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Eccos Revista Científica

versión impresa ISSN 1517-1949versión On-line ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.66 São Paulo jul./sept 2023  Epub 19-Feb-2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n66.23291 

Artigos

REUNIÕES PEDAGÓGICAS SÃO NECESSÁRIAS? OBSERVAÇÕES DA PRÁTICA DE UMA DOCENTE DA EDUCAÇÃO INFANTIL APÓS DISCUSSÕES DA TEORIA

ARE PEDAGOGICAL MEETINGS NECESSARY? OBSERVATIONS OF THE PRACTICE OF AN EARLY CHILDHOOD EDUCATION TEACHER AFTER THEORETICAL DISCUSSIONS

¿SON NECESARIAS LAS REUNIONES PEDAGÓGICAS? OBSERVACIONES DE LA PRÁCTICA DE UNA MAESTRA DE EDUCACIÓN INFANTIL DESPUÉS DE DISCUSIONES TEÓRICAS

Maria José Milharezi Abud, Doutora e Mestre em Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-3917-6893

Elisabeth Ramos da Silva, Doutora e Mestre em Educação2 
http://orcid.org/0000-0001-7299-7784

Diogo Fernando dos Santos, Mestre em Linguística Aplicada3 
http://orcid.org/0000-0001-8930-2061

1Doutora e Mestre em Educação (PUC-SP), Universidade de Taubaté - UNITAU, Taubaté, São Paulo - Brasil

2Doutora e Mestre em Educação (USP), Universidade de Taubaté - UNITAU, Taubaté, São Paulo - Brasil

3Mestre em Linguística Aplicada (UNITAU), Universidade de Taubaté - UNITAU, Taubaté, São Paulo - Brasil


Resumo

O objetivo deste trabalho é relatar as ações de uma docente para adequação do espaço físico em uma sala de aula de educação infantil, bem como os decorrentes benefícios que tais alterações causaram. Essas mudanças de ambiente foram feitas após estudos relativos a teorias e documentos oficiais realizados durante reuniões pedagógicas. Mediante a compreensão dos textos e dos documentos, a professora pôde organizar sua rotina de trabalho e promover alterações significativas à dinâmica e à qualidade do ensino ao alterar o espaço físico em suas aulas. Constatamos que as reuniões pedagógicas foram úteis, promovendo alterações significativas ao trabalho docente.

Palavras-chave: formação docente; educação infantil; adequação de espaço.

Abstract

The objective of this work is to report the actions of a teacher to adapt the physical space in a kindergarten classroom, as well as the resulting benefits that such changes caused. These changes of environment were made after studies related to theories and official documents carried out during pedagogical meetings. By understanding the texts and documents, the teacher was able to organize her work routine and promote significant changes to the dynamics and quality of teaching by changing the physical space in her classes. We found that the pedagogical meetings were useful, promoting significant changes to the teaching work.

Keywords: teacher training; kindergarten; suitability of physical space.

Resumen

El objetivo de este trabajo es relatar las acciones de una docente para adecuar el espacio físico en un aula de jardín de infantes, así como los beneficios resultantes que tales cambios provocaron. Estos cambios de ambiente se dieron luego de estudios relacionados con teorías y documentos oficiales realizados durante encuentros pedagógicos. Al comprender los textos y documentos, la docente pudo organizar su rutina de trabajo y promover cambios significativos en la dinámica y calidad de la enseñanza al cambiar el espacio físico en sus clases. Encontramos que los encuentros pedagógicos fueron útiles, promoviendo cambios significativos en el trabajo docente.

Palabras clave: formación de professores; jardín de infantes; adecuación del espacio físico.

Introdução

Muitos professores questionam sobre os reais benefícios dos encontros pedagógicos. Assim, resolvemos convidar uma docente que se mostrou disposta a colaborar com nosso trabalho a promover algumas mudanças em sua sala de aula. O principal assunto discutido durante as reuniões pedagógicas foi a adequação do espaço físico nas salas de aula de educação infantil. Essas mudanças de ambiente seriam feitas pela professora após estudos relativos a teorias e a documentos oficiais disponibilizados pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC). Após a interpretação e a compreensão dos textos e dos documentos durante os encontros pedagógicos, seria possível observar se tais encontros foram úteis à professora, e se ela pôde organizar sua rotina de trabalho e promover alterações significativas à dinâmica e à qualidade do ensino ao alterar o espaço físico em suas aulas. Em outros termos, a observação do trabalho realizado por essa professora da educação infantil teve por objetivo entender como de fato a teoria contribuiu para fundamentar mudanças, fazendo-a pensar e refletir sobre o seu papel de educadora.

Consideramos que “[...] pensar envolve construir hipóteses inadequadas ‘erradas’ e ter que refazer, ou inventar outro percurso em busca da adequada ‘certa’. (Freire, 1997, p.17, grifos da autora). Portanto, os primeiros pensamentos e as reflexões da docente na tentativa de construir o seu próprio percurso pedagógico tornam-se pertinentes para esta discussão. Nota-se que o conhecimento apresentado pela documentação oficial fomentou o desejo da professora em ajustar o seu trabalho a essa nova aprendizagem.

