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Childhood & Philosophy

versión impresa ISSN 2525-5061versión On-line ISSN 1984-5987

child.philo vol.18  Rio de Janeiro ene./dic 2022  Epub 31-Dic-2022

https://doi.org/10.12957/childphilo.2022.64107 

Artigos

É tão estranho a gente sentir que existe: infância e cinema no curta alma

It’s so strange feel that we exist: childhood and cinema in the short film alma

Es tan extraño sentir que existimos: infancia y cine en el cortometraje alma

caroline trapp de queirozI 
http://orcid.org/0000-0003-2265-9351

Iuniversidade do estado do rio de janeiro, rio de janeiro, brasil


resumo

Esse artigo tem por objetivo apresentar uma discussão sobre infância a partir das questões suscitadas pelo curta-metragem intitulado Alma, dirigido, produzido e roteirizado pelo cineasta paraibano André Morais. Na obra, experienciamos um dia na vida de uma menina que vive com sua avó e que, ao longo de toda a trama, tece questionamentos sobre sua própria existência, os sentidos da vida e as dimensões das relações que vamos estabelecendo uns com os outros. Discute-se nesse texto, portanto, a potência do cinema e da infância como dimensões que convidam a um diálogo capaz de fazer convergir arte e vida, fertilizando também o campo da ciência, a partir das reflexões que são caras à dinâmica da experiência humana. Que concepções de infância são apresentadas na produção? De que formas a abordagem escolhida amplia a discussão sobre a infância e o cinema como potências? Em que medida as questões levantadas pela criança conectam sua experiência de infância às experiências de quem a assiste em tela? A fim de mobilizar a discussão, o texto é organizado a partir de cenas, que caracterizam a sequência dos acontecimentos que dão sentido ao que o filme quer expressar. Na primeira delas, apresenta-se a temática central; na segunda, as questões para as quais o curta nos desperta ao longo da narrativa; e na terceira, busca-se ampliar as possibilidades de leitura, no lugar de encerrá-las. Dão embasamento às discussões aqui levantadas Walter Benjamin, Mikhail Bakhtin, Antoine de Saint-Exupéry, Aristóteles e Hannah Arendt.

palavras-chave: infância; cinema; potência.

abstract

This article aims to present a discussion about childhood from the issues raised by the short film entitled Alma, directed, produced and scripted by the filmmaker André Morais. In the work, we experience a day in the life of a girl who lives with her grandmother and who, throughout the plot, weaves questions about her own existence, the senses of life and the dimensions of the relationships we establish with each other. It is discussed in this article, therefore, the power of cinema and childhood as dimensions that invite a dialogue capable of converging art and life, also revitalizing the field of science, from the reflections that are dear to the dynamics of human experience. What conceptions of childhood are presented in the production? In what ways does the chosen approach broaden the discussion about childhood and cinema as potencies? To what extent do the questions raised by the child connect their childhood experience to the experiences of those who watch it on screen? In order to mobilize the discussion, the text is organized from scenes, which characterize the sequence of events that give meaning to what the film wants to express. In the first, the central theme is presented; in the second, the questions for which the short awakens us throughout the narrative; and in the third, it seeks to expand the possibilities of reading, rather than closing them. These scenes support the discussions brought here through Walter Benjamin, Mikhail Bakhtin, Antoine de Saint-Exupéry, Aristotle and Hannah Arendt.

keywords: childhood; cinema; potential

resumen

Este artículo pretende presentar un debate sobre la infancia a partir de las cuestiones suscitadas por el cortometraje Alma, dirigido, producido y guionado por el cineasta paraibano André Morais. En la película, vivimos un día en la vida de una niña que vive con su abuela y que, a lo largo de la trama, se plantea preguntas sobre su propia existencia, los significados de la vida y las dimensiones de las relaciones que establecemos unos con los demás. Este texto, por lo tanto, discute la potencia del cine y de la infancia como dimensiones que invitan a un diálogo capaz de hacer converger arte y vida, fertilizando también el campo de la ciencia, a partir de las reflexiones que resultan caras a la dinámica de la experiencia humana. ¿Qué concepciones de infancia se presentan en la producción? ¿De qué manera el enfoque elegido amplía el debate sobre la infancia y el cine como potencias? ¿En qué medida las preguntas planteadas por la niña conectan su experiencia de infancia con las experiencias de quienes la observan en la pantalla? Para movilizar el debate, el texto se organiza a partir de escenas, que caracterizan la secuencia de los acontecimientos que dan sentido a lo que la película quiere expresar. En la primera de ellas, se presenta la temática central; en la segunda, las preguntas que nos despierta el cortometraje a lo largo de la narración; y en la tercera, se busca ampliar las posibilidades de lectura, en lugar de cerrarlas. Walter Benjamin, Mijail Bajtin, Antoine de Saint-Exupéry, Aristóteles y Hannah Arendt sientan las bases de los debates aquí planteados.

palabras clave: infancia; cine; potencia

“é tão estranho a gente sentir que existe”: infância e cinema no curta alma

Alma (2005) é o primeiro filme do cineasta, ator e cantor paraibano André Morais. Escrito, dirigido e produzido por ele, o curta-metragem venceu, dentre outros, o prêmio de Melhor Curta de Ficção no 7º Alucine, Festival Latino Americano de Toronto, no Canadá, e o prêmio de Melhor Curta Universitário Brasileiro do Ministério da Educação. É no jogo de luzes e sombras, em um ambiente bucólico, que o filme se faz: “Uma criança, um olhar, mil mundos. Um dia na vida de uma menina e sua doce percepção” (Morais, s.d.). A simplicidade do cotidiano no interior do país e a complexidade do inédito na experiência da criança.

