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Eccos Revista Científica

Print version ISSN 1517-1949On-line version ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.67 São Paulo Oct./Dec 2023  Epub Feb 19, 2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n67.24329 

Artigos

A FORMAÇÃO CONTINUADA EM SERVIÇO DE PROFESSORES DE UM MUNICÍPIO DO TRIÂNGULO MINEIRO

IN-SERVICE CONTINUING TEACHER TRAINING IN A MUNICIPALITY IN TRIÂNGULO MINEIRO

LA FORMACIÓN CONTINUA EN SERVICIO DE DOCENTES DE UN MUNICIPIO DEL TRIÁNGULO MINERO

Adrinelly Lemes Nogueira, Doutora em Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-0311-0737

Maria Célia Borges, Doutora em Educação, Professora Associada2 
http://orcid.org/0000-0002-5445-023X

1Doutora em Educação, Prefeitura Municipal de Uberaba - PMU, Uberaba, Minas Gerais - Brasil

2Doutora em Educação, Professora Associada da Universidade Federal de Uberlândia - UFU/FACED, Uberlândia, MG - Brasil


Resumo

O artigo é um recorte de uma tese de doutorado e discute a formação continuada em serviço dos professores do Ensino Fundamental I da rede pública de um município do Triângulo Mineiro. Do ponto de vista teóricometodológico trata-se de uma pesquisa qualitativa, orientada pela abordagem dialética. Quanto aos procedimentos de coleta de dados, foram realizados pesquisa bibliográfica, documental e de campo e questionários online como instrumentos. O processo de análise e interpretação de dados seguiu as orientações metodológicas de Categorização, Inferência, Descrição e Interpretação. Concluiu-se que os gestores, assim como os professores da rede, têm muito a contribuir para o desenvolvimento e organização das ações, pois estão no dia a dia da sala de aula e vivenciam as necessidades e carências do ensino público. A formação deve estar vinculada à valorização profissional. Reafirmou-se, incessantemente, que as aclamações sejam ouvidas e ações efetivadas em prol de um ensino público de qualidade.

Palavras-chave: ensino fundamental I; formação continuada em serviço; políticas públicas de formação.

Abstract

This article is an excerpt from a doctoral thesis and discusses the in-service continuing teacher training of Elementary School I teachers from the public network of a municipality in Triângulo Mineiro. It is a qualitative research based on a dialectical approach. Data collection procedures include bibliographic, documentary and field research with online questionnaires as the instruments used. The process of data analysis and interpretation followed the methodological guidelines of Categorization, Inference, Description and Interpretation. It can be concluded that both managers and teachers have a lot to contribute to the development and organization of actions because they are in the classroom on a daily basis and know the needs and shortcomings of public education. Teacher training must be linked to professional development. It should be reiterated that teachers’ demands need to be heard and actions taken in favor of a quality public education.

Keywords: elementary school I; in-service continuing teacher training; teacher training public policies.

Resumen

El artículo forma parte de una tesis doctoral y discute la formación permanente en servicio de los docentes de Educación Fundamental I de la red pública en un municipio del Triángulo Minero. Desde el punto de vista teórico-metodológico, se trata de una investigación cualitativa, guiada por el enfoque dialéctico. En cuanto a los procedimientos de recolección de datos, fueron realizadas: investigación bibliográfica, documental y de campo y se utilizaron cuestionarios online como instrumentos para la recolección de datos. El proceso de análisis e interpretación de los datos siguió las pautas metodológicas de Categorización, Inferencia, Descripción e Interpretación. Se concluyó que los gestores, así como los docentes de la red, tienen mucho que aportar en el desarrollo y organización de las acciones, ya que están día a día en el salón de clases y vivencian las necesidades y carencias de la educación pública. La formación debe estar ligada a la valoración profesional. Se reafirmó, incesantemente, que las aclamaciones sean escuchadas y se realicen las acciones en favor de una educación pública de calidad.

Palabras Clave: educación fundamental I; formación continuada en servicio; políticas públicas de formación.

1 Introdução

Neste estudo partimos do pressuposto de que é preciso aguçar outras reflexões para que novos conhecimentos e novos olhares despontem, a fim de favorecer a construção de saberes capazes de auxiliar os professores a superarem suas dificuldades diárias, na busca permanente por conhecimentos e aprendizados. Assim, a formação continuada é um processo complexo, visto que foi construído ao longo da história, é dinâmico e influenciado por diversos aspectos sociais, culturais e econômicos.

Existem diferentes modelos formativos que direcionam as políticas de formação continuada e é preciso conhecê-los por serem importantes para subsidiar a reflexão sobre um projeto de formação que contemple as propostas individuais e coletivas dos professores. Este estudo é um recorte de uma tese de doutorado defendida em uma universidade pública federal de Minas Gerais que teve como objetivo entender como as políticas públicas de formação continuada de professores da Educação Básica, no Brasil, influenciaram, e/ou influenciam, as políticas de formação continuada dos professores efetivos do Ensino Fundamental I da rede pública de um município do Triângulo Mineiro.

A pesquisa foi delineada como qualitativa e optou-se pela abordagem do Materialismo Histórico-dialético (MHD) para orientá-la. Devemos lembrar que “[...] a destruição da pseudoconcreticidade significa que a verdade não é nem inatingível, nem alcançável de uma vez para sempre, mas que ela se faz; logo, se desenvolve e se realiza” (Kosik, 1976, p. 19).

Existem aspectos inseridos em um texto que intencionam manter a obscuridade dos objetivos do documento, motivo pelo qual nossa função ou, pelo menos, o intuito funcional, foi transparecer o não dito. Para atingir tal fim, buscamos organizar uma relação de ir e vir entre os documentos nacionais e municipais, pesquisas já realizadas acerca do assunto e o discurso dos profissionais da educação.

