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Eccos Revista Científica

versão impressa ISSN 1517-1949versão On-line ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.66 São Paulo jul./set 2023  Epub 19-Fev-2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n66.25158 

Artigos

A SIMULAÇÃO REALÍSTICA COMO PRÁTICA EDUCACIONAL NA FORMAÇÃO DA ENFERMAGEM CONTEMPORÂNEA

REALISTIC SIMULATION AS AN EDUCATIONAL PRACTICE IN CONTEMPORARY NURSING TRAINING

LA SIMULACIÓN REALISTA COMO PRÁCTICA EDUCATIVA EN LA EDUCACIÓN DE ENFERMERÍA CONTEMPORÁNEA

Renato Fábio Espadaro, Doutor em Ciências da Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-4346-8805

1Doutor em Ciências da Educação, Universidade Nove de Julho - UNINOVE, São Paulo, SP - Brasil


Resumo

Este artigo é um recorte da dissertação e tese apresentadas ao Programa de Mestrado e Doutorado em Educação da Universidade Nove de Julho (PPGE-UNINOVE), com os temas centrais de educação em saúde na temática de simulação realística na enfermagem. Neste texto, o objetivo foi contextualizar a formação de enfermagem na contemporaneidade, utilizando como método de ensino a simulação realística. A metodologia utilizada foi uma revisão de literatura levando em consideração os temas centrais. Sua estrutura possui introdução com uma breve descrição da profissão enfermagem e suas características, o ensino na enfermagem e a simulação realística. Na segunda parte o desenvolvimento com toda a revisão de literatura conceituando o ensino na saúde, ensino por competências, a enfermagem contemporânea e o uso da metodologia ativa titulada como simulação realística. A conclusão como última estrutura, compreendeu que a enfermagem busca por evolução constante a utilização da tecnologia para aprimoramento e qualificação do ensino e da prestação de serviço em saúde, sendo a simulação o melhor método de ensino para formação, qualificação e aprimoramento e, treinamento.

Palavras-chave: simulação realística; enfermagem; metodologias ativas.

Abstract

This article is an excerpt from the dissertation and thesis presented to the Master's and Doctorate Program in Education at the Universidade Nove de Julho (PPGE-UNINOVE), with the central themes of health education in the theme of realistic simulation in nursing. In this text, the objective was to contextualize nursing education in contemporary times, using realistic simulation as a teaching method. The methodology used was a literature review taking into account the central themes. Its structure has an introduction with a brief description of the nursing profession and its characteristics, teaching in nursing and realistic simulation. In the second part, the development with the entire literature review conceptualizing health education, teaching by competences, contemporary nursing and the use of the active methodology titled as realistic simulation. The conclusion, as the last structure, understood that nursing seeks constant evolution in the use of technology for the improvement and qualification of teaching and the provision of health services, with simulation being the best teaching method for education, qualification and improvement, and training.

Keywords: realistic simulation; nursing; active methodologies

Resumen

Este artículo es un extracto de la disertación y tesis presentada en el Programa de Maestría y Doctorado en Educación de la Universidade Nove de Julho (PPGE-UNINOVE), con los temas centrales de la educación en salud en el tema de la simulación realista en enfermería. En este texto, el objetivo fue contextualizar la educación de enfermería en la época contemporánea, utilizando la simulación realista como método de enseñanza. La metodología utilizada fue una revisión de la literatura teniendo en cuenta los temas centrales. Su estructura cuenta con una introducción con una breve descripción de la profesión de enfermería y sus características, enseñanza en enfermería y simulación realista. En la segunda parte, se desarrolla toda la revisión de la literatura conceptualizando la educación para la salud, la enseñanza por competencias, la enfermería contemporánea y el uso de la metodología activa denominada simulación realista. La conclusión, como última estructura, entendió que la enfermería busca la evolución constante en el uso de la tecnología para el perfeccionamiento y calificación de la enseñanza y la prestación de servicios de salud, siendo la simulación el mejor método de enseñanza para la educación, calificación y perfeccionamiento y formación.

