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Eccos Revista Científica

versão impressa ISSN 1517-1949versão On-line ISSN 1983-9278

Eccos Rev. Cient.  no.67 São Paulo out./dez 2023  Epub 19-Fev-2024

https://doi.org/10.5585/eccos.n67.23822 

Artigos

ATENDIMENTO PEDAGÓGICO HOSPITALAR: UMA REVISÃO NARRATIVA

HOSPITAL PEDAGOGICAL CARE: A NARRATIVE REVIEW

ATENCIÓN PEDAGÓGICA HOSPITALARIA: UNA REVISIÓN NARRATIVA

Ecleide Cunico Furlanetto, Doutora em Educação1 
http://orcid.org/0000-0002-1326-3075

Karina Alves Biasoli, Doutora em Educação2 
http://orcid.org/0000-0002-9222-3329

Cristiane Nobre Nunes, Mestre em Educação3 
http://orcid.org/0000-0002-9080-9780

1Doutora em Educação, Universidade Cidade de São Paulo-UNICID, São Paulo, São Paulo - Brasil

2Doutora em Educação, Universidade Cidade de São Paulo-UNICID, São Paulo, São Paulo - Brasil

3Mestre em Educação, Universidade Cidade de São Paulo-UNICID, São Paulo, São Paulo - Brasil


Resumo

Este artigo apresenta os resultados de uma Revisão Narrativa empreendida entre os anos de 2011 e 2021, cujo objetivo foi analisar as principais produções acadêmicas sobre o atendimento pedagógico hospitalar. Além da formulação de políticas públicas que sustentam a obrigatoriedade deste atendimento em hospitais, muitos estudos têm sido desenvolvidos visando dar sustentação aos trabalhos educacionais realizados nos hospitais em atenção aos estudantes enfermos, impossibilitados de frequentar a escola regular. Esta pesquisa organiza-se a partir de uma discussão sobre como uma revisão narrativa, comumente realizada na área da Saúde (Ercole; Alcoforado, 2014), mas ainda é pouco utilizada na área de educação se delineia e descreve o caminho percorrido para realizá-la. Esse tipo de revisão, de caráter descritivo-discursivo, tem como base a apresentação e a discussão de temas de interesse científico, o que permite organizar conhecimentos produzidos acerca de uma temática específica. Na sequência, são apresentadas as temáticas emergentes que envolvem o atendimento pedagógico hospitalar e pautam formulações, análises e sínteses que permitem uma maior delimitação e compreensão de como o campo está se delineando. Finalmente são tecidas considerações que indicam tendências e lacunas existentes no campo do atendimento pedagógico hospitalar.

Palavras-chave: atendimento pedagógico hospitalar; classe hospitalar; pedagogia hospitalar; revisão narrativa.

Abstract

This article presents the results of a Narrative Review undertaken from 2011 to 2021, whose purpose was to analyze the main academic productions on inpatient pedagogical care. In addition to the formulation of public policies, that support the obligation of this service in hospitals, many studies have been developed aiming to give support to the educational work performed in hospitals for ill students, unable to attend regular school. It is organized, therefore, from a discussion on how a narrative review, commonly carried out in the area of Health, (Ercole; Alcoforado, 2014), but still little used in the area of education is outlined and describes the path taken to carry it out. This type of review, of descriptive-discursive nature, is based on the presentation and discussion of topics of scientific interest, which allows the organization of knowledge produced about a specific theme. Next, the emerging themes that allow for greater delimitation and understanding of how the field is being delineated are presented. Finally, considerations are made that indicate trends and gaps in the field of inpatient pedagogical care.

Keywords inpatient pedagogical care; hospital class; hospital pedagogy; narrative review.

Resumen

Este artículo presenta los resultados de una Revisión Narrativa emprendida entre los años 2011 y 2021, cuyo objetivo fue analizar las principales producciones académicas sobre la atención pedagógica hospitalaria. Además de la formulación de políticas públicas, que avalan la obligatoriedad de este servicio en los hospitales muchos estudios han sido desarrollados buscando dar sustentación a los trabajos educativos realizados en los hospitales en atención a los estudiantes enfermos, imposibilitados de frecuentar la escuela regular. Se organiza, por consiguiente, a partir de una discusión sobre cómo una revisión narrativa, comúnmente realizada en el área de la Salud, (ERCOLE; ALCOFORADO, 2014), pero todavía es poco utilizada en el área de educación se delinea y describe el camino recorrido para realizarla. Este tipo de revisión, de carácter descriptivo-discursivo, se basa en la presentación y discusión de temas de interés científico, lo que permite organizar el conocimiento producido sobre un tema específico. En la secuencia, se presentan las temáticas emergentes que permiten una mayor delimitación y comprensión de cómo el campo se está delineando. Finalmente se tejen consideraciones que indican tendencias y lagunas existentes en el campo de la atención pedagógica hospitalaria.

Palabras clave atención pedagógica hospitalaria; clase hospitalaria; pedagogía hospitalaria; revisión narrativa.

