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Educação UFSM

versión impresa ISSN 0101-9031versión On-line ISSN 1984-6444

Educação. Santa Maria vol.44  Santa Maria  2019  Epub 11-Nov-2020

https://doi.org/10.5902/1984644439110 

Artigo Demanda Contínua

Um olhar sobre a educação de infância em Cabo Verde

A glance at the preschool in Cabo Verde

Catarina Fernandes Delgado* 

*Doutoranda na Universidade de Extremadura Espanha. Docente na Faculdade de Educação e Desporto da Universidade de Cabo Verde, Cruz Grande Santa Catarina, Cabo Verde. Catarina.delgado@docente.unicv.edu.cv, kat261@hotmail.com


RESUMO

O presente estudo tem como objetivo compreender a realidade da educação de infância em Cabo Verde, centrando-se nas políticas e nas práticas. No que tange às técnicas de recolha de dados optamos pela triangulação, usando técnicas qualitativas e quantitativas. O estudo permitiu-nos concluir que em Cabo Verde, a educação de infância teve o seu aparecimento oficial com a publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo em 1990 e que o mesmo aparece como subsistema educativo. Relacionado a prática verificamos há uma cobertura de mais de 70% e existência de vários jardins-de-infância em diversas localidades do país, além de existirem muitas perspetivas que permitem a sua expansão e organização. Por outro lado, verificamos lacunas a nível da formação de profissionais de infância e não só, os que estão formados estão noutro subsistema escolar. Constatamos uma baixa capacitação dos profissionais, ou seja, na sua maioria tem habilitações baixas que não lhes permite ter uma prática fundamentada. A educação pré-escolar carece de normativos claros relativos ao recrutamento do pessoal docente, abertura de jardins-de-infância e dentre outros aspetos.

Palavras-chave: Educação Pré-Escolar; Políticas e Práticas

ABSTRAT

The present study aims to understand the reality of preschool in Cabo Verde, focusing on policies and practices. In which concerns the data collection, we chose data triangulation, using both qualitative and quantitative approaches. The study allows us to conclude that preschool in Cabo Verde officially emerged in 1990, by the publication of Basic Law on Education, it appears as an educational subsystem. In which regards to the practices, we noticed there is more than 70% of coverage in many kindergartens in several communities across the country, and there are many perspectives that allow its organization and extension.

On the order hand, we verified weakness related to the training of preschool staff and other issues, those who are trained to teach are performing in another educational subsystem. We noticed a weak training of employees, that is, most of them have low skills which do not allow them to have a solid background practice.

Preschool needs clear regulating acts in which concerning to recruitment of teaching staff, the opening of kindergartens and other issues.

Keywords: Preschool Education; Policies and Practices

Introdução

Cabo Verde é um pequeno país, formado por 10 ilhas e 5 ilhéus de origem vulcânica, situando-se a cerca de 500 km a oeste da costa africana, no Oceano Atlântico. As ilhas distribuem-se por dois grupos, Sotavento e Barlavento.

Na ilha de Santiago (grupo Sotavento) situa-se a capital do país, Praia e os concelhos estudados. Devido ao seu relevo acidentado com altas montanhas e vales profundos, a acessibilidade aos aglomerados populacionais torna-se bastante difícil. A seca constitui um problema para o desenvolvimento das ilhas, embora surjam alguns vales com plantações de banana, papaia, coco, milho e feijão.

A educação em Cabo Verde foi considerada como pilar primordial de desenvolvimento. Nesta ótica, os sucessivos Governos não pouparam esforços para investir nesse setor (Cabo Verde, 2016) e ainda o plano estratégico para a educação (Cabo Verde, 2017 p.18) refere que “A alocação para educação tem estado em volta dos 5-6% do PIB, e a alocação do orçamento de Estado entre 23-27%. Isto reflete a prioridade dada à educação”.

A Educação pré-escolar, enquanto direito das crianças e uma fase muito importante para o desabrochar das suas potencialidades e importante para o sucesso das aprendizagens das crianças, precisa ser estudada na nossa realidade com intuito de melhor conhecer o subsistema e identificar as dificuldades, os avanços e as perspetivas futuras. Assim, definimos como perguntas de partida do estudo:

  • a) Será que os problemas da educação pré-escolar estão identificados?

