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Childhood & Philosophy

versão impressa ISSN 2525-5061versão On-line ISSN 1984-5987

child.philo vol.17  Rio de Janeiro  2021  Epub 31-Maio-2021

https://doi.org/10.12957/childphilo.2021.56076 

Dossiê Infâncias e necropolítica: outros possíveis

sobrevida da infância surda numa sociedade centrada na língua oral: o caso covid-19 e a viralização da libras

survival of deaf childhood in a society centered in the oral language: the covid-19 case and the viralization of libras

supervivencia de la infancia sordana en una Sociedad centrada en el lenguaje oral: el caso covid-19 y la viralización de libras

vanessa regina de oliveira martinsI  1
http://orcid.org/0000-0003-3170-293X

Iuniversidade federal de são carlos, são carlos, são paulo, brasil


resumo:

Estudos apontam desafios para a aquisição da língua brasileira de sinais (Libras) por crianças surdas. A maioria dos surdos são filhos de pais ouvintes que desconhecem a Libras e o primeiro contato com essa língua pode ocorrer apenas no ambiente escolar. Com o quadro de isolamento social e a impossibilidade de abertura das escolas devido à pandemia do "Novo Coronavírus" estes problemas se agravaram. O projeto denominado #CasaLibras de atenção virtual em Libras às crianças surdas objetivou produzir vídeos com contações de histórias infantis diretamente em Libras. As ações justificam-se como forma de informar, entreter, bem como, estimular o contato dessa língua por crianças surdas em suas casas. Esse artigo pretende analisar esse cenário político, problematizando: 1) as concepções, filosófico-sociais, sobre a surdez, 2) a luta pela sobrevida surda, diante da falta de políticas públicas, sociais e educacionais, numa necropolítica que se afirma na produção da morte (simbólica e real de surdos, pela pauta da adequação de corpos surdos à língua oral e pela falta de informação, expondo-os mais ao risco) das diferenças surdas; e, por fim, 3) a análise dos resultados do projeto #CasaLibras voltado às crianças-surdas. Os dados sugerem uma ampla utilização das mídias e certa viralização da Libras, na pandemia, por meio da ação do povo. Destaca-se a positividade do projeto na promoção da acessibilidade para crianças-surdas e a urgência de ampliação das políticas inclusivas bilíngues que fortaleçam as singularidades dessas vidas, deixando-os menos vulneráveis, física e simbolicamente.

palavras-chave: libras; infância surda; necropolítica; surdez.

abstract

Studies point out challenges for the acquisition of the Brazilian sign language (Libras) by deaf children. Most deaf people are children of hearing parents who do not know Libras and the first contact with this language can occur only in the school environment. With the situation of social isolation and the impossibility of opening schools due to the "New Coronavirus" pandemic, these problems have worsened. The project called #CasaLibras of virtual attention in Libras for deaf children aimed to produce videos with children's storytelling directly in Libras. The actions are justified as a way of informing, entertaining, as well as, stimulating the contact of this language by deaf children in their homes. This article intends to analyze this political scenario, problematizing: 1) the philosophical-social conceptions about deafness, 2) the struggle for deaf survival, given the lack of public, social and educational policies, in a necropolitics that is affirmed in the production of death (symbolic and real for the deaf, due to the guidelines for the adaptation of deaf bodies to the oral language and the lack of information, exposing them to the risk) of deaf differences; and, finally, 3) the analysis of the results of the #CasaLibras project aimed at deaf children. The data suggest a widespread use of the media and some viralization of Libras, in the pandemic, through the action of the people. It highlights the positivity of the project in promoting accessibility for deaf children and the urgency of expanding inclusive bilingual policies that strengthen the singularities of these lives, leaving them less vulnerable, physically and symbolically.

keywords: libras; deaf childhood; necropolitics; deafness.

resumen

Los estudios señalan los desafíos para la adquisición de la lengua de signos brasileña (Libras) por parte de niños sordos. La mayoría de las personas sordas son hijos de padres oyentes que no conocen Libra y el primer contacto con este idioma solo puede ocurrir en el entorno escolar. Con la situación de aislamiento social y la imposibilidad de abrir escuelas por la pandemia del "Nuevo Coronavirus", estos problemas se han agravado. El proyecto denominado #CasaLibras de atención virtual en Libras para niños sordos tenía como objetivo producir videos con cuentos infantiles directamente en Libras. Las acciones se justifican como una forma de informar, entretener, así como, estimular el contacto de este lenguaje por parte de los niños sordos en sus hogares. Este artículo pretende analizar este escenario político, problematizando: 1) las concepciones filosófico-sociales sobre la sordera, 2) la lucha por la supervivencia de los sordos, ante la falta de políticas públicas, sociales y educativas, en una necropolítica que se afirma en la producción de muerte (simbólica y real para los sordos, por las pautas de adaptación de los cuerpos sordos al lenguaje oral y la falta de información, exponiéndolos al riesgo) de las diferencias sordas; y, finalmente, 3) el análisis de los resultados del proyecto #CasaLibras dirigido a niños sordos. Los datos sugieren un uso generalizado de los medios de comunicación y una cierta viralización de Libras, en la pandemia, a través de la acción del pueblo. Destaca la positividad del proyecto en la promoción de la accesibilidad para los niños sordos y la urgencia de expandir políticas bilingües inclusivas que fortalezcan las singularidades de estas vidas, dejándolas menos vulnerables, física y simbólicamente.

palabras clave: libras; infancia sorda; necropolítica; sordera.

sobrevida da infância surda numa sociedade centrada na língua oral: o caso covid-19 e a viralização da libras

Problematização e cenário de abertura ao diálogo proposto neste texto

Inicio a escrita com o tema da sobrevida. Que pensamentos essa palavra pode nos mobilizar? Tematizar a sobrevida em 2020/2021 é algo bem significativo, quando vivemos o auge de uma pandemia viral (Covid-19), no mundo todo e quando a repercussão dela, em nosso país, é bem complexa: um número expressivo de mortes pela nova doença. Sobrevida aqui se coloca como luta para manutenção da vida, ou ação de busca pelo prolongamento possível de certos modos de existências. Acompanhamos as incertezas e as dissonâncias governamentais quanto ao combate e controle da nova doença provocada pelo coronavírus e, de certo modo, as políticas sanitárias no Brasil, escancaradamente, não estão em alta. Evidencia-se a falta de ações efetivas advindas do governo federal, exemplificadas aqui pelas constantes trocas e pela pouca representatividade do ministério da saúde, quando após duas trocas de ministros, em meio à pandemia, temos o cargo ocupado por um interino sem nenhuma formação na área da saúde. Diante disso, a pergunta apresentada inicialmente parece ser bem prudente e a amplio com essa indagação: que vida pode ser prolongada e que vida tem sido descartada em nossa contemporaneidade? Que sobrevida é possível no Brasil de 2020/2021 com o surto pandêmico?