Para a coleta de dados foram realizadas pesquisa bibliográfica, documental e de campo. Questionários online organizados no “Formulário Google” foram respondidos por dez professores efetivos, atuantes no Ensino Fundamental I da rede municipal, e por oito diretores das instituições de ensino do município do Triângulo Mineiro, após consentimentos obtidos por meio de termos.

Nesse sentido, no que diz respeito aos procedimentos de organização e análise dos dados coletados no trabalho de campo, o processo seguiu as orientações metodológicas propostas por Minayo (2012), quais sejam: Categorização; Inferência; e Descrição e Interpretação. Elas permitem um destrinchar dos dados encontrados e propõem uma análise das particularidades do objeto de estudo. Realizamos a decomposição do “material a ser analisado em partes (o que é parte vai depender da unidade de registro e da unidade de contexto que escolhemos)” (Minayo, 2012, p. 88).

Uma das categorias elencadas na pesquisa é a formação continuada em serviço, analisada neste estudo com o objetivo de entender a formação continuada em serviço dos professores do Ensino Fundamental I da rede pública de um município do Triângulo Mineiro. Na primeira parte apresentamos a importância da formação continuada em serviço, abordando os vários conceitos existentes e, em seguida, refletimos sobre as falas dos participantes da pesquisa sobre esta formação que faz parte da rede municipal.

2 Desenvolvimento

2.1 A formação continuada em serviço

O pensar dialético é crucial na transformação da sociedade e deve ocorrer no “local de trabalho dos professores, considerando que é no cotidiano das escolas que estão presentes os conflitos e necessidades que se refletem na construção da identidade e na ação pedagógica” (Silva, 2017, p. 4319).

Nessa acepção, a formação continuada em serviço é importantíssima e, por isso, ressaltamos que não se almeja aqui apresentá-la como a salvação, ou solução dos problemas dos professores, uma vez que nosso anseio é defendê-la como possibilidade de se formar permanentemente, de valorizar as experiências e vozes dos professores coletivamente, de construir um espaço no qual o professor seja protagonista da sua prática, tenha significância e motivos para querer estar ali.

Em linhas gerais “na formação, o contexto no qual se dão as práticas educativas, ou seja, a própria instituição educativa e a comunidade que esta envolve, assume, assim, uma importância decisiva” (Imbernón, 2009, p. 52). Na mesma esteira de Imbernón (2009), compreendemos que a formação continuada em serviço é um espaço que possibilita pensar novas alternativas e responder aos questionamentos e constatações relacionadas ao cotidiano e à realidade da instituição escolar.

Os professores constroem conhecimento coletivamente e precisam de espaço para que esse propósito ocorra e esses espaços coletivos de estudo podem ser o “chão da escola”. No entanto, diante de perspectivas equivocadas os “(...) programas têm-se revelado ineficientes para promover a mudança da prática docente, uma vez que desconsideram as práticas construídas pelos professores e não possibilitam a produção de novos saberes e práticas” (Grigoli et al., 2010, p. 239).

Podemos perceber que aprender “[...] é tornar o aprendizado parte do ser, implicando desenvolver-se com ele” (Alvarado Prada; Freitas; Freitas, 2010, p. 369) e, no caso dos docentes, estes se formam, principalmente, no contexto de seu trabalho. Por essa razão, há a necessidade de que a escola, enquanto local de formação, seja ressignificada.

Corroborando com esta ideia, Flóride e Steinle (2013) destacam que a formação continuada em serviço é uma alternativa para a melhoria do processo de ensino aprendizagem e transformação da realidade escolar porque “além de contribuir com a reflexão e a (re) organização da prática pedagógica, é feita a partir das necessidades e interesses da comunidade escolar. Sendo assim, atendendo aos interesses e aos problemas comuns de toda a comunidade [...]” (Flóride; Steinle, 2013, p. 3-4).

O profissional da educação “dificilmente é considerado como aprendiz e como autor e produtor de sua própria formação” (Alvarado Prada; Freitas; Freitas, 2010, p. 373). Neste sentido, entendemos que a formação continuada em serviço pode contribuir para alterar essa proposição, permitindo que os professores assumam a posição de protagonistas de sua aprendizagem e a escola se torne espaço de reflexão e intervenção, já que “na reflexão da prática é que se geram os conceitos teóricos, que se desencadeiam as soluções dos problemas e, principalmente se sentem as necessidades educativas” (Souza; Tozetto, 2011, p. 5885).

Para que exista esse protagonismo dos professores, a formação continuada em serviço deve ser planejada de acordo com as necessidades dos profissionais que dela participarão, com a realidade da escola e necessidades levantadas por todos que dela fazem parte. Compreendemos que refletir sobre a prática pedagógica coletivamente permite que sejam desencadeadas tanto a transformação da escola quanto a do sistema de ensino, pois o diálogo na escola permite que ideias emancipatórias sejam construídas. Diante das leituras realizadas, encontramos diversas contribuições que a formação continuada em serviço oferece, quais sejam:

• nas estratégias de formação em serviço, os professores constituem-se em sujeitos do próprio processo de conhecimento onde ora são professores “ensinantes”, ora professores “aprendentes”; • esta modalidade de formação, por estar mais centrada no espaço escolar acaba oferecendo ao professor plena autonomia, decorrência natural da condição de sujeito do próprio conhecimento; • por estar centrada nos reais problemas da escola, a probabilidade de adesão e de comprometimento coletivo, com certeza, será maior; • favorecendo o envolvimento coletivo alunos e professores só terão a ganhar, pois professores conscientes de sua ação, através da prática pedagógica refletida, consequentemente, alunos aprendendo mais e melhor e professores mais satisfeitos (Flóride; Steinle, 2013, p. 11-12).