  • b) Face aos problemas enfrentados qual é a prática pedagógica dos profissionais de infância e seu conhecimento sobre as leis que aplicam à educação pré-escolar e uma prática pedagógica adequada?

Quanto aos objetivos, definimos os seguintes: Conhecer a evolução da educação pré-escolar no País e nas ilhas de Santiago e São Vicente Reconhecer a importância da Lei de Bases do Sistema Educativo de 1990, para a evolução da educação em Cabo Verde, no que tange à educação pré-escolar; Apontar as alterações à Lei de Bases do sistema educativo 103/III/90 relativamente à educação pré-escolar em Cabo Verde e por fim Caraterizar a realidade educativa especialmente referente à educação pré-escolar nas ilhas de Santiago e São vicente.

Metodologia

No presente estudo, recorremos as duas abordagens metodológicas (metodologia qualitativa e quantitativa), no sentido de conferir maior rigor ao estudo. A combinação metodológica permite, por sua vez, a combinação de diferentes técnicas. Relativamente às técnicas de recolha de dados, optamos pela triangulação, na medida em que usamos três técnicas, nomeadamente a análise documental, a entrevista semiestruturada e o questionário fechado. Recorremos à análise documental para analisar a legislação cabo-verdiana e outros documentos que nos ajudam a conhecer a evolução da educação pré-escolar bem como conhecer as políticas para este subsistema.

Após a análise documental, procedemos à realização das entrevistas. Optamos pela realização de entrevistas semiestruturadas, visto que permitem a otimização do tempo disponível, o tratamento sistemático dos dados e possibilita ainda a introdução de novas questões sempre que se verifica essa necessidade. Definimos como público-alvo para a realização da entrevista vários atores da sociedade Cabo-verdiana. No que tange à análise da entrevista, recorremos à análise de conteúdo (Bardin,1995). Tal como em relação aos guiões de entrevista, elaboramos duas grelhas de análise de conteúdo, onde efetuamos a análise dos 11 protocolos de entrevistas.

Para aplicação do questionário percorremos as seguintes etapas: definimos o número de profissionais de educação de infância a nível do país, recorrendo ao anuário do Ministério de Educação e identificamos as ilhas com maior número de profissionais. A partir daí selecionamos uma do Norte - Barlavento (S. Vicente) e uma do Sul - Sotavento (Santiago) e aplicamos a fórmula da determinação do tamanho da amostra. Os cálculos determinaram que deveríamos aplicar 246 questionários.

Para o tratamento dos dados do questionário, optamos pelo uso do software estatístico SPSS versão 21, onde fizemos a análise descritiva dos dados. Os gráficos foram concebidos no programa excel, visto que este apresenta gráficos esteticamente melhores.

Um olhar sobre a Educação Pré-escolar

A Educação Pré-Escolar é uma etapa decisiva na vida das crianças. É nesse momento que se promovem estratégias de aprendizagem para que cada criança consiga estruturar o seu pensamento e as suas ideias. A importância e o papel da educação infantil para aprendizagem e o sucesso das crianças nos subsistemas subsequentes são inquestionáveis, na medida em que visa o desenvolvimento integral da criança. Segundo Vasconcelos (2001) a educação de infância é um bem social e cultural que tem um papel crucial na promoção do desenvolvimento enquanto instrumento de integração e inclusão social. Face a estas teorias diria: será que Cabo Verde está a par disso?

Bem, referindo - se às leis e às normas existentes, podemos dizer até que sim, mas vendo e convivendo com a real situação por que a educação pré-escolar passa, sobretudo a não clarificação do papel do Governo entre as competências dos diferentes intervenientes, nomeadamente, a nível do Poder Central e dos Municípios, é sem dúvida, um “remar contra a maré”, sendo que há uma estrutura que coordena e outra que gere e administra sem uma conveniente articulações.