A contextualização do momento atual no Brasil me remete ou se aproxima a um interesse de pesquisa que traço no campo dos estudos surdos há algum tempo: as tensões da sobrevida surda em nosso país, acirradas no momento da pandemia. Fica latente o desejo em mim de analisar as políticas sociais implementadas a esse grupo minorizado2 no Brasil. Neste artigo, portanto, busco abordar estas tensões, na possibilidade de problematizar a sobrevida da criança-surda3, como campo de produção potente de uma infância surda. Reafirmo o desejo de falar de um subgrupo interno ao conjunto de sujeitos surdos, aprofundando a pauta sobre as exclusões produzidas no interior desses grupos, os quais já são marginalizados politicamente. Afirmo a sobrevida da criança-surda como ato de resistência à lógica da infância ouvinte e também à lógica da vida surda adulta, capturada nas políticas sociais normalizadoras que solidificam as formas de vida surda possível de serem vividas - atrelada a lógica da língua oral.

Vale afirmar a forte captura dos movimentos surdos sinalizadores no Brasil, mesmo quando temos um cenário de certa visibilidade à língua de sinais, crescente desde a regulamentação da Libras (Língua Brasileira de Sinais)4. A Libras passa a ser referenciada como meio de comunicação e expressão da comunidade surda desde 2005 (BRASIL, 2005). Para além da pauta legal, verifica-se uma maior visibilidade dada aos surdos no governo federal atual. A presença da Libras em espaços midiáticos cresceu, mas não vemos nisso alterações em práticas sociais efetivas que garantam o uso desta língua e da acessibilidade aos surdos nos mais variados espaços públicos, como ação de políticas públicas. Reconhecemos certo uso das pautas surdas como holofote político e o aumento da visibilidade linguística. Evidencia-se isso desde a última eleição presidencial em 2018, quando na posse da presidência da república parte do discurso de abertura foi sinalizado em Libras e nas mãos da primeira dama. Porém, ainda que afirmemos a presencialidade midiática da Libras, indago: que visibilidade é essa e o que efetivamente ela tem repercutido aos surdos? Por que todo esse processo de ênfase nas lutas populares surdas? E mais, esta visibilidade se reflete em práticas de vida5ou sobrevida surda?

Para essa conversa proponho o diálogo com Jacques Rancière (2018) a fim de traçar a distinção conceitual de política e polícia, auxiliando na análise das políticas linguísticas (existentes ou não) surdas e a seguridade da vida ou forças de resistências à sobrevida desse grupo. Mais especificamente aponto meu interesse na análise desse prolongamento da diferença do ser criança-surda em um país marcado pela língua oral e pela expressividade que essa língua cria no corpo ouvinte. Destaco essa etapa de vida, das pessoas surdas, e o faço na pandemia, pelo prejuízo causado com o isolamento social e que vem repercutindo de um modo muito mais severo a esse público (infantil surdo). Embora marquemos que as tensões de políticas de seguridade linguística e cultural trazidas às crianças surdas, já eram desafiadoras e escassas, na pandemia do Covid-19, fica mais evidente a urgência de ação nessa direção pelo duplo isolamento que essas crianças sofrem: 1) isolamento da sociedade e reclusão em seus lares (como todos nós) e 2) isolamento no seu contexto mais familiar, quando a comunicação não se efetiva entre seus pais (em Libras) e tão pouco em informações e entretenimento oferecidos em mídias sociais abertas. Como prática de luta na pandemia, convergi forças ao que chamei da viralização política da Libras, como movimento do povo6 (surdo e ouvinte), em defesa da sobrevida da criança-surda (que emerge na produção individual e coletiva: a defesa é da entrada em cena desta criança na coletividade, como parte de um grupo surdo maior).

Faço a análise da ação da biopolítica nas comunidades surdas, afirmada através das práticas sociais que deixam morrer as singularidades sociais da vida surda, e instaura políticas de adestramento, na reparação do corpo surdo por meio de práticas de disciplinamento deste corpo, na lógica da língua oral e no funcionamento baseado no corpo ouvinte. Essa discursividade não se coloca claramente, mas se vê como efeito da pouca representatividade (circularidade é diferente de visibilidade, ver a língua em muitos lugares pode ser uma ótima armadilha por trazer uma falsa sensação de pertencimento aos surdos) das necessidades e petições das comunidades surdas, da falta de entrada da língua de sinais em espaços de negociações sociais e em informações caras para a o exercício da cidadania surda, ação que se dá também pela língua e a produção discursiva compartilhada por ela.

Quero dizer que no Brasil temos falta de políticas linguísticas que deem circularidade a outro idioma que não a língua portuguesa. Para pensar a ação da biopolítica faço uso dos estudos foucaultianos (FOUCAULT, 1999, 2010). E por fim, nesse artigo ainda trago a prática de luta anunciada com as considerações do projeto #CasaLibras que coordeno e como ele auxiliou na viralização desta língua na pandemia, às crianças-surdas. A reverberação desta ação pode nos dar pista para se pensar pautas educativas ou movimentos mais éticos para a chamada “escola inclusiva” para surdos e seu alinhamento à produção da infância surda na escola. Isso é possível porque o movimento popular empreendido na ação pode ser visto como espaço de manobra para a afirmação das diferenças surdas na infância e feita pela/com a língua de sinais, ou seja, o #CasaLibras se colocou como um movimento literário popular em Libras e não um movimento literário adaptado para a Libras7 (MARTINS, 2020).