A infinidade de temas que o cinema coloca em discussão, com sua linguagem própria é tomada nesse artigo como campo a partir do qual se discutirá infância, seguindo o rastro das pistas deixadas por Alma ao longo do curta. Que concepções de infância são apresentadas na produção? De que formas a abordagem escolhida amplia a discussão sobre a infância e cinema como potências? Em que medida as questões levantadas pela criança conectam sua experiência de infância às experiências de quem a assiste em tela?

Ao evocar a perspectiva da criança, a partir dos ajustes de suas lentes e de sua mirada para o mundo, o curta coloca em questão os vieses com que a leitura da realidade é construída e sustentada. Como mirar pressupõe também enfocar e, por consequência, excluir de seu horizonte tantas outras nuances presentes em um mesmo plano, são as possibilidades de uma leitura infantil, com as concepções que ela carrega, no interior de uma produção artística, que se abrem diante de nossos olhos a partir da história de Alma.

São as conexões com essa leitura que buscaremos contemplar nesse artigo, ou seja, refletir sobre infância a partir do que nos apresenta como questão de mundo o olhar da protagonista do curta. Junto dessa reflexão nos acompanhará a discussão sobre a potência do cinema e o desafio de criar pontos de convergência entre as dimensões da arte, da vida e da ciência, como modo de fertilizar as produções estéticas, éticas e políticas. Para isso, as discussões serão organizadas em forma de cenas, que especificamente no campo do cinema caracteriza a sequência dos acontecimentos que dão sentido ao que o filme quer expressar (Vaz, 2008).

A primeira das cenas apresentadas nesse artigo é a cena de abertura do curta, na qual a temática central é apresentada; a segunda é a cena mais longa, onde serão discutidas as questões para as quais o curta nos desperta ao longo da narrativa; e a terceira é a cena de encerramento, que não se pretende conclusiva, ampliando as possibilidades de leitura ainda mais. A ideia, portanto, não é produzir uma análise do campo do cinema, enquanto produção artística, mas sim no campo da ciência que, sensível às proposições da arte, evoca novos olhares à dimensão da vida.

Cinema e infância: o encontro de duas potências

Walter Benjamin (1994), em sua análise sobre a arte no contexto de reprodutibilidade técnica, chama atenção à perspectiva emancipatória que ela evoca, sobretudo diante da quebra dos conceitos tradicionais de criatividade, genialidade e aura, que reforçavam lugares de classe ao conferir às obras caráter ritualístico. A reprodutibilidade permitiria, nesse sentido, a realização do desejo de pessoas comuns ao dar visibilidade aos enredos da vida e fazer as coisas “ficarem mais próximas” (Benjamin, 1994, p. 170). No caso do cinema, o simples fato de ser possível acessar uma produção sem a mediação de um crítico ou de um especialista, já cumpriria função política por princípio. No entanto, Benjamin adverte também para seus usos, compreendendo o cinema como ferramenta capaz de, na mesma medida, ser produzido de forma a anestesiar os sentidos, ou conduzi-los de acordo com interesses específicos de subalternização e controle.

A técnica assumiria, portanto, duplo sentido, do mesmo modo que traria contida em si a potência de emancipação, provocando uma sensível mudança na relação do povo com a arte, essa mesma técnica possibilitaria reificar os sujeitos, tornando-os dela dependentes, em diferentes contextos. A despeito da infinidade de discussões que essa reflexão nos abre, importa pensar aqui a diferença que Benjamin estabelece entre o ato de politizar a arte e o de estetizar a política - prática da qual lançavam mão efusivamente os regimes fascistas que se levantam na Europa enquanto o filósofo construía sua crítica. A mesma potência emancipatória guarda, portanto, como outro lado da moeda, a capacidade da manutenção das relações de exploração a partir de seu caráter anestesiante. De modo geral, o que Benjamin nos diz é que a técnica em si, no caso o cinema, não garante que as reflexões caras à sociedade e aos contextos sejam levantadas. São os seus usos, entretanto, que circunscrevem o que e como determinadas questões emergirão no interior da narrativa produzida.