Palabras clave: simulación realista; enfermería; metodologías activas.

Introdução

Para Horta (1979), a ciência está fundamentada em uma filosofia para manutenção de sua existência. Na atividade de enfermagem, a filosofia unifica as bases da profissão, deixando-a mais consolidada. As bases filosóficas da enfermagem são: o Ser, o Conhecer e a Linguagem.

A princípio, quando dos primórdios do exercício da profissão, no século XIX, a enfermagem desenvolveu-se de modo intuitivo. Mas, a partir da criação das escolas de formação profissional, a enfermagem vem acumulando conhecimentos e, nos dias de hoje, tem alcançado uma produção mais científica, a partir de pesquisas consolidadas, às quais este trabalho pretende se somar. Para esse desenvolvimento profissional contribuíram várias teorias, que fortaleceram a enfermagem como ciência. Dentre as teorias mais consolidadas destacam-se: do processo de enfermagem, da adaptação, do autocuidado, das relações interpessoais, da sinergística, da holística, da homeostática e das necessidades humanas básicas.

Entende-se que a enfermagem é também uma intervenção, cujos princípios fundantes e especificidade podem ser detectados no cuidado a ser dispensado ao ser humano, à família e à comunidade, de modo integral e holístico, desenvolvendo ações que visam a promoção da saúde, a prevenção, o tratamento e a reabilitação do doente. (Horta,1979)

Fundamentalmente, para se promover a saúde, faz-se necessária a utilização da ciência como fundamento da enfermagem e a intervenção humanística como método de ação e desenvolvimento da assistência, ambas comprometidas com a vida. A prática de enfermagem deverá basear-se em técnicas e procedimentos seguros e eficazes, garantindo diretamente a qualidade do atendimento, o que quer dizer uma assistência livre de iatrogenias. Para isto, é preciso treinamento contínuo e educação permanente nos serviços de saúde (Espadaro, 2017)

Historicamente, a Enfermagem iniciou-se com atividades desenvolvidas em campos de guerras, internacionalmente e pela primeira vez, na Criméia, e, no Brasil, na Guerra do Paraguai, onde senhoras donas de casa acompanhavam seus esposos e filhos durante os serviços militares para a prática clínica necessária. Por meio das necessidades locais, jovens mulheres e adultas solteiras eram selecionadas por aquelas mais velhas para participarem dos grupos de atendimento. A prática de enfermagem, nessa época, era totalmente empírica, mas reconhecia a necessidade de aprimoramento, de estudo sobre procedimentos e sobre a evolução das estratégias dos cuidados. A partir da Cruz Vermelha e outras entidades assistenciais, a enfermagem iniciou a produção de conhecimento, criou empoderamento sobre técnicas e procedimentos e evoluiu como ciência até os dias de hoje.

Hoje, são reconhecidas, no Brasil, três categorias profissionais na enfermagem: auxiliares, técnicos e enfermeiros. Os auxiliares e técnicos de enfermagem são profissionais do nível técnico, com formação secundária de aproximadamente dois anos de duração, cujo principal objetivo é operacionalizar a assistência de enfermagem diretamente junto ao paciente. Os auxiliares e técnicos de enfermagem realizam técnicas e procedimentos sob supervisão do profissional enfermeiro. Este, deve ser graduado com tempo mínimo de quatro anos de formação, de acordo com o determinado pelas normas que regem a educação superior no País. Suas principais funções são: gerenciamento do cuidar, execução de técnicas e procedimentos da alta complexidade, acompanhamento e desenvolvimento de assistência integral ao paciente, independentemente do nível de atenção. O enfermeiro também realiza treinamentos, consultorias, auditorias e atua como empreendedor em diversas áreas da saúde. Ao serem habilitados como auxiliares, técnico de enfermagem ou enfermeiros, os profissionais em foco exercem a profissão, que é fiscalizada pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e pelos Conselhos Regionais de Enfermagem (CORENs).