O movimento surdo, desde a adoção, em 1990, da política inclusiva escolar, no Brasil, apresenta em suas lutas o dissenso em relação a esse movimento, mais efetivamente, nas práticas instituídas pela inclusão que defende um lugar comum de ensino, para surdos e ouvintes. A comunidade surda reivindica o que isso reproduz em relação à falta da língua de sinais na instrução dada aos surdos, em salas inclusivas. Com essa voz dissonante às políticas de inclusão (pela via de junção de ensino entre surdos e ouvintes, com a língua portuguesa como língua de instrução) a comunidade surda marca seu desejo pelo agrupamento de surdos nas práticas educativas, por meio do reconhecimento de si como parte de uma minoria linguístico-cultural, efeito da própria condição biológica do ser surdo, e a importância de um espaço escolar de qualidade favorável à constituição cultural e identitária (CAMPELLO; REZENDE, 2014;LOPES, 2007). Esse movimento, portanto, parte da reivindicação de construção de políticas linguísticas sólidas em que o uso desta língua se dê oficialmente nos mais variados espaços públicos, não só com visibilidade, mas como participação efetiva dos surdos nas decisões sobre o governo de suas vidas-surdas na escola e do tipo de ensino que querem ter para si (CAMPELLO; REZENDE, 2014; BRASIL, 2002, 2005).

Enquanto a posição mais radical da política inclusiva avança na pauta da presença física do surdo na escola inclusiva, defendendo espaços comuns de ensino e de vida, as pessoas surdas reivindicavam a possibilidade de manutenção de escolas e salas específicas para surdos, na direção de que o ensino deve ser feito, às crianças-surdas, em Libras, com docentes fluentes nessa língua e que haja a troca relacional entre pessoas surdas. Portanto, reforçam dois pontos: 1) a defesa de salas bilíngues (Libras/Língua Portuguesa) e 2) a concentração de pessoas surdas em escolas-polo, para a melhor qualificação e construção de um cenário em que a Libras consiga (sobre)viver diante da robustez e força que a língua oral (Língua Portuguesa) exerce em nosso país (LACERDA; SANTOS; MARTINS, 2016). Sempre em contraposição ao discurso social da junção de corpos, na defesa da necessidade de união pela língua, o movimento surdo não encontrava força para se afirmar nas instâncias superiores e vinha se afirmando como um movimento de contra-conduta mais no cotidiano, propondo reivindicações principalmente no espaço escolar (CAMPELLO; REZENDE, 2014).

Entretanto, neste momento, a pauta das pessoas surdas ganha visibilidade quando alinhada a uma frente do governo federal, como mencionado já e como marca de campanha política. Vê-se isso claramente no novo texto legal apresentado pelo Decreto 10.502 de 2020 que institui a “Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida” - PNEE (BRASIL, 2020)8. Nele as lutas surdas de anos aparecem “supostamente” contempladas. Há no documento um maior destaque às petições surdas, pois em quase 70% do Decreto temos o uso das palavras: “bilíngues”, “língua de instrução”, “salas de surdos” e outros conceitos tão defendidos pela comunidade surda. Mas afinal, será que essa visibilidade toda se traduz em políticas públicas aos surdos? Será que a aparente seguridade do uso da língua, tão caro à comunidade surda, não coloca o povo surdo refém e efeito de uma captura voltando-se ainda a certa política comum (e normalizadora da) à população, com roupagem de respeito às singularidades deste grupo? Às crianças-surdas esta pauta da visibilidade e não da circulação efetiva da língua e desejo surdo, fica mais evidente, quando vemos operar certa vulnerabilidade de ações do governo, refletindo em suas vidas. A vulnerabilidade da criança-surda se reforça na falta de ações para a constituição subjetiva desse ethos surdo que também se constitui pela língua de sinais, em interação com um grupo social que compartilha desta mesma experiência de troca linguística.

A falta de certa governamentalidade da infância surda revela a negligência social às crianças-surdas e produz uma política de morte simbólica: morte de seus direitos de ser criança e de se narrar gestualmente (GALLO, 2017). Ou seja, não ter a circulação da língua de sinais amplamente, acirra a constituição de um campo de ação que induz a uma necropolítica (numa leitura diferenciada do que seria essa política de morte) ao favorecer uma política de morte simbólica deste ser, o não pertencimento a um grupo social e o não direito de ter um ensino para si e em Libras. Esse ethos surdo não tem espaço para aparecer na sua infância, ainda que a singularidade da criança-surda esteja lá, pois a troca social é marcadamente negligenciada - falaremos disso adiante. Mas é interessantemente notar como a escola tem sido espaço para a aparição do ethos da criança-surda. A escola, em alguns casos, traz a língua de sinais como foco de produção interativa, o que favorece esse movimento de aparição de si. Interessa-nos afirmar a diferença surda da criança marcada pelo funcionamento corporal, na linguagem e expressividade desse sujeito surdo (PAGNI, MARTINS, 2019). Com essa introdução apresentei um pouco do cenário de problematização, na reflexão da criança-surda: as tensões que a infância traz a esse grupo, a negligência política em meio a toda essa governamentalidade democrática e às lutas de aparição de suas diferenças surdas em um ethos que só se coloca na sobrevida9 da criança-surda e por meio de ações sociais do povo.

O isolamento social no covid-19 e a vulnerabilidade social da criança-surda

Como continuidade dessa conversa, escolho contextualizar as tensões do governo ouvinte dirigidos à infância surda (ou o desgoverno em Libras) e as implicações delas no cenário da pandemia. Foco na precária ação política (como política para gestão das vidas) aos surdos que resulta na vulnerabilidade e pouca atenção à criança-surda. A falta de incorporação das crianças-surdas nas políticas públicas (de saúde, assistência social e educação) expõe essa população ao risco de morte pela precariedade de políticas interventivas de apoio à vida. Assim, vejo a resistência como estratégia necessária para a aparição do ethos surdo, diante de seu direito de seguridade de sua vida/existência. Seguimos as questões gerais sobre a criança-surda na contemporaneidade e as lutas presentes.