É nessa perspectiva que se compreende o cinema como potência nesse artigo, entendendo que a intencionalidade presente no ato de produção da narrativa advoga quanto ao propósito que se quer atingir, em relação a quem o consome. No entanto, essa intencionalidade não garante como a recepção se dará, pensando que quem consome o filme também o transforma de acordo com as relações que cria com a realidade, no ato de fazer circular, sobre e a partir dele, múltiplos sentidos. Se é na criação de quem assina a autoria da obra que se decide se a guerra será romantizada ou denunciada como contexto de violação e segregação, é também nos modos de apropriação dessa criação que são construídas as reflexões que levam o cinema a transcender a dimensão da arte e transbordar para a vida. Há intencionalidade não apenas na escrita, direção e produção do filme, mas também em sua leitura, recepção e construção de sentidos.

Essa interconexão das dimensões de produção, produto e recepção de textos e discursos, contida numa obra, é evidenciada nos estudos do linguista Patrick Charaudeau (2006), que fala do desenrolar dos efeitos, diante das narrativas, que ultrapassam a intencionalidade presente no ato de produção, se constituindo também na relação com o que circula a partir da recepção desse produto. Embora se refira especificamente à narrativa jornalística, sua concepção discursiva ajuda a compreender a potência do cinema nessa circularidade de sentidos. Assim,

A distinção que propomos, entre os três lugares de construção do sentido, permite explicar a informação como algo que não corresponde apenas à intenção do produtor, nem apenas à do receptor, mas como resultado de uma co-intencionalidade que compreende os efeitos visados, os efeitos possíveis, e os efeitos produzidos. Esses três lugares se definem, portanto, cada um em relação aos demais como num jogo de espelhos em que as imagens incidem umas sobre as outras (CHARAUDEAU, 2006, p. 28).

Ainda que não seja possível prever os efeitos que determinada obra provocará no público, é importante atentar-se ao fato de que essa co-intencionalidade situa o público como consumidor e agente, no interior desse campo de embate discursivo. Nesse sentido, um filme ganha vida exatamente quando mexe, em alguma medida, com quem o assiste, ou seja, quando convida o consumidor a agir. É no intervalo entre o consumo e o ato que o cinema exerce sua potência, quando a experiência estética com as imagens se torna uma “ética da existência” (JOBIM E SOUZA, 2007, p. 02). O cinema cumpre, então, sua função de,

[...] exercitar o homem nas novas percepções e reações exigidas por um aparelho técnico cujo papel cresce cada vez mais em sua vida cotidiana. Fazer do gigantesco aparelho técnico do nosso tempo o objeto das inervações humanas - é essa a tarefa histórica cuja realização dá ao cinema o seu verdadeiro sentido (BENJAMIN, 1994, p. 188).

Essa mesma potência que constitui o cinema enquanto dimensão que mobiliza a partir do que afeta se expressa também na experiência da infância. E é na dialética que constrói com a vida adulta que a infância dá a ver sua potência, na medida em que chama atenção àquilo que vamos desaprendendo a ver, ou aprendendo a tornar invisível na vida adulta. Saint-Exupéry, escritor de “O Pequeno Príncipe”, conta que desistiu da sonhada carreira de pintor, para tornar-se piloto durante a Segunda Guerra Mundial, justamente por conta da incompreensão e do desencorajamento que recebeu dos adultos em relação a seus desenhos, quando criança. Para explicar o fato, Saint-Exupéry reproduz o desenho e a tentativa de redesenho que fez, na busca por tornar compreensível aos adultos o que queria apresentar durante sua infância.

SAINT-EXUPÉRY, 2008

Imagem 1 Isso não é um chapéu 

Na memória revelada por Saint-Exupéry é possível perceber a distância entre as percepções adultas e as infantis, como se o olhar adulto fosse incapaz de alcançar a perspectiva das crianças. É nesse sentido que Walter Benjamin (2012, p. 17) nos fala sobre o interesse das crianças pelos produtos residuais da cultura, onde “reconhecem o rosto que o mundo das coisas volta exatamente para elas e para elas unicamente”, e a partir dos quais abrem a possibilidade de formulação de uma crítica dessa mesma cultura, justamente por nos questionarem sobre os motivos pelos quais descartamos o que as atrai.

A criança que olha e enxerga é a alegoria para a compreensão dos modos como temos fitado a vida. Talvez por esse motivo é que Saint-Exupéry (2008, p. 08) narre o cansaço que sentia, quando criança, ao tentar mudar a percepção das “pessoas grandes”, que “não compreendem nada sozinhas”. Por esse motivo também é que, talvez, o autor tenha usado a infância como mecanismo de fuga à cruel realidade que vivia durante a Segunda Guerra Mundial. Compreender a infância em sua potência é ato que se efetiva nas relações que estabelecemos com as crianças à nossa volta, o que passa pelas discussões sobre as múltiplas concepções de infância que são construídas, sobretudo a partir do advento do capitalismo e do nascimento das ciências modernas.