Nesse contexto, percebemos que os aspectos positivos da formação continuada em serviço são inúmeros. No entanto, é necessário mencionar também as constantes ameaças e barreiras que a efetivação dessa formação permanente encontra como as burocráticas a seguir: a falta de interesse e disponibilidade do corpo docente; a gestão escolar tradicional; e a voz do professor ser silenciada porque “a reflexão do professor muitas vezes fica oculta, somente reservada para si e ele não se sente à vontade para partilhar suas verdadeiras angústias e necessidades. O cotidiano não é realmente analisado e problematizado [...]” (Souza; Tozetto, 2011, p. 5886).

Diante dessas ameaças e barreiras, ressaltamos a necessidade de que exista correlação entre gestão democrática e formação continuada em serviço porque uma gestão democrática permitirá que as vozes dos professores sejam ouvidas, que o professor reflita e que o cotidiano seja analisado e problematizado, como afirma Souza e Tozetto (2011).

Neste ponto destacamos a importância que o gestor tem na construção da democracia em suas escolas porque o gestor democrático possibilita espaço e tempo para que seus professores dialoguem, troquem experiências e angústias entre si, desenvolvendo, assim, um espaço de participação e luta dentro da escola. Entendemos que a gestão democrática está delineada em lei e desempenha um papel essencial no âmbito das instituições porque ela permite que espaços de democracia e autonomia passem a existir dentro delas. A gestão democrática, como afirma Peroni e Flores (2014), permite a construção do

[...] projeto político-pedagógico, a participação em conselhos de escola, a eleição para diretores, o exercício da autonomia financeira, processos pedagógicos de aprendizagem da democracia, tanto para a comunidade escolar quanto para a comunidade em geral, porque a participação exige um longo processo de construção no qual a gestão democrática é um fim, mas também um meio (Peroni; Flores, 2014, p. 186).

O papel do gestor na formação continuada em serviço é importantíssimo, assim como na adoção de práticas inovadoras e ainda no atendimento das demandas da comunidade escolar. Corroboramos com o pensamento de Imbernón (2009) quando este afirma que é necessário haver motivação intrínseca e extrínseca para a busca pela formação permanente para que ela tenha real significância para os professores:

uma motivação intrínseca relacionada com a tarefa de se fingir de professor ou professora, o que é muito mais difícil se o professor ou professora se encontra imerso num ambiente de desmotivação e passividade (educativa ou ideológica). Se o professorado se encontra desmotivado, é necessário encontrar mecanismos para motivação extrínseca (por exemplo, permitir trabalhar com qualidade, aprofundar a matéria, encontrar-se consigo mesmo para melhorar a autoestima, realizar-se profissionalmente). Também faz falta uma grande motivação relacionada com a autoestima (Imbernón, 2009, p. 98-99).

Ante o exposto, condições e estímulos devem ser criados para uma formação continuada no ambiente de serviço, pois, embora essa modalidade não seja a solução dos problemas educativos, entendemos que ela proporciona um espaço onde o professor possa refletir e buscar a melhor forma de intervir nos problemas educativos. Cabe lembrar que além de qualquer tipo de formação inicial ou continuada, só haverá mudanças no ensino, e na sua qualidade, se houver valorização dos profissionais da educação.

2.2 A formação continuada em serviço em um município do Triângulo Mineiro

A formação continuada em serviço tem papel importantíssimo no desenvolvimento dos professores, uma vez que permite aprendizagem de conhecimentos novos entre eles. Existem inúmeros aspectos positivos nesta modalidade de formação quando ela é organizada com e para os professores.

Definida a importância da formação continuada, coube perguntarmos aos professores “Qual é o papel da formação continuada realizada em serviço para a prática pedagógica deles?”. No quadro 1 é possível observar as respostas.

Quadro 1 Papel da formação continuada em serviço 

Respostas
“Troca de experiências e novos olhares” (P1)
“Dar ao professor oportunidade de se aprimorar” (P2)
“É um espaço de reflexão sobre a prática, de diálogo sobre saberes e experiências. É um lugar privilegiado na construção de possibilidades de superação das dificuldades e necessidades encontradas no cotidiano. O principal objetivo precisa ser o sucesso da aprendizagem” (P4)
“No crescimento de cada aluno” (P5)
“Atualização” (P6)
“É indispensável! Pois a educação não é neutra, não é estática e requer constantes conhecimentos” (P7)
“Seria de colaborar e enriquecer a prática em sala de aula” (P8)
“Aperfeiçoamento e capacitação aos professores” (P10).

Fonte: Construído pela autora, considerando a fala dos professores.

Nesse prisma, os professores veem a formação continuada em serviço como um espaço de atualização no qual podem refletir sobre suas próprias práticas. A formação continuada em serviço é um dos caminhos que permite que os professores se atualizem. Enxergamos que a

[...] escola faz parte da vida do professor; ele passa grande parte da sua vida em função dos alunos. A formação realizada no ambiente escolar poderia tornar-se muito mais rica. A escola poderia organizar eventos, fazendo com que esta realidade acontecesse mais vezes. Na escola o trabalho é planejado, realizado e avaliado. Na própria escola, os professores poderiam se abrir mais a essa verdade, trocarem mais experiências, buscando ajuda uns nos outros, participando, juntos, de congressos, eventos e grupos de estudo para aperfeiçoar suas limitações e darem continuidade à sua formação (Santos et al., 2011, p.50).

A escola faz parte da vida do professor e nela ele pode se formar continuamente. Os professores do município enxergam os aspectos positivos da formação continuada em serviço, atribuindo ao local de trabalho um valor significativo como espaço de desenvolvimento. Mas, será que concordam que ela deva ocorrer apenas na escola? Indagamos se “a escola deve ser o espaço central da formação continuada. Sim, não, em termos? - Justifique a sua resposta” e obtivemos as respostas do quadro 2.