Elucidamos que os pressupostos teóricos em que este trabalho se baseia são os documentos oficiais disponibilizados pelo Ministério da Educação e Cultura - Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (Brasil, 2018a), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) (Brasil, 2010) e Documentação Pedagógica: concepções e articulações - caderno 1 (MEC/UNESCO) (Brasil, 2018b), entre outros autores. O primeiro caderno da Documentação Pedagógica foi o marco na discussão das reuniões pedagógicas feitas pela direção de uma escola municipal do interior de São Paulo com a docente efetiva no cargo de professora da educação infantil. De acordo com a DCNEI (Brasil, 2010), a educação infantil é a primeira etapa da educação básica e está dividida, nessa unidade escolar, em duas etapas, sendo a etapa I para as crianças de quatro anos de idade e a etapa II para as crianças de cinco anos de idade. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa bibliográfica e da aplicação de um questionário respondido pela professora acerca das mudanças efetuadas pós leitura dos documentos, bem como de observações de seus registros escritos.

Este trabalho está dividido em duas partes. Inicialmente, abordamos os principais aspectos teóricos que esclarecem as características da educação infantil, bem como a contribuição do espaço físico para o desenvolvimento da criança, além de enfatizarmos a intencionalidade no trabalho pedagógico como vetor fundamental na implantação de mudanças qualitativas no processo de ensino-aprendizagem. Em seguida, expomos o relato das ações docentes para adequação do espaço físico e os decorrentes benefícios encontrados. Dessa forma, foi possível conferir na prática as mudanças significativas que a teoria causou. Daí a importância de oferecer encontros para a formação docente.

A educação infantil é uma continuação para outras etapas de aprendizagem

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) (Brasil, 2010, p. 12) definem a criança como um sujeito histórico que se relaciona com o seu meio, experimentando e vivenciando, nas relações estabelecidas com o outro, a construção de sua identidade pessoal e coletiva. Para a construção dessa identidade, o espaço escolar de aprendizagem precisa lhe oferecer condições para o desenvolvimento de sua autonomia e o sentimento de pertencimento ao local em que se relaciona. A autonomia não está somente relacionada ao significado de independência, mas também está imbricada no ambiente educativo para que este possa dar legibilidade e tornar visíveis os dizeres das crianças. Em outros termos, a mudança no ambiente pode conferir às crianças valor e sentido no que fazem. Dessa forma, podem emergir do anonimato e da invisibilidade, e sentirem-se apreciadas por seus dizeres serem ouvidos. (Rinaldi, 2014). Para Rinaldi (2018, p. 160, grifos da autora) a escola é

[...] vista como um ‘organismo vivo’ que pulsa, muda, se transforma, cresce e amadurece. Essa definição coloca uma questão que poderíamos definir como ‘processos de entropia’, ou administração da mudança. Um organismo vivo permanece o mesmo, e a escola para crianças pequenas nunca é a mesma de um dia para o outro. Por isso, devemos ser capazes de assegurar a continuidade da identidade em meio à mudança, uma memória do passado e uma ‘memória’ do futuro.

E pertencer a esse ambiente que pulsa, muda, transforma-se, cresce e amadurece está, intrinsecamente, associado à ideia de concepção da infância. Essa concepção, segundo Campos (2012, p. 13), está ligada ao movimento que tem como premissa “[...] dar atenção à especificidade da criança, e em suas diversas etapas de desenvolvimento.” Logo, pensar em variáveis etapas de desenvolvimento é refletir acerca do sentido de educação integral. Esta, dissertada pela BNCC, reconhece a importância da aquisição de competências e habilidades que garantam o desenvolvimento humano global do estudante, assumindo “[...] uma visão plural, singular e integral da criança, do adolescente, do jovem e do adulto - considerando-os como sujeitos de aprendizagem.” (Brasil, 2018a, p. 14). Ademais, Dewey (1959, p. 51) menciona que “[...] a vida da criança é integral, e unitária: é um todo único.” Por essa razão, não cabe fazer da educação infantil e de todo ensino básico uma fragmentação com visões reducionistas que privilegiam apenas os aspectos cognitivos ou afetivos (Brasil, 2018a), para Dewey (1959, p. 41), “[...] educação é vida, não preparação para a vida.”, assim como, para Bruner (1999 apudStrozzi, 2014, p. 79), a escola “[...] não é uma preparação para a vida, mas é um pedaço da vida. A escola pode ser uma maneira honesta de viver a vida.” Inferimos a importância de trazer a vida cotidiana para dentro escola, no sentido de que o discente se sinta pertencente àquele espaço em que transforma e é ao mesmo tempo transformado por suas ações.

Por essa razão, aceitamos que a educação infantil contribui para o desenvolvimento de competências e habilidades que serão ampliadas ou darão possibilidades para criação de outras em anos subsequentes. Portanto, ela não é uma preparação para o ensino fundamental, uma vez que consideramos a escola um pedaço da própria vida do sujeito que nela atua.

