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Childhood & Philosophy

versión impresa ISSN 2525-5061versión On-line ISSN 1984-5987

child.philo vol.19  Rio de Janeiro ene./dic. 2023  Epub 20-Mar-2023

https://doi.org/10.12957/childphilo.2023.72948 

Artigos

Tornar-se calunga: participação e subjetivação política de crianças e jovens

Participación y subjetivación política de niños y jóvenes calungas

Participation and political subjectivation of calunga children and young people

josé eduardo gama noronhaI 
http://orcid.org/0000-0002-5718-7000

gabriela tebetII 
http://orcid.org/0000-0002-2786-5907

IUniversidade Estadual de Campinas, Campinas, Brasil - Email: jozeduardo@gmail.com

IIUniversidade Estadual de Campinas, Campinas, Brasil - Email: gabigt@unicamp.br


resumo

O artigo pretende discutir processos de subjetivação política de crianças e jovens a partir de recortes de uma pesquisa realizada no âmbito de mestrado em educação, apresentando uma cartografia da participação política de crianças e jovens moradoras de territórios vulnerabilizados do município de São Vicente, no litoral Sul de São Paulo, integrantes de coletivos e ações educativas do Instituto Camará Calunga. Os conceitos de participação e subjetivação se apresentam como elementos importantes dos processos de politização, retratando o modo pelo qual crianças e jovens se engajam politicamente de diferentes formas, coordenadas ou apoiadas por adultos, representando a si mesmas ou apoiando os adultos em suas demandas, contrapondo a noção de que as crianças não agem politicamente ou de que o modo ideal de participação de crianças e jovens seria a produção de consenso e não haveria espaço para a contestação. A pesquisa ocorreu em meio a pandemia de COVID-19, fundamentalmente de modo virtual, mas traça uma continuidade com as práticas de participação do Instituto no período pré-pandêmico. A pesquisa fez uso do método cartográfico, de modo virtual e presencial no contexto do trabalho vivo, da convivência cotidiana com crianças, jovens e educadores do Camará, por meio de entrevistas semiestruturadas e diários de campo.

palavras-chave: participação; infâncias; juventudes; subjetivação; educação

abstract

The article intends to discuss processes of political subjectivation of children and young people based on excerpts from a research carried out within the scope of a master's degree in education, presenting a cartography of the political participation of children and young people living in vulnerable territories of the municipality of São Vicente, on the south coast from São Paulo, members of collectives and educational actions of the Instituto Camará Calunga. The concepts of mobilization and subjectivation are presented as important elements of politicization processes, portraying the way in which children and young people engage politically in different ways, coordinated or supported by adults, representing themselves or supporting adults in their demands, opposing the notion that children do not act politically or that the ideal way for children and young people to participate would be to produce consensus and there would be no room for contestation. The research took place in the midst of the COVID-19 pandemic, essentially in a virtual way, but it traces a continuity with the Institute's participation practices in the pre-pandemic period. The research made use of the cartographic method, in a virtual and face-to-face way, in the context of live work, of daily living with children, young people and educators from Camará, through semi-structured interviews and field diaries.

keywords: participation; childhood; youth; subjectivation; education

resumen

El artículo pretende discutir procesos de subjetivación política de niños y jóvenes a partir de extractos de una investigación realizada en el ámbito de una maestría en educación, presentando una cartografía de la participación política de niños y jóvenes que viven en territorios vulnerables de la municipio de São Vicente, en la costa sur de São Paulo, integrantes de colectivos y acciones educativas del Instituto Camará Calunga. Los conceptos de movilización y subjetivación se presentan como elementos importantes de los procesos de politización, retratando la forma en que los niños y jóvenes se involucran políticamente de diferentes maneras, coordinados o apoyados por adultos, representándose o apoyando a los adultos en sus demandas, contraponiéndose a la noción de que los niños no actuar políticamente o que la forma ideal de participación de los niños y jóvenes sería generar consenso y no habría espacio para la contestación. La investigación se desarrolló en medio de la pandemia de la COVID-19, esencialmente de manera virtual, pero traza una continuidad con las prácticas de participación del Instituto en el período prepandemia. La investigación hizo uso del método cartográfico, de forma virtual y presencial, en el contexto del trabajo vivo, de la convivencia con niños, jóvenes y educadores de Camará, a través de entrevistas semiestructuradas y diarios de campo.

palabras clave: participación; infância; juventud; subjetivación; educación

tornar-se calunga: participação e subjetivação política de crianças e jovens

introdução

O presente trabalho se baseia em pesquisa realizada no âmbito de mestrado por um dos autores pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Unicamp, cujo intuito foi acompanhar ações formativas do Instituto Camará Calunga, organização da sociedade civil de São Vicente, cidade do litoral sul de São Paulo, e cartografar processos de participação, educação e subjetivação política de crianças e jovens.

Quando decidimos enveredar pelas trilhas da participação das infâncias e juventudes, faz-se necessário relembrarmos que desde a conquista do Estatuto da Criança e do Adolescentes (ECA) (Brasil, 1990), crianças, adolescentes e jovens ganham novo estatuto jurídico como sujeitos de direito, agora resguardados por uma perspectiva de proteção integral, inédita no contexto do país e que as assegura, pelo menos do ponto de vista legal, “todas as oportunidades e facilidades” (Brasil, 1990), reconhecendo-as como cidadãos e que deveriam participar das questões públicas e políticas que lhe dizem respeito.

De todo modo, como nos indica Castro (2013, p. 92),

Concedidos por seus representantes, [...] os direitos das crianças não propiciaram um entendimento claro, do ponto de vista das próprias crianças, sobre quais eram as opressões as quais estavam submetidas, e em que direções gostariam de ver tais relações transformadas.

No contexto pós-ECA, portanto, ainda não fomos capazes de superar uma interpretação liberal da condição de sujeito de direitos de crianças e jovens que ainda os mantém em xeque, na medida em que a leitura jurídica majoritária compreende que

[...] não existe plena capacidade jurídica para a criança e o adolescente, que não exercem, portanto, plenamente, todos os direitos de que são formalmente titulares, a “expressão ‘sujeitos de direito’ deve ser entendida com algumas ressalvas” (Cappi, 2003, p. 167-168).

Essa interpretação foi condicionada pela expressão “pessoas humanas em processo de desenvolvimento” (Brasil, 1990), contida no artigo quinze do Estatuto. A participação política de crianças e jovens, assim, tem se pautado principalmente pela produção de consenso e cooptação neoliberal, rejeitando as dimensões contestatórias e inventivas destas etapas geracionais (Gallo, 2015; Souza, 2008).