Para Horta, 1979 o enfermeiro desenvolve três principais dimensões de trabalho: (I) a do cuidar, que é específica, é o eixo norteador; (II) a interdependência, em que a promoção e recuperação da saúde é fundamental e (III) por último, a social, que ensino, pesquisa e responsabilidades legais são características obrigatórias.

A prática de ensino na enfermagem deveria ser função do enfermeiro devidamente preparado para a docência. Sua formação, na graduação, não o habilita para a prática de ensino, sendo necessário um complemento como, por exemplo, a pós-graduação da área de práticas educacionais no ensino em enfermagem (Formação Docente para o Ensino Técnico e Superior).

Nesse sentido, os desafios relacionados à educação para o século XXI remetem a uma preocupação, na qual o docente deve repensar, reavaliar e reconstruir a própria prática pedagógica, refletindo sobre o processo educativo no qual o educador e o educando apresentam papel ativo (Gomes; Germano, 2007).

A cultura tradicional do ensino em saúde tem sofrido mudanças nos últimos anos. O processo de ensino-aprendizagem de habilidades clínicas era tradicionalmente baseada em um modelo didático-pedagógico centrado no professor, em que o aluno desempenhava um papel puramente passivo e observador. O conhecimento fragmentado e o aprendizado baseado em técnicas passivas; como aulas teóricas, ou atividades desenvolvidas em ambiente hospitalar, centradas no professor, nas quais os alunos têm um papel de simples observador; diminuem a retenção do conhecimento e aplicabilidade na prática, prejudicando a formação do aluno.

As novas tendências para a formação dos futuros profissionais de saúde sinalizam para a incorporação de metodologias ativas e inovadoras do processo de ensino aprendizagem, centradas nos estudantes. Entre as inovações destacam-se a interdisciplinaridade, o aprendizado baseado em problemas, a integralidade da assistência à saúde, a segurança do paciente, a diversificação dos cenários de prática e a avaliação formativa do aluno.

Considerando a informação acima, o ensino de enfermagem deve ser pautado no aprendizado significativo, pois os discentes necessitam de estímulos para adquirir, aprimorar e qualificar o processo de aprendizagem. A adoção de processos inovadores de educação impõe a necessidade de se fazer uma análise crítica da situação atual da educação em enfermagem, bem como a identificação das necessidades educacionais, para a implementação de ações por meio da adoção de novas modalidades de ensino. Assim, muitos educadores têm buscado, ao longo dos anos, tecnologias que levem em consideração os novos cenários mundiais, que sinalizam mudanças no processo ensino-aprendizagem, bem como transformações no paradigma científico relacionado à educação (Dal Sasso; Barbosa, 2000).

As aulas expositivas e práticas laboratoriais, sob forma de habilidades demonstrativas, não resolvem totalmente as demandas de um ensino de qualidade em sua totalidade. As metodologias ativas para o ensino na área da saúde vêm crescendo cada vez mais, gerando qualidade e melhor curva de retenção de conhecimentos pós-aplicação.

Uma das metodologias de ensino que parece vir garantindo uma prática consubstanciada na evolução do processo de ensino-aprendizagem é a Simulação Realística. A formação do discente que aprende com a Simulação Realística deve ser baseada no domínio de conhecimentos científicos, no processo de ensinar e aprender, recriando situações de aprendizagem por investigação do conhecimento de forma coletiva, com o propósito de valorizar o universo cognitivo e cultural dos acadêmicos como processos interativos (Feijó, 2010). O uso da Simulação Realística como estratégia de ensino em enfermagem tem se tornado uma ferramenta fundamental e frequente para a formação dos discentes em cursos de graduação e de pós-graduação. No entanto, existem correlações potenciais entre a eficácia do emprego do manequim como simulador e de outros tipos de simulação, incluindo a de realidade virtual.