Se antes a infância inexistia como categoria coletiva - especificamente para o mundo ocidental, branco e burguês -, a partir desse momento histórico ela passou a concentrar estudos, pesquisas e discussões que colocaram a criança no centro, demarcando suas particularidades (LACOMBE, 2004). Ao longo das décadas, novas abordagens foram responsáveis por chamar atenção à alteridade da infância, ou seja, à necessidade de enxergar as crianças no limiar entre a familiaridade, que nos permite uma aproximação pelo que dela conhecemos por já termos um dia integrado essa categoria; e o estranhamento, que demanda maior reflexão em relação ao que dela julgamos saber, na medida em que é uma categoria renovada constantemente pela chegada ininterrupta de novas crianças. É esse estranhamento, assumido como ato, que possibilita desconstruir idealizações sobre a infância para mergulhar em referências encarnadas, que situam as crianças como agentes, partícipes e fundantes da realidade social.

A arte para crianças Ela estava sentada numa cadeira alta, na frente de um prato de sopa que chegava à altura de seus olhos. Tinha o nariz enrugado e os dentes apertados e os braços cruzados. A mãe pediu ajuda: - Conta uma história pra ela, Onélio - pediu. - Conta, você que é escritor… E Onélio Jorge Cardoso, esgrimindo a colher de sopa, fez seu conto: - Era uma vez um passarinho que não queria comer a comidinha. O passarinho tinha o biquinho fechadinho, e a mamãezinha dizia: “Você vai ficar anãozinho, passarinho, se não comer a comidinha.” Mas o passarinho não ouvia a mamãezinha e não abria o biquinho. E então a menina interrompeu: - Que passarinho de merdinha - opinou. (GALEANO, 1995)

É importante ponderar que essa infância, constituída por crianças reais, possui também seus recortes de classe, raça, gênero, geração, religião etc., o que significa reafirmar a pluralidade de experiências que a demarcam, bem como o fato de pertencerem à sociedade e se constituírem também em suas contradições, não sendo uma comunidade isolada (BENJAMIN, 2009, p. 94). O exercício de potência e a capacidade de afetamento que a infância carrega consigo só serão concretizadas se em voga estiver uma concepção de infância que enxergue seu lugar de autoria no mundo. Para isso, deve-se compreender que as crianças de hoje são as únicas capazes de nos aproximar do olhar de uma infância contemporânea, pois elas são os sujeitos que dão sentido, vida e significado a essa categoria no presente. O alcance dessa perspectiva não está dado, pois uma ideia de infância existe em dependência com quem a cria e a adota para si como postura ética. Esse é um caminho por ser trilhado diariamente e nas microrrelações. Enxergar a infância como experiência, potência e de forma sensível demanda diálogo constante e para esse diálogo o cinema pode contribuir.

O filósofo Aristóteles (2002) formula, a partir de Heráclito e Parmênides, uma distinção entre ato e potência. Para ele, o ato seria a realização e a potência a possibilidade de transformação. Sendo modos de existir divergentes, importa considerar que é o ato que concretiza a potência. Isso porque a potência sem o ato inviabiliza a transformação e, da mesma forma, o ato sem a potência impossibilita a transformação. Buscar unir, portanto, as dimensões do cinema e da infância é um ato que tem por objetivo concretizar sua potência de construção de novos sentidos a partir de diferentes perspectivas, visando fertilizar mutuamente os campos da arte, da ciência e da vida.

Alma: a potência em ato

O dicionário Aurélio1 traz 27 significados para a palavra alma. Dentre elas: “parte imortal do ser humano”, “pessoa, indivíduo”, “vida”, “consciência”, “espírito”, “ente querido”, “alma penada: a que vagueia penando pelo mundo”. No dicionário Michaelis,2 além desses, encontramos ainda: “assombração, fantasma, visagem”. Todas essas significações se misturam às sensações propiciadas pelo curta e somam, com ele, reflexões.

Cena 1

ALMA, 2005

Imagem 2 Os olhos da Alma 

Respiro profundamente. Abro os olhos e a luz vai me roubando da escuridão e adentrando pela porta da casa de dois cômodos em que vivo. Estou deitada na cama e desse ângulo enxergo o mundo de lado. Vejo vó lavando o rosto e observo até que ela saia de casa. Respiro fundo e decido me levantar. Agora passo a enxergar o mundo de pé e de frente. Ando até a mesa na qual repousa a bacia d’água usada por vó. Nela lavo minhas mãos e meu rosto. Em um fragmento de espelho quebrado que se encontra ao lado de um pente de cabelos sobre a mesa, vejo meu próprio reflexo, distorcido pelas ranhuras provocadas por uma possível queda. O estranhamento toma conta de mim,

Quem é você? Você é eu. Eu sou você. Oxe, eu sou eu. (ALMA, 00:01:07’, 2005)

Assim começa a narrativa de um dia na vida da menina Alma. No filme, somos a menina. A câmera nos coloca em seu lugar. Vemos através das janelas da Alma, através de seus olhos. Essa perspectiva nos permite, nesse momento, ver as mãos sendo lavadas como se quem as lavasse fôssemos nós. Enquanto se olha no fragmento rachado de espelho, a menina começa a se indagar sobre quem é e sobre o que significa sua existência. Em momento algum o reflexo distorcido da menina sugere que ela esteja verbalizando essas questões, pois o que vemos é Alma se olhando e o que ouvimos é sua respiração ritmada com constância. Tudo indica que a menina está pensando e se perguntando.