No entanto, existem processos, por vezes intensos, mas curtos, como as ocupações de escolas pelos secundaristas (Catini, 2016), por vezes contínuos, como o Movimento dos Sem Terrinha (Ramos; Aquino, 2019), que reintroduzem uma perspectiva crítica e contestatória nos processos de subjetivação de crianças e jovens e afirmam a capacidade autogestionária das crianças e jovens ou a força política intergeracional das práticas participativas de adultos com crianças e jovens. As organizações da sociedade civil (OSCs), que tiveram um importante papel na construção desse novo modo de compreender a infância e a juventude introduzido pelo ECA e em processos críticos de participação política hoje vivem essa dupla função de fomentar ações educativas sob o crivo do fortalecimento da cidadania que transitam entre os dois pólos (Benelli, 2014).

Isso situado, de que forma as OSCs, no contexto atual, podem contribuir para a promoção de processos de participação política que contemplem as expressões e singularidades de crianças e jovens e que não se pautem pela produção de consenso e alienação política, apesar de todas as dificuldades que possuem em se sustentar financeiramente e ideologicamente?

A partir da convivência cotidiana com crianças e jovens em defesa de seus direitos e em processos de pesquisa e construção de conhecimento por meio de experiências referências em educação política promovidas pelo Instituto Camará Calunga, serão esboçados alguns elementos que compõem os processos de subjetivação política a partir da participação e mobilização.

Esses processos acompanhados pelos pesquisadores acontecem em espaços educativos do Instituto, que podem se dar entre quatro paredes, em videoconferências virtuais ou em movimento (literal e figurativo) de si e de outros em torno de temas associados à política, que envolvem a participação em eventos como protestos, manifestações, desfiles, ou intercâmbios com outros coletivos que tem como pauta a defesa de direitos humanos, mas também a partir de encontros menores e cotidianos entre sujeitos e pela circulação e ocupação da cidade.

De algum modo, tentaremos confrontar, com a discussão aqui apresentada, a afirmação de Qvortrup (2010, p. 791) de que a ‘’ideia de ‘crianças como sujeitos políticos’ continua sendo no presente, como fora no passado, um conto de fadas’’.

notas metodológicas

A cartografia foi o método que orientou a pesquisa, pois trabalha a partir do desenho de uma ‘’rede de forças à qual o objeto ou fenômeno em questão se encontra conectado’’ (Barros; Kastrup, 2009, p. 57). Abertura, relação, disponibilidade e imersão marcam a postura de aproximação aos acontecimentos nos territórios e nas experiências vividas por aqueles que se buscam acompanhar (Rosa, 2017). Para isso, foi importante ter um lastro de convivência e vinculação com os participantes da e a instituição da pesquisa, pois possibilitou que a transição para as ações virtuais no período da pandemia de COVID-19 não sofressem de um certo distanciamento característico das videochamadas, já que a pesquisa foi realizada quase em sua totalidade de modo virtual.

Esse tipo de postura cartográfica tem aproximações com os conformes dos Estudos da Infância contemporâneos, que indicam que para que se fortaleça a participação de crianças e jovens na produção de conhecimento e na problematização da relação pesquisador (adulto) - participante (criança. jovem) se utilizem métodos de pesquisa que respeitem suas falas, silêncios e gestos (Spyrou, 2018), bem como a necessidade de nos afastar de uma concepção cristalizada de sujeito ou de um sujeito fundado na falta e acompanhar os processos que os formam e transformam (Barros & Kastrup, 2009; Prout, 2004). Deste modo, sempre que possível, apresentaremos citações diretas de crianças e jovens entrevistadas, de modo que nossas reflexões possam se apoiar e serem complementadas por elas (Fernandes, 2020).

Para produzir os dados da pesquisa participamos de grupos que aconteciam cotidianamente no Camará, como grupos de estudo, convivência e assembleias comunitárias em três territórios de São Vicente. Importante destacar que o Instituto Camará Calunga, realiza há 25 anos ações de promoção e defesa dos direitos humanos no Litoral sul de São Paulo, com ações educativas, cuidado em saúde, assistência social e mobilização comunitária. Também fizemos uso de materiais do Instituto de períodos pré-pandêmico para apresentar e comparar o processo de participação política antes e durante a pandemia. Para a coleta de dados, foram utilizadas quatro ferramentas: documentos internos do Instituto (como relatórios e diários dos educadores), diário de campo, entrevistas semiestruturadas e uma análise grupal dos resultados parciais com os participantes da pesquisa. Os diários de campo foram escritos no período de setembro de 2020 a julho de 2021. Após acompanhamento das ações, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com três crianças (entre 10 e 11 anos), três jovens (entre 17 e 18 anos) e três educadoras do Instituto. Do total de participantes entrevistados, cinco se autodeclaram pretas, duas pardas, duas brancas, sete do gênero feminino, um do gênero masculino e um participante não-binário.

A análise dos dados seguiu as pistas levantadas por Barros e Barros (2013), no sentido de levantar problematizações acerca dos processos de subjetivação acompanhados e deste modo, tentar criar novas análises e outros problemas que talvez não estivessem sido considerados pelos Estudos da infância, em especial no atravessamento entre política, infância e juventude. Outros analisadores, como o território e as relações escolares/educativas, também emergiram como problemas importantes, no entanto, trataremos mais da participação de crianças e adolescentes em eventos tipicamente considerados políticos e como contribuem para a subjetivação política destas no presente artigo.

dispositivos calungas de participação e subjetivação política

No decorrer da pesquisa, se destacaram três ações que consideramos serem mais significativas relativas à participação política de crianças e jovens, sendo essas: Assembleias, EURECA e Manifestações. Iremos discuti-las adiante.

Mas antes, e os Calungas, quem são?

Calunga, em São Vicente, é aquele que nasce na cidade, designação nem sempre reconhecida pelos moradores, pois passou a ter conotação pejorativa, com a suposição de que a palavra significa rato. Assim, oficialmente, aquele que nasce ou mora em São Vicente passa a se denominar vicentino.

Trata-se, ao nosso ver, de um embate entre uma perspectiva libertadora contra uma colonial, já que Rodrigues (2019, p. 3) indica que para os africanos escravizados ‘’‘calunga grande’ era o mar que atravessavam, e ‘calunga pequeno’ era a terra que iriam chegar. São Vicente/SP era o ‘calunga pequeno’ para os africanos”.

Para nós, a Kalunga é uma força vital representada pelo oceano (Lopes, 2005), que em tempos antigos era impossível de ser atravessado pelos povos africanos, portanto, encarnava o mistério da morte. São Bernardo (2018, p. 33) destaca a força da representação de Kalunga como travessia de uma linha no horizonte, retomando suas origens junto aos Bacongos, pois para estes, a linha marca a necessidade de ‘’atravessar a linha do grande oceano se quiser reencontrar o seu destino e o da sua comunidade’’.