Na Simulação Realística, percebe-se que o discente é estimulado, por vários mecanismos e instrumentos (efeitos em um cenário controlado), a ter o protagonismo necessário à mediação mencionada. Para dar um exemplo, o manequim, com suas características realistas de um paciente, apresenta-se ao discente como um verdadeiro paciente. Aqui, no exemplo dado, trata-se realmente, de um “paciente”, cujo protagonismo só pode ser simulado no caso de atores ou de robôs. A simulação expõe à equipe de saúde, aos docentes, discentes, ao paciente real e a seus familiares, o mecanismo da doença em forma de sinais e sintomas, garantindo a segurança do paciente e explicitando, previamente, os procedimentos que deverão ser realizados durante o atendimento real. Todas essas informações e estímulos favorecem o enriquecimento da aprendizagem dos saberes, das técnicas, dos protocolos, dos procedimentos, enfim de toda a abordagem e intervenção que, necessariamente, deverão ser utilizadas no atendimento e no cuidado.

Desenvolvimento

Para Freire, 2010 A formação com qualidade depende de um esforço coletivo e não puramente o treinamento de destrezas. É fundamental que o educando tenha autonomia para seu aprendizado e a busca constante do raciocínio para o movimento da autonomia. Esse é um processo contínuo que movimenta intimamente o interesse pelo conhecimento e suas virtudes. É importante estimular o aprendiz a buscar o entendimento entre o conteúdo e a vivência, para que ambos, possam fortalecer o “eu” como futuro profissional e indivíduo nos aspectos social, político e cultural. Daí a importância de o docente respeitar os limites, as características humanas, sem rotular o indivíduo, pois os estereótipos podem prejudicar a evolução do indivíduo e não prepara-lo para a vida. De fato, Freire, 2010 nos narra que não há “docência sem discência, as duas se explicam”. Não há o ensinar sem o aprender e nem o aprender sem ensinar. O docente deve se preparar para ensinar e o discente deve se estruturar para aprender. O conceito da educação bancária de Freire, 1987, traz justamente a limitação do aprendizado de acordo com diretrizes pactuadas pelo mundo moderno. Deixamos de gerar a curiosidade epistemológica. O educando deve ser estimulado a sua capacidade de se arriscar e de se aventurar pelo mundo do conhecimento. Isso, formará um sujeito, reflexivo, interativo, inovador, com aspectos políticos, sociais e culturais.

Para Boff ,2014 o cuidado é relacionado não só a uma ação, mas uma atitude do ser humano em relação ao outro. O cuidado é o oposto do descuido e do descaso. Ele representa uma atitude de ocupação, responsabilidade, zelo, preocupação e o mais importante, uma relação de afeto com o próximo. A relação do cuidar está também no ato de ensinar, pois a formação do aluno, futuro profissional é um cuidado permanente com o aprendizado e o manejo das informações para que o ensino tenha base e alicerce na fundamentação do cuidado.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996 estabeleceu as bases filosóficas, conceituais, políticas e metodológicas para a Educação Brasileira e dentre seus objetivos orienta a construção de novos projetos pedagógicos de cursos profissionais estruturados na prática e no exercício profissional. Assim, os cursos para formação em enfermagem deverão apresentar características detalhadas do exercício dessa profissão, de acordo com competências e habilidades exigidas, propondo que os profissionais egressos, possam vir a ser críticos, reflexivos, dinâmicos, ativos, diante das demandas do mercado de trabalho, aptos a “aprender a aprender”, a assumir os direitos de liberdade e cidadania, compreendendo as tendências do mundo atual e as necessidades de desenvolvimento do país.

Em função dessa necessidade, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) em conjunto com instituições interlocutoras da área, como o Conselho Federal de Enfermagem, pensaram e discutiram o perfil necessário do (a) profissional enfermeiro (a), com os devidos conhecimentos, habilidades e posturas: capacidade de dispensar atenção à saúde, para a tomada de decisões, para comunicação adequada, para a liderança, para a administração e o gerenciamento institucional, quando for o caso, e para se educar permanentemente. Entre as seis “competências” apontadas, cinco podem ser caracterizadas como gerenciais, que deverão ser exercidas principalmente no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) (Peres; Ciampone, 2006).