Dewey (1959, p. 8-9) elucida sobre o processo de viver:

Enquanto vivo, eu não me estou, agora, preparando para viver e daqui a pouco, vivendo. Do mesmo modo eu não me estou em um momento preparando para educar-me e, em outro, obtendo o resultado dessa educação. Eu me educo através de minhas experiências vividas inteligentemente.

Suas considerações sobre o ensino estão voltadas para os aconselhamentos aos educadores para que planejem suas tarefas tendo em vista uma realidade estável e lógica, ou seja, para vislumbrarem as necessidades do aluno para o desenvolvimento de capacidades e não simplesmente para acumulação de conhecimentos. Por isso, o autor enfatiza a ideia de educar o aluno por meio de experiências vividas inteligentemente, que lhe façam sentido, a fim de entenderem o porquê de fato estão aprendendo determinado conteúdo, e não por uma simples imposição do educador. “Aprender envolve um processo ativo de assimilação orgânica, iniciado internamente. De sorte que, literalmente, devemos partir da criança e por ela nos dirigirmos. A quantidade e a qualidade do ensino, ela é que as determina e não a disciplina a estudar.” (Dewey, 1959, p. 56).

Se estamos pensando na qualidade do ensino, qual seria de fato o sentido de trabalhar horas e horas a coordenação motora? Por qual motivo ensinar as letras do alfabeto e insistir no contorno do desenho da letra? Qual a finalidade de um caderno pautado na educação infantil e de lições de casa sendo mandadas aos pais? Qual o sentido de ter um conjunto de folhas de sulfite com desenhos impressos para colorir? Se estamos discutindo uma educação que se opõe ao que é mecânico e formal e valorizando a vida e a experiência da criança, não podemos mais nos satisfazer com meras respostas tendenciosas de que a criança está aprendendo tal conteúdo porque mais adiante será bom para ela.

Campos (2012, p. 15) atesta que:

[...] é preciso ter uma pedagogia, explicitar um modelo pedagógico, o que supõe também a adoção de uma gramática pedagógica capaz de sustentar aquela práxis educativa baseada na concepção de criança competente, que requer uma escuta e condições de aprendizagem que a respeitem enquanto sujeito social.

Enfim, “[...] a criança de 0 a 6 anos é complexa, desafiadora, surpreendente e exuberante” (São Paulo, 2019, p. 53). O professor precisa munir-se de um repertório vasto, relativo a outras ciências, favorecendo a aquisição de conhecimentos pela criança que a habilite a se desenvolver integralmente (São Paulo, 2019). Esse desenvolvimento não será uma preparação para o ensino fundamental, mas uma continuação no avanço do seu processo formativo. E o espaço físico igualmente contribui para esse desenvolvimento, e isso é o que veremos a seguir.

O espaço físico também contribui para o desenvolvimento da criança

O Currículo Paulista (São Paulo, 2019, p. 53-54, grifos nossos) afirma que a instituição de educação infantil:

[...] visa a atender as especificidades da criança pequena sem, contudo, ser preparação para o ensino fundamental. Assim, contrapondo-se à ideia de preparatória, essa etapa exige priorizar as interações e as brincadeiras como eixos estruturantes para a organização de tempos e ‘espaços’, de modo a garantir experiências ricas para a aprendizagem, o que não combina com a proposição de atividades estanques, fragmentadas.

A organização dos espaços de atuação da criança dentro da instituição escolar garante também momentos de aprendizagem em sua formação integral. De acordo com os Indicadores da Qualidade Na Educação Infantil (Brasil, 2009, p. 50), “[...] os ambientes físicos da instituição de educação infantil devem refletir uma concepção de educação e cuidado respeitosa das necessidades de desenvolvimento das crianças, em todos os seus aspectos: físico, afetivo, cognitivo, criativo.” O espaço deve proporcionar a divulgação dos registros das produções infantis tanto para constituição de um acervo precioso quanto para estimulação de novas trocas entre as crianças. Rinaldi (2018) considera o espaço físico como uma linguagem que fala atrelada às concepções culturais e biológicas. Para a autora (2018, p. 154), “[...] como qualquer outra linguagem, o espaço físico é um elemento constitutivo da formação do pensamento. [...] As qualidades relacionais entre o indivíduo e seu habitat são recíprocas, de modo que tanto a pessoa quanto o ambiente são ativos e modificam um ao outro.” Entendemos que não adianta haver um espaço apenas para receber crianças de uma determinada idade, bem como haver materiais ou mobiliários que suprem as necessidades do professor. É preciso ser um espaço que acolha e dialogue com a criança, e que, ao mesmo tempo, faça com que a criança se sinta pertencente a ele, que ela o sinta, cheire, brinque e se envolva tanto com outras crianças quanto com os materiais que estão a sua disposição.

Para Fochi (2019), pensar para que de fato servem os espaços educativos contribui para refletir sobre como organizar e responder às necessidades das crianças e dos adultos.