Mas, o que é ser uma pessoa? Ser uma pessoa é existir, né? É tão estranho a gente sentir que existe. [...] Como que a pessoa sente que deixou de existir? Será que se existe depois que se deixa de existir? (ALMA, 00:01:44’; 00:03:58’, 2005)

A pergunta funda um acontecimento, na medida em que convoca o movimento rumo ao desconhecido. Sob esse aspecto, a pergunta emerge como abertura, um passo em direção ao campo das infinitas possibilidades. É a pergunta que permite pensar e repensar o que supomos dado ou estabilizado, ampliando e diversificando a compreensão do mundo; mas é ela também que viabiliza pensar o ainda não pensado, transformando o horizonte de expectativas do sabido e borrando as fronteiras entre o conhecido e o desconhecido, tornando mutuamente um no outro.

A partir da pergunta, o filósofo Sócrates mobilizava uma verdadeira revolução. Era por meio do “conhece-te a ti mesmo” que ele invocava a pergunta como busca e o ato em direção às descobertas como motor não só de autoconhecimento, mas do conhecimento sobre o mundo. O humano é sua própria pergunta, na medida em que seu nascimento e sua morte são perguntas centrais de sua existência, acompanhadas das que indagam também, constantemente, sobre quem se é. Nesse sentido, o homem “vale sua pergunta” (MURARO, 2015, p. 08),

Vale no sentido “do que pode”, da potencialidade, do poder de sua liberdade. Vale no sentido do seu direito, vale no sentido da sua dignidade, vale no sentido de vida, no sentido de vale a pena. [...] A pergunta é o poder, a força do humano. A pergunta é a correnteza do rio, o broto da semente, o raio / relâmpago da tempestade, a chuva irrigando o chão, a comida para o corpo, o quebrar da casca do ovo por dentro, o aguilhão da abelha, a mordida da fera, o fogo de Prometeu, o fio de Ariadne, a força do arremesso de sua pedra, flecha lançada em direção ao alvo da vida (MURARO, 2015, p. 08).

Às perguntas da menina Alma, Bakhtin (2010) talvez respondesse que somos porque o outro nos vê, nos narra. Descartes (1996), por sua vez, provavelmente responderia que se há capacidade de duvidarmos de algo, nesse caso da própria existência, então a dúvida, a pergunta em si, bastaria para atestar que existimos, uma vez que pensamos. E o ato de duvidar, até mesmo de que existimos, seria a única coisa da qual não se poderia duvidar.

Ô vó, é bom a gente existir? A gente existir não é bom? E se todo mundo deixasse de existir? Como é que ia ser? E se a senhora deixasse de existir agora? (ALMA, 00:02:53’, 2005)

Nesse recorte do curta, pelos olhos de Alma, vemos a avó de cima. Pode ser que estejamos em uma árvore, mas isso não está claro. Nessa cena, vó aparece molhando a terra que está sobre um pano. Essa terra, transformada agora em barro, servirá de base para um vaso que, no decorrer do filme, vemos vó moldando com as mãos. Às perguntas de Alma, vó parece indiferente. Não há sequer uma troca de olhares, nada que sugira que as duas estão em interação naquele momento, a não ser a fala que a menina lhe dirige. À sua busca por relação, vó responde com um silêncio ensurdecedor.

Cena 2

O povo diz que o espírito da gente vai pro céu ou pro inferno, ou se não, fica vagando feito alma penada por aí. Vó, eu sou uma alma penada? Com esse nome de Alma, eu só posso ser uma alma penada. E eu vivo vagando por aí... (ALMA, 00:04:06’; 00:04:27’, 2005)

Essa parte do filme é envolta em cenas bastante misteriosas. Sob a perspectiva de Alma, parecemos flutuar em direção à vó para perguntar-lhe. Vó, por sua vez, segue em silêncio, olhando fixamente para frente enquanto, com as mãos, dá forma ao vaso de barro. Quanto ao questionamento da menina, no estranhamento de si, ela recorre ao outro que narra sua existência desde sempre. Ao silêncio de vó, que também comunica no não-dito, ou não respondido, a menina deduz ser uma alma penada, pois tudo o que conhece através do “povo” sobre almas penadas se encaixa exatamente com o modo de vida que leva cotidianamente. Aqui outra leitura começa a se tornar possível. Será que Alma é alma mesmo?

Na cena que se segue, a menina observa de longe enquanto a vó cobre com um lençol algo que queima numa espécie de forno improvisado com pedras. Podemos pensar que o forno está sendo usado como parte da confecção do vaso de barro. Por outro lado, o tamanho do forno e a postura ritualística que marca as ações de vó abrem a possibilidade para pensar que talvez o forno esteja sendo usado na cremação de um corpo. Novamente surge a pergunta: será que Alma é alma mesmo?