Introdução

O atendimento pedagógico hospitalar destina-se a crianças e adolescentes impossibilitados de frequentar a escola por apresentarem enfermidades que requerem internações em hospitais. No Brasil, as Políticas Públicas Educacionais, com foco na educação inclusiva que garante a estes estudantes em situação de internação a continuidade de seus estudos, vêm sendo aprimoradas conforme observado nas Diretrizes Nacionais para Educação Especial na Educação Básica (CNE/CEB, 2001). No entanto, apesar de reconhecido por lei, o direito à educação de crianças e adolescentes internados em instituições hospitalares ainda não está totalmente garantido em nosso país, sinalizando um longo caminho a ser percorrido para a concretização desse direito.

Além da formulação de políticas públicas, muitos estudos têm sido desenvolvidos no sentido de dar sustentação aos trabalhos educacionais realizados nos hospitais. Para fins deste artigo, serão apresentados os resultados de uma revisão narrativa que teve por objetivo analisar as principais discussões acadêmicas produzidas a partir da temática que envolve o Atendimento Pedagógico Hospitalar, focalizando aspectos que são próprios da área da Educação, pois conforme afirmam Vosgerau e Romanowski (2014, p. 184), tal modalidade de revisão permite “sintetizar, avaliar e apontar tendências”, considerando o número elevado de pesquisas realizadas e a necessidade de uma análise crítica sobre as fragilidades que marcam cada uma dessas tendências.

Assim sendo, este artigo é o resultado de uma extensa revisão narrativa empreendida entre os anos de 2011 e 2021 que teve por objetivo analisar o modo como o atendimento pedagógico hospitalar foi abordado em diferentes publicações científicas. Por meio da análise do material coletado tornou-se possível identificar as principais temáticas cuja discussão permite uma maior delimitação e compreensão de como o campo está se constituindo a partir dos estudos produzidos sobre a temática.

Este artigo se organiza, inicialmente, tratando de como uma revisão narrativa se delineia e delimitando o caminho percorrido para realizá-la. Na sequência, são abordadas as temáticas que emergiram mediante o emprego do referido tipo de revisão e, finalmente, são tecidas as considerações acerca das temáticas que marcaram as tendências dentro do recorte temporal tratado.

2 Revisão narrativa

A revisão narrativa é comumente realizada na área da Saúde (Ercole; Alcoforado, 2014), mas ainda é pouco utilizada na área de educação. Para Toledo, Góngora e Bastos (2017), foi introduzida com vistas a complementar a abordagem quantitativa prevalente na área da Saúde, sendo considerada pertinente, principalmente, no que se refere à sintetização de questões de interesse para determinados campos do conhecimento.

Diferentemente de uma revisão sistemática que busca mapear o maior número possível de artigos sobre o tema, na revisão narrativa são escolhidos os autores mais significativos para o estudo (Ferenhof; Fernandes, 2016). Sem a pretensão de esgotar as fontes de informações e ou de aplicar técnicas exaustivas de buscas, procura-se construir uma narrativa com base nos materiais abordados, no sentido de proporcionar à comunidade acadêmica, em um único texto, informações sintetizadas a respeito das abordagens de determinado tema.

Nessa linha, uma revisão narrativa procura estabelecer relações entre produções no sentido de levantar questões, identificar temas recorrentes, apontar tendências, localizar novos conceitos e metodologias de pesquisa presentes na literatura analisada, contribuindo, dessa maneira, para a atualização e a divulgação do conhecimento científico que nos permita localizar os núcleos que congregam e disseminam conhecimento de um dado tema ou campo (Faro; Pereira, 2013).

Na perspectiva de Cordeiro et al. (2007), a revisão narrativa, se comparada à sistemática, apresenta uma temática mais aberta, sendo que poucas vezes é desencadeada por uma pergunta específica e parte de fontes pré-determinadas. Cabe ressaltar, também, que não se pauta em uma metodologia que permita a reprodução dos dados e nem fornece respostas quantitativas para questões específicas. De acordo com Rother (2007, p. 5), essa categoria de artigos de caráter descritivo-discursivo tem um papel fundamental para a pesquisa e para a educação continuada pois, permite ao leitor adquirir e atualizar o conhecimento sobre uma temática específica em curto espaço de tempo.

3 O caminho percorrido

A seleção de artigos foi realizada na “Scientific Electronic Library Online” (SciELO), e foram utilizados os seguintes descritores: classe hospitalar; criança hospitalizada e; pedagogia hospitalar. Em relação ao levantamento de teses e dissertações, realizado junto à Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD/IBICT), foram utilizadas as mesmas palavras-chave. Além desse levantamento, procedeu-se um criteriosa análise das referências bibliográficas observadas, de forma recorrente, em um número expressivo de artigos, publicações em livros, capítulos de livros e atas de congressos, sendo possível localizar autores que se situavam como referências na área investigada. Desse modo, foram selecionadas as produções consideradas mais pertinentes ao estudo em questão, tendo sido localizados: 46 dissertações, 15 teses e 15 artigos.

Para a seleção dos textos que compuseram o corpus da análise narrativa deu-se prioridade àqueles que apresentavam pressupostos e perspectivas teóricas que contribuíssem para a compreensão de como a temática sobre o atendimento pedagógico hospitalar foi se constituindo ao longo do tempo e como orientaram pesquisas sobre a referida temática. Dado o volume do material localizado, recorreu-se aos seguintes critérios para a seleção: leitura do título; leitura do resumo; e, posteriormente, a leitura na íntegra do texto, incluindo a análise do referencial teórico de cada trabalho.