Uma sala de referência, por exemplo, é um espaço que precisa responder a múltiplas funções: precisa ao mesmo tempo ser um lugar para o grupo mas também ser o lugar para cada criança, ou seja, deve fortalecer a identidade grupal e as identidades de cada um; é um espaço para aprendizagens plurais e que igualmente precisa acolher a pluralidade de temporalidades (de cada criança, do grupo de criança, dos adultos, da instituição); é um espaço que serve ainda a distintas funções (também são realizadas as refeições, o descanso) (Fochi, 2019, p. 263).

Assim, se houver um lugar para si e para o outro, e se a criança se sentir pertencente àquele espaço onde seja um ambiente educativo descentralizado da figura do adulto “[...] e suficientemente bom para as crianças brincarem e interagirem, os meninos e as meninas podem ter espaços para a construção de sentido sobre a própria experiência educativa” (Brasil, 2018b, p. 19).

Na continuidade, consideramos pertinentes as observações de Fochi no contexto desse ambiente educativo. Fochi (2018, p. 18) menciona, dentre outros estudiosos, o educador italiano Loris Malaguzzi, cuja coordenação do trabalho pedagógico na cidade de Reggio Emília, no Norte da Itália, tem contribuído com o debate sobre a Educação Infantil. Essa experiência italiana de educação constitui um contexto que tem enfatizado a prática de documentação pedagógica, ao concebê-la como uma estratégia para tornar visível a aprendizagem das crianças. Em outros termos, trata-se de uma abordagem pedagógica que incentiva a criança a explorar todas as suas potencialidades, o que requer como tarefas a escuta de cada criança e o atendimento a sua individualidade.

São destacados por Fochi (2018, p. 18) aspectos caracterizadores dessa abordagem pedagógica que podem contribuir para a constituição de “[...] um quadro conceitual que acolha as crianças em suas competências, em sua força e em seus limites”. O primeiro aspecto diz respeito à visão da criança pelo enfoque Reggio Emilia, ou seja, à imagem de uma criança pleiteada por Malaguzzi: uma criança competente, ativa e crítica, feita de cem linguagens. “Uma criança que não precisa tão somente da amorosidade dos adultos, como afirma Hawkins (2016), mas uma criança que precisa ser respeitada no reconhecimento de suas capacidades. [...]” (Fochi, 2018, p. 18).

São também mencionados pelo autor outros dois aspectos a respeito da experiência de Reggio Emilia:

[...] a aposta na organização do espaço como um outro educador (Malaguzzi, 2001) e como um ativador das aprendizagens das crianças (Vecchi, 2013) e a dupla pedagógica na composição da docência para a Educação Infantil. [...] Na verdade, os espaços e a dupla pedagógica são compreendidos por Malaguzzi como “os três educadores” de uma escola da infância (Fochi, 2018, p. 19, grifos do autor).

Os espaços físicos da escola, compreendidos como um educador, são trabalhados para serem ambientes educativos e lúdicos de aprendizagem. Ao valorizar as representações simbólicas, as artes, a música, a pintura são tratadas como ferramentas primordiais no aprendizado, possibilitando às crianças explorarem suas linguagens por meio das artes. Logo, podemos inferir que a construção de sentido sobre a própria experiência vivida pela criança nesse espaço educativo depende também da intencionalidade do ato de ensinar do professor.

A intencionalidade no trabalho pedagógico

O ato de ensinar, segundo Freire (1996), exige do educador a pesquisa, a procura incessante pelas respostas. A sua busca pelo conhecimento o impulsiona a indagar a si mesmo, a intervir, a constatar as informações pesquisadas ou a conhecer algo desconhecido. Nessa mesma linha de pensamento, Camargo (1997, p. 15) esclarece que

Quanto mais consciente se fizer o ato educativo, mais consistente será o seu produto. Isto é possível quando se atua tendo: clareza sobre o significado da função da escola, espaço este privilegiado na construção da cultura simbólica; clareza quanto ao papel do educador, como aquele que ensina através da organização e ampliação das pautas interativas, nelas incluídos sujeitos diferenciados e objetos de conhecimento; clareza e nitidez do olhar que é lançado sobre o grupo e sobre cada um em particular, buscando conhecer necessidades e potencialidades, para que seja possível implicar cada uma das partes num processo de todos.

A tentativa de olhar para a construção do trabalho, avaliar o desempenho e buscar as estratégias para ampliar e potencializar a execução das atividades é um passo consciente da práxis do docente e reflexivo sobre ela. Tudo que é ensinado ao aluno precisa ter uma intencionalidade educativa que demanda “[...] planejamento e previsão de etapas pelo professor, para alcançar objetivos predeterminados” (São Paulo, 2007, p. 116). A clareza e a objetividade nos processos de organização e execução do fazer pedagógico potencializam o ato educativo. Até mesmo o ato de brincar sem uma intencionalidade didática do professor não propicia experiências voltadas a um determinado campo de aprendizagem. (São Paulo, 2007)

[...] olhar para cada experiência com intencionalidade e foco, ou seja, olhar para o conhecimento matemático e planejar situações, interessantes e significativas, mas, sobretudo, que ofereçam problemas ao mesmo tempo difíceis e possíveis para as crianças. Uma maneira de trabalho que olhe para a forma própria das crianças se aproximarem de cada conteúdo relativo ao conhecimento matemático e os planeje de modo aproximá-los delas. Este modo de organizar as situações propostas para as crianças pequenas respeita o seu fazer, considerando a brincadeira como uma forma de conhecer e se apropriar do mundo. Ao mesmo tempo, o trabalho do professor ganha intencionalidade em relação ao planejamento, às propostas feitas às crianças e às intervenções do professor (São Paulo, 2007, p. 111).