Selene (1992, p. 92) apresenta diversos significados a palavra kalunga, dentre eles que ela é o plural de malungo(a), utilizada pelos escravizados, sendo

possível que nlungu/ulungu (em kikongo) e ulungu (em kimbundu) sejam derivados da mesma raiz que kalunga, também por metonímia (isto é, que de “rio/mar” tenha-se chegado a “canoa”). Seja como for, para escravos falantes desses três idiomas, ou para povos que compartilhavam sua cultura, “malungo” não teria significado apenas “meu barco”, e por extensão “camarada da mesma embarcação”, mas forçosamente também “companheiro na travessia de kalunga”. Ora, acontece que kalunga também significava a linha divisória, ou a “superfície”, que separava o mundo dos vivos daquele dos mortos; portanto, atravessar kalunga [...] significava “morrer”, se a pessoa vinha da vida, ou “renascer”, se o movimento era no outro sentido.

Desse modo, os calungas carregam consigo uma história de travessias marcadas pelo sofrimento, mas também pelas resistências e camaradagem diante do desconhecido. Por isso optamos por chamar aqueles que nascem e vivem em São Vicente, bem como aqueles que passam pelas experiências do Camará, de calungas. Como indica Rodrigues (2019, p. 3), se referir as pessoas como “calunga” ao realizar uma pesquisa com essas crianças e jovens é uma escolha ético-política que tenta fazer com que a história da escravidão e seus desdobramentos não sejam esquecidos. Quando falarmos em subjetivações calungas, portanto, nos colocaremos ao lado desses processos limiares, de travessia, estaremos situados entre mares e rios (e nestes também), buscando transitar por um lugar incerto, mas, fundamentalmente, em busca de vida.

assembleias comunitárias ou assembleias de presenças

As assembleias comunitárias se mostraram como o espaço mais importante do Camará sejam estas realizadas em territórios nos quais já existam ações e vínculos comunitários entre os educadores do Instituto, os moradores e outras organizações locais, de modo presencial ou virtual. Destaca-se que são raros os estudos na literatura sobre assembleias com a participação de crianças e jovens, com sua presença geralmente relegada à escola ou a espaços alternativos de participação ou recreação em ações políticas (Macedo, 2016).

É importante indicar que a ação que viria a se tornar as assembleias comunitárias teve início em 2003, com um projeto de enfrentamento ao abuso e exploração sexual de meninas e tinha como nome “Oficina da igualdade”. O funcionamento e as questões discutidas nestas oficinas se davam de modo muito similar ao que descreveremos como sendo as assembleias que nos deparamos durante a pesquisa.

O que marca a gênese das assembleias, portanto, é a ideia de igualdade como ponto de partida entre os sujeitos presentes, crianças, jovens e adultos. Igualdade aqui parece não ser compreendida como ilusão da ausência de diferenças, que existem, mas como aquela igualdade de inteligência, de possibilidade “de se fazer compreender, que passa pela verificação do outro” (Rancière, 2017, p. 107). Essa afirmação não se dá por uma via jurídica (“somos todos cidadão iguais perante a lei”), nem pela declaração de uma autoridade, como a dos educadores, mas pelo exercício em ato de igualdade “verificada a cada passo por esses caminhantes que, em sua constante atenção a si próprios […], encontram as frases próprias para se fazerem compreender pelos outros” (Rancière, 2017, p. 106).

As assembleias se mostram espaços de diálogo sobre os territórios e acontecem fundamentalmente em espaços públicos destes, como escolas e praças, mas também podem acontecer dentro da casa de participantes ou de conjuntos habitacionais em que vivem. Elas se configuram em formato de roda, ao que parece, para possibilitar que todos os participantes possam se ver e a palavra, desse modo, possa circular, entre os presentes.

Vejamos uma cena da Assembleia Geral do Instituto:

O grupo da Vila Margarida começa a se apresentar. Elas dizem que lá são julgadas pelo que vestem; os policiais invadem a casa das pessoas, matam ou levam presas quem quiserem. Disseram que querem mais proteção. Elas não conseguem pensar no futuro, porque é muito incerto, muita gente morre ou é presa sem fazer nada. Tem gente que quer matar os policiais. (Trecho de relatoria da Assembleia Geral de 11/12/2020).

O grupo de crianças e jovens que moram na Vila Margarida relatam um contexto de violência e violação de direitos em seu território. Diferente dos demais espaços de convivência, há uma postura mais atenta das crianças, jovens e adultos ao que se passa, já que quem fala não necessariamente está perto daquele que ouve. Há também o constante pedido dos educadores para que se minimizem as conversas paralelas e se preste atenção àquele(a) que fala para o coletivo, mesmo que a conversa seja por janelinhas. Dessa forma, essa ação ganha um aspecto mais sério do que os demais espaços formativos, como destaca um dos entrevistados:

ela é séria né? Ela é por formato dela, ela é importante que seja séria, mas ela tem esse nome, esse cunho, talvez político? [...] Então a gente tem algumas experiências de assembleia na vida, né? Que é a Assembleia de Deus, que é a igreja e também tem a Assembleia Geral da ONU, mas também tem a assembleia dos deputados e enfim tem essas três tipo, três referências de assembleia que eu sempre tive, mas aí eu vim eu entrei na Assembleia do Camará né? E aí ela sempre foi um espaço muito político porque ela era um espaço democrático, então todo mundo lá naquele momento tinha voz, todo mundo naquele momento podia opinar e podia participar das decisões. [...] Eu acho que quando a gente dá pra pessoa o poder, o direito de tomar uma decisão de fazer parte das decisões que tem a ver com ela eu acho que a gente consegue realmente fazer uma política democrática, uma política que faz parte da vida das pessoas e que não é só escolher alguém que faça isso pra você, sabe? (Trecho de entrevista com FABI).

Para que se efetuem, as assembleias parecem seguir um rito, como indica uma das crianças:

O primeiro momento, a gente começa discutindo comida, falando o que a gente comeu, o que a gente gosta. No segundo momento, a gente espera chegar [as pessoas]. No outro momento a gente começa a discutir uma coisa, aí essa coisa leva a outro assunto, que começou a ser de política, por exemplo. Aí o Mateus já começa a ficar nervoso porque começa a pensar sobre coisas que estão acontecendo, todo mundo começa a prestar atenção. Aí o final, né, a gente faz uma brincadeira basicamente, a gente fala pra alguém encerrar a assembleia, uma criança ou qualquer outra pessoa. (Trecho de entrevista com SO).