Com base na revisão realizada emergiram sete temáticas: i) início das ações educativas no hospital; ii) políticas públicas educacionais de atendimento pedagógico hospitalar; iii) terminologias utilizadas para nomear o atendimento pedagógico em ambiente hospitalar; iv) organização pedagógica e as ações educativas na classe hospitalar; v) atenção à saúde integral dos escolares que frequentam as classes hospitalares; vi) formação de professores para atuação nas classes hospitalares/aprendizagem hospitalar; e vii) o professor frente à criança doente e a convivência com a morte, que serão abordadas na sequência.

4 Resultados do estudo com base na revisão narrativa

4.1 Início das ações educativas no hospital

Esta vertente aborda o histórico da Pedagogia Hospitalar no Brasil, desde o primeiro hospital que iniciou o atendimento pedagógico a crianças e adolescentes hospitalizadas, tratada por Zombini (2011), Oliveira (2013) e Nunes (2014).

A primeira ação educativa hospitalar, segundo Oliveira (2013, p. 2), aconteceu em 1950, no Hospital Municipal Jesus, localizado no Rio de Janeiro (RJ), embora, “registros indicassem que em 1600, ainda no Brasil Colônia, havia atendimento escolar aos deficientes físicos na Santa Casa de Misericórdia em São Paulo” conforme registros datados de 1931, localizados nos arquivos do referido hospital. Ainda conforme o autor, já havia o objetivo de assegurar a crianças e adolescentes, em situação de internação hospitalar, o compromisso com o desempenho escolar considerando o afastamento da escola de origem.

Ainda que no decorrer do tempo tenham sido verificadas algumas iniciativas isoladas na oferta de atendimento escolar em ambientes hospitalares, esse serviço de apoio especializado vinculado à educação especial ganhou força somente a partir de 1960, quando o Hospital Barata Ribeiro, também localizado na cidade do Rio de Janeiro (RJ), inaugurou sua classe hospitalar (Nunes, 2014).

Dentre as experiências e iniciativas empreendidas, no sentido de oferecer o atendimento educacional para crianças e jovens hospitalizados, verificaram-se diferentes modalidades de oferta que variavam conforme o local de implantação, as características locais, a frequência da oferta, o espaço disponibilizado para o atendimento, a seleção de critérios para assegurar a frequência e definir o público atendido, o desenvolvimento de práticas pedagógicas e, até mesmo, a formação daqueles que atuavam em tais espaços. Diversidade essa que se constituiu como temática de estudo também na área acadêmica e impulsionou a construção de um conhecimento próprio sobre o Atendimento Pedagógico Hospitalar.

4.2 Políticas públicas educacionais de atendimento pedagógico hospitalar

A segunda vertente aborda os aspectos legais para implantação e manutenção das classes hospitalares relacionadas às políticas públicas educacionais que amparam o trabalho pedagógico hospitalar e domiciliar.

Além da legislação existente, o direito ao atendimento escolar de crianças e adolescentes internados em ambiente hospitalar, são apresentados em trabalhos como aqueles de Paula e Zais (2015), Fonseca (2020) e Menezes, Trojan e Paula (2020). O surgimento da primeira incorporação da temática em legislação educacional nacional aconteceu na década de 1990, a partir da entrada em vigor do Estatuto da Crianças e do Adolescente (1990), embora já houvesse expressa indicação de tal modalidade de atendimento desde a Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959) que no princípio 5º traz: “À criança incapacitada física, mental ou socialmente serão proporcionados o tratamento, a educação e os cuidados especiais exigidos pela sua condição peculiar”.

Em 1993, a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância (ABRAPIA) publica o “Guia de Orientação para Educadores e Acompanhantes de Crianças e Adolescentes Hospitalizados”. Contudo, foi em 1994 que o Ministério da Educação (MEC) assumiu a responsabilidade de assegurar o direito à educação de crianças e adolescentes hospitalizados por meio do serviço da Classe Hospitalar.

De acordo com Paula e Zais (2015, p. 8), a Política Nacional de Educação Especial (Brasil, 1994) definiu a Classe Hospitalar como espaço no qual seria ofertado o atendimento educacional a crianças e adolescentes que estivessem internados ou que necessitassem de educação especial, definindo a necessidade de um local para tal oferta.

Posteriormente, o documento elaborado pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), “Direitos da Criança e Adolescentes Hospitalizados” (1995), cujo objetivo foi nortear a conduta dos profissionais de saúde no ambiente hospitalar sendo fundamental para a publicação da Resolução nº 41, de 13 de outubro de 1995 que, de acordo com Costa, Passeggi e Rocha (2020), retoma a defesa dos direitos dos pacientes pediátricos, abordados na “Carta da Criança Hospitalizada” (1988), por diversas associações europeias. Dentre os elementos resgatados no documento de 1988, destaca-se o item 9 da Resolução nº 41/1995 (Brasil, 1995, p. 1) que prevê expressamente o direito da criança hospitalizada de “desfrutar de alguma forma de recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do curriculum escolar durante sua permanência hospitalar”.