ALMA, 2005

Imagem 3 A resposta de vó 

O único momento do filme em que há diálogo entre a menina e a vó é quando as duas estão indo de burro a algum lugar que não é explicitado. Essa cena é marcada por mistérios: em momento algum a vó olha para Alma; em momento algum parece que a vó está verbalizando aquilo que no filme se ouve como um diálogo - é quase como se ela estivesse se lembrando de uma conversa com a menina; Alma parece estar ao lado da vó, mas onde? No burro em que está a vó há lugar para que outra criança se sente, mas ali a menina não está, pois vemos o corpo inteiro do animal. Não há um segundo burro na cena e não parece que a menina está caminhando. Estaria Alma acompanhando a vó ou a alma de Alma é que a acompanharia?

Se há muitas dúvidas que pairam nessa cena, pelo menos uma certeza extraímos dela: provavelmente em decorrência de uma catarata não tratada, devido à situação paupérrima que marca sua vida e, pelo que podemos arriscar, toda a sua história, vó é cega. Em determinado momento ela diz: “tentando ver assim de hoje, com a pouca luz que eu vejo, antes parecia mais longe o horizonte” (ALMA, 00:06:42’, 2005). Essa fala pode ser lida na perspectiva de que, no passado, vó enxergava. Após esse diálogo, que não se sabe se pertence ao presente ou se é uma memória, vemos vó seguir o caminho em cima do burro. Com Alma ficamos parados observando vó se distanciar.

A princípio parece que a menina está no chão, olhando as pedras que compõem a estrada. Se repararmos na cena, Alma está muito próxima das pedras para estar de pé, mas ela também não pode estar sentada no chão, pois a imagem se move como quem estivesse andando. Ao longe ela vê a silhueta do burro e de vó. Não fica claro o que vó está fazendo ao lado do burro e de costas para a menina. Essa cena é marcada pelo refrão da cantiga que Alma repete constantemente: “O anel que tu me destes era vidro e se quebrou, o amor que tu me tinhas era pouco e se acabou” (ALMA, 00:06:58’, 2005).

A seguir, a imagem muda. Estamos agora em cima do burro e vó está caminhando na frente, puxando-o pela rédea. Lembrando que vemos o filme pela perspectiva da menina, olhamos para baixo e vemos uma espécie de lençol branco no qual parece que estamos enrolados. Esse lençol está sujo de sangue. Por que a menina sairia com a vó enrolada em um lençol branco? Por que esse lençol estaria sujo de sangue? Será que Alma está vivendo sua menarca? Ou será que Alma é alma mesmo e começa agora a ter consciência da morte de seu corpo?

O fragmento do curta narrado acima possibilita pensar a questão do entrelaçamento que une as pessoas na caminhada de autoconhecimento que é a vida, o que tem ligação direta com nosso grau de abertura para o diálogo com o outro. Ser ou não ser é uma questão de relação, interação, narrativa e construção. Nesse processo, Jobim e Souza e Albuquerque (2013, p. 113) destacam três momentos da tomada de consciência do sujeito a partir dos encontros com o outro,

Podemos destacar três momentos da tomada de consciência do sujeito que se revelam no encontro na vida: o outro para mim; eu para o outro; eu para mim mesmo. Vale dizer que esses momentos não se evidenciam de forma estanque, mas são revelados simultaneamente no modo como o diálogo na vida vai se constituindo.

Há algo que sou para mim, como me reconheço, como me enuncio para o outro, que acabamentos construo sobre mim na vitrine das relações humanas. O que sou para mim quase sempre é diferente daquilo que o outro constrói de mim em seu íntimo. Esse algo que o outro constrói sobre mim nasce do modo como ele me enxerga e como me enuncia; como a mim narra. Em contrapartida, há também a dimensão de quem é esse outro na minha construção, no modo como o enuncio, como o enxergo e como dele falo. Somos, portanto, muitos e só o somos na e em relação com o outro.

Talvez a dificuldade de Alma no dia em que a acompanhamos no filme se encontre justamente na falta de resposta do outro, que é sua avó. O tempo todo a menina se questiona sobre sua existência, muitas vezes em pensamento, mas em alguns momentos do filme esse questionamento se transforma em perguntas intencionalmente endereçadas à vó, que age aparentemente com indiferença e se mantém em silêncio. Como já arriscamos, é possível que Alma esteja vivendo um processo de passagem para outra forma de existência - que pela ótica da religião, da fé e do misticismo se torna possível. Essa leitura ganha ainda mais sentido porque, ao término do filme, quando os créditos são exibidos, Alma é chamada pelo nome diversas vezes por uma voz que não parece ser de sua vó. “Alma... Alma... Alma...”.