O conceito de competência vem sendo analisado e abordado com muita frequência em eventos científicos. A formação baseada em competência cria um cenário na educação profissional, caracterizando especificidades como atitudes, comportamento, comunicação, liderança e outras definições para eficiência de um futuro profissional.

Segundo Zarifian,1999 a competência é a inteligência prática para situações que se apoiam sobre os conhecimentos adquiridos e os transformam com tanto mais força, quanto mais aumenta a complexidade das situações.

O profissional enfermeiro em sua base de exercício de trabalho, deve exercer uma comunicação efetiva, relacionamento interpessoal, acolhimento dos colegas de trabalho e “pacientes”, ter um bom desempenho de suas atividades de planejamento e tomadas de decisões, como também a segurança do paciente.

A utilização de estratégias de ensino inovadoras para a formação de profissionais mais consolidados caracteriza a necessidade da realização de estudos mais críticos das situações atuais, bem como a identificação das necessidades educacionais para a implementação de ações por meio da adoção de novas modalidades de ensino. Assim, muitos educadores têm buscado, ao longo dos anos, tecnologias que levem em consideração os novos cenários mundiais que sinalizam mudanças no processo ensino-aprendizagem, bem como transformações relacionadas à educação (Espadaro, 2022).

Com base nas prerrogativas exigidas para a formação de um futuro profissional preparado para enfrentar o mercado de trabalho, é exigido também do docente, uma postura diferenciada, com base em estratégias na educação para adultos, significativa e dinâmica. É fundamental que o docente esteja preparado para lidar com estratégias de ensino em que o discente se torne sujeito de sua própria aprendizagem. As situações problematizadas deverão fazer parte da formação mais crítica e reflexiva. Estratégias de ensino prático diferenciadas, caracterizam uma inovação para uma formação consolidada nos tempos contemporâneos.

Uma estratégia de ensino que vem sendo utilizada para a formação em enfermagem, principalmente para atividades práticas, é a Simulação Realística, em que o discente é o sujeito ativo da aprendizagem, em cenários estratégicos e previamente criados, de modo a garantir a qualidade do ensino. Esses cenários mimetizam ambientes pré e intra-hospitalares, com equipamentos da realidade, estrutura diferenciada e manequins que proporcionam sinais e sintomas, fazendo com que o discente entenda a dinâmica de um sistema real (COREN,2020)

A simulação é uma metodologia inovadora, centrada no aluno, que valoriza a integração de conteúdo, e que é inclui, portanto, a participação ativa dos sujeitos, favorecendo sobremaneira o aprendizado. Utiliza como cenários de prática ambientes seguro e controlados, com situações previamente planejadas muito semelhantes às situações reais, permitindo que os participantes aprendam enquanto vivenciam a situação problema de forma agradável, ativa, desafiadora, motivadora e segura (Duran, 2014).

A Simulação Realística se fundamenta em quatro bases:

  • a) o conhecimento teórico;

  • b) a habilidade por meio de procedimentos individualizados;

  • c) a aplicação do cenário com estímulos para aplicação de raciocínio clínico e crítico e;

  • d) o debriefing (discussão estruturada com base na prática executada) como retroalimentação do conhecimento.

Assim, a formação do docente em enfermagem que atua com a Simulação Realística, deve ser baseada no domínio de conhecimentos científicos no processo de ensinar e aprender, recriando situações de aprendizagem por investigação do conhecimento de forma coletiva, com o propósito de valorizar o universo cognitivo e cultural dos acadêmicos como processos interativos (Feijó, 2010).

Deste modo, entende-se que o uso da metodologia de simulação pode direcionar e proporcionar ruptura com o modo tradicional de ensino, por contemplar um método no qual o professor deixa de ser o detentor do conhecimento e passa a construí-lo em conjunto com seus discentes, proporcionando, ao discente, a participação proativa no seu próprio aprendizado. Neste formato, o conhecimento é compartilhado e, por meio de tarefas simuladas, passa a requerer dos envolvidos intervenções e habilidades capazes de promover melhoria real na apreensão do conteúdo aprendido (Ferreira; Carvalho; Carvalho, 2015).