Estudos apontam os desafios para a aquisição da Libras por crianças-surdas no contexto familiar (LODI; ROSA; ALMEIDA, 2012; CONCEIÇÃO; MARTINS, 2019). Estas pesquisas comprovam a importância do espaço escolar como cenário facilitador e mediador para a constituição enunciativa em Libras ao público surdo infantil. Assim, a escola tem se colocado como o principal espaço de aprendizado da língua de sinais, por crianças-surdas, filhas de pais ouvintes (CONCEIÇÃO; MARTINS, 2019), quando esta escola atende à legislação que defende a educação em Libras aos surdos. Embora ainda seja um desafio implementar programas inclusivos e bilíngues (Libras/Língua Portuguesa), é importante apontar que a ação é regida por vários dispositivos legais (BRASIL, 2002, 2005, 2015). Sua conquista ocorre com movimentos políticos e científicos em favor da disseminação e do reconhecimento da importância da Libras na vida e como direito linguístico de expressão das pessoas surdas. Em 2002 a Libras ganhou seu reconhecimento legal. Contudo, apenas em 2005 essa lei, conhecida como “Lei Libras” foi regulamentada (BRASIL, 2002, 2005) e com isso foram impostos determinados prazos para cumprimento da acessibilidade linguística aos surdos (socialmente, de modo mais amplo e nas escolas), assegurando o direito de seu uso nos mais variados espaços sociais, principalmente o escolar. Conceição e Martins (2019) em suas pesquisas afirmam que a maioria dos surdos investigados e matriculados em escolas comuns, em suas pesquisas, são filhos de pais ouvintes e que desconheciam a Libras antes do seu ingresso na escola ou não a usavam em interações familiares cotidianas, ou seja, o uso desta língua ocorre apenas após o ingresso deles em escolas municipais com programas bilíngues. Pais que participaram da pesquisa relataram que o uso da Libras na escola incentivou seu interesse e aprendizado da língua de sinais e apontam a melhora de comunicação em sues lares, já que sentiam empobrecida a interação deles com seus filhos no contexto domiciliar, apontando limitações que encontram para construir trocas interativas simples em seu dia a dia.

Com os estudos mencionados vemos que crianças-surdas, filhas de pais ouvintes, em escolas bilíngues, tiveram ampliadas a sua comunicação em Libras, expandindo o uso inicial e limitado dos gestos caseiros. Assim, as crianças passam a demandar maior interação nesta língua, fazendo menor uso dos sinais caseiros, usados de forma restrita apenas com seus familiares - quando os pais estabelecem esse elo linguístico pela gestualidade. Todavia, o processo de aquisição de linguagem tardia por surdos ainda é uma realidade e os desafios para aprendizagem da língua de sinais, pelas famílias ouvintes, se coloca como algo a ser considerado com muita atenção e a ser pensado como política de assistência social (na pauta da saúde pública). Como o acesso à língua portuguesa demanda certa relação com a sonoridade desta língua, para as crianças-surdas esse processo é muito complexo, custoso e há limitações em sua apropriação, não sendo feito de modo natural, como em crianças ouvintes. Para esse aprendizado pressupõe-se a intervenção clínica e terapêutica. A falta de acesso da criança-surda a uma língua gestual, como a Libras, a qual não lhe traga empecilhos orgânicos de apropriação, como nas línguas orais, é promotora deste atraso de linguagem mencionado, tendo consequências importantes no desenvolvimento infantil: psíquico e cognitivo (LODI; ALBUQUERQUE, 2016).

O desconhecimento social sobre a importância da apropriação da língua de sinais precocemente por crianças-surdas e mais a falta de conhecimento social de que a Libras é uma língua de fato, com todos os status necessários ao funcionamento linguístico, e que sem ela as consequências às crianças-surdas são graves, geram tamanhas limitações às políticas públicas e educacionais. Todavia, o Estado (enquanto órgão de controle das vidas populacionais) deve assegurar políticas linguísticas de expansão e proteção da Libras a seus falantes surdos. A escassez dessa prática contribui diretamente para a estigmatização e a exclusão da população surda, de sua marginalização, bem como para a manutenção do olhar sobre os surdos, narrando-os em políticas sociais como sujeitos deficientes (a saber, tendo-os avaliado a partir de sua menor eficiência no uso da linguagem e na opção apenas pela reparação do corpo deficiente em políticas sanitárias que defendem apenas o implante coclear, a protetização e a aprendizagem da língua oral falada). Esse movimento paralisa as ações de narrativas das pessoas surdas por suas diferenças culturais e linguísticas (como sujeitos visuais que se constituem em outra língua) - como os movimentos surdos reivindicam serem narrados (PELUSO, 2019; LODI; ROSA; ALMEIDA, 2012; CAMPELLO; REZENDE, 2014).

Afirmo minha filiação ao movimento antropológico empreendido nos estudos surdos (SKLIAR, 2005) que traz o paradigma da diferença surda e de suas produções culturais interligadas a relação desse corpo, produzido pela modalidade de uma língua gestuovisual. Avançando esse tema, entendo a surdez pela pauta filosófica produzida na perspectiva de uma ontologia surda que se narra pela expressividade ético-estética (PAGNI; MARTINS, 2019). Com base na produção de uma expressividade surda marcada por Pagni e Martins (2019) adoto os estudos de Wittgenstein (1996, p. 18) sobre os efeitos da linguagem/língua na produção subjetiva resultante de encontros entre signos. Esta posição evidencia a importância da língua ao apontar que são através dos jogos de linguagem que “os processos pelos quais se aprende uma língua materna, se denomina objetos e se repete a palavra pronunciada”. A interação com o outro, portanto, é ponto fundamental para a produção do ethos que se formula na ação intrapsíquica e intercomunitária. Compreendendo a totalidade da linguagem na expressividade forjada em um corpo, defendo neste trabalho a importância do acesso e difusão da língua de sinais às crianças-surdas, já que essa ação é favorável ao desenvolvimento cognitivo e psíquico desses sujeitos. Como efeito da produção de si e do outro (laços relacionais) na língua (na Libras), há possibilidade de aparição das singularidades surdas. Portanto, vemos nesse processo a constituição efetiva dos surdos no jogo social que a linguagem produz subjetivamente. É na ação interativa e criativa da língua que há a constituição da singularidade humana.

Para Pagni (2010) a linguagem se forma através da experiência consigo mesmo, com o meio e com o outro, sendo o produto destes vários encontros-acontecimentos criativos e, por isso, estéticos: que produz uma forma ao/no sujeito. Movimento este que a todo instante formulam um (novo) ser. Nesse processo efetiva-se a expressividade de um corpo. Na infância vê-se o ápice desse movimento intensivo de forças criativas do devir. A criança é esse ser que extravasa expressividade ainda pouco controlada pelos significantes adultos. Nessa troca de sentidos produzidos internacionalmente, entre a criança e o adulto, formam-se os processos de condução da vida impostos na maquinaria social.