Em 2001, o Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica (CNE/CEB) instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, trazendo para o debate a situação das Classes Hospitalares e o Atendimento Pedagógico Domiciliar, embora só tenha sido regulamentado pelo MEC por meio da Secretaria de Educação Especial, no ano de 2002, com a publicação do documento intitulado “Classe Hospitalar e Atendimento pedagógico domiciliar: estratégias e orientações”, que tinha por objetivo estruturar o sistema de atendimento educacional em ambientes hospitalares e domiciliares.

De acordo com Paula e Zais (2015), tal documento tornou-se referência no período de sua publicação e ainda é considerado um dos grandes marcos do atendimento educacional em espaços hospitalares, ainda que apresente elementos que necessitam de atualização e não atendam adequadamente às demandas atuais, pois o direito ao atendimento pedagógico no hospital não está presente em todos os estados brasileiros.

Apenas em 2015 a Educação Especial alinhada com a Educação Inclusiva é vinculada à Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) e realiza avanços significativos em diferentes áreas que compõem o atendimento pedagógico hospitalar e domiciliar. Mais recentemente, em 2018, a Lei nº 9.394/1996 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) foi alterada pela Lei nº 13.716 (Brasil, 2018) que, em seu artigo 4º- A, explica:

É assegurado atendimento educacional, durante o período de internação, ao aluno da educação básica internado para tratamento de saúde em regime hospitalar ou domiciliar por tempo prolongado, conforme dispuser o Poder Público em regulamento, na esfera de sua competência federativa (Brasil, 2018).

Em que pese os avanços observados, sobretudo, a partir do ano de 2015, o direito à educação hospitalar e ao atendimento pedagógico domiciliar ainda não é uma realidade em todos os estados e municípios brasileiros.

4.3 Terminologias utilizadas para o atendimento pedagógico em ambiente hospitalar

A terceira temática diz respeito às diferentes terminologias utilizadas para definir o atendimento pedagógico em ambiente hospitalar. Verificou-se que uma das maneiras a se referir a esse tipo de atendimento tem sido nomeá-lo de “Pedagogia Hospitalar” que, segundo Fontes (2005), prevê a construção de conhecimentos dos quais derivem práticas pedagógicas que considerem as características próprias do hospital e a situação em que se encontram os alunos que diferem de uma escola regular.

Para Matos e Muggiatti (2014), a Pedagogia Hospitalar é um trabalho especializado e bastante amplo que vai além da escolarização da criança hospitalizada. Lecionar dentro de um hospital é muito mais que escolarizar, é um ato de promover momentos de bem-estar, de reflexão e de aprendizagem sobre os conhecimentos do mundo, da enfermidade e da própria vida. A atuação do professor, nesse sentido, além de proporcionar a continuidade dos estudos, se compromete com a recuperação e melhoria da saúde de seus alunos, em consonância com os profissionais da equipe multiprofissional que compõem o hospital.

Na perspectiva de Tinós et al. (2018, p. 240), “a Pedagogia Hospitalar incorpora e amplia o conceito de classe hospitalar, pois não se restringe necessariamente à transposição do conhecimento escolar para o ambiente hospitalar”.

Outra designação recorrente nos trabalhos apurados neste estudo é “classe hospitalar”. No Brasil, classe hospitalar é a denominação utilizada para descrever o atendimento pedagógico-educacional que acontece em ambiente hospitalar, em razão da necessidade de internação da criança ou adolescente em idade escolar. Esse termo é utilizado nos documentos legais que normatizam o atendimento escolar no ambiente hospitalar (Brasil, 2002).

A classe hospitalar por parte de alguns autores é considerada como um espaço que se assemelha às classes regulares:

A Classe Hospitalar executa um serviço bem parecido com o das salas de aulas regulares, em conjunto, de modo heterogêneo. [...]. Em suma, funciona em turmas multisseriadas, intercalando momentos de ensino dos conteúdos regulares, com momentos de descontração e brincadeiras que também devem fazer parte do processo ensinoaprendizagem, [...]. (Ferreira; Pessoa, 2021, p. 4).

No entanto, outros autores como Arosa (2012), destacam a importância de aprofundar as discussões a respeito da nomenclatura “classe hospitalar” de forma a refletir a realidade do que ocorre nos hospitais. Ao considerar que nesses ambientes são atendidos escolares com idades diversas, inseridos em etapas diferentes de escolarização, com tempos diferentes de internação, os encontros entre o professor e os alunos podem ocorrer nos leitos, nas enfermarias, nas unidades de terapia intensiva, nos centros de tratamento intensivos, nas brinquedotecas e também nas classes hospitalares, sendo que muitos desses ambientes são compartilhados com os profissionais da área de saúde, que priorizam o atendimento hospitalar ao educacional.