Como nos diz Bakhtin (2010, p. 49), não nos suspendemos pelos próprios cabelos, o que significa admitir que chegamos ao mundo já com determinado acabamento postulado pelo outro, uma vez que mesmo na barriga da mãe, nos estamos em interação. Então, chegamos ao mundo narrados como filhos, irmãos, bebês e o que mais em nossas relações for construído. Tomamos consciência desses acabamentos todos também por meio da interação e do que nos narram sobre nós. Quando o outro deixa de nos narrar, como acontece com Alma no curta, quando ele deixa de responder às nossas inquietudes existenciais, que são da ordem da vida e não somente da infância, uma grande confusão se instala, pois passa a faltar ao eu a parcela do outro.

É claro que nem sempre os acabamentos construídos pelo outro serão passíveis de meu reconhecimento enquanto eu. Esse fato está diretamente relacionado à impossibilidade de nos enxergarmos como o outro nos enxerga. Sempre nos olhamos de dentro. Esse é o principal limite do imbricamento entre a visão do outro sobre mim e a minha visão sobre mim mesmo. Há deslocamento e um esforço na tentativa de me compreender sob o ponto de vista do outro, mas apesar disso, eu continuo sendo eu e o outro continua sendo ele mesmo. Ainda assim, somos pelo outro, pelo seu olhar e pela sua narrativa, em composição com a nossa própria.

Às vezes eu me acho tão troncha... Vó sempre fala que eu custei a nascer, que eu não queria sair pro mundo. Será que eu sou troncha por causa disso? Era tão bom se a gente pudesse escolher. A gente não pode nem escolher se quer ser uma pessoa ou outra. (ALMA, 00:01:19’, 2005)

A interdependência que marca essa relação entre eu e o outro impossibilita a escolha. Não podemos decidir quem seremos para o outro. Paradoxalmente, partilhamos da responsabilidade pela construção do outro sobre nós. Somos algo para nós mesmos, ou seja, há um acabamento que construímos sobre nós, um acabamento que funciona como uma vitrine para que o outro possa nos olhar da maneira como desejamos ser vistos. Esse acabamento é construído para servir como uma espécie de portfólio, pois fala de nós, segundo nós mesmos e segundo o modo como enxergamos nossa existência.

Por outro lado, como pintura, a imagem construída pelo outro ganha a cor que o outro escolher para nós. Essa cor, de certo, será constituída de diversas tonalidades do que oferecemos em nosso portfólio, do que expusemos em nossa vitrine. Mas o resultado final será sempre algo totalmente novo, pois cada um que passa por nós constrói uma nova maneira de nos enxergar, uma nova forma de sermos vistos, um novo acabamento sobre nós que passamos a (re)conhecer, ainda que esse acabamento seja sempre provisório e variável.

Talvez por esse motivo Alma esteja em confusão. Para a avó, talvez a menina não seja mais que uma alma agora. Entretanto, para ela mesma, isso ainda não está claro. Alma, ao que tudo indica, vai tomando consciência de sua nova condição a partir da relação com a vó - ou da falta dela que, ainda assim, é uma forma de relação. A ausência de relação é, por si, uma maneira de se relacionar com o outro que diz sobre nós mesmos. Isso é interessante porque, pensando bem, se a vó é o outro de Alma, Alma é o outro da avó. Isso significa que se há ausência de respostas por parte da vó às perguntas da menina, pode ser mesmo porque há ausência de Alma na vida de vó, que agora vive sozinha. Essa perspectiva implica considerar também a experiência dessa avó, pois quando morre alguém, morre com ela um modo singular de sermos vistos e narrados, um acabamento específico cuja existência dependia da relação única e exclusiva com aquela pessoa que se foi. Com ela, vai-se um pouco de nós.

Cena 3

Murchou... Fechou a flor... A cor... Acabou tudo? (ALMA, 00:08:19’, 2005)

Abro os olhos e, mais uma vez, estou deitada. Dessa perspectiva vejo vó sentada, aparentemente rezando ao pé da cama. Um ruído que não consigo compreender chama atenção de vó, que ergue a cabeça como quem tenta escutar algo. Na sequência, já fora de casa, vemos a menina pela primeira vez na perspectiva da terceira pessoa. Até então, o filme todo tinha sido assistido pelo espectador do ponto de vista da menina. Agora, no entanto, já não somos mais Alma... A vemos de costas, nua, com os cabelos molhados e aparentemente sujos de barro. É uma cena poética e ao mesmo tempo assustadora. Ela caminha e, embora pareça que a deixamos ir, a perspectiva do filme volta a dar a sensação de que estamos olhando através dos olhos de alguém. Ouvimos a voz de Alma que se pergunta,

Mas será que tudo que existe tem que ter começo e fim? Onde começa e termina tudo? Hoje eu tô numa confusão... (Alma, 00:08:38’, 2005)

Sim. Ainda estamos no lugar de quem, através da objetiva, assume o olhar de outra pessoa. A câmera desfoca de Alma, que distante desaparece da cena, e desce vagarosamente fazendo com que tenhamos a sensação de estarmos voltando nossos olhos para baixo. Vemos, então, nossas próprias mãos cheias de barro. A essa altura, uma segunda certeza: ainda somos a própria menina, ainda estamos olhando pelas janelas da Alma.