A experiência artística do ser criança ao ser traduzida verbalmente busca pela decifração daquilo que é da ordem da intradutibilidade: o acontecimento. É na “constituição de seus gêneros linguísticos, em busca de encontrar os limites e as possibilidades de a experiência se expressar, em sua relação ontológica com a vida e com a estética da existência” (PAGNI, 2010, p. 18). Mas, é por meio da expressão e dos instrumentos produzidos pela linguagem que pensamos poder, de certo modo, acessar ao outro e o outro a nós. Ainda que seja da ordem do impossível, a ilusão da compreensão do outro é necessária. Vaz (2010) baseado na concepção da experiência nos estudos benjaminianos, alinhado ao que trouxe anteriormente, afirma que

a experiência é aquela tessitura objetiva e subjetiva, que se vitaliza apenas quando pode ser narrada, compartilhada, trazida ao plano da consci ência, é porque, de fato, narrar e curar se cruzam no encontro entre corpo e pensamento, entre os sentidos humanos, capazes de interagir, e os significados, os conceitos, que elucidam e rompem com o passado mítico que aprisiona, que adoece (p.43).

A linguagem, portanto, faz parte da produção experiencial, é produtiva e interacional. Só se revela socialmente no efeito de um acontecimento que se materializa no encontro entre corpos: do corpo surdo com a língua de sinais apresentada por um falante desse idioma e dos sentidos do encontro com signos necessariamente visuais. O que quer dizer que há necessidade de trocas linguísticas (verbais e não verbais) entre os falantes para a apropriação natural de uma língua e de múltiplos sentidos, tendo a materialidade da língua como principal veículo de condução destas trocas. A criança vai, portanto, se desenvolvendo nas suas relações sociais, “havendo sempre um caráter de evolução e revolução no desenvolvimento, que não é linear e cuja transformação abarca o novo a partir do anteriormente constituído” (CAMARGO, 2010, p. 5). Desse modo, a falta de contato com falantes qualificados (em potencial e em Libras), traz consequências sérias ao seu desenvolvimento.

Há mudanças significativas quando o indivíduo começa a dominar a língua, pois esta apresenta duas funções de uso que são paralelas: a função social e a função cognitiva. Acrescente-se, ainda, que há um pensamento verbal e um pensamento prático, e este último não mantém relação direta com a fala. O surdo, mesmo sem língua, não estaria impedido de pensar. Há outros mecanismos de significação além da linguagem oral (SANTANA, 2007, pp. 207-208).

A citação acima retoma a importância da língua no desenvolvimento do pensamento da criança-surda e em sua constituição subjetiva. Apontado o não acesso natural à língua oral, temos posto um problema efetivo de desenvolvimento da criança que carece de ações políticas amplas. Reitera-se que os surdos, quando em contato com uma língua verbal gestual, passam a estar imersos no universo simbólico da linguagem e na captura social e discursiva estabelecida nos contratos sociais veiculados por uma gramaticalidade comum e compartilhada. A pandemia da COVID-19 e o isolamento social decorrentes dela, às crianças-surdas, nos impulsionam a pensar em ações de acessibilidade voltadas para ese público infantil, em Libras, dada a realidade da interação maior da Libras ocorrer no ambiente escolar. O quadro de isolamento social imposto como forma de controle da epidemia no Brasil afetou diretamente e de modo significativo à população surda infantil.

Inicialmente para combater a desinformação sobre a doença e gerar ações sociais apostamos (por meio da ação #CasaLibras hoje tendo 10 integrantes na equipe) na construção de um projeto de extensão que resultou como braço de um projeto de pesquisa com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (FAPESP), Processo n° 2018/08930-0. O objetivo do projeto de extensão (efetivado na Universidade Federal de São Carlos) produzido em diálogo com a pesquisa por mim desenvolvida foi o de construir materiais digitais voltados ao público infantil surdo para acesso na pandemia. Os materiais estão sendo usados também em escolas municipais públicas com programas bilíngues e inclusivos de ensino, na pandemia e posteriormente poderá ser aderido ao ensino presencial, na retomada pós-pandemia.

O projeto investe numa "força tarefa" colaborativa (com professores, técnicos e estudantes da UFSCar) para que esses materiais cheguem aos pais de crianças surdas, como um suporte nas orientações em Libras a essas crianças. Sintetizando, o isolamento de crianças-surdas preocupa por três motivos: 1) a falta de interlocutores em potencial em Libras, neste período de restrições comunicativas, e seus efeitos para a aquisição da língua de sinais já tardiamente; 2) a falta de informação diante das barreiras linguísticas entre pais e filhos surdos e por fim, 3) a falta de materiais para entretenimento dessas crianças em língua de sinais. Com esses argumentos justificados, a atividade de extensão propôs duas ações distintas de produção de materiais: a) a tradução de mídias digitais (com janela em Libras) e criação de materiais didáticos em Libras (traduzidos e produzidos); b) a produção de mídias com contações de histórias em Libras (de modo lúdico, numa interatividade virtual) com proposta de adesão de novos parceiros (contadores de histórias em Libras) com a divulgação da #CasaLibras - Levando a Libras na Casa de Crianças Surdas. As duas atividades se deram como forma de entretenimento às crianças surdas e estímulo ao contato com essa língua (Libras) em casa e depois. Mas, é a ação #CasaLibras que teve uma maior repercussão e que considero ação popular para sobrevida da Libras por crianças-surdas.

Produção da equipe #CasaLibras

Imagem 1:  Produtos de contações livres em Libras editadas pela equipe do #CasaLibras - variedade nacional de participação de sujeitos 

Alguns resultados serão trazidos neste texto e que revelam a ação, apontando para a potente interação das crianças-surdas com os produtos sociais populares, bem como o uso dos materiais para interação da criança com seus pais. Uma ação virtual virulenta da Libras. Isso pode ser afirmado quando na proposta de contações de história proposto na chamada do #CasaLibras tivemos muitos adeptos, pulverizando nacionalmente produções cotidianas do povo, contadas em Libras. O desejo inicial era de passar informações em Libras e com conteúdo infantil sobre a pandemia e acabamos produzindo entretenimento em combate à situação de isolamento atual, já que muitos surdos não conseguem dialogar com seus pais, pela barreira linguística. A ação vem propiciando muitas histórias infantis em Libras, contadas por pessoas que tem feito adesão ao projeto com a marca #CasaLibras.