Medeiros (2020), por sua vez, propõe nomear o trabalho pedagógico realizado no hospital de “atendimento escolar hospitalar”, configurado numa perspectiva de atenção especializada ofertada a crianças e adolescentes em situações de hospitalizações e/ou de tratamento de saúde, em substituição ao conceito de “classe hospitalar” dado o caráter mais amplo das ações que são desenvolvidas nessa modalidade de atendimento, o que inclui atividades escolares e recreativas. Assim, leva-se em conta as condições físicas, psicológicas, sociais e educacionais destas crianças e adolescentes e intercâmbios com as escolas de origem, de modo a assegurar a continuidade da trajetória acadêmica destes estudantes.

Cabe salientar também a maneira díspar de nomear as crianças e adolescentes que frequentam as classes hospitalares. Autores, como Menezes (2018), sinalizam não existir uma terminologia específica referindo-se aos referenciais teóricos e às políticas públicas educacionais.

Há uma variedade de designações, tais como: crianças hospitalizadas; criança enferma; alunado da classe hospitalar e do atendimento pedagógico domiciliar; alunos portadores de afecções; estudantes com impedimento de frequentar a escola; criança em situação de tratamento da doença; crianças e jovens hospitalizados; educando hospitalizado e; escolar hospitalizado (Menezes, 2018, p. 23).

Ao considerar a literatura consultada, pode-se aferir que as terminologias Pedagogia Hospitalar, Classe Hospitalar e Atendimento Escolar Hospitalar, assim como as que se referem a crianças e adolescentes que recebem atendimento pedagógico no hospital estão ainda em processo de discussão e elaboração, comportando ações também tão diversas quanto às terminologias utilizadas, o que leva a crer na importância de estudos que aprofundem essas reflexões. Nesse texto optamos por utilizar o termo “Atendimento Pedagógico Hospitalar”.

4.4 Organização pedagógica e as ações educativas na classe hospitalar

A quarta temática refere-se à organização pedagógica e às ações educativas desenvolvidas dentro do hospital, que têm por objetivo assegurar a continuidade dos processos de aprendizagem dos alunos enfermos.

Os estudos relacionados a essa temática discutem aspectos como: modos de adaptação de propostas pedagógicas e de rotinas (Mutti, 2016; Fonseca, 2020); o tempo e o espaço do trabalho pedagógico no hospital (Lima; Lugli, 2020); a utilização de metodologias variadas (Paula, 2011; Nunes, 2014; Mutti, 2016) e; a avalição das aprendizagens (Silva; Ponte, 2011).

Considerar a continuidade dos processos de aprendizagem de crianças e adolescentes hospitalizados implica modos, adaptação de propostas pedagógicas e de rotinas que atendam às necessidades de cada estudante. Contudo, conforme observa Fonseca (2020), para que tal continuidade seja assegurada é necessário, além da integração entre os profissionais da saúde e o docente, um rol de novos conhecimentos.

Dentre os conhecimentos necessários ao atendimento escolar hospitalar, Mutti (2016) destaca a necessidade de conhecer os protocolos que envolvem o atendimento em tal ambiente, de forma que as atividades se integrem à rotina e à realidade do aluno. E Fonseca (2020 p. 3) afirma: “Dependendo da enfermidade do aluno, o professor pode não dispor dos recursos necessários para que tenha condições de propor e de desenvolver adequadamente e, de acordo com as necessidades do doente, as atividades escolares pertinentes, [...]”

Esse processo requer a ajuda da equipe de especialistas, responsáveis por indicar os momentos e os locais mais adequados para a intervenção pedagógica, seja no leito, na UTI ou no espaço reservado. Também se torna importante o contato estabelecido entre a escola do hospital e as escolas de origem dos alunos, que por sua vez encaminham as propostas pedagógicas correspondentes à classe do estudante, cabendo ao professor da classe hospitalar basear o seu trabalho, desde que possível, no material enviado, selecionando e definindo as formas como tais propostas serão oferecidas dentro do ambiente hospitalar.

Nesse cenário, embora haja um currículo definido, com conteúdos, tempos e espaços indicados pela escola de origem, no ambiente hospitalar prevalece a construção de uma rotina singular, na medida em que o grupo de alunos é flutuante e composto por crianças e adolescentes com diferentes idades, provenientes de diversas escolas.

As peculiaridades que envolvem essa rotina singular de atendimento adquirem maior relevância na medida em que exigem do professor uma avaliação constante de suas ações e uma reorganização rápida das propostas oferecidas, conforme o delineamento do grupo e de suas necessidades a cada dia. Toda ação educativa repleta de intencionalidade esbarra por situações que muitas vezes desorganiza o trabalho docente, o que acorre com frequência no hospital:

Conhecer a rotina do hospital, estabelecer um diálogo por meio do qual o professor busca perceber a visão do mundo do aluno, suas necessidades, seus medos e incertezas e, só a partir daí, realizar uma prática pedagógica que vá ao encontro de sua realidade para, dessa forma, contribuir para a aquisição de novos conhecimentos (Nunes, 2014, p. 44).