Esse rito permaneceu durante o período de pandemia, mesmo em modo virtual. Destaco que durante a pandemia, as assembleias se mantiveram, com pouca ou nenhuma alteração quanto aos dias e horários, no entanto foi observado a redução do número de crianças presentes e de sua participação nas pautas. Isso se deu, ao nosso ver, por dois motivos: o primeiro é de caráter estrutural, pois várias crianças não possuíam celulares, computadores e/ou internet suficiente para entrar e permanecer nos encontros, por vezes optando por entrar em outras atividades, como as ações artísticas, de convivência e estudo. Isso nos leva ao segundo motivo: a maioria das assembleias pautava com força temáticas que as crianças poderiam interpretar como políticas no sentido acima atribuído por elas, ou seja, como coisa que não são para crianças ou de forma que não compreendiam do que se falava. Se discutia muito sobre a situação da COVID-19 no município, as políticas governamentais, as ações de apoio às famílias, entre outros temas similares.

Destaco que, nesse período, quando perguntadas do por que de não estarem participando nas assembleias, algumas delas diziam que “estava chato”, “não entendo nada do que vocês falam”, “tenho coisa da escola pra fazer”, dentro outros motivos similares. Aqui, as crianças parecem indicar que o modo pelo qual os educadores abordavam o assunto não estabelecia diálogo e pertencimento e/ou não consideravam seus modos de compreensão e leitura do momento.

Mesmo assim, como anterior a pandemia, as assembleias mantiveram seu caráter de análise e de tomada de decisão coletiva entre os participantes. Quando indicamos tomada de decisão, é preciso indicar que as decisões tomadas fogem ao modelo do voto individual. O regime de votação só é utilizado quando não é possível chegar a um consenso mais ou menos estabilizado, digo isso, pois o consenso aqui não é necessariamente um aceite geral da proposta aceita na assembleia, como aquele que submete a uma ordem hierarquizada e opressora, como indica Souza (2008), mas uma mediação (e não um meio termo) entre aquilo que se discutiu e as posições tomadas, o consenso, portanto, não é uma forma de agradar a todos os participantes, pelo contrário, são muitas as assembleias que terminam com caras ranzinzas e com reclamações de canto de boca, com os conflitos ainda quentes. Há uma dimensão da resolução de conflitos que passa não pela lógica do merecimento ou da penalização, mas do comunitarismo (São Bernardo, 2018).

Como indicado por uma das educadoras, a politização ou a experiência não se resume a ir para o evento, mas é parte da própria produção de sentido da ida e o retorno, que passam a ser discutidos nas assembleias, grupos, etc. Uma das brincadeiras entre os educadores é de que vão ouvir como retorno das crianças, logo após alguma expedição, de que foi ‘’legal’’, ‘’normal’’, ‘’foi bom’’, no entanto, observamos que essas experiências retornam em outros momentos, ou ainda em anos ou meses posteriores, quando se reflete sobre o ocorrido ou alguma situação as remetem aquelas experiências.

[…] vai muito pela onda da gente poder fazer uma saída, da gente poder tá junto, da gente se divertir, mas sempre fica alguma coisa e aí não volta muitas vezes no grandão, que a gente se irrita, né? Porque a gente fala assim, como que foi? E ninguém fala. ‘Ah, foi legal. Ah, eu gostei’. Mas quando tá ali no pequeno grupo que de fato vem as cenas do território com as coisas, aí conseguem fazer, então como que a gente consegue criar nos espaços maiores, né? Nos espaços coletivos, o mesmo ambiente desses pequenos grupos pra que as pessoas consigam de fato falar e se posicionar relacionadas as coisas que elas vivenciaram nesses atos. (Trecho de entrevista com MI).

A participação política aqui não pode ser compreendida como um evento episódico ou comprovada por meio de uma marca ou fala que a revela, mas por um processo que varia de sujeito a sujeito, a partir de sua implicação nas ações do Instituto (sem determinismos como: quem participa mais é mais politizado) e em outros espaços (escolas, coletivos, etc), as condições e situação da vida cotidiana (família, território).

Esse modo de organizar, conduzir e participar de uma assembleia sem mesa, mas com coordenação (que ocasionalmente circula), sem pautas completamente definidas, fechadas e por vezes afinadas, mas com contorno e aberta para as questões dos presentes, sem voto individual, mas produção de um caminho que muitas vezes não é consensual e cujo desdobramentos deverão ser lidados posteriormente, não é comumente encontrado nas experiências dos movimentos e organizações sociais e nas assembleias escolares, por exemplo, que adotam uma postura mais programática e protocolar da assembleia.

Aqui, é preciso destacar que há uma afinidade no modo pelo qual essa ação se desenrola com aquela indicada pelo Comitê Invisível no livro A Insurreição que vem (2013), especialmente quando os autores, militantes comunistas franceses, apresentam propostas de construção de uma comuna e recusam as noções Assembleias Gerais (pelo menos do modo como classicamente os movimentos a compreendem), de Representação e Voto. Para esses camaradas, o

simples ato de voto, da decisão a tomar, é suficiente para transformar a assembleia num pesadelo, fazendo dela o palco onde se confrontam todas as pretensões ao poder. Somos aí vítimas do mau exemplo dos parlamentos burgueses. A assembleia não é feita para a decisão mas para a palavra, para a palavra livre que se exerce sem objetivo. (Comitê Invisível, 2013. p. 144).

Não à toa, a palavra que se exerce sem objetivo é algo que geralmente associamos aos delírios de psicóticos e das crianças e adolescentes cujas associações livres contam sobre suas experiências, sentidos, sentimentos, histórias, assim como as inventam por meio de uma cadência quase ilógica ao mundo dos adultos, mas cuja consistência, pelo menos para aquele que exerce a palavra, é certa e com sentido, pois “o sentido entre as coisas importa mais do que as coisas em si” (São Bernardo, 2018, p. 79).

Desse modo, o voto passa a ser, como apresentamos, um componente do dispositivo liberal que individualiza as questões e produz um consenso forçado, campo potente para a produção de ressentimento. A experiência de encontro e de palavra gerada pelas assembleias faz parte da necessidade dos sujeitos de se reunirem e falar, em oposição a uma rara necessidade de decidir.

Portanto, uma assembleia das presenças é, ao nosso ver, o melhor modo de definir as assembleias comunitárias. No caso do Instituto, que opera pela cogestão, a tarefa de produzir e garantir a presença é sustentada pelos participantes, mas é tarefa explícita dos educadores, que devem garantir um mínimo de presença e contexto (na forma de pautas, provocações, fala e mediação). O ponto aqui não é indicar que essa responsabilidade é exclusiva dos educadores, mas eles a devem sustentar até que outros passem a sustentá-la, pois a “circulação do saber anula a hierarquia, iguala nivelando por cima” (Comitê Invisível, 2013, p. 145).