Em consonância, ensinar precisa ter relação com o desenvolvimento de capacidades e não, simplesmente, com o acúmulo de conhecimento (Dewey, 1959). Deve haver sempre intencionalidade educativa no ato de ensinar sem desconsiderar que “[...] as crianças também têm suas próprias iniciativas para trabalhar” (São Paulo, 2007, p. 117). Uma relação de respeito tem grande influência na qualidade do processo educativo; mas, para que isso ocorra, é preciso que o professor crie condições para que a criança se desenvolva mediante experiências e aprendizagens, bem como perceba a presença da criança em sua prática. É a escuta não só da palavra falada, mas também dos gestos, dos desenhos, das expressões (Baracho, 2011) que possibilitam à criança enxergar-se como sujeito participativo e protagonista ativo no seu próprio processo de aprendizagem (Araújo, 2017).

Portanto, para que a criança se torne protagonista do seu aprendizado é preciso que esteja em um espaço organizado pelo professor como um ambiente educativo em interação com outras crianças, participando de práticas sociais, tendo experiências vividas que lhe propiciem o desenvolvimento de conceitos, valores e comportamentos.

Conforme relata Fochi (2018, p. 31, grifos do autor), uma das grandes contribuições da abordagem de Loris Malaguzzi diz respeito à escuta, a qual, nesse contexto,

é uma metáfora que caminha ao lado de outra metáfora de Loris, a de que a criança é feita de “cem linguagens”. Para Malaguzzi (2001), a escuta das cem linguagens é uma possibilidade das professoras perceberem e tornarem-se conscientes das tantas riquezas e potencialidades das crianças. A escuta é o pano de fundo da construção de toda a documentação pedagógica, pois nela está a imagem de criança que cada professora tem.

Desse modo, “[...] a escola que trabalha com essa abordagem pedagógica torna-se viva e transformadora por acreditar na capacidade de pensar e de aprender de cada criança” (Araújo, 2017, não paginado), o que implica ainda aprimorar a atuação pedagógica do professor.

Nesse processo de aprendizagem, é o professor que dirige esse desenvolvimento, por isso, conforme expõe Fochi (2018, p. 19), coloca-se ao lado das crianças a fim de “[...] acompanhá-las para também poder elaborar e reelaborar significados sobre as próprias imagens e ideias sobre as crianças, sobre a docência e sobre a natureza do conhecimento emergente”.

Dessa forma, iniciar a reforma do espaço ocupado pela professora e os alunos como uma maneira de acolher as crianças e estabelecer o vínculo de pertencimento ao espaço em que atua é condição importante no fazer pedagógico de um educador. Com esse intuito, torna-se necessário também saber lidar com as diferentes situações esperadas / inesperadas / inusitadas/ rotineiras (Abud, 2004) que podem estar presentes nesse espaço a serem enfrentadas e resolvidas com intenção de aprendizagem.

Assim considerando, exemplificaremos a seguir, mediante o relato de uma professora que se dispôs a promover mudanças no espaço físico, como de fato docente e alunos se envolveram na organização da sala de aula.

Relato das ações docentes para adequação do espaço físico e os decorrentes benefícios encontrados

A professora da educação infantil que nos forneceu as informações sobre suas ações para a adequação do espaço físico tem quarenta anos de idade e leciona em uma escola pública de uma cidade do interior paulista. Nosso objetivo foi colher suas percepções quanto ao ambiente escolar a ser transformado, Para alcançarmos tais informações, solicitamos à professora que respondesse por escrito algumas questões, as quais puderam nortear nosso entendimento sobre seu trabalho e sua avaliação acerca das mudanças efetuadas. Abaixo, transcrevemos as questões oferecidas à professora:

  1. Pensando na parte física do espaço, o que você propôs para adequar a sala de aula a essa nova proposta de trabalho, quanto às carteiras, às cadeiras, aos armários etc.?

  2. Como você organizou a sua rotina de trabalho com os alunos, tendo em vista os conteúdos que são trabalhados nessa etapa?

  3. Como compartilhou a ideia de mudança do espaço físico com os alunos?

  4. O que tem observado com essa mudança?

  5. Como tem registrado as manifestações das crianças?

  6. Quais as dificuldades sentidas nesse trabalho?

Primeiro tentamos entender quais seriam as intencionalidades da professora em fazer a adequação do ambiente de sua sala, bem como compreender se ela estava consciente de que tais mudanças agregariam vantagens positivas a seu trabalho, corroborando a aprendizagem dos alunos. Elencamos alguns trechos das respostas às questões:

O primeiro passo foi percorrer os espaços da escola, observar o mobiliário que estaria disponível para fazer as adequações na sala de aula, depois observar atentamente e estudar uma maneira de alterar o mobiliário de maneira que ficasse funcional para todos, de maneira que todos pudessem se sentir pertencentes e à vontade de estarem interagindo na sala de aula. Antes de apresentar a proposta para as crianças, eu precisava mentalizar tais mudanças, para ter o que propor e discutir com eles.
A princípio explorei bastante as atividades de rotina utilizando o tatame, já que foi uma das primeiras sugestões de mudanças que as crianças deram e que havia sido um dos espaços que eles mais gostaram de ver sendo mudado e auxiliaram nessa mudança.