ALMA, 2005

Imagem 4 Lama e caos 

Confusão

Embora o curta “Alma” não explicite a situação vivida pela criança, ele oferece pistas para a compreensão de que o dia que acompanhamos em tela é um dia atípico, levando a menina a afirmar reiteradamente: “hoje eu tô numa confusão...”. Seguindo essas pistas, foi possível levantar, nesse texto, pelo menos duas leituras: a primeira diz respeito à necessidade do outro no processo de constituição do eu, considerando que os acabamentos criados nessa relação são de inteira responsabilidade dos sujeitos envolvidos, o que significa comprometimento mútuo. Respondo pelo que construo do outro, da mesma forma que ele responde pelo que constrói de mim. Eu e o outro nos apresentamos, nos relacionamos, nos questionamos, nos devolvemos, nos estranhamos, nos (re)conhecemos... Um processo que não tem fim.

A segunda leitura traçada nesse texto dá ênfase ao debate levantado pela protagonista do curta a partir de elementos que colocam em dúvida sua própria existência. São as perguntas formuladas por ela, ao longo da narrativa, que guiam essa leitura. Afinal, Alma está viva ou morreu e sua alma está procurando o caminho a seguir? As duas velas que aparecem na mesinha de canto dentro da casa são velas que simbolizam duas mortes - a da mãe, que nunca aparece na narrativa, e a da menina - ou elas estão acesas com a finalidade de iluminar o ambiente? Quem é a família que aparece na foto que fica acima dessa mesinha? A menina diz que “deita por cima de vó”, que sentido tem essa afirmação quando aludimos que ela pode ser uma alma? O sangue que a menina lava da perna simboliza a consciência de sua morte ou a passagem da menina para a puberdade?

As reflexões que se abrem como possibilidade com a história de Alma permitem conectar diferentes experiências de infância justamente a partir da dimensão da pergunta, ato de liberdade do pensamento, a pergunta que provoca o que se quer dado, que cria desestabilidades ao inserir a perspectiva dos “e ses” como potência de produção da novidade no mundo, da qual nos fala Hannah Arendt (2005, p. 217) ao trazer da ideia de nascimento como precursora de novos começos, a chegada da criança como “milagre”. No lugar de respostas, mais perguntas: quem é que diz o que é assunto de criança? Vida, morte, almas... Quem é que sabe como a criança se sente diante de sua própria existência? Quem é que se dá à experiência de lhe perguntar? Ou de lhe ouvir dizer? Se não considero a criança sujeito na produção da cultura, se entendo que o que ela pensa, pergunta e diz não faz diferença para mim ou para o mundo, reafirmo seu lugar café com leite, uma inserção no jogo discursivo sem pertencimento, uma posição desconsiderada. Que relação pode existir de um encontro que já nasce marcado pela desconsideração? Vale lembrar que as perguntas que Alma se faz são questões da humanidade de maneira geral, e que, portanto, tocam às crianças tanto quanto aos adultos, uma vez que ambos participam da constituição da cultura, da história e da vida.

Como seres em incompletude que somos, é preciso criar pontes que viabilizem o diálogo com o outro, pois essa relação nos põe diante de nós mesmos, devolvendo-nos à nossa consciência, e também diante do mundo, nos convocando a formular perguntas, construir indagações e apresentar questões, exteriorizando o que pensamos dentro de nossa cabeça. A interseção de cinema e infância convida a esse diálogo, confirmando sua potência na encruzilhada onde arte e vida se encontram - e fertilizam o campo da ciência com as reflexões caras à dinâmica da experiência humana. No entanto, como nos adverte Aristóteles (2002), é o ato que concretiza a potência, sendo necessário assumir a responsabilidade pelo diálogo que com essas dimensões estabelecemos.

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Alma . Direção, Produção e Roteiro: André Morais. Co-Produção: Universidade Federal da Paraíba e Ctav/Funarte. Elenco: Luana Emília e Zezita Matos. Fotografia: João Carlos Beltrão. Direção de Arte: Petra Ramalho. Assistente de Direção: Alex Camilo. Assistente de Câmera: Bruno Salles. Assistente de Arte: Thiago Nóbrega. Elétrica e Maquinaria: Lúcio César. Montagem: André Morais e Karen Barros. Edição de Som: Nisélio Garcia. Maquiagem: William Muniz. Platô: Seu Lula. Filmado na cidade de Cuité/PB em Janeiro de 2004. Duração: 00:09:53. Ficção. 2005. Disponível em: Disponível em: < https://vimeo.com/620262739> . Acesso em: 29 nov. 2022. [ Links ]

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Recebido: 16 de Fevereiro de 2022; Aceito: 03 de Dezembro de 2022

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