Situações de complexidades variadas são reproduzidas por várias vezes, de acordo com os objetivos e fase do itinerário formativo do aluno. Nessas situações, acertos e possibilidades de melhorias são discutidos de forma construtiva, estimulando o processo de ensino aprendizagem. O treinamento das diversas competências se desenvolve em um ambiente controlado, sem necessidade de pacientes reais, e integrado com as demais atividades curriculares.

Na simulação, o conhecimento é construído a partir da vivência e discussão das ações em situações programadas, representativas da realidade da prática profissional, simuladas por pacientes-atores e/ou por manequins em ambiente protegido e controlado. Na simulação há reprodução de aspectos essenciais de um cenário clínico real para que, quando um cenário semelhante ocorrer na vida real, a atuação seja exitosa e facilmente gerenciada. O uso da simulação, em diferentes cenários e momentos do itinerário formativo dos estudantes da área da saúde, aprimora o processo ensino-aprendizagem, permitindo aos alunos praticarem as competências necessárias em um ambiente controlado onde, inclusive, o erro é permitido e discutido. Os alunos recebem feedback do professor e dos colegas, favorecendo a reflexão de seus conhecimentos, habilidades e atitudes em relação à situação proposta e à tomada de decisão, de forma crítica.

A simulação pode ser utilizada em contextos de complexidades crescentes, podendo ser empregada para treinamento de uma habilidade específica, por exemplo, a punção de um acesso venoso, até a vivência de cenários complexos, com procedimentos invasivos e envolvendo trabalho em equipe, com várias categorias profissionais, como por exemplo na simulação de um atendimento em uma unidade de terapia intensiva. Atualmente, na área da saúde, simuladores de última geração reproduzem perfeitamente os mais diversos comportamentos do corpo humano, mimetizando situações de normalidade e de extremo desarranjo das funções fisiológicas (Pezzi; Neto, 2008).

Além disso, a simulação é um excelente método de avaliação estruturada, com a padronização dos problemas apresentados pelos pacientes e feedback para os estudantes. Favorece o aprendizado de comunicação efetiva entre profissionais de saúde e entre esses e pacientes/familiares, gerenciamento de crise, liderança, empatia, trabalho em equipe e segurança do paciente. A simulação contribui para aquisição de uma postura mais confiante do futuro profissional, que tomará decisões de forma estrategicamente planejada em benefício da sociedade.

Para Sanino, 2011 a prática clínica simulada possibilita aos participantes vivenciarem aspectos essenciais de uma determinada situação clínica, permitindo que esta situação seja entendida e incorporada pelos alunos, visando que esses mesmos alunos a executem de forma adequada e segura no contexto real. Permitem simular o atendimento integral a um paciente, explorando todos os aspectos do atendimento, a relação médico-paciente, as atitudes individuais, o relacionamento interpessoal na equipe de atendimento, a definição de prioridades e o comportamento diante de situações crises. Os cenários altamente realísticos e os manequins de alta fidelidade permitem que os estudantes se envolvam no atendimento simulado de maneira próxima ao atendimento real.

Para vivência de uma prática clínica simulada, a situação problema envolvendo um paciente deve ser apresentada para os alunos, divididos em pequenos grupos, que assumirão a responsabilidade pelo atendimento do paciente. É a partir da interação entre os estudantes e o simulador que surgem dados objetivos e subjetivos que determinarão a realização de um conjunto de intervenções direcionadas à situação. O simulador responde a essas intervenções com a alteração de diferentes funções fisiológicas, ao mesmo tempo que se comunica com os alunos por meio da fala (Rodriguez, 2014).