Vemos que, em seu relato, a palavra pertencente, no plural, é o sustentáculo de suas afirmações para as mudanças ocorridas. Sua intenção não foi apenas permitir que os alunos se sentissem parte do processo de construção do ambiente, foi também validar as vozes trazidas para a mudança. Não era um espaço de favorecimento à professora, era um espaço sendo criado para construção de significados importantes para as crianças. Tratava-se de uma sala onde pudessem se sentir à vontade para interagir entre os pares. E se sentir à vontade é estar em um ambiente que lhe seja seguro e, ao mesmo tempo, agradável. É um ambiente “[...] que é empático, que captura o significado da vida das pessoas que o habitam, mas também lhe dá significação” (Rinaldi, 2018, p. 164).

Foi o próprio ambiente em que a professora estava inserida que lhe ofereceu respostas relativas às adequações necessárias que deveriam ser feitas. Essas mudanças não estavam ligadas às mobílias, e sim às condições de interação entre os pares:

Um ponto negativo da sala (da maneira como estava) era que as crianças interagiam somente com quem sentava na mesma mesa, e o vínculo de amizade, troca de ideias durante as atividades, observação do processo criativo ficava bem mais restrito.

Entendemos que a intervenção da professora por uma nova organização do espaço da sala foi pensada como elemento de qualidade da aprendizagem ao permitir a conexão dos alunos entre si. Vigotski1 (2009) elucida que a cooperação entre os pares da mesma idade ou de idades diferentes contribui para o avanço na aprendizagem dos alunos. A legítima preocupação da docente em garantir que o aluno circule mais livremente pela sala e interaja com um grupo maior de colegas é válida, pois “[...] na perspectiva de Vygotsky, construir conhecimento implica uma ação partilhada, já que é através dos outros que as relações entre sujeitos e objeto de conhecimento são estabelecidas” (Rego, 2012, p. 110).

Assim considerando, a professora optou por uma mesa retangular para caber um número maior de crianças e estabelecer um contato afetivo e cooperativo entre elas durante a execução de uma atividade. Da mesma forma, garantiu a distribuição dos tatames feita pelos alunos, além da organização das estantes na altura deles. Estes foram fatores que possibilitaram novas observações para a professora:

A organização da sala de aula ficou mais funcional e, de certa forma, o conteúdo ficou mais atrativo para os alunos, já que participaram de todo processo. Percebi que houve uma otimização do tempo, já que todo o material necessário está à disposição dos alunos e da professora a todo momento.
Acredito que a melhor forma de deixar a sala acolhedora e adequada à faixa etária foi a organização em cantos, então procuramos adaptar nosso espaço, dividindo-o com estantes baixas e os materiais de uso das crianças organizados e acessíveis a elas.

Um outro ponto relevante para nosso relato foi o modo como a professora registrou as manifestações das crianças.

Assim que a sala foi organizada, em cantos adaptados, parei para conversar e ouvir as crianças. Sentamos em círculo para uma conversa breve, onde cada criança expressou sua opinião sobre as mudanças que foram feitas. Depois, propus uma votação como forma de registro e expliquei que construiríamos um gráfico para visualizar quantas crianças gostaram ou não da mudança da sala, e, conforme as crianças foram colocando seus votos e opiniões, fui registrando e ajudando a encaixar e colar as peças para o gráfico ir se formando.

Constatamos que as rodas de conversa foram de grande importância nesse momento de acolher as opiniões dos alunos e validá-las. Foi o início para a construção de um vínculo afetivo e de parceria estabelecida pela professora com os alunos. Inferimos que a aprendizagem durante a roda de conversa permitiu que a docente construísse, segundo Vigotski (2009), boas intervenções para impulsionar a criança a elaborar o próprio pensamento. De fato, “[...] aprender envolve um processo ativo de assimilação orgânica, iniciado internamente” (Dewey, 1959, p. 56). Entendemos que não adiantaria apenas a professora desejar promover mudanças no espaço, era preciso conscientizar os alunos de que o lugar frequentado pertencia a todos e, democraticamente, todos precisariam opinar sobre tais mudanças. Concordamos quando Dewey (1959, p. 55-56) afirma: “[...] a criança é o ponto de partida, o centro e o fim. [...] devemos partir da criança e por ela nos dirigirmos.” Então, além de ouvi-las, a educadora materializou as opiniões construindo um gráfico com eles.

Fonte: Imagem do acervo pessoal da professora disponibilizada aos pesquisadores.