Quadro 2 A escola deve ser o espaço central de formação 

Respostas
“Sim, e se possível, dividir por faixa etária de atuação para que a formação se torne significativa”. (P2)
“Sim”. (P5)
“Sim, na escola temos a oportunidade de expandir o que aprendemos”. (P6)
“Sim. Muitas vezes o acesso a outros locai não são viáveis a todos os profissionais”. (P8)

Fonte: construído pela autora, considerando a fala dos professores.

Com as respostas dessas quatro professoras apreendemos que a escola deve ser espaço central da formação, uma vez que a mobilidade para outros locais seria até um aspecto dificultador. No entanto, é possível afirmar que a formação dos professores ocorre em diferentes espaços como nas universidades, centros de formação, outras escolas, e ainda espaços não escolares.

Contrariando essas falas, outros professores partem do entendimento que a formação continuada não deve acontecer apenas na escola, conforme o quadro 3:

Quadro 3 A escola deve ser o espaço central de formação 

Respostas
“Não, vejo como um todo: Escola, comunidade e municípios”. (P1)
“Em termos, a formação em diferentes ambientes, que não o escolar, também seria enriquecedor”. (P3)
“Em termos. É no chão da escola, na nossa realidade e com nossos pares que precisamos discutir. Mas a educação tem sua função social e não ficar somente no seu "quadrado". (P7)
“Em termos. A Equipe da Escola deve reunir, realizar e prever estudos formativos, isto acontecendo na Escola; no entanto, a Equipe deve, em outros espaços formativos, aprimorar estudos formativos, considerando, sobremaneira, experiências de outras escolas”. (P9)
“Sim, e também fora da escola, o profissional deve buscar se aperfeiçoar sempre”. (P10)

Fonte: construído pela autora, considerando a fala dos professores.

Na própria Lei Complementar n° 552 do munícipio estudado, de 15 de setembro de 2017, no que diz respeito à avaliação desses profissionais, com base em seu art. 36, entende-se que eles devem investir em sua formação em instituições credenciadas pelo Ministério da Educação (MEC), cursos da Secretaria de Educação ou em instituições parceiras. Devemos lembrar que movimentos isolados pouco contribuem para a formação dos professores porque “formar-se é um processo de toda a vida; enquanto seres humanos, temos a possibilidade de aprender e, portanto, nos humanizamos permanentemente, mediante as relações e interações que acontecem nos diversos ambientes culturais nos quais temos relações” (Alvarado Prada; Freitas; Freitas, 2010, p. 369).

O seguinte questionamento foi feito aos professores: “A política de formação continuada em serviço realizada na instituição em que atua atende às necessidades dos professores da escola e da rede municipal de ensino?” Enquanto quatro professoras responderam afirmativamente, por outro lado uma delas ressaltou que parcialmente. Cinco professores relatam o seguinte: “Nunca” (P1); “Muitas vezes não, porque acontece muita divergência de opiniões” (P2); “Não. É apenas mais uma reunião pedagógica, sem propostas de reflexão, diálogo, debates ou construção de propostas” (P4); “Não. Nem a formação sistêmica” (P7). Assim, numa lógica controversa, se por um lado os professores do município afirmam valorizar a formação contínua em serviço, por outro desmerecem a formação que recebem.

Ao analisar a jornada desses profissionais, foi possível constatar que eles devem cumprir as atividades de formação continuada, uma vez que a contagem de horas é parte integrante da sua jornada extraclasse. Entretanto, somente a participação não garante que aprendizagens ocorram. Acreditamos que o planejamento dessas ações deve ser repensado e se adequar às necessidades dos professores porque da forma como estão sendo organizadas, principalmente as que acontecem em serviço, têm sido insuficientes para atender aos anseios dos professores.

Temos esse entendimento quando há a seguinte declaração: “Não, nunca participei de nenhuma que enriquecesse minha prática na sala de aula” (P8). A esse respeito devemos nos preocupar com os saberes que estão sendo colocados em discussão nos encontros formativos. Na prática pedagógica dos professores, que deve ser objeto de estudo, eles devem ser protagonistas do próprio conhecimento e as tarefas burocráticas precisam ficar em segundo plano.

Existe uma crença, da qual compartilhamos, que a formação continuada em serviço, baseada em princípios impostos de dentro para fora da escola, não contribui para a construção/reconstrução da identidade e da prática dos professores; portanto, não contribui para sua formação. Por conseguinte, além de amparo legal e estrutural do município, um projeto de formação continuada em serviço precisa de recursos financeiros, contribuição das universidades e anseio e valorização por parte dos participantes. Concordamos que

a valorização da prática como ambiente formativo não é, por si só, suficiente para resolver o problema da formação continuada dos professores. Há inúmeros outros fatores, desde escolares até extra-escolares que interferem sobre esse processo, o que nos leva a crer que o processo não pode ser pensado exclusivamente a partir de qualquer uma das suas partes, mas senão de todas elas ao mesmo tempo (Salles, 2004, p.1).

Por isso, as vozes dos professores devem ser ouvidas na formulação de propostas dessas formações. Voltando à questão anterior, indagamos aos professores: “Quem participa da formulação da política de formação continuada na rede pública de ensino? Se participam? Como?” O professor P2 disse que era apenas ouvinte e as professoras P4 e P8 disseram que esta ação compete apenas à Secretaria de Educação do Município (Semed). Tais professores informaram que a formação continuada em serviço não atende às suas necessidades, nem às da escola e da rede municipal de ensino. Mediante esses depoimentos, compreendemos que devem ser realizados levantamentos sobre as necessidades formativas dos docentes para a reestruturação das formações. Caso contrário, estes momentos se tornarão insignificantes para o professor.