Temos adotado esta estratégia como produção de distração e entretenimento ao público infantil surdo “viralizando” a Libras em meio à pandemia da COVID-19. Sobre as ações desta atividade faremos algumas considerações da repercussão da adesão do povo ao movimento como aceno da luta travada em reação à biopolítica (na força que regula a população) ou política das vidas surdas regulada pelas demandas do público ouvinte e que ao negligenciar informações diretivas a um grupo, os torna marginalizados e negligenciados das políticas sanitárias de cuidado e prevenção da doença. Se essa política não faz viver essas vidas, produz neles ou os deixa vulneráveis, tornando-os mais expostos ao risco de morte - poderíamos ver nisso a ação da necropolítica (MBEMBE, 2018) ou de uma política de condução à morte de certas vidas?

Biopolítica e a viralização da libras como ação do povo no projeto #casalibras

Foucault (2014) apresentou estudos sobre as relações de poder e as práticas de condução resultantes de regularidades discursivas que revelam o tipo de condução das vidas que se forjam em dada sociedade. A essa força regulamentar de grandes populações no ocidente, o filósofo deu o nome de biopolítica. A depender das verdades que se pretende afirmar, tecem-se teias enunciativas em práticas discursivas e delas derivam os sujeitos. Gallo (2017) sobre os estudos foucaultianos afirma que o autor “no conjunto de seu trabalho, explorou diferentes manifestações do fenômeno do poder nas sociedades ocidentais: soberania, poder pastoral, disciplina, biopoder” (p. 1500). Do poder que disciplina os corpos individuais, às ações mais generalizadas de regulamentação, o poder nas populações transita como efeito do biopoder e a biopolítica age de forma a conduzir a conduta de um a um e de todos com a manifestação do poder pela prática da governamentalidade. Sobre essa produção social do poder direcionado à população, temos:

É a população, portanto, muito mais do que o poder do soberano, que aparece como o fim e o instrumento do governo: sujeito de necessidades, de aspirações, mas também objeto nas mãos do governo [...] [A] população vai ser o objeto que o governo deverá levar em conta nas suas observações, em seu saber, para chegar efetivamente a governar de maneira racional e refletida. A constituição de um saber de governo é absolutamente indissociável da constituição de um saber de todos os processos que giram em torno da população no sentido lato, o que se chama precisamente “economia” [...] Pois bem, é apreendendo essa rede contínua e múltipla de relações entre a população, o território e a riqueza que se constituirá uma ciência chamada “economia política” e, ao mesmo tempo, um tipo de intervenção característica do governo, que vai ser a intervenção no campo da economia e da população. Em suma, a passagem de uma arte de governar a uma ciência política, a passagem de um regime dominado pelas estruturas de soberania a um regime dominado pelas técnicas do governo se faz no século XVIII em torno da população e, por conseguinte, em torno do nascimento da economia política (FOUCAULT, 2008, p. 140-141 - aspas do autor).

Mas se os surdos usam uma língua que não é a estabelecida para o contrato social e não fazem parte da negociação de sentidos por uma língua comum, eles escapam da condução regimental imposta, na ação da biopolítica que conduz vidas pela governamentalização? Por incrível que pareça a resposta para mim é, não. Não escapam da condução, mas muito pior, a eles cabe vir sendo conduzido como população-fantoche, pois são conduzidos mesmo sem estabelecer ou fazer parte de certa negociação imposta no jogo social, pela linguagem. É como se houvesse uma tutela social do que lhes cabe e de como devem viver, incluindo a vestimenta linguística que podem e devem usar: a língua portuguesa em detrimento da língua de sinais que certamente lhes dá um conforto maior; a escola que pode e devem se matricular; a condução da aprendizagem, e em qual língua esse processo deverá ser, qual língua pode-se ter para si mesmo, e mais, são conduzidos sem direito de acesso aos contratos sociais que circulam nas mídias, já que se dão na língua portuguesa. Mas, a questão que mais me inquieta é a escancarada violência simbólica que se faz na negligência informativa em Libras e que os expõe à condição de não-fala, de não-decisão.

Com isso se configura o aceite ou a conformação dos surdos (de muitos) de seguir padrões ouvintes, que os ditam como ser, porque se colocam na posição de estar em falta (de audição) e por isso, “pelo acometimento da surdez”, parece que a única saída é ter de se contentar com as migalhas gestuais, os restos de leitura labial, a incompleta interpretação textual em português, as poucas aparições das informações sociais com janela em Libras de noticiários espalhados por aí, buscando construir para si uma colcha de retalhos informativos que lhes dê sentido dos acontecimentos sociais. Se isso é o que muitos surdos adultos sinalizadores relatam estar sentindo na pandemia, essa sensação de desconhecimento total, num misto de medo e de curiosidade em saber os porquês de tantas mudanças sociais vividas, imagine então as crianças-surdas que têm muito menos meios para buscar esses retalhos informativos. Se essa condução não reflete uma biopolítica que privilegia certas formas de vidas e ao não conduzir outras às deixam morrer, ou seja, se essa não é a alegoria mais clara do Racismo de Estado, produzido nos estudos de Foucault (1999), não consigo alinhar um exemplo melhor. Em Foucault (2008, 2014) temos o anuncio dos cuidados frente ao biopoder, a produção de verdades às populações que podem inclusive conduzir em práticas cruéis e políticas que reforçam estereótipos, segregações, inimizades, extermínios e conduzem à morte. Essa alegoria de vida e luta dos surdos me parece ser um reflexo interessante disso.

Nos estudos de Foucault (2014) marca-se o governamento das vidas populacionais e sua produção de forma micro e macrossocial: das relações cotidianas familiares à ação do governo em suas regularidades jurídicas, todas como práticas de condução impostas às vidas para seu ordenamento, sua classificação. Portanto, há a defesa de uma lógica governamental na constituição subjetiva, através desse poder nomeado pelo autor como governamentalidade.

Nos cursos dos dois últimos anos, procurei esboçar um pouco essa noção de governo, que me parece muito mais operacional que a noção de poder, “governo” entendido, claro, não no sentido estrito e atual de instância suprema das decisões executivas e administrativas nos sistemas estatais, mas no sentido lato, e aliás antigo, de mecanismos e procedimentos destinados a conduzir os homens, a dirigir a conduta dos homens, a conduzir a conduta dos homens (FOUCAULT, 2014, p. 13 - aspas do autor).

Claro está isso na aparição do “governo, então, como ação de conduzir condutas” (GALLO, 2017, p. 1501). Para Foucault (2008, 2014) assim como na relação de poder há liberdade individual, as práticas de condução se dão da mesma forma, com possibilidade de contra movimentos. Desta forma, o projeto de uma sociedade democrática, segundo Gallo (2017), se efetiva na construção da governamentalidade que tem como meta a captura de todos e o direcionamento padrão à todas as vidas, portanto, se inclui todos, obedecendo ao padrão elegido por um grupo e aplicado ao conjunto populacional. Evidente que nesse processo a exclusão das diferenças e das singularidades é inevitável.