Figura 1 Gráfico de votação sobre a mudança na sala 

No gráfico vemos que um aluno não aceitou a mudança. Não ter aceitado também faz parte do processo de discussão e de validação. Participar concordando ou não com a mudança do ambiente é um direito da criança, o qual a BNCC apoia, uma vez que recomenda:

Participar ativamente, com adultos e outras crianças, tanto do planejamento da gestão da escola e das atividades propostas pelo educador quanto da realização das atividades da vida cotidiana, tais como a escolha das brincadeiras, dos materiais e dos ambientes, desenvolvendo diferentes linguagens e elaborando conhecimentos, decidindo e se posicionando (Brasil, 2018a, p. 38).

No entanto, as opiniões também mudam, são flexíveis e sujeitas a alterações, e cabe ao docente o registro das novas manifestações de interesses demonstrados pelas crianças:

No decorrer do trabalho tenho registrado a evolução do grupo através das rodas de conversa e da observação da organização deles, assim que uma atividade é proposta e como organizam a sala quando terminam.

A roda de conversa é chave principal do trabalho didático dessa educadora tanto para observar e constatar quanto para ajustar os combinados entre os alunos. É necessário destacar também a predisposição da docente, pois o agir didático lhe permitiu criar rotas de ensino diferentes para manter o interesse dos alunos pelo projeto.

Cabe mencionar que tanto os benefícios relativos às mudanças em sala de aula, quanto as teorias que orientaram o planejamento e a prática dessa professora foram previamente discutidos durante as reuniões pedagógicas. A teoria pôde iluminar o fazer docente porque a professora assimilou os aspectos teóricos que lhe conferiram segurança para promover as alterações necessárias. Assim, a teoria, longe de ser algo distante da prática, tornou-se parte constitutiva do planejamento. De fato, para atender à abordagem sociointeracionista de Vigotski (2009) relativa à educação, a professora interessou-se pela proposta de Rinaldi (2018), que até então lhe era desconhecida. Foram as discussões durante as reuniões pedagógicas que apresentaram tais possibilidades e, consequentemente, fomentaram as alterações significativas no espaço da sua sala de aula.

Por fim, é interessante elencar também as dificuldades encontradas pela professora, já que a prática em sala de aula é sempre dinâmica e nem sempre previsível. Na tabela abaixo, organizamos seus registros das situações vividas da seguinte forma:

Tabela 1 Registros das situações vividas pela professora 

Esperadas _ A organização da sala de aula ficou mais funcional e, de certa forma, o conteúdo ficou mais atrativo para os alunos.”
_ Acredito que a melhor forma de deixar a sala acolhedora e adequada à faixa etária foi a organização em cantos, então procuramos adaptar nossos espaços, dividindo-o com estantes baixas e os materiais de uso das crianças organizados e acessíveis a elas.
Inesperadas _ Existem dias que a turma chega mais agitada e preciso readequar as atividades ou mudar a sequência do planejado, até que eles se acalmem e possamos seguir com os cantos propostos para o dia com calma e menos agitação.
_ Em alguns dias, mudo totalmente o planejamento e resgato regras de convivência e esqueço um pouco a proposta com cantos, pois ainda estamos construindo nossa integração e adaptação ao outro e a convivência pacífica.
_Inferimos que a votação de um aluno contra a mudança também foi uma situação inesperada pela professora.
Inusitadas _ Percebi que houve uma otimização do tempo, já que todo o material necessário está à disposição dos alunos e do professor a todo momento.
_ Parece terem entendido que não há certo ou errado e sim um espaço para ser explorado e a aprendizagem ocorre de forma leve e lúdica.
Rotineiras _ No dia seguinte, sentei com os alunos na roda para ler algumas histórias que haviam sido selecionadas por eles e validar junto ao grupo.
_ As crianças organizando os jogos de sequência lógica, tangram, mosaico, blocos lógicos dentre outros.
_ As crianças escolhendo as histórias e organizando no varal de histórias.
_ Interação com fantoches e escolhas de quais ficariam expostos na sala e onde deveriam ficar.
_Inferimos que as atividades nas mesas e o uso do tatame também entraram como situações rotineiras.

Fonte: Elaboração dos autores.

Consideramos que as situações esperadas fazem parte do planejamento da professora e estão relacionadas aos seus objetivos pedagógicos estabelecidos à luz da teoria. Entendemos que a organização do espaço em cantos e a distribuição dos materiais de apoio, como tatame, fantoches, sacola de leitura, mesas retangulares, estantes baixas dentre outros, ajudariam a compor um ambiente mais harmônico e interativo entre as crianças. Essa foi a hipótese construída pela docente para se chegar a uma aprendizagem mais participativa dos alunos. A todo momento, tornar visível a voz da criança e suas preferências foram termos usados pela professora, com a finalidade do aluno se sentir pertencente ao espaço construído por todos. Aliás, foram esses os pressupostos discutidos durante as reuniões pedagógicas. Nota-se que a professora incorporou-os a seus objetivos.