A realidade na qual vivemos hoje é o resultado de uma construção histórica que precisa ser conhecida e enfrentada. Alguns passos precisam ser dados e um deles é conhecer os desafios a serem encarados. No que diz respeito à questão “Quais são as principais dificuldades que os professores enfrentam no momento de participar da formação continuada em serviço?”, apenas uma professora respondeu que “Nenhuma”. (P6)

Três professoras ressaltaram que a falta de disciplina dos colegas atrapalha muito. Além da indisciplina, ressaltam que a formação continuada em serviço tem ficado atrelada a questões burocráticas: “Temas administrativos não são somente com nossos pares. Hoje em dia há mais reunião administrativa do que um momento de estudo” (P7). Assim, é denunciado o mau aproveitamento do tempo destinado à formação.

Depreendemos que comumente o retrato das formações realizadas em serviço tem sido professores sem interesse em delas participar, bem como questões burocráticas e administrativas preponderando sobre a aprendizagem. As professoras compreendem que as formações desenvolvidas nas escolas propiciam a melhoria da prática pedagógica; porém, entendem que esse significado tem se perdido em meio a recados, conversas paralelas, entre outros.

Não podemos culpar os professores pelo desinteresse por ser este o momento de aprendizagem, e não de resolução de questões administrativas. Faz-se urgente repensar algumas questões que envolvem a formação continuada em serviço como o espaço, recursos, formadores, a carga horária extensa, que, segundo os professores, é outra dificuldade: “Tempo” (P1); “O tempo” (P5); “Tempo” (P8); “Carga horária extensa e a participação de professores desinteressados que acabam por atrapalhar o bom andamento da formação” (P2); “A formação, sendo após o horário e nos fins de semana, comprometendo o nosso descanso” (P3); “O tempo, fora da carga horária de trabalho, à noite ou aos sábados, o cansaço depois de dois turnos de aulas e a falta de um planejamento motivador, sem momentos de estudos e debates” (P4).

A carga horária excessiva pode trazer graves consequências para a vida dos professores: “[...] ocasionam estresse e doenças mentais, psicológicas ou psicossomáticas, físicas como dores musculares, gastrites, problemas na voz (laringite, faringite), alergia, problemas cardiovasculares e cefaleia” (Cunha; Souza, 2019, p. 26). Logo,

[...] conciliar os horários exige muito esforço para não comprometer a qualidade do trabalho, visto que há também outros compromissos no seu dia a dia como: cronogramas escolares, planejamento pedagógico mensalmente aos sábados, cursos de capacitação promovidos pela Secretaria de Educação, que são obrigatórios e realizados no período de férias escolares, e ainda é necessário levar os trabalhos para serem desenvolvidos em casa, pois o tempo é pouco para tanta atividade na instituição (Cunha; Souza, 2019, p. 30-31).

A rede municipal deve estar atenta a esse aspecto que influencia diretamente a atuação dos professores e, ao se tratar a questão da saúde dos profissionais da educação, vale ressaltar a meta 15, que tem como objetivo a valorização destes profissionais, e a estratégia 10 de “implantar e sistematizar, de forma permanente, programas que promovam a saúde integral e a qualidade de vida dos profissionais da Rede Pública Municipal de Educação (Município, 2015, p. 54).

Logo, se existem estratégias que prezam pela qualidade de vida dos professores, nada mais justo que as ações e programas aconteçam efetivando-as. Quanto às demais dificuldades, seguem as citadas pelas docentes entrevistadas: a falta de disciplina dos colegas; o mau aproveitamento do tempo destinado à formação; a questão da carga horária; e de ser um espaço atrelado a questões burocráticas e administrativas. Todas elas também devem ser sanadas.

Ao serem questionados, os gestores responderam à pergunta: “Quais são as principais dificuldades enfrentadas como gestor no momento de organizar e colocar em prática a política de formação continuada na sua escola? (Estrutura; Tempo; para definir e organizar os temas de formação; envolvimento docente na organização; participação docente nas atividades, etc.)”. Apenas uma gestora ressaltou que esta acontece com êxito. Outra gestora diz que:

Na escola que atuo há divisões de tarefas e participação de todos. Os dias de formação são definidos previamente e todos participam. Assim, com datas, horários e temas definidos, a dificuldade maior é o estudo dos temas e mediação das discussões para avanços para além do senso comum. Outro fator de desafio é estreitar as teorias e estudos realizados às práticas diárias, mas temos conseguido com sucesso (G7).

Essa gestora ressalta a mediação das discussões para além do senso comum e o ato de estreitar as teorias e estudos realizados durante as práticas pedagógicas como aspectos dificultadores. Podemos depurar que a mediação das formações deve ser feita por alguém que ajude os professores, que conheça aquele coletivo e dê abertura para que dialoguem, que possam ir além dos slides e saibam relacionar teoria/prática, dando o devido valor aos dois aspectos.

Contudo, de nada adianta haver um excelente mediador, temas e carga horária estruturados, se os professores não tiverem interesse em participar da formação. Alguns gestores dizem que enfrentam a falta de envolvimento dos professores como dificuldade: “Maior envolvimento de todos os docentes no processo de formação” (G2); “Envolvimento dos docentes: existe muito desânimo, tanto no estudo quanto na revisão das práticas pedagógicas” (G4); e “O envolvimento dos docentes, pois vejo que muitos não se comprometem efetivamente” (G8). Esse envolvimento precisa ser conquistado a partir de ações que instiguem os professores a sentirem anseio em aprender cada vez mais e mais.