É inegável o ganho democrático para a sociedade brasileira com as políticas públicas que vêm sendo implantadas no âmbito desta governamentalidade made in Brazil; porém, ainda que haja avanços, estes avanços são direcionados no quadro de um determinado regime do político, no qual cada um só pode ser parte do processo ao seguir as regras e condições impostas pela governamentalidade democrática. E não somos convidados a participar do jogo; ao contrário, somos todos incluídos, queiramos ou não. É preciso que todos joguem: eis a regra democrática. E com a participação de todos, os possíveis conflitos e as contradições serão resolvidos segundo a lógica da maioria, através da produção de consensos (GALLO, 2017, p. 1518).

Para exemplificar esse processo de planificação das vidas pela governamentalidade policialesca proposta nos estudos de Michel Foucault (2008) ao retratar a constituição deste Estado democrático ocidental, e de ajustamento de corpos, dentro de determinada lógica, Gallo (2017) faz uso dos conceitos empreendidos por Ranciére (2018), na distinção feita entre a política e a polícia. Descreve a política como ação de quebra de um poder instituído, sendo a perturbação de certo ordenamento imposto, ou seja, “é uma ‘partilha do sensível’, é um acontecimento, o que significa que não é algo fortuito, mas implica sempre uma ruptura com uma ordem estabelecida” (Gallo, 2017, p. 1519 - aspas do autor). Já a polícia é para Rancière (2018) exatamente seu oposto. Gallo (2017) apresenta a atividade da polícia alinhada à constituição democrática porque captura, investiga, conduz os corpos disciplinando as formas de vida permitida e a inserção de todos os corpos que passam a ser gestado e aprendem a se auto-gestar nessa perspectiva desejada. A ação policial ela é macro e micro, porque são produzidos mecanismos de fiscalização externas que vão sendo incorporadas pelos sujeitos em suas práticas, tornando a ação autogovernada. É efeito, nos movimentos surdos, o policiamento que os próprios surdos fazem a si mesmo, na cobrança individual pela compreensão da língua portuguesa, para estarem inseridos nas práticas de condução. Gallo (2017) intensifica esse conceito ao analisar as práticas inclusivas e menciona a distinção da política da diversidade para a política da diferença. Enquanto a primeira atua na lógica policialesca em que os corpos se ajustam a lógica comum, no segundo, a diferença se manifesta no rompimento com a ordem, como acontecimentos pontuais que ferem a conduta instituída, agindo, portanto, na contraconduta pela resistência. Explica que “a polícia é um tipo de partilha do sensível que trabalha na perspectiva da completude, em que não há vazio e não há suplemento, ela é uma ferramenta que serve muito bem para pensar a lógica da diversidade e da inclusão” (GALLO, 2017, p. 1519).

Como vimos, inclui-se para não se deixar nada nem ninguém de fora, de modo que não haja suplementos, de modo que não haja vazios. A lógica policial é a lógica do preenchimento. E pelo que trabalhamos aqui, a governamentalidade “à brasileira”, a governamentalidade democrática em curso entre nós nas últimas três décadas articula-se perfeitamente com esta perspectiva policial. Todos são cidadãos para que todos sejam devidamente governados por este Estado policial (GALLO, 2017, p. 1519).

O governamento das vidas surdas se faz dentro da inclusão, quando seus corpos são obrigados a se curvar à língua oral, sendo ela a língua instituída para a condução jurídico-social. As ordens na pandemia, às conduções sanitárias, os contratos institucionais que fazem uso da língua portuguesa para o comando social, mas e os surdos sinalizadores? Passam a seguir modelos e práticas acordadas socialmente, sem ao menos entender o combinado, ou seja, sem compreender as regras do jogo que devem jogar. Jogam pela repetição de práticas que vem e se autoconduzem a partir de fracos elementos e muitas vezes por fragmentos de conversas que recebem de colegas/parceiros intérpretes de Libras e familiares que se comunicam por esse idioma. E novamente, marco a violência simbólica e a pouca margem para a política do contrário ou a ação da resistência aparecer.

Com essa explanação passamos a apresentar dados do projeto #CasaLibras anunciando-o como contraconduta produzida com e polo povo na resistência à manutenção discursiva apenas na língua oral, ou seja, na língua portuguesa. Ao propor voluntariamente a tradução de vídeos infantis em Libras sobre o momento vivido do Covid-19, a viralização da Libras passa a ser possível e chega na casa de crianças-surdas. Foram três vídeos instrutivos compartilhados com escolas municipais com propostas bilíngues para surdos e enviados a familiares de crianças-surdas. Com o aumento do projeto criei uma chamada pública com a #CasaLibras anunciando essa proposta como ação do povo às crianças-surdas. A palavra-conceito povo nos estudos foucaultianos pode ser compreendido em duas formas: como corpos desviantes de certa normalidade e como população ou agrupamento a se controlar por meio de um conjunto de regulações. Faço uso da palavra povo no primeiro modo, alinhado à perspectiva de multidão em Negri (2004), entendendo esse povo/multidão como sendo “corpos desviantes que escapam à normalização empreendida pelas tecnologias de biopoder - o que caracteriza como uma anátomo-política” (PAGNI, 2019, p. 4).

A ação do projeto pode se colocar como prática de desvio por ter sido uma proposta lançada a interessados voluntários, pedindo que gravassem um vídeo livre de até dez (10) minutos com uma contação espontânea em Libras, para partilharmos às crianças-surdas que no isolamento social, provocado pela pandemia, ficaram limitadas na interação e entretenimento em Libras. A regra era apenas essa que fosse uma produção em Libras, livre, sem roteiro, direcionada com fundo liso e com a qualidade de filmagem que tivessem. Pedimos que fosse produzida nesta materialidade linguística: na Libras. Ao receber várias produções de pessoas de todo o Brasil, num e-mail institucional da UFSCar, criado pelo grupo, produzimos com os materiais brutos um formato para a edição do material, a tradução em português para que as famílias de surdos pudessem compreender (a tradução foi a inversa, da Libras língua de diálogo para a língua portuguesa).