O que se percebe são mudanças nas ações das professoras e dos alunos, que claramente representam uma ruptura com a forma da escola regular. O tempo e o espaço de trabalho pedagógico no hospital dependem do trabalho da equipe de saúde, por vezes priorizado, podendo representar descontinuidade das atividades pedagógicas, exigindo do professor um replanejamento constante,

Nos espaços e tempos abertos da classe hospitalar, rompe-se o modelo culturalmente conhecido; quando as professoras preparam atividades específicas, acompanham individualmente o aluno-paciente, seu desenvolvimento e evidenciam que quando ensinam (re) aprendem, recriam a relação professora-aluno (Lima; Lugli, 2020, p. 9).

Autores, como Paula (2011) e Nunes (2014), destacam a necessidade de propostas que sejam envolventes e, nessa perspectiva, a utilização de metodologias variadas que respeitem suas condições e despertem nos alunos o desejo de aprender e, com isso permitem que eles deem continuidade às suas trajetórias acadêmicas. Nessa perspectiva, o professor, de acordo com Nunes (2014, p. 42): “constrói, reconstrói, produz e transforma os instrumentos da prática docente, bem como os conhecimentos, modos de atuação, técnicas, linguagens, percepções, entre outros aspectos”.

Um outro aspecto que merece atenção dos autores diz respeito à avaliação das aprendizagens, parte do processo de ensino-aprendizagem. Para isso, tem que se levar em conta que os grupos são flutuantes, as rotinas diferenciadas e a organização espaço-temporal bastante peculiar.

Nesse sentido, torna-se difícil pautar a avaliação nos mesmos padrões da escola regular, faz-se necessário pensar em estratégias que valorizam a aquisição de habilidades e competências, assim como descobertas e participação deste aluno, num movimento de acolhimento e compreensão das diferentes dimensões do aprender no ambiente hospitalar.

4.5 Atenção à saúde integral dos escolares que frequentam as classes hospitalares

A quinta temática destacada enfatiza a importância do vínculo estabelecido entre professor e aluno de forma que a aprendizagem se torne possível, além de ajudar o aluno no enfrentamento da sua condição de adoecimento e colaborar para o restabelecimento da saúde.

Conforme afirma Zombini (2011), episódios de internação na infância podem alterar significantemente o desenvolvimento infantil e juvenil, uma vez que ao impor limites à socialização, restringem as relações e as interações com a família, a escola e os amigos em geral. A rotina anterior à internação é substituída, no ambiente hospitalar, por um conjunto de cuidados muitas vezes invasivos e doloridos que pressupõem regras e controle sobre o corpo.

O trabalho pedagógico dentro do hospital constitui-se como um espaço diferenciado de aprendizagem que ocorre mediante à articulação entre atividades pedagógicas e procedimentos terapêuticos. Assim, intenta contribuir para a continuidade nos estudos, mas também para a melhoria da qualidade, amenizando o estresse inerente ao processo de hospitalização.

Quanto à contribuição das atividades pedagógicas para o bem-estar das crianças e adolescentes em tratamento de saúde, segundo Fontes (2005), são detectadas duas vertentes de análise. A primeira incorpora o lúdico às atividades das crianças, possibilitando o reestabelecimento das relações com as brincadeiras, os brinquedos e jogos, e assim com a infância vivenciada antes da entrada no hospital; e a segunda, mais fortemente defendida “trabalha a hospitalização como um campo de conhecimento a ser explorado” (p. 119), oportunizando a reflexão sobre os espaços e as rotinas de atendimento à saúde dentro do hospital, atribuindo a ele novo significado.

Por essa razão, a necessidade do atendimento escolar no hospital passa a ser uma prática social que além de estar comprometida com a socialização do conhecimento, abre-se para o acolhimento da subjetividade do estudante hospitalizado, o que inclui a escuta de sua história de vida, assim como o reconhecimento das experiências por ele vividas durante o período de adoecimento. Segundo Costa, Passeggi e Rocha (2020, p. 09), “A criança enferma ouve e conta histórias que permitem pôr em ordem os acontecimentos provocados pelo adoecimento e dar uma diacronicidade ao seu tempo de vida”. A escuta pedagógica aproxima o professor da realidade do aluno e, alargando os laços de afetividade e confiança, fortalece o trabalho pedagógico. Continuando com Costa, Passeggi e Rocha (2020, p. 3), os autores afirmam:

Escutar a criança implica compreender o que ela tem a dizer, levando em consideração que ela realiza um triplo esforço: primeiramente, o de dar sentido ao que lhe acontece, em seguida, o de se fazer compreender e, finalmente, o de se compreender a si mesma, no instante de sua existência, [...].

Trata-se, portanto, de permitir que estes enfermos ao refletirem sobre o que estão vivendo possam significar suas experiências e reconhecer que mesmo as mais dolorosas situações possibilitam aprendizagens. Dessa forma, professor e aluno podem se tornar parceiros nos processos de aprendizagem, configurando-se o hospital não apenas como um lugar de grandes rupturas, mas também “de cura, de múltiplas aprendizagens intelectual, emocional e de resistência” (Costa; Passeggi; Rocha, 2020, p. 16).

Os vínculos afetivos ocupam um papel fundamental nas relações de aprendizagem. A construção desse vínculo não está presente somente nas palavras, mas na atenção que o professor despende ao planejar as atividades para cada um, na percepção do momento em que cada um se encontra no respeito e na valorização de cada aprendizagem; o que pode ser percebido em gestos corriqueiros, como chamar o aluno pelo nome, dedicar um tempo para saber como está sua recuperação, conversar sobre assuntos que são do seu interesse e outros.