Apesar da importância da educação pré-escolar estar patente nos principais normativos de referência para este subsistema em Cabo Verde (guia de atividades 2003, plano estratégico para a educação 2003 e 2017, lei nº103/III/90 de 29 de Dezembro, e o decreto lei nº2/2010 de 7 de Maio, dentre vários outros), ainda constatamos uma grande dificuldade de afirmação do subsistema. Mas nesse pormenor mesmo países europeus e outros passaram pelas mesmas dificuldades de acordo com (Peixoto, 2008).

Em Cabo Verde a educação pré-escolar foi sempre facultativa. Contudo até 2008, para entrar no ensino básico obrigatório, a criança teria que, pelo menos, frequentar dois anos da educação pré-escolar para entrar com seis anos, caso contrário entraria com sete anos. Essa medida foi abolida (I série, Boletim oficial nº43 de 24 de novembro de 2008 art. 1º) com vista à igualdade de oportunidades para o acesso ao Ensino Obrigatório.

Antes da Independência Nacional1, conforme podemos ver no quadro 1 abaixo, a educação pré-escolar não existia e nem o ensino superior. O que existia era o ensino pré-primário (cujo principal objetivo era a socialização com a língua portuguesa e preparar os alunos para o ensino primário), que logo após a independência foi excluído do Ministério da Educação.

Quadro 1: Dados relativos ao ano letivo 1984/1985 

Nível Nº alunos Total de professores % prof. Habilitados Nº estabelecimento de ensino Nº sala de aula Regime de utilização de salas
Dupla Tripla
EBE 47.232 1.588 14.9% 256 679 291
EBC 8.972 261 7.6% 15 140 140
ES 4.135 170 37.6%* 3

(*) Formação específica - Ensino Básico Elementar (EBE), Ensino Básico Complementar (EBC) e Ensino Secundário (ES)

No quadro 2 encontramos os números de jardins-de-infância e escolas existentes desde a Independência até ao ano letivo 2015/2016

Quadro 2 Número de jardins e escolas 

Subsistemas 1975/1976 1990/1991 2000/2001 2015/2016
Educação pré-escolar ------ 203 384 543
Ensino básico 33 370 420 414
Ensino secundário 3 8 29 62
Ensino médio ------ 2 3 ----
Ensino superior ------- ----- 4 10

Fonte: construção própria com dados dos anuários da educação dos anos letivos referidos

Fica evidente a existência ou mesmo a emergência da educação pré-escolar a partir dos anos noventa com 203 estabelecimentos. E a partir de 1990, nota-se o aumento gradual do número de estabelecimentos de educação pré-escolar que no ano letivo 2015/2016 foi de 543 jardins-de-infância, mais do que dobro de quando iniciou oficialmente.

Quadro 3 Evolução de efetivos 

Subsistemas 1990/1991 2000/2001 2014/2015
Educação pré-escolar 12.464 19.810 23.316
Ensino básico 69.823 90.640 64.591.*
Ensino secundário 9.071 44.748 56.402
Ensino médio 518 ------
Ensino superior 717 12538

*Redução devido a baixa de natalidade.

Fonte: Duarte in meta avaliação, vol, 1, nª 3(2009) e Anuário da Educação, 2015

Pela análise do quadro nº 3, podemos notar uma clara evolução dos efetivos da educação pré-escolar, embora ainda a taxa bruta de acolhimento deste subsistema em 2017 seja de 76,2,%, a nível nacional de acordo com os principais indicadores da educação (Cabo Verde, 2017, p.26).

Comparando com outros subsistemas, a educação pré-escolar, estava atrás do ensino básico (que contém o maior número de efetivos) nos anos 90, em relação aos efetivos. No entanto, a partir de 2000, o ensino secundário evoluiu mais do que a educação pré-escolar em termos de efetivos.

Em relação ao pessoal docente mais de 70% não tem a qualificação de base. Segundo dados estatísticos do anuário da educação, 2016, conforme podemos ver na tabela a seguir.