Com isso, podemos indicar que esse aspecto de circulação da palavra e dos saberes das assembleias não necessariamente se assentam na busca pela verdade dos fatos ou presume que aquilo que os sujeitos falam é de fato aquilo que acreditam e uma narrativa exata das cenas relatadas. Pelo contrário, os sujeitos são contraditórios e paradoxais e narram suas vidas a partir de diferentes perspectivas (Spyrou, 2011), com intencionalidades e desejos diversos.

No que se refere a importância de criar contextos favoráveis à participação, a pandemia parece ter feito exatamente isso em relação às adultas e jovens, que não conseguiam se deslocar ou estavam presas em trabalhos domésticos ou formais, não conseguindo chegar às assembleias na rotina normal, diferente das crianças, que acabam circulando pelos territórios e tem mais tempo livre.

O oposto, no entanto, se passa com as crianças, elas deixam de participar consistentemente na pandemia dos espaços da assembleia, pois fica limitada a experiência corporal, já que estão confinadas em suas casas. Além de poderem falar, destaca-se aqui os gestos mínimos que acontecem durante as assembleias presenciais: falas paralelas, distrações, trocas de olhares, toque, carinhos, cochilos das crianças menores. Isso, para as crianças, é tão ou mais importante do que alguns dos temas e pautas discutidos nas assembleias. Sua permanência no ambiente virtual é mais precária, mas parece se sustentar após algumas convocações ou quando as temáticas discutidas têm mais relação com o mundo infantil. Isso é diferente em outros grupos, como os grupos de estudos, cuja linguagem e sentido é mais afinado aos interesses das crianças e jovens, que se sentem mais à vontade de ficarem em suas camas ou espaços confortáveis, “largados”. Com isso, não queremos afirmar que as crianças não participaram, de modo geral, mas indicar que a participação destas precisam ser compreendidas e ações pensadas para/com elas dentro de um quadro que não se reduz aos formatos pré-definidos da educação, a partir de uma contingência radical que deve, portanto, reinventar as noções de atenção, agência e tempo (Alderson & Yoshida, 2016).

As assembleias, portanto, parecem ser a matriz da roda que gera a força das ações e da participação de crianças e jovens no Camará, deixando sua marca nos outros dispositivos como possibilidade de verificar a igualdade (de pensamento, de condições e de atenção) entre os participantes.

eu reconheço o estatuto da criança e do adolescente

Realizado pela primeira vez em 1992, o Bloco EURECA (Eu Reconheço o Estatuto da Criança e do Adolescentes), foi criado pelo Projeto Meninos e Meninas de Rua (PMMR), OSC que atua com crianças e adolescentes em situação de rua em São Bernardo (SP), seguindo a aprovação do ECA e com intuito de levar às ruas e dar visibilidade ao Estatuto e atentos às necessidades de transformação das relações de opressão das infâncias e juventudes brasileiras. O Bloco conta com a participação de crianças, adolescentes, jovens e educadores na sua construção e realização, tendo no carnaval a inspiração estético-política de afirmação de uma identidade popular. Para isso, faz uso fantasias e figurinos, mestre-sala e porta-bandeira, grupos de percussão e adereços que trazem um tom lúdico e festivo para a manifestação, ao mesmo tempo em que o samba enredo feito a partir de um tema decidido coletivamente que dá o tom de luta.

O samba enredo se altera anualmente, tendo afinco com questões relacionadas ao contexto brasileiro, aos direitos humanos e as vidas das várias infâncias e juventudes. Os temas variam, como o reconhecimento do ECA, a fome, questões étnico-raciais, dentre outros1 e tem como eixos transversais a discussão do lugar das crianças e dos jovens na dimensão política, participativa e de ocupação da cidade. Nos últimos dois anos, no entanto, o Bloco manteve seu enredo “Eu preciso respirar! Entre pandemias e desgoverno, a luta é nosso oxigênio!”, pois sintetizou os dilemas e lutas do período de pandemia e do governo federal de extrema-direita, bem como marcou a impossibilidade de realizar um desfile presencial no final de 2020 e ao longo de todo ano de 2021.

O EURECA já foi às ruas de diversos municípios brasileiros (São Bernardo, São Paulo, São Vicente, Campinas, Guarulhos, Buenos Aires), contando com a participação de coletivos e organizações que atuam com crianças, adolescentes e jovens, em sua grande maioria da sociedade civil e de trabalhadores de políticas públicas da infância e juventude (Fernandes, 2016) e se apresenta como uma importante processo de subjetivação política, pois para além da participação mais ou menos pontual em ações políticas como manifestações, que geralmente são organizadas por outros grupos, o EURECA é organizado pelas crianças e adolescentes do Camará, sendo um marco anual esperado por todos, como chance de criar coletivamente, sair às ruas, se manifestar e brincar.

Uma das entrevistadas conta a importância de sua participação no EURECA quando criança:

[...] quando eu era criança e participava dos EURECA eu só sabia jogar panfleto (ou, panfleto é aqueles negócio que joga, era panfleto, né?) Não, panfleto não é. [Confete]. Bem pequenininho, é confete isso aí! Aí joga papel higiênico, joga os negócio. Ah pra mim era só diversão quando eu era criança. (Trecho de entrevista com LIV).

Se a diversão e a brincadeira eram predominantes na infância, isso muda conforme vai entrando na adolescência e na juventude,

[...] mas depois que eu fui crescendo entendendo, aí foi algo mais sério. Eu tenho que me defender, eu tenho que ter voz, então eu vou sim ler uma poesia no meio da multidão, vou sim dizer que eu tenho voz e que toda a criança e adolescente também tem! Então depois que eu parei de ser criança e fui amadurecendo mais, foi totalmente diferente, porque antes era só diversão. Hoje é e continuou sendo a diversão claro, porque nós está pulando, brincando, a energia continua a mesma, mas agora é algo mais sério (Trecho de entrevista com LIV).

O EURECA sintetiza, dessa forma, duas facetas que geralmente não andam juntas nas ações políticas: seriedade e alegria. Isso se dá, principalmente, pela mistura da arte com a manifestação política, que produz outros sentidos e lugares para os participantes, que elaboram cenas, alegorias e brincadeiras nos grupos culturais do Camará para serem apresentadas no desfile.

[...] os grupos culturais, grupos de produções artísticas são muito importantes porque é isso, é conseguir potencializar essa arte que já tá dentro das pessoas e transformar em alguma coisa que a gente possa produzir mesmo. (Trecho de entrevista com FABI).