4.6 Formação de professores para atuação nas classes hospitalares/ aprendizagem hospitalar

A sexta temática elencada a partir da revisão de literatura enfatiza a importância do vínculo estabelecido entre professor e aluno de forma que a aprendizagem se torne possível, além de ajudar o aluno no enfrentamento da sua condição de adoecimento e colaborar para a sua recuperação (Ortiz; Freitas, 2011; Furlanetto, 2012; Nunes, 2014).

O professor que atua no hospital, segundo Ortiz e Freitas (2001 p. 71), empenha-se na luta contra a doença, não com o arsenal curativo da medicina, mas com uma atenção educativa que prevê um compromisso com o crescimento pessoal de seus alunos. Assim, de acordo com Nunes (2014, p. 42): “O trabalho pedagógico reúne o domínio de saberes e modos de agir acumulados pela experiência e, também, pela formação humana a qual mostra o caráter educativo a partir da intencionalidade em proporcionar condições para emergir do sujeito sua autonomia e liberdade.

A falta de preparo de profissionais para o ingresso na realidade hospitalar, no que diz respeito às rotinas e particularidade das crianças e adolescentes em tratamento de saúde, segundo Nunes (2014), coloca a formação inicial do professor e seus processos identitários como pontos centrais a serem considerados nas pesquisas que se debruçam sobre os saberes necessários à ação docente que acontece dentro do ambiente hospitalar, posto que resulta não somente da formação acadêmica, mas também compõem vivências, experiências, crenças e valores construídos durante toda a vida e, não só a partir de relações professor-aluno.

São múltiplos os saberes exigidos para o professor atuar no hospital: capacidade de adaptação; repertório para adaptação e flexibilização das atividades pedagógicas; habilidade de trabalhar com diversas faixas etárias simultaneamente; desenvoltura para organizar os tempos e os espaços de aprendizagem, respeitando o estado dos alunos e as rotinas de atenção à saúde; capacidade para lidar com o inesperado e equilíbrio emocional para lidar com a proximidade da doença e da morte. Sabemos que:

Os profissionais da educação, ao exercerem a profissão em cenários incertos em meio a desafios e conflitos, são deslocados de territórios conhecidos, o que faz com que muitos se afastem das salas de aula[...]. No entanto, também existem aqueles que estão construindo saídas criativas para os desafios propostos pela docência [...] (Furlanetto, 2012, p. 116).

No entanto, no hospital, esses cenários se tornam ainda mais complexos, exigindo dos professores uma considerável maturidade profissional e pessoal. Acompanhar as crianças doentes internadas nos hospitais é um grande desafio e para que possa ser enfrentado exige um trabalho reflexivo permanente sobre seu fazer docente.

Se consideramos a rotina do hospital, muito diferente da rotina escolar, na medida em que o grupo de alunos se refaz com regularidade, sendo composto por crianças/adolescentes com idades diferentes, cada qual com diferentes ritmos e interesses, temos no processo de ensino-aprendizagem uma não linearidade que exige deste profissional uma atitude reflexiva sobre o cotidiano que, repleto de dúvidas, angústias, inquietações, indicam caminhos possíveis para ensinar e aprender.

Compreender como esses profissionais organizam sua prática educativa, como elaboram estratégias de atuação, como se relacionam com os demais elementos que compõem a equipe hospitalar, e como ampliam seu olhar para além da doença que acomete seus alunos, pode permitir uma reflexão sobre a formação deste professor (Nunes, 2014, p. 46).

Diante do exposto, os saberes dos professores apreendidos durante a formação inicial, as teorias de aprendizagem, os saberes disciplinares e metodologias de ensino serão reformulados e reconstruídos no cotidiano da sala do hospital, onde o processo de ensino e de aprendizagem se concretiza, considerando as experiências vivenciadas.

4.7 O professor frente à criança doente e a convivência com a morte

A última temática que emergiu da revisão de literatura discute a convivência do docente com a morte, a dor e as limitações impostas pela doença (Nunes, 2014; Rangel; Gomes, 2019). Nas relações de convívio com os escolares em tratamento de saúde, os professores enfrentam situações que, por vezes, os desestabilizam, por se apresentarem carregadas de incertezas e exigirem uma reorganização constante de seu trabalho. O professor da classe hospitalar ao se inserir num ambiente distante da prática cotidiana das escolas regulares, convivendo com profissionais da área de saúde, se expõe a situações deveras complexas que envolvem a dor, o sofrimento e um convívio próximo com a morte.

Conforme explica Nunes (2014), vivenciar situações dolorosas implica um ressignificar constante da relação que se estabelece entre o professor e seus estudantes, de tal modo que seja possível ultrapassar as barreiras da dor e do luto e, apesar das limitações impostas, potencializar as aprendizagens destes ou, como afirmam Rangel e Gomes (2019), fazer emergir vivências de superação e transformação.

Lidar com a dor, as limitações impostas pela doença, muitas vezes em estágios terminais e ainda assim, procurar se manter ativo e motivado, faz parte do cotidiano de quem realiza trabalhos educativos no hospital.