Tabela 1: Profissionais de infância por categoria em Cabo Verde 

Profissionais da infância %
Educadores (com formação superior ou média 131 10,2
Monitores (com formação pedagógica e certificação) 259 20,2
Orientadores (com habilitação académica sem formação pedagógica) 893 69,6
Total 1283 100

Fonte: Autoria própria com dados estatísticos do anuário da educação 2016

Em jeito de síntese, a educação pré-escolar conta, com um total de 543 jardins de infância, sendo 317 públicos e 226 privados. O sector conta, ainda com um total de 1283 profissionais, sendo todos do sexo feminino, destes apenas 30,4 % possui formação, apenas um concelho pequeno Paul na ilha de Santo Antão possui 70,6% do pessoal formado, contudo sobressai mais três concelhos, Mosteiros na ilha do Fogo, Ribeira Brava e Tarrafal de São Nicolau com 100% do pessoal sem qualquer formação na área (Cabo Verde, 2016).

Segundo o Ministério da Educação e Valorização dos Recursos Humanos, A Educação de Infância em Cabo Verde, designada por Pequena Infância, abrange a faixa etária dos 0 aos 8 anos, correspondente a 3 períodos importantes:

  • Período dos 0 aos 3 anos, período decisivo para o desenvolvimento da criança em que a dimensão Sobrevivência tem de ser particularmente vigiada, sem descurar a dimensão despertar, negligenciada entre nós;

  • Período dos 3 aos 6 anos, período correspondente à entrada no ensino pré-escolar em que as duas dimensões, Sobrevivência e Despertar, devem desenvolver-se harmoniosamente e de forma articulada;

  • Período dos 6 aos 8 anos, corresponde à primeira fase do ensino básico, correspondente a um período de adaptação, seja para as crianças que saíram do pré-escolar, para reforço dos conhecimentos, seja para as que não tiveram essa oportunidade e que beneficiando de ações integradas, poderão usufruir de maiores possibilidades de sucesso.” (Cabo Verde, 2001, p.9).

Porém, como acontece em muitos países da região, Cabo Verde focaliza, somente, o período da pré-escolarização (4-6 anos), como o mais importante na Pequena Infância (aliás, em muitas regiões, a pequena infância é referida somente como o período do pré-escolar). Este facto revela, sem qualquer dúvida, uma desarticulação profunda em termos de políticas, definição dos níveis de responsabilidade, formação dos recursos humanos e aproveitamento dos serviços básicos existentes relativamente ao desenvolvimento destas 3 etapas (resumidamente, a Pequena Infância). “A inexistência de uma visão holística da criança constitui um forte constrangimento à eficácia das ações (…)” ( Cabo Verde, 2003, p.18).

Assim, os responsáveis da educação integram somente a educação pré-escolar no sistema educativo, destinado às crianças com idade compreendida entre os 3 e os 6 anos (a idade de ingresso no ensino básico), isto de acordo com a antiga lei de bases (lei nº103/III/90 de 29 de Dezembro). Já o decreto lei nº2/2010 de 7 de maio diz no seu artigo 16 ponto 2…que a educação pré-escolar “destina-se às crianças com idades compreendidas entre os 4 anos e a idade de ingresso no ensino básico”. Ademais:

O sistema educativo de Cabo Verde reconhece a necessidade de proteção à infância, relevando a importância da educação pré-escolar, no desenvolvimento da personalidade considerada em todos os seus aspetos; na aquisição de competências e desenvolvimento de atitudes nos vários domínios do saber; na familiarização com o meio cultural; no desenvolvimento de comportamentos refletidos e responsáveis; na integração social e escolar, tendo em vista o seu contributo impulsionador o sucesso da escolaridade básica (Cabo Verde, 2001, p.8).

De frisar que, nas condições de Cabo Verde, a educação pré-escolar deve ser uma resposta simultaneamente social e educativa, dependendo a melhoria da sua qualidade e credibilidade da complementaridade e coexistência dessas duas vertentes.

Consequentemente, a educação pré-escolar visa uma formação complementar das responsabilidades da família (onde a criança tem as primeiras interações) e a preparação da criança para o ingresso no sistema escolar, onde as componentes sociais e educativas se afunilam cada vez mais.