Os recursos financeiros representam condição sine qua non para que uma boa formação se realize. Para a gestora G3 trata-se de uma dificuldade a ser enfrentada: “a falta de recursos financeiros” (G3). Além dos recursos financeiros, dois gestores ressaltam que: “O único problema encontrado é haver profissionais que trabalham em mais de uma rede de ensino e não participam da formação continuada na escola” (G5); “Docentes que trabalham na rede Estadual ou até mesmo privada” (G6), fator que, na visão dos gestores, atrapalha a qualidade da formação continuada.

No Art.7 da Portaria nº 0019/ 2018 (Município, 2018), é exposto que o profissional detentor de dois cargos ou dobra de turno, em instituições diferentes, deverá cumprir as atividades formativas nas duas escolas. Caso as atividades aconteçam no mesmo dia e horário, ele deverá cumprir em uma unidade e assumir a ausência na outra e ainda caso “§2º as datas e os horários da formação continuada de ambas as Unidades de Ensino coincidam, o profissional do magistério terá o direito de cumprir a carga horária dessa atividade formativa na Casa do Educador” (Município, 2018, p. 55).

Em síntese, os gestores apontam os seguintes aspectos dificultadores para a realização da formação continuada em serviço: a mediação das discussões para além do senso comum; a dificuldade em estreitar as teorias e estudos realizados às práticas pedagógicas; a falta de envolvimento dos professores; a falta de recursos financeiros; e profissionais que trabalham em mais de uma rede de ensino e não participam da formação continuada na escola. Tais dificuldades devem ser analisadas e acreditamos serem passíveis de correção.

No intuito de entendermos a visão dos professores frente a essas dificuldades, perguntamos se eles tinham “alguma proposta para a formação continuada em serviço que possa ser colocada em prática e seja capaz de contribuir efetivamente com o crescimento profissional e a valorização dos professores”. Uma professora respondeu que: “Formação significativa com carga horária não muito cansativa, estressante” (P1). Delineamos, aqui, o primeiro ponto para a reestruturação da formação continuada em serviço: a questão da sua carga horária.

Vale destacar a questão da carga horária extensa, cansativa e que ocasiona problemas de saúde. Devemos lembrar que muitos professores têm dois cargos ou dobra de turno, seja no município, no estado, ou até mesmo em outra função e que, quando retornam para fazer a formação continuada em serviço, o que geralmente acontece no meio de semana no período noturno, encontram-se exaustos, com pouca capacidade de assimilação dos conteúdos ou do que é dito nos encontros. Exemplo disso é a pesquisa de Feitosa; Mendes Júnior; Carvalho (2010), que analisa o porquê de o professor da rede pública não participar da formação continuada, cuja conclusão é de que este fato ocorre devido “[...] à sobrecarga de trabalho, stress da profissão, baixa remuneração, desvalorização do profissional da educação, condições precárias de trabalho, como ainda o descaso político em oferecer uma educação pública de qualidade e prioritária, entre outros fatores” (Feitosa; Mendes Júnior; Carvalho, 2010, p. 10).

Outra pesquisa que reafirma esse fato é a de Alvarenga (2016) que buscou correlacionar as políticas de Estado e as políticas governamentais no que concerne aos processos de valorização do trabalho docente e, tratando da questão da carga horária, trouxe que “ [...] a maioria que tem dupla jornada acaba tendo um comprometimento do tempo para planejar e pensar seu trabalho, realizando muitas atividades à noite e nos finais de semana, como pode ser constatado no depoimento das professoras” (Alvarenga, 2016, p. 274-275).

Percebemos, assim, que a carga horária excessiva dos professores tem sido um impedimento à sua formação. Vale destacar que os docentes têm noção que a formação continuada em serviço é importante, o que pode ser ilustrado no seguinte relato: “Que sempre seja inovadora e capacite os professores” (P10). Os professores da rede municipal de Uberlândia-MG (Alvarenga, 2016) ressaltam a dupla jornada como um impedimento para a procura da formação continuada. Uma professora declara:

Sim. Penso a formação continuada em serviço como um processo de desenvolvimento profissional que valorize os saberes de experiência dos docentes, realizado mediante o estudo, o debate, a reflexão e análise das práticas instituídas em uma aproximação de teóricos para a construção de um espaço de diálogos e novas práticas, mais prazerosas e capazes de promover novas aprendizagens (P4).

A formação continuada em serviço permite valorizar os saberes da experiência porque “acreditamos que a formação em serviço, apesar de não ser a única solução para todos os desafios postos para a escola e para prática docente, constitui-se como uma atividade fundamental na formação do professor contemporâneo” (Flóride; Steinle, 2013, p. 13), é essencial e necessita ser efetivada em todas as escolas.

Tornam-se cada vez mais escassas as ações que subsidiam o trabalho docente, ao passo que as exigências colocadas para os professores têm aumentado substancialmente. Outro ponto ressaltado relaciona-se à orientação quanto aos problemas do cotidiano escolar. Uma docente destaca: “Vejo que a maior necessidade no momento é uma formação onde o professor possa ser orientado quanto às agressões sofridas em sala de aula, as quais se iniciam na educação infantil” (P2).

Os professores enfrentam vários problemas em sua rotina diária e a indisciplina é um deles. Pesquisando sobre a forma como a formação contínua poderá vir a responder às necessidades dos professores para a intervenção e prevenção da indisciplina, Palma (2011) concluiu que os professores do agrupamento investigado sabem da importância da formação continuada “ [...] para refletir/trocar experiências com outros professores, utilizar na sua prática pedagógica os conhecimentos, técnicas e competências na prevenção da indisciplina, (re)construir saberes orientados para a resolução de problemas específicos relacionados com a indisciplina [...]” (Palma, 2011, p. 92). Relata ainda que a

determinação de ações de formação contínua de professores decorrentes das expectativas individuais e de grupo, e das necessidades sentidas pelos próprios nas suas práticas escolares, e que tenha como finalidade colaborar com estes na reflexão e clarificação das situações educativas e na procura de soluções para os problemas com que se deparam no seu dia a dia, desempenhará um papel decisivo na reconstrução da sua identidade profissional e contribuirá para a mudança positiva das suas práticas e das representações que as suportam (Palma, 2011, p. 11-12).