No hospital é preciso ultrapassar as barreiras da dor e do luto, transformando-os em vivências de superação e transformação. Quando a dor pode ser compartilhada entre as várias categorias profissionais, apostando em suas capacidades colaborativas e de trocas, vemos uma composição desse movimento de produção de vida (Rangel; Gomes, 2019, p. 576).

Dentre os textos selecionados que abordam a temática do encontro do professor com a dor, o luto e a morte no ambiente hospitalar, todos apontam para a necessidade de um trabalho de formação que ofereça espaços para que esse profissional também seja acolhido em sua própria dor e possa também ressignificar seu papel educativo ante à finitude de uma vida.

Para tanto, a questão que se apresenta diz respeito à ausência de uma proposta formativa que contemple também essa temática, que prepare esses educadores para transitar entre a saúde e a doença, a vida e a morte, nos espaços de ensino e aprendizagem dentro do ambiente hospitalar.

Considerações finais

Este artigo apresentou uma revisão narrativa que, empreendida entre os anos de 2011 e 2021, teve por objetivo analisar o modo como a temática do atendimento pedagógico hospitalar foi abordado em diferentes publicações científicas.

Por meio da revisão narrativa, que busca estabelecer relações entre diferentes produções acadêmicas, identificando temas recorrentes, construindo uma narrativa com informações sistematizadas a respeito dos diferentes modos de abordar temas específicos, foi possível destacar sete grandes temáticas que envolviam o tema em questão no recorte realizado.

Dentre os temas mais discutidos nos trabalhos analisados, adquiriram maior relevância: i) Início das ações educativas no hospital, abordando o histórico da Pedagogia Hospitalar no Brasil, desde o primeiro hospital que iniciou o atendimento pedagógico a crianças hospitalizadas, sinalizando um atendimento incipiente que até hoje não se consolidou em boa parte dos Estados e Municípios; ii) Políticas Públicas educacionais de atendimento pedagógico hospitalar e domiciliar que no decorrer dos anos formularam ações nem sempre convergentes entre si, indicando que há ainda um longo caminho a ser percorrido para que haja, de fato, uma política pública capaz de atender à demanda de crianças e adolescentes; iii) Discussão e definição das terminologias utilizadas para o atendimento pedagógico em ambiente hospitalar, sinalizando também uma diversidade que alcançava o campo das práticas, ora situando o papel da classe hospitalar numa perspectiva reducionista no que diz respeito aos espaços ocupados pelo professor que atua no ambiente hospitalar, ora ampliando essa visão a partir de uma proposta mais holística de atendimento que extrapolava os limites de uma sala convencional; iv) Organização pedagógica e as ações educativas na classe hospitalar, retomando as peculiaridades do trabalho educativo desenvolvido no hospital e sua flexibilidade em termos de planejamento, seleção e oferta de propostas aos estudantes enfermos, levando-se em conta sua condição de saúde e os procedimentos realizados pela equipe multidisciplinar, abrindo um debate sobre o papel de cada um dos envolvidos, as negociações necessárias visando um atendimento capaz de fomentar vivências que valorizem o bem-estar da criança atendida e, ao mesmo tempo, assegurem a continuidade de suas aprendizagens; v) Atenção à saúde integral dos escolares que frequentam as classes hospitalares, enfatizando a importância do vínculo estabelecido entre professor e aluno de forma que a aprendizagem se torne possível, além de ajudar o aluno no enfrentamento da sua condição de adoecimento e colaborar para o restabelecimento da saúde; vi) Necessidade de uma atenção às formações inicial e continuada dos professores que atuam nas classes hospitalares, de modo capaz para compreender os saberes fundamentais para a sua atuação na lida com os conteúdos escolares em situações que exigem propostas bastante diferentes daquelas costumeiramente desenvolvidas na sala de aula da escola regular; e, vii) O professor frente à criança doente e sua convivência com a dor, a morte e o luto, indicando que para além de uma formação diferenciada em termos do trabalho docente, há aspectos que envolvem a construção de uma identidade docente própria por parte daqueles que atuam nos hospitais e que possam ressignificar seu papel ante às limitações impostas no ambiente hospitalar.

As temáticas identificadas neste estudo se articulam e se manifestam no trabalho desenvolvido no hospital e oferecem, cada uma, um amplo leque de possibilidades para novas investigações a fim de oferecer uma melhor compreensão sobre as peculiaridades que envolvem esse atendimento, nesse acontecer múltiplo e diversificado, que visem assegurar de modo efetivo o direito à educação de crianças e adolescentes em situação de internação, no ambiente hospitalar.

Por fim, ao visar se consolidar como campo de conhecimento científico, com base nesta revisão narrativa, constata-se a necessidade de maior investimento em pesquisas com vistas a validar os pressupostos conceituais e teóricos que sustentam o Atendimento Pedagógico Hospitalar.

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Recebido: 13 de Fevereiro de 2023; Aceito: 10 de Agosto de 2023

Editoras: Profa. Dra. Ana Maria Haddad Baptista e Profa. Dra. Marcia Fusaro

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