse em atuar nessa modalidade. Comumente, o ingresso nas instituições é fruto de imposição, ou até mesmo uma espécie punição, por parte de setores político-partidários locais.

De modo diferente, outros resultados de pesquisas mostram experiências em que os professores das Escolas do Campo vivenciam a realidade das populações rurais, como herança cultural ou a partir da entrada na Escola do Campo e da aproximação com os saberes e diversidade de formas de vida no campo. O estudo de Pimenta (2015), desenvolvido em Maués/AM, e o de Lopes (2013), nas escolas de Breves/PA, por exemplo, apresentam professores que assumem as escolas da Educação do Campo e não fazem parte das comunidades ribeirinhas que frequentam as Escolas do Campo, mas, se inserem em seus contextos durante o período de aulas, inclusive morando em casas da comunidade, ou em espaços cedidos dentro de residências, e participam, ativamente, da rotina das comunidades durante o calendário letivo.

A pesquisa desenvolvida por Klein (2013) analisa como os saberes e culturas de uma comunidade campesina do Espírito Santo, influenciam o currículo adotado na escola de um assentamento. O estudo mostra a realidade do professor nativo, pois grande parte dosdocentes da escolas eram os filhos, as esposas de agricultores e moradores do campo. Para a autora essa identidade com o campo:

possibilita um engajamento dos sujeitos, pois são do campo, vieram do campo e trabalham em uma escola do campo, há uma identificação territorial. São conhecedores do universo e cultura campesina, o que desencadeia consequentemente, sob nosso olhar, um sentimento de maior responsabilidade com uma educação comprometida com a realidade campesina. (Klein, 2013, p.173)

Desse modo, não nos surpreende a constatação de que a relação entre os professores investigados e as comunidades na quais as escolas estão inseridas seja frágil. Cada vez mais, compreendemos que a relação do professor com a comunidade campesina é pautada na impessoalidade e no olhar do professor sobre o “outro” (cultura estranha), quando deveria ser no autorreconhecimento como sujeito do campo (Arroyo, 2013).

As condições em que os professores investigados nas Escolas do Campo, situadas em Garanhuns, desenvolvem a sua profissão (vinculados à Rede Municipal por contrato de curta duração e em constante rotatividade) constituem os maiores desafios para o estabelecimento de vínculos mais próximos aos saberes, hábitos e vivências campesinas. Esses professores não têm acesso, via Secretaria Municipal de Educação, a formação continuada específica para sua atuação nessa modalidade, como é preconizado nas diretrizes (BRASIL, 2002, Art. 13I), e seu ingresso na função é desprovido de critérios vinculados ao domínio de conhecimentos acerca do ideário da Educação do Campo, a passagem pela função de professor costuma ser transitória e, por conseguinte, não há pertencimento, as relações com a comunidade são formais e difusas.

Considerações finais

A análise das entrevistas, com 35 professores da Rede Municipal de Garanhuns-PE, revela representações sociais de Escola do Campo pautadas em distanciamento e não identidade com realidade campesina e suas escolas.

Sabemos que a literatura politicas públicas referentes à Educação do Campo preconizam o direito desses povos, historicamente excluídos, a um processo de escolarização que respeite e valorize sua cultura, no entanto a pesquisa realizada com docentes mosta que ainda estamos distantes de concretrizar esse propósito. As representações sociais de Escola do Campo dos professores investigados são marcadas por um conteúdo simbólico que coloca em oposição o campo e a cidade, privilegiando o espaço e a cultura urbana em detrimento da cultura campesina.

O pertencimento do docente a Escola do campo é fragilizado devido a constante rotatividade dos professores entre as escolas, o modo como são designados para essas instituições, a contratação temporária e ainda por serem, majoritariamente, radicados na cidade. Trata-se de uma realidade desafiadora que impede desenvolvimento de práticas pedagógicas compatíveis com os valores e cultura da comunidade campesina.

Ressaltamos que as representações sociais têm como principais funções dar sentido à realidade social, proporcionar a comunicação, guiar as práticas e produzir identidades. Coerente com as representações identificadas, os achados sugerem que o professor da Escola do Campo não revela identificação e pertencimento com a realidade em que atua.

1A Conferência Nacional Por Uma Educação Básica do Campo foi realizada em Luziânia, Goiás, de 27 a 31 de julho de 1998. A proposta para sua realização surgiu durante o I Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária (I ENERA) ocorrido em julho de 1997. A conferência, promovida a nível nacional pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); Universidade de Brasília (UNB); e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância, foi preparada nos estados através de encontros que reuniram os principais sujeitos e práticas e de preocupações relacionadas à Educação do Campo (KOLLING; CERIOLI; CALDART, 2002).

2A Educação do Campo defende em seu ideário que: a) a Educação do Campo é incompatível com o modelo de agricultura capitalista; b) tem vínculo de origem com as lutas sociais camponesas; c) a antinomia rural e urbana e da visão predominante de que o moderno e mais avançado é sempre o urbano; d) participa do debate sobre desenvolvimento, assumindo uma visão de totalidade, em contraposição à visão setorial e excludente que ainda predomina em nosso país. Assim, a Educação do Campo se contrapõe à educação rural, que menosprezava os conhecimentos campesinos, exaltava a cultura urbana e se fortalecia na dicotomia entre rural x urbano. (CALDART, 2004, p. 15)

3 A Educação do Campo defende em seu ideário que: a) a Educação do Campo é incompatível com o modelo de agricultura capitalista; b) tem vínculo de origem com as lutas sociais camponesas; c) a antinomia rural e urbana e da visão predominante de que o moderno e mais avançado é sempre o urbano; d) participa do debate sobre desenvolvimento, assumindo uma visão de totalidade, em contraposição à visão setorial e excludente que ainda predomina em nosso país. Assim, a Educação do Campo se contrapõe à educação rural, que menosprezava aos conhecimentos campesinos, exaltava a cultura urbana e se fortalecia na dicotomia entre rural x urbano. (CALDART, 2004, p. 15)

4Utilizamos a designação ‘campo’ neste trabalho em respeito à definição adotada pela literatura específica da Educação do Campo. Conforme Fernandes e Molina (2004) o ‘campo da Educação do Campo’ é analisado a partir do conceito de território (definido como espaço político por excelência, campo de ação e de poder). Conforme esclarecem, enquanto o paradigma da educação rural compreende o campo apenas enquanto um espaço voltado à produção de mercadorias, no ideário da Educação do Campo esse é um “espaço de vida e resistência, onde camponeses lutam por acesso e permanência na terra e para edificar e garantir um modus vivendi que respeite as diferenças quanto à relação com a natureza, o trabalho, a cultura e suas relações sociais”. (FERNANDES; MOLINA, 2004, p.63)

5Codificação utilizada para preservar a identidade dos participantes.

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Recebido: 19 de Abril de 2022; Aceito: 09 de Março de 2023

Editor Chefe: Prof. Dr. José Eustáquio Romão

Editora Científica: Profa. Dra. Ana Maria Haddad Baptista

Editora Científica: Profa. Dra. Marcia Fusaro

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