É ainda nesse espaço de produção, os chamados barracões, ou nos ensaios dos grupos de dança (Coisa de Petra) e percussão (Grupo Percussivo Afrocalunga), que crianças e jovens vão se agenciando com o tema, com as histórias uns dos outros e das ancestralidades e com os objetos que vão levar para o Bloco, sejam adereços, sejam instrumentos.

O tamborim quando eu fui tocar, é muito difícil isso, no começo era muito difícil, e fora que tem a giradinha [faz o movimento da giradinha do tamborim], no começo era muito difícil, agora consigo de boa. […] Quando eu olhei o tamborim eu falei, eu já quero, eu já quero esse instrumento, é muito legal! (Trecho da entrevista com YAS, 11 anos)

Nosso surdo era um sofrimento mas era tão alegre. Voltava com as minhas canela roxa porque batia aqueles ferrinho a mão toda calejada o peso, o cansaço nas costa. (Trecho de entrevista com LIV)

Como indicam Dip e Tebet (2019, p. 39), o brincar marca a participação de crianças pois possibilita o “o exercício da criatividade e a capacidade de produzir”. Ainda, a brincadeira gera um espaço transicional pelo qual crianças e jovens podem ressignificar e elaborar suas experiências, ao mesmo tempo em que compartilham de uma solidariedade geracional e intergeracional pelo seu próprio mundo, presente e futuro. Os objetos (o confete e o tamborim, por exemplo) se tornam um dos modos pelos quais as crianças e jovens criam esses espaços. Não se trataria tanto, aqui, de falar da capacidade de agência política das crianças, ou seja, como individualmente elas se preparam para participar, neste caso, politicamente, mas se trata da capacidade coletiva de crianças, jovens e adultos se agenciarem entre si e entre os objetos do mundo para conseguirem transformá-lo (Duhn, 2015). Podemos ver isso por meio das marcas que ficaram do desfile realizado em 2020, logo antes da pandemia. As crianças, motivadas pela leitura de uma coluna escrita pela jornalista Eliane Brum2, fizeram uma ala do desfile chamada de “Ala da Pirralhada”, pois “o Bolsonaro xingou a Greta Thunberg de pirralha, só que ela não é pirralha, ela tá ajudando o clima, dizendo as verdades sabe?” (trecho de entrevista com YAS).

Eu fiquei na ala da turma da Pirralhada […] nós dançava, brincava, essas coisa. Pirralhada foi por causa do Bolsonaro, que chamou uma menina de pirralha, porque pirralha não é um xingamento. Nós queria mostrar que a pirralhada podia fazer tudo! […] Sensação é bastante legal, porque você está ali defendendo direito seu, acho legal, saudades. (Trecho de entrevista com BI).

Parece-me que a marca deixada pela Ala da pirralhada se dá principalmente pelo fato de que uma suposta figura de autoridade adulta, como Bolsonaro, entra em conflito direto com uma adolescente e a provoca com uma palavra que descreve o lugar transgressor que muitas vezes as crianças ocupam ou desejam ocupar (Jenks, 2004), revelando a possibilidade de afirmação e expressão apoiada por um lugar singular (o Bloco) para continuar o gesto transgressor de Greta diante da desqualificação de figuras adultas que consideram não ter legitimidade.

A transgressão, desse modo, é também um dos componentes da subjetivação política, na medida em que se pode liberar aquilo que não foi consensuado ou produzido junto às próprias crianças e jovens, ou foi decidido de modo autoritário. Não nos parece fugir muito a lógica das manifestações artísticas e políticas de adultos por seus direitos. Qualquer adulto que participou de atos políticos se identificaria com a fala de uma das jovens entrevistadas:

os cartazes significava muito pra nós, né? Que nós que estávamos escrevendo para para apresentar pras muitas pessoas uma manifestação de quinhentas, quatrocentas, trezentas pessoas e você levantar o cartaz dizendo que criança tem direito, criança tem voz, criança tem que ser escutada, criança tem que brincar o tempo inteiro, criança tem que dar sua opinião, e tá ali o direito seu e o direito da criança, como o adulto, tem voz pra dar autoridade de falar algo sobre política, essas coisa a criança também tem, a criança, os adultos, os adolescente tem Voz. Tem que ter, né? Tem que ter voz, tem que lutar pelos seus direitos, ir pra rua e dizer, né? (Trecho de entrevista com LIV).

O processo de subjetivação política pela mobilização do Bloco se dá de modo que os adultos passam a assumir uma posição de apoio às crianças e jovens e estas passam a representar a si mesmas tal como Martins e Viana (2020), a partir de uma representatividade infante em que elas mesmas são o grupo social cujo que conta e constrói parte da história e da cultura, interpretando-a e agindo sobre ela.

Esse momento de aparição pública e de expressão de uma parcela da sociedade que se vê sem parte nela é importante na medida em que possibilita, de acordo com Rancière (2014) o próprio processo de subjetivação política, ou seja, aquilo que primeiro realiza uma desidentificação com a ordem estabelecida (a infância como infante e necessitária da proteção total) e uma outra ordem ainda não compreendida (o enigma da criança). Pois esse processo é a

atualização da igualdade - ou o tratamento de um dano - pelas pessoas que estão juntas na medida em que estão entre. É um cruzamento de identidades baseado num cruzamento de nomes: de nomes que ligam o nome de um grupo ou de uma classe ao nome do que ficou de fora, do que não foi tido em conta, isto é, que ligam um ser a um não-ser ou a um ser-por-vir (Rancière, 2014, p. 72).

No período de pandemia, no entanto, com a impossibilidade de sair às ruas, o Bloco adotou uma medida comum no período, tentando apresentar sua mensagem por meio de transmissões audiovisuais (lives) pelas redes sociais. O Camará realizou três lives entre fevereiro e março de 2021 sobre o Bloco, de forma a mobilizar os participantes e apresentar o tema do Bloco3. Foi uma maneira de manter um rit(m)o anual, em que as temáticas discutidas pelo EURECA permaneceram visíveis.

Para fazer as lives, foram realizados encontros virtuais de preparação. Nestes, momentos de diálogo e construção se alternavam constantemente, pois como já indicamos, as crianças não sustentavam ou não se interessaram por longos períodos de conversa online. Dessa forma, as reuniões se transformavam também em momentos de reencontro entre crianças de diferentes territórios que não se viam há muito tempo. Para fazer a reunião, por exemplo, crianças de um dos territórios se reuniram na casa de uma delas, pois nem todas tinham celular e internet, o que acabava por gerar um grupo dentro de um grupo, dando um tom lúdico e híbrido as imagens individualizadas que consagraram os encontros virtuais do período.