A Lei de Bases do Sistema Educativo Cabo-verdiano (decreto lei nº2/2010 de 7 de maio, 2010 no seu artigo 17º, define para este nível educativo os seguintes objetivos gerais:

  • a) Apoiar o desenvolvimento equilibrado das potencialidades da criança;

  • b) Possibilidade à criança a observação e a compreensão do meio que a cerca;

  • c) Contribuir para a estabilidade e segurança afetiva da criança;

  • d) Facilitar o processo de socialização da criança;

  • e) promover a aprendizagem das línguas oficiais e, de pelo menos uma língua estrangeira;

  • f) Favorecer a revelação de características específicas da criança e garantir uma eficiente orientação das suas capacidades.

A rede da educação pré-escolar é, essencialmente, da iniciativa das autarquias locais e de instituições oficiais, bem como de entidades de direito privado constituídas sob forma comercial ou cooperativa, cabendo ao Estado fomentar e apoiar tais iniciativas, de acordo com as possibilidades existentes.

O Ministério da Educação tem unicamente a responsabilidade da coordenação pedagógica da Educação pré-escolar a nível nacional. Essa missão se concretiza, em cada concelho, através da coordenação pedagógica local, que é assegurada pelas Delegações Escolares (Serviços desconcentrados do Ministério da Educação), cabendo aos coordenadores da Educação Pré-escolar a função de auxiliar, orientar, supervisionar a prática pedagógica dos educadores, monitores e orientadores no concelho que está inserido.

Como os Jardins-de-Infância pertencem a entidades diferentes, como autarquias, igrejas, Organizações Não Governamentais (ONGs) ou privadas, existe uma diversidade estrutural, financeira e logística, levando a uma grande discrepância de parâmetros. No entanto, no que concerne ao objetivo geral do Jardim de Infância, todas as entidades se afunilam: “O Jardim-de-Infância é considerado como um estabelecimento de educação que presta serviços orientados para o desenvolvimento e a aprendizagem da criança, proporcionando-lhes atividades educativas complementares de apoio à família.” (Cabo Verde, 2003, p.8).

A rede é constituída por jardins-de-infância da iniciativa das Câmaras Municipais (55% dos jardins), sendo que a OMCV (Organização das Mulheres de Cabo Verde) detém cerca de 16% dos jardins, as Organizações Religiosas 11%, os privados cerca de 7,5% e as Organizações não-governamentais, como a Fundação Cabo-verdiana da Solidariedade e a Cruz Vermelha, 10,5%.

Tabela 2: Percentagens dos jardins de infância por entidade gestora 

Entidade Gestora %
Câmaras Municipais 55%
OMCV 16%
Organizações Religiosas 11%
Privados 7.5%
ONGs 10.5%
Total 100%

Fonte: (Plano estratégico de educação, 2003)

Em Cabo Verde tem-se vindo a apostar na construção progressiva de Jardins-de-Infância com infra-estruturas adequadas e recursos cada vez mais apropriados (a maioria por iniciativa das Câmaras Municipais), de modo a diminuir o problema que abrange uma grande dimensão (por motivos relativos aos fatores inerentes ao próprio país: problemas económicos das famílias das crianças, pouco tempo disponível para as crianças de modo a assegurarem uma profissão, serviços públicos carecem de qualidade, recursos e pessoal docente desqualificado, papel secundário da mulher e criança na sociedade, violência nas suas diversas formas, doenças sexualmente transmissíveis, …): não acompanhamento e abandono das crianças do sistema educativo. Em todos os Jardins-de-Infância, existe uma orientadora/ monitora (consoante as suas habilitações académicas) responsável por um grupo de crianças (uma sala).

Em Cabo Verde ainda não existe uma política relativa ao sector do pré-escolar e subsequentemente, contudo a partir de 2005 a Universidade de Cabo Verde e o Instituto Pedagógico de Cabo Verde (IPCV) criaram os primeiros cursos de licenciatura e de nível médio, respetivamente. Deste modo, as monitoras com um nível académico variado, entre a 4º e o 12º ano, (mas com uma formação específica de 10 meses ministrados pelo Instituto Pedagógico de Cabo Verde) e as orientadoras (também com um nível académico variado). Assim falta-lhes habilitações básicas para suportar a sua prática, reconhecimento profissional, tanto a nível de escalão como de remuneração.

A Formação dos Agentes do pré-escolar:

A seguir analisaremos