As situações inesperadas partiram de uma necessidade de mudar a sequência ou a rota de trabalho em favor do bem-estar das crianças para que se sentissem ouvidas, acolhidas e respeitadas. Isso mostra o domínio da professora acerca do conhecimento do objeto e do sujeito observados por ela em sala de aula. A percepção e a sensibilidade em mudar a rotina para resgatar regras de convivência ocorrem por meio de dois fatores importantes: o conhecimento sobre si e o conhecimento sobre a sua didática de ensino. Inferimos que são condições valiosas inseridas na conduta dessa educadora, pois consideramos que não adianta apenas trazer um conteúdo pronto e definido, é preciso rever o planejamento durante sua execução e, se necessário, buscar novos caminhos. No entanto, reprogramar algo só é possível quando o educador tem consciência e domínio para fazê-lo. Daí a importância de haver espaços de reuniões pedagógicas para discussões de teorias e práticas entre os professores.

As situações inusitadas ampliaram as percepções dessa professora. A otimização do tempo e o entendimento do espaço em ser um ambiente que sofreria modificações constantes para ser sempre mais bem aproveitado por todos não foram condições programadas pela professora e sim consequência da observação e da verificação de seu trabalho e do retorno dado pelos alunos. São observações plausíveis e aceitas por uma professora que demonstra ter domínio sobre o conteúdo trabalhado e o entendimento do público assistido.

As situações rotineiras são condições estabelecidas pela professora por meio de combinados ou ações explicitas ou implícitas demonstradas pela educadora ao longo da jornada do dia. Ler todos os dias em roda é uma ação implícita e entendida pelos alunos que, em uma parte do dia, aguardam o momento destinado às rodas de leitura. Conversar sobre algo que chamou a atenção também pode ser uma condição implícita e entendida pela criança. É um contrato didático que vai sendo construído ao longo das semanas que não necessariamente precisa ser explicitado pela docente a todo momento. É algo vivido e compreendido por todos.

Todas as situações fazem parte do fazer pedagógico de um professor ao aprender a ação educativa e ao refletir sobre ela em sua ocorrência cotidiana. Isso se dá no sentido de considerar seus avanços e seus questionamentos, possibilitando uma tomada de decisão para superar possíveis impasses desse processo. Considerar a mudança da sala para o favorecimento da aprendizagem não está relacionado apenas à organização da mobília, mas sim às condutas humanas e democráticas estabelecidas no espaço trabalhado. Nesse sentido, os encontros de reuniões pedagógicas foram ocasiões decisivas para ensejar o conhecimento significativo, capaz de transformar práticas educativas e fomentar reflexões.

Considerações finais

Iniciamos este texto com uma pergunta: Reuniões pedagógicas são necessárias? Muitas vezes, parece que se trata apenas de mais um compromisso impingido ao professor. No entanto, segundo o que observamos no relato dessa professora, a teoria discutida nas reuniões pôde ser transformada em prática, causando benefícios ao seu trabalho. De fato, o reconhecimento da criança como sujeito de direitos, inclusive o direito à Educação Infantil deve ser considerado como uma forma de ampliar as suas possibilidades de aprender nesse espaço.

A natureza do trabalho docente requer um continuado processo de formação envolvido com a ação pedagógica realizada no dia a dia da escola. Não há nenhum modelo a ser seguido, daí a necessidade de atualização perene. No entanto, essa ação de ensino precisa ser objeto de reflexão, de estudos e de planejamentos. É preciso promover formações continuadas aos professores em serviço, em reuniões periódicas sobre os temas trabalhados na Educação Infantil.

Consideramos essas propostas de formações continuadas dos professores de grande importância nessas situações para o aprimoramento da atuação pedagógica. Isso guarda relação, em parte, com o que foi observado por Imbernón (2010) ao ponderar que podem ocorrer mudanças na atividade docente quando o professor percebe, nas propostas de formação continuada, possibilidades concretas de benefícios para os alunos e para a forma como desenvolve a docência.

De modo geral, os professores se valem de diversos procedimentos para ensinar. Por procedimentos, entende-se, neste trabalho, as ações que levam ao desenvolvimento de certas capacidades e desempenhos no aluno, necessários à sua formação. Nesse sentido, os procedimentos são meios que revelam o tratamento dispensado ao aluno e ao conteúdo trabalhado e não um fim em si mesmos.

A professora, sujeito desta pesquisa, não apenas deu voz aos alunos para que se sentissem pertencentes ao espaço reelaborado, mas também mostrou o quanto é valioso aprender a observar o ambiente inserido e ter conhecimento sobre o objeto, o sujeito, sobre si e sobre a didática de ensino. Não adianta ter um espaço modificado sem ter consciência dos sujeitos que nele atuam. Olhar para a educação infantil é sentir suas necessidades e contemplar as capacidades que precisam ser desenvolvidas ao longo dessa etapa de ensino. Se tudo gira em torno do desenvolvimento da criança, pode-se afirmar que o ambiente também se torna um educador.

1Neste texto, o nome deste autor será grafado desta maneira, Vigotski, diferenciando-se apenas a data da obra.

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Recebido: 16 de Novembro de 2022; Aceito: 10 de Agosto de 2023

Editoras: Profa. Dra. Ana Maria Haddad Baptista e Profa. Dra. Marcia Fusaro

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