Cabe ressaltar que a eficiência da prática clínica simulada depende que o estudante tenha adquirido habilidades técnicas com treino em simuladores de menor complexidade, para que sua ação não esteja centrada somente na execução técnica de um determinado procedimento, mas, na interação com o paciente, no raciocínio clínico, na avaliação das respostas do paciente simulado às suas intervenções, no trabalho em equipe, na tomada de decisões clínicas. Ao final da prática clínica simulada, ocorre uma discussão em relação às ações, atitudes e decisões tomadas pelos estudantes, os erros e acertos, sempre mediada pelo professor ou facilitador. Essa discussão reflexiva após vivência da prática clínica simulada é chamada de debriefing. O debriefing permite também a análise dos sentimentos, atitudes e deficiências presentes durante o atendimento, a dinâmica entre os membros da equipe e suas consequências na evolução do paciente. O debriefing leva à reflexão crítica das ações executadas e a troca de experiências entre os participantes a identificação dos problemas e a doção das medidas corretivas necessárias (Duran, 2014).

Baggio (2010), relata que a tecnologia acelerou o ritmo de vida, o aumento das informações e a forma de se comunicar também implicou nos aspectos de sobrevivência do indivíduo.

Na contemporaneidade, o cuidado também precisou ser reformulado para acompanhar as constantes mudanças do mundo contemporâneo e da enfermagem, afinal a contemporaneidade é o já, o agora e não pode esperar.

A contemporaneidade, a vida, a cientificidade, a condição humana, os necessitados dos cuidados, as instituições variadas de saúde com suas múltiplas atividades, os processos de produção dos saberes, ainda fazem parte da arte do conjunto cuidar.

A diferença do profissional do passado e do presente é que antes os enfermeiros tinham escassas possibilidades de atuação que se restringiam apenas a assistência nos hospitais. Atualmente as práticas de enfermagem estão presente nos setores públicos, privados, hospitalares, assistenciais e administrativos e suas atividades cada vez mais abrangentes neste contexto.

De acordo com o Código de Ética de Enfermagem de N° 564 implantado no ano de 2017 pelo Cofen, o enfermeiro na contemporaneidade pode atuar com: crianças, adolescentes, idosos, pessoas com transtornos mentais, gestantes, deficientes físicos e todas as classes de pessoas nos diferentes níveis de atenção, sendo capacitados para:

Promover, recuperar e organizar o funcionamento dos serviços de saúde de forma autônoma ou em colaboração a uma equipe multidisciplinar;

Planejar, organizar, coordenar, executar e avaliar os serviços da assistência de enfermagem prestada por auxiliares e técnicos de enfermagem;

Realizarem consultorias e auditorias nos diferentes serviços de enfermagem;

Realizarem consulta de enfermagem como uma sistematização especifica contendo: coleta de dados ou histórico de enfermagem, diagnóstico de enfermagem, planejamento de enfermagem, implementação e avaliação de enfermagem;

Cuidados diretos a pacientes graves e com risco de vida em nível: primário, secundário, terciário ou quaternário;

Cuidados de enfermagem de alta complexidade e com técnica específica de conhecimento científico capaz de tomar decisão de forma imediata;

Prescrever medicamentos estabelecidos nos programas de saúde pública ou em rotina de acordo com a instituição de saúde;

Porto, (2006) explica que ao analisarmos toda a trajetória da enfermagem, os caminhos foram diversos: os cenários, as pessoas que fizeram a história da enfermagem e fazem até hoje, as leis estabelecidas, porém o enfermeiro sempre demonstrou potencial e por isso atualmente contempla infinitas transformações e opções para exercer o cuidado na enfermagem.

Conclusão

A enfermagem contemporânea deve incorporar a evolução dos processos tecnológicos e de informação para aprimoramento e acompanhamento das novas tendências da formação e do cuidado em saúde. Novas metodologias de ensino que qualificam o aprendizado tornando significativo, facilita a condução da formação, como também processos de educação permanente nos serviços de saúde. A simulação realística como método de ensino inovador, traz ao aluno e o professor, como ao enfermeiro, uma experiência única, contextualizando a prática clínica com segurança, eficiência, utilizando aspectos de raciocínio clínico e crítico nas competências essenciais da enfermagem brasileira.

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Recebido: 01 de Setembro de 2023; Aceito: 05 de Setembro de 2023

Editoras: Profa. Dra. Ana Maria Haddad Baptista e Profa. Dra. Marcia Fusaro

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