Dados retirados do formulário on-line de inscrição para participação no projeto

Imagem 2 Relação das localidades dos participantes 

A divulgação em redes sociais (Canal do Youtube, Facebook, Instagram) viralizou rapidamente. Recebemos vídeos de crianças-surdas compartilhando histórias, relatos de pais que auxiliaram a gravação e envio das produções de seus filhos, adultos surdos, intérpretes de Libras, docentes de crianças surdas. Uma pluralidade identitária (mulheres, homens, crianças, adolescentes, adultos, negros, surdos, ouvintes) numa enxurrada de materiais solidários ao momento de isolamento e às questões já anunciadas de falta de recurso e de política pública “democrática” às crianças-surdas. A circulação das produções pode ser vistas nas estatísticas do vídeo “Os três porquinhos”, narrado em Libras pelo João Pedro (link compartilhado na nota de rodapé 10), que é uma criança surda de 11 anos, filho de pais ouvintes, estudante de uma escola bilíngue de São Carlos, e que já enviou duas contações de histórias ao projeto. Ele representa muito bem o público alvo da ação, e acreditamos que por esse motivo, seus vídeos tenham uma taxa de visualização alta e boa quantidade de compartilhamentos, conforme dados apresentados. O vídeo teve um alcance de mais de 30 mil pessoas, das quais 3 mil assistiram a pelo menos 15 segundos da história, e mais de 220 compartilhamentos.

Facebook oficial do Curso de Bacharelado TILSP da UFSCar

Imagem 3 Repercussão do vídeo “A mulher e sua galinha” 

A atividade de extensão proposta nos direcionou a positividade da liberdade de contar, interagir, afetar e ser afetado pela/em Libras e nesse processo deixá-la construir múltiplos sentidos entre os participantes, a partir de um fluxo discursivo compartilhado por eles, na Libras. Ao olhar a liberdade de produção das narrativas e adesão da comunidade surda pelas mídias digitais virtuais temos clareza da necessidade de investimento em produções como essas para que a acessibilidade viralize em muitas casas, em muitas salas de aula e contamine a política pública com o bem e a equidade de direitos.

A solidariedade fortaleceu a rápida produção desta ação. Pessoas voluntárias construindo conteúdos em Libras e uma equipe de dez participantes que trabalham neste projeto. Inicialmente uma ação individual de pesquisa e hoje uma extensão da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). A equipe atua trabalhando na edição, tradução (Libras/Língua Portuguesa) e na divulgação dos produtos. Entendemos essa luta como ação do povo à multidão de crianças-surdas.

Considerações finais do povo surdo para a escola inclusiva: política para a população infantil surda ou política do povo/multidão com as crianças-surdas?

A ação do povo, no âmbito das forças populares que fraturam uma lógica instituída, é possível na medida em que se consolidam práticas de resistência. A comunidade surda tem marcado a luta pela inclusão da língua de sinais há anos. A marginalização ou a pseudo-incorporação da Libras e das pautas surdas se colocam como arma de captura policial do estado neoliberal que precisa regulamentar a vida de todos, incluindo os surdos. O que quero dizer é que a Libras já está incorporada dentro da pauta social e está bem presente hoje na sociedade, mas o discurso legal e a visibilidade não garantem que a vida surda, em sua expressividade e em sua diferença, possam ser exercida/vivida sempre e em todos os espaços e tendo a Libras como meio de singularização. Temos na escola a maior mostra disso: a Libras está nas escolas, mas na tradução da língua portuguesa, na romantização deste idioma e sempre nas beiras do que lhe sobra como possibilidade de aparição. É essa frágil inserção de vidas que precariza a diferença e enfraquece o movimento do povo surdo. Na medida em que a sensação de respeito, na forma de tolerância, à vida surda se coloca na mídia, na quase invisível janela de Libras produzida, na escola com a presença de intérpretes sem formação em Libras, na sociedade com a pseudo-inserção das decisões dos surdos, a nuvem e os pingos/migalhas de aceite provocam o embaçamento do direito, a visão borrada serve como desarticulador da luta social e da pauta da resistência.

A pandemia serviu para fazer o corte nessa nuvem da tolerância, chocar, isolar ainda mais aqueles que já vivem o isolamento estando dispersos na multidão. A robotização de suas vidas surdas ficou ainda mais evidente na pandemia. Isso ao seguir os passos dos outros/ouvintes (na lavagem de mão, no uso de álcool entre outros modos aderidos na pandemia) sem saber muito o porquê das coisas, já que a comunicação sempre é intercortada e barrada pela língua não partilhada. Esse isolamento radical às crianças-surdas já em atraso de aquisição de linguagem foi duramente acirrado. A reflexão dessa perda às crianças-surdas pesou sendo ponto de encontro e convergência no fortalecimento de uma rede solitária do povo às crianças-surdas.

Trago como aprendizado desta experiência a potência de união, as ações do povo/multidão (NEGRI, 2004) em um cenário tão desolador, de morte e abandono do estado, pode ser mote para a fortificação dos marginalizados na luta e produção criativa de respiro e vida. À educação e a inclusão o que tudo isso me trouxe? Que as políticas inclusivas para surdos, ou seja, dirigidas à essa população estão marcadas por práticas discursivas e regimes de verdades na lógica oral, presas à constituição dessa polícia que ordena às regras instituídas da diversidade. Para o movimento e a aparição das diferenças, a construção é cotidiana, interna, emergente do sufoco do dia a dia e das lutas que ali, nas salas de aula travamos. A saída está no povo, na multidão, docente, discentes, técnicos e voluntários, sujeitos que encontram em seus sofrimentos diários, a força necessária para sobreviver na contracontuda. À ação do povo se fez direcionada às particularidades das crianças-surdas e mais, a ação do povo com as crianças-surdas é o que auxilia a sobrevida deste grupo, em Libras, na pandemia do Covid-19. Essa saída estratégica é uma abertura a pensar as lutas cotidianas na escola e a presença de táticas do povo na abertura de novas possibilidades. O lugar da luta está na ação popular, na união contra os abusos do poder que opera na inclusão-excludente numa política que deixa algumas vidas à margem das ações de seguridade. Se há condução, a contraconduta pode operar lá. Na lógica inclusiva as contracondutas frente ao desejo do povo à multidão surda podem ser um aliado forte ao processo do aprender de crianças-surdas na escola, e em Libras.

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Recebido: 16 de Novembro de 2020; Aceito: 22 de Março de 2021

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