Em outro dos encontros preparatórios, um dos educadores fez menção a fala do presidente do Brasil de que não será culpa dele se as pessoas se transformarem em jacaré após tomarem as vacinas, afirmação negacionista. O mesmo educador dá ênfase ao jacaré, o que dá um tom de diversão a conversa, especialmente por dois livros que tem jacarés como protagonistas serem constante leituras das crianças no Camará, o que as levou as a comentarem a fala, sugerindo que a temática fosse representada no Bloco, com uma das meninas presentes se colocando como alguém que poderia confeccionar máscaras de jacaré. Assim, elementos da cultura carnavalesca, que subvertem a participação política a partir da arte e da ludicidade, se mostram como potentes dispositivos na promoção da participação infantil e juvenil (Garcia, 2004).

Ainda que ausente das ruas por um ano, o Bloco permaneceu como marcador da participação política de crianças e jovens, em especial as lembranças de sua realização na avenida da praia de São Vicente, banhada pelo Atlântico, horizonte que trouxe o início do fim de Pindorama e sequestrou milhões de pessoas de sua terra natal. É aí, nesse horizonte, que as crianças e jovens calungas podem ano a ano realizar um processo, lúdico e carnavalesco, que põe em xeque o adultocentrismo político, na medida em que se afirmam e que os adultos passam a um ocupar um lugar de apoio e sustentação, prestando homenagem aos calungas que vieram e aos calungas que nos tornamos, “camaradas da mesma embarcação” (Slenes, 1992, p. 93).

Ééééé, assim, pra mim é incrível, é um lugar livre, é um lugar libertador. Eu acho que sempre foi a mesma sensação, nunca tive tipo uma, ‘nossa, eu amei e essa vai ficar marcada pra sempre’, sempre foi a mesma sensação de liberdade, de poder brincar livre, correr, pular, cantar, tocar e é isso. (Trecho de entrevista com SO).

manifestações, marchas e protestos

Como último elemento que contribui a subjetivação política de crianças e jovens no Camará, destacamos a participação destas em espaços políticos tipicamente compostos por adultos: manifestações, marchas e protestos. A diferença, aqui, é que crianças e jovens não são protagonistas da ação nem são maioria.

Importante destacar que a organização para essas participações se deu por meio das assembleias comunitárias, em comum acordo entre todas as partes e com os familiares e responsáveis legais das crianças e jovens. Desse modo, se constrói um sentido para a participação e uma segurança subjetiva para os que irão e os que ficarão, assim como a segurança objetiva, ou seja, a minimização do risco às crianças e jovens participantes, que passa pela organização dos adultos (educadores, integrantes de outros coletivos que se encarregam da segurança das manifestações) e pelo apoio de todo os participantes (ficarem próximos, atentos e em diálogo).

Aqui ganha lugar a importância do apoio dos adultos na garantia da participação de crianças, como indica um dos entrevistados,

e aí eu acho que isso é um papel importante por exemplo dos adultos que fazem parte disso, que é o apoio e a sustentação pra que aquilo aconteça, né? [...] Porque enquanto eles tão questionando a nossa participação e a gente consegue fazer a nossa defesa sozinho, mas eu acho importante também que a gente consiga ter como base, outras pessoas que falam do mesmo lugar que é essa pessoa que tá criticando, que não, eles as crianças, o adolescente, a gente que tava lá a gente consegue sustentar aquela humanização, a gente consegue participar daquilo, a gente entende que tá fazendo aquilo. Então, não é sobre a gente não conseguir se defender, é sobre ter outra base, ter base pra sustentar a gente, sabe? Ter algum lugar que a gente consiga pisar, sabe? (Trecho de entrevista com FABI).

Desse modo, os adultos presentes passam a ocupar um papel que já é tradicionalmente atribuído a eles, de proteção: atenção às retaliações de pessoas contrárias, que ninguém se perca, garantir o uso de máscara PFF2, distribuir água. Aqui, no entanto, a questão é que a proteção se dá em decorrência de desproteções (a crise climática, o corte orçamentário da educação pública, a falta de vacinas para imunização contra COVID-19, a fome), e o gesto de se manifestar é o exercício do direito à participação para que sejam efetivados os direitos de provisão. Assim, se materializam de modo claro os 3ps da CDC e o que trata o artigo 12. A proteção perde sua qualidade romântica e passa a significar uma disposição intergeracional de garantir direitos e promover uma vida melhor.

Nesse sentido, uma importante cena é descrita por uma das educadoras nesse processo de acompanhamento durante um protesto, em 2021, contra as violências causadas pelo governo federal nos últimos anos:

Daí a gente andou mais um pouco e aí a gente passou na frente de um bar e essa criança, ela tem uma mãe que frequenta aquele bar e durante algumas vezes a mãe ficou bem alcoolizada naquele bar junto com ela. E daí ela olhou e falou, olha é o [nome do bar], [...] ela ficou prestando bastante atenção, assim, se as pessoas do bar iam se posicionar, e daí o que acontece? Por sorte que ela tava naquela reflexão quando a manifestação parou ali no lugar que nós estávamos, em frente ao bar e todo mundo começou a gritar na frente do barco e daí todo mundo que tava no bar saiu do bar, e daí ela falou ‘ó lá aquele careca ele tá falando que a gente tá errado’, e daí ela se colocou lá de alguma forma e falou que ‘ele tava sendo contra, né?’ [a manifestação]. Daí eu falei, bom tem espaço pra todas as pessoas se colocarem aqui e se ele não concorda com a gente, tudo bem, ele também pode se manifestar e daí ela continua associando, daí ela falou, ‘’mas os polícias tão tudo conversando com eles, não tão conversando com a gente’’. Eu falei é, é porque nesse momento a polícia está mais a favor desse governo que a gente está dizendo que não está legal. (Trecho da entrevista com VAL).

Uma manifestação se torna, junto a toda força política da denúncia e do anúncio, acontecimento pelo qual as crianças podem elaborar questões de suas vidas: conflitos e relações familiares, violências, ressignificação de símbolos paradoxais, como a polícia e a cidade. Podem ser espaços de ampliação da compreensão crítica sobre os atores do mundo: a polícia que se alia com aqueles que causam violência, o lugar de consumo desejado que rechaça, o símbolo de pertença (a bandeira) cooptado por pessoas que parecem desejar a morte e não a vida.

A participação política, desse modo, é ao mesmo tempo espaço pedagógico, de confronto com as certezas e com as durezas do mundo e de enfrentar a realidade que gera as condições trágicas em que se encontram os territórios. O saber se constrói também ali, e a cobrança de um saber total por parte das crianças e adolescentes, para um dos jovens, parece não corresponder a própria lógica aplicada aos adultos:

se você, criança ou adolescente, entende o que você tá fazendo lá e eu acho que isso vale pra todo mundo, né? Parece que é só os adolescentes que precisam entender, tipo, ah, você tá aqui, por que você entende? Mas às vezes nem os adulto entende, não faz ideia do que tá fazendo lá e tão lá, mas enfim, se você, pessoa que vai pra manifestação e entende o que você tá fazendo, entende porque você tá indo nessa luta, acho que você deveria participar. (Trecho da entrevista com FABI).