Por conseguinte, podemos constatar que para que realmente haja aprendizagem é preciso “que os temas sejam mais enriquecidos e atuais” (P3); “Um grupo de estudos, temas relacionados com a realidade educacional e turma que atua” (P7). Outro ponto que também merece destaque em nossa discussão é que os temas sejam pertinentes e atuais. A fala dessas professoras pode indicar que as escolas não têm oportunizado as escolhas dos temas e, quando o fazem, muitos professores se atêm a temas já discutidos.

Outra proposta suscitada pelas docentes é em relação ao distanciamento da prática. Vejamos algumas respostas: “Gostaria que fosse mais prática que teórica e que trouxesse momentos de planejamento e confecção de materiais de intervenção” (P8). Esta discussão da dicotomia teoria/prática é antiga e outros professores querem utilizar desse tempo para: “Construção de REAP1” (P5); “Planejamento” (P6); “Produções textuais” (P9). Fica evidente a pouca clareza da importância da teoria na construção de suas práticas. Acreditamos que a formação continuada em serviço precisa proporcionar aos professores o entendimento que deve relacionar a teoria com a prática diária e que este espaço vai além de um momento para planejamento ou organização de atividades de sua rotina diária. Temos como respaldo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB nº 9394/96) que, em seu art. 61 ressalta:

Parágrafo único. A formação dos profissionais da educação, de modo a atender às especificidades do exercício de suas atividades, bem como aos objetivos das diferentes etapas e modalidades da educação básica, terá como fundamentos: (Incluído pela Lei nº 12.014, de 2009). I - a presença de sólida formação básica, que propicie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas competências de trabalho; (Incluído pela Lei nº 12.014, de 2009). II - a associação entre teorias e práticas, mediante estágios supervisionados e capacitação em serviço; (Incluído pela Lei nº 12.014, de 2009). III - o aproveitamento da formação e experiências anteriores, em instituições de ensino e em outras atividades (Incluído pela Lei nº 12.014, de 2009) (Brasil, 1996, p. 75).

A importância dessa relação teoria/prática também é discutida em âmbito municipal no Plano Decenal Municipal de Educação (PDME 2015-2024), documento que traz que “os novos paradigmas que caracterizam a sociedade atual, no aspecto produtivo, exigem níveis cada vez mais altos de escolaridade e de formação profissional em que a relação teoria-prática seja o eixo articulador do processo educativo” (Município, 2015, p. 107).

Percebemos, assim, que não deve haver dissonância entre teoria/prática na formação continuada e que devemos compreender o porquê de até hoje existirem professores que clamam pela prática, em detrimento da teoria, em suas formações. Nossa realidade deve se adequar de forma a proporcionar a esses sujeitos ambas as aprendizagens. As falas das professoras nos trazem elementos importantes para subsidiar as propostas para a formação continuada em serviço que podem ser colocados em prática e são capazes de contribuir efetivamente para o crescimento profissional e a valorização dos professores. Dentre eles devem ser destacados a redução ou reorganização da carga horária, que está intimamente ligada à valorização dos professores, bem como a exigência do atendimento ao piso salarial dos professores, pois, caso sejam valorizados e tenham seus salários adequados, não precisarão ter duas ou três jornadas diárias.

Além da questão da relação teoria/prática na carga horária, ou da eleição da supremacia da prática na formação, os professores ressaltaram a pertinência de temáticas inovadoras que atendam às suas dificuldades e anseios, como a questão da indisciplina, que se faz cada dia mais presente nas salas de aula. Essas propostas das professoras devem ser ouvidas e atendidas pela Secretaria Municipal de Educação. Contudo, para que sejam desenvolvidas, e concretizadas, é preciso um planejamento e organização dialogada entre os pares.

Diante desses aspectos dificultadores apresentados pelos gestores e professores, e propostas elencadas pelos professores em prol de melhorias na rede de ensino, ficamos curiosos em relação aos gestores. Fizemos o questionamento: “As políticas de formação continuada promovidas pela Secretaria Municipal de Educação (SME) contribuem com a elevação da autoestima e a valorização docente no meio escolar? Justifique a sua resposta”. Todas as gestoras concordaram que sim. De acordo com o quadro 4, temos:

Quadro 4 Políticas de formação continuada da SME contribuem com a valorização docente 

Respostas
“Sim. São trabalhados temas muito pertinentes”. (G1)
“Sim, porém precisamos atingir um número maior de docentes que queiram elevar seu conhecimento”. (G2)
“Sim. São demandas escolhidas e/ou sugeridas pelos profissionais; assim, o processo se torna prazeroso”. (G3)
“É voltada para as práticas pedagógicas e não para a autoestima”. (G4)
“Sim, pois refletimos e replanejamos em cima dos resultados adquiridos”. (G6)
“Sim, não só pelo incentivo aprendiz, como financeiro”. (G7)
“Sim, através de cursos oferecidos pela Casa do Educador e Congressos promovidos ao longo do ano”. (G8)

Fonte: Construído pela autora a partir das falas dos gestores.

Visualizamos que para os gestores a formação continuada se tornou um projeto pessoal, e social, pois consideram os temas pertinentes, o processo prazeroso voltado à prática pedagógica, além do incentivo financeiro. Ser um professor que ensina com qualidade, inovação, criatividade, exige também uma formação continuada de qualidade que amplie seu conhecimento e que responda aos seus problemas e dificuldades.