Desse modo, há uma certa igualdade geracional no sentido de que a luta política não se dá somente por meios racionais, ou seja, se sei explicar logicamente o porque meu estado de ser se coloca disposto a revolta e a contestação, mas porque vivo e sinto que a vida não deveria ser assim, o que as crianças e jovens que convivemos parecem saber indicar ou expressar, seja nas assembleias, no EURECA ou nos espaços de estudo e convivência.

Aqui é importante destacar os vários tipos de participação possíveis em ações políticas, pois quando falamos sobre as assembleias havia um tipo de participação de crianças e jovens apoiada pelos adultos, com estes detendo maior poder de fala e coordenação (Wyness, 2009), já no caso do EURECA, se tratou mais de uma participação em que as crianças representam a si mesmas (representatividade infante) naquilo que demandam e expressam, com sustentação dos adultos (Viana & Martins, 2020), aqui no entanto, se trata ao nosso ver de um espaço em que as crianças, ao se integrarem a uma mobilização em que os adultos representam a si mesmo, entram como apoiadores a partir de uma posição menor e ainda incerta. As crianças e jovens passam a criar um contexto de solidariedade e sustentação de questões que, se hoje são decididas por adultos, dizem também sobre elas.

A participação de adolescentes e jovens em um ato contra a violência policial em Peruíbe no ano de 2021 parece ilustrar bem esse último ponto. Jovens de várias cidades do Litoral se somaram a um ato realizado pela família de uma criança de dois anos que foi morta em 2019 por um policial que atirou no carro em que ela estava. O ato, que reuniu diversas famílias que perderam seus filhos de maneira similar, foi marcado pela dor da tragédia ainda não resolvida pela justiça local4. Por essa razão, a concentração se deu em frente ao fórum da cidade e exigia respostas do judiciário e seguiu em marcha pelas ruas da cidade.

Houve dororiedade (Piedade, 2017) entre os presentes, que se alternavam contando histórias sobre seus entes queridos e sobre as consequências de suas perdas para aqueles que permanecem. No ato, a reação a presença dos jovens, participantes de um projeto chamado “Crescer com Proteção” (e que estavam utilizando camisetas com referência a esse nome) foi a princípio de surpresa, mas depois de acolhimento, afinal, se tratavam de jovens que agiam sob a égide de que as crianças deveriam crescer com seus direitos protegidos pelo Estado, e não serem mortas por esse, conversa que aconteceu entre jovens e as famílias. Ainda, passaram a ocupar um lugar de apoio, carregando faixas, caixas de som e registrando o evento, bem como acolhendo uma pessoa ou outras que não conseguia sustentar a firmeza diante da realidade da perda. Desse modo, adolescentes e jovens cumpriram um papel de sustentação da ação política dos adultos e de suas demandas por justiça.

considerações finais

Se cada vez mais os Estudos da Infância passam a olhar para as condições de participação a partir da relação entre crianças, jovens e adultos (Fernandes, 2009; Trevisan, 2015), os processos e ações analisadas parecem convergir para que repensemos os formatos institucionais e a própria tarefa e sentido das OSCs que fomentam a participação política de crianças e adolescentes por meio de ações formativas e de cuidado, de modo que criem seus próprios dispositivos de participação orientados não por um modelo, mas uma ética e política democrática e, se necessária, contestatória, junto às crianças e jovens.

A mobilização política de crianças, em especial na rua, possibilita a partilha intergeracional de um exercício de liberdade, de circulação da palavra, de solidariedade e contestação, da possibilidade de viver os espaços negados ou limitados, como nos parecem apontar as ações realizadas pelo Instituto Camará Calunga. Durante a pandemia, apesar de transformações radicais no modo de vida e na redução da circulação de circulação de crianças e jovens entre territórios e dentro dos próprios territórios, ainda foi possível, por meio da presença constante de figuras adultas familiares, especialmente mulheres e educadoras, criar espaços e momentos, presenciais e virtuais, de análise crítica, diálogo, estudo e brincadeira que promovessem experiências de subjetivação política. Processos participativos mais que projetos de participação.

Deste modo, o conceito de cidadania, que constitui uma marca para legitimar as ações de OSC, não apareceu em nenhuma das falas e espaços acompanhados no decorrer da pesquisa. Isso nos leva a pensar que talvez a meta de processos formativos políticos não fosse a cidadania, em sua acepção liberal e republicana, mas a produção de uma ética de (e de uma) vida coletiva mais digna na medida em que os sujeitos conseguem fazer aparece sua condição de sem parte (Rancière, 2014) acompanhados por seus pares, comunidades e educadores.

Houve uma associação direta entre a defesa de direitos humanos e a garantia de vida melhor, entre aquilo que lhes é interditado (a voz, a participação, a alimentação digna, escola precária) e aquilo pelo qual devem lutar (escola e educação melhor, mais espaços de escuta, acolhimento e brincadeira).

Seguimos os apontamos de Prout, Simon e Brichall (2006), quando indicam que a proveniência de recursos simbólicos (cultura local, poesia, dança, teatro, música, experiências novas) e materiais (bolsas para participantes, recursos financeiros para seus coletivos, equipamentos, etc) são necessários e importantes para que a participação de modo potente possa ocorrer, tanto de adultos quando de jovens e crianças, de modo que os sujeitos possam sustentar seus lugares de atuação política sem serem cooptados pelas demandas monetárias ou escolares.

Com isso, nos parece possível criarmos condições de participação de crianças e jovens de forma mais qualificada e ampliada, não só as erguendo acima de nossos ombros, ou ainda criando espaços específicos para que elas sejam cuidadas, pois,

É importante, pra elas [crianças] saberem mais sobre isso, porque aí eles sabem o que eles têm direito, o que eles tão lutando. […] Pelos direitos deles. […] Eu acho que é bom porque a gente tá lutando pelo nosso direito, é bom saber sobre isso e lutar para isso. (Trecho de entrevista com YAS).

No caso do Camará, esse processo participativo e orientado pela roda, se aproxima do próprio movimento da Kalunga, pois “se quiser reencontrar o seu destino e o da sua comunidade” (São Bernardo, 2018. p. 33) é no processo de circular e atravessá-la que os sujeitos se transformam, um apoiando o outro, em sujeitos políticos: calungas.

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Recebido: 19 de Janeiro de 2023; Aceito: 10 de Março de 2023

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