Para esses gestores, a formação continuada da rede contribui para a valorização docente. Quando perguntados “O que apresentariam como proposições objetivas para formular e colocar em prática uma política de formação continuada, que seja capaz de contribuir efetivamente com a valorização dos professores de sua escola e, portanto, do meio escolar?”, questão que também foi explorada pelos professores, os participantes relatam que: “A valorização vai além da formação; o professor tem sido alvo constante de degradação” (G4). De acordo com nossas discussões, percebemos que essa é a realidade. O que o mercado anseia é a formação de um perfil de professores que atua como técnico e reprodutor, instruindo seus alunos a aprender habilidades para o mercado. Uma política de formação continuada, ao contrário, remete à valorização dos professores.

Outra participante traz a necessidade de mais recursos financeiros: “Dinamização de recursos financeiros para a aquisição de obras bibliográficas para o enriquecimento do conhecimento dos professores. Cursos fora da escola e passeios culturais” (G2). Esse aspecto é relevante porque a formação continuada não deve ficar atrelada apenas ao espaço escolar. Por isso, os professores devem ter mais oportunidades de buscar novos conhecimentos. Para tanto, é necessário recursos financeiros, como apontado pela gestora, para a aquisição de obras, cursos e passeios. Sabemos que essas atividades têm muito a contribuir com a formação dos professores.

Dois gestores ressaltam o incentivo com recursos financeiros: “Continuar sendo remunerada e com as devidas exigências” (G1); “Um incentivo salarial, mesmo que seja uma pequena porcentagem, mas que não fosse embutido no salário. Pois, nesse caso, o profissional perceberá que realmente recebe por essa formação” (G6).

O incentivo salarial deve potencializar a busca pela qualificação. Concordamos que

A única proposição, ao meu ver, que possa contribuir de forma efetiva para a valorização dos professores, não só na unidade em que eu atuo mais como num todo é o cumprimento de outra política pública: o cumprimento do piso salarial dos profissionais da educação básica. Pois, conforme respondi à pergunta anterior, a "valorização dos professores" vai além de sua formação profissional (G5).

Três gestores reafirmam a necessidade de a formação continuada partir da identidade da escola para contribuir efetivamente com a valorização dos professores: “Que seja elaborada conforme a identidade da escola” (G3); “A já existente na escola em que trabalho, que valorize os saberes práticos dos professores, que faça a leitura real das dificuldades dos alunos e da escola como um todo e, a partir dessas constatações, estude e se aprimore para melhorar, de fato, o que se precisa, dentro da própria escola” (G7); “Ofereceria mais cursos de formação continuada que visam a mudanças práticas, oferecendo conteúdos e trabalhando a criatividade e racionalidade dos profissionais” (G8).

Para os gestores é preciso haver: a valorização dos professores; maiores recursos financeiros; incentivo salarial; e formação, a partir da identidade da escola. Essas proposições devem ser seguidas para formular e colocar em prática uma política de formação continuada que seja capaz de contribuir efetivamente com a valorização dos professores de sua escola e, portanto, do meio escolar.

Podemos perceber que os gestores relatam que a formação continuada oferecida na rede contribui para a valorização docente. Porém, quando indagados sobre melhorias, apresentam esses fatores delineados anteriormente. Essa visão contraditória nos alerta que nem sempre as atitudes e opiniões são o que parecem ser. Por essa razão há a necessidade de um olhar crítico sobre os fatos que encontramos, para podermos compreender que a valorização dos professores ainda carece de ser reescrita e efetivada em nossa sociedade. O papel diz algo; porém, a realidade nos mostra que é tudo ao contrário.

É visível que para os gestores e professores do Ensino Fundamental I do município, a formação continuada e a formação continuada em serviço são aspectos imprescindíveis da formação docente junto à formação inicial. Eles reconhecem suas potencialidades e empecilhos e apresentam propostas que podem mudar esse cenário.

Sabemos que “[...] dois elementos ganham força e se constituem em tendências nas políticas educacionais sob a condução do atual governo, o componente conservador e o caráter mercantil privatizante da educação [...]” (Taffarel; Neves, 2019, p. 320). Por isso, entendemos que agora, mais do que nunca, os professores e gestores, a sociedade em geral, devem lutar pelos seus direitos e garantir o cumprimento das políticas públicas.

3 Conclusão

As legislações do município tratam a formação continuada como algo imprescindível ao melhoramento do trabalho docente, bem como da educação propriamente dita. No entanto, os entrevistados ressaltaram aspectos que não contribuem para sua formação e há falas totalmente rasas que apresentam a dissociação entre teoria/prática. Ademais, a valorização do profissional docente, com plano de carreira e salários mais atrativos, é essencial.

Os gestores, assim como os professores da rede, têm muito a contribuir para o desenvolvimento e organização das ações, pois estão no dia a dia da sala de aula e vivenciam as necessidades e carências do ensino público. Reafirmamos, incessantemente, que as aclamações sejam ouvidas e as ações efetivadas em prol de um ensino público de qualidade. É necessário que os aspectos dificultadores apresentados pelos professores e gestores sobre a realização da formação continuada, principalmente a realizada em serviço, sejam ponderados e que ocorra uma reestruturação nos documentos municipais.

Os professores, alunos, a comunidade escolar em geral, não podem ser responsabilizados, haja vista haver falta de incentivo público e cortes orçamentários. Esperamos que a sociedade compreenda quem são os verdadeiros culpados pelo fracasso escolar, pela angústia dos professores e pela derrota do ensino público, que vem se acentuando cada dia mais e mais. Que compreendam e decidam ir à luta!

1Registro de Acompanhamento Pedagógico

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Recebido: 22 de Abril de 2023; Aceito: 26 de Outubro de 2023

Editoras: Profa. Dra. Ana Maria Haddad Baptista e Profa. Dra. Marcia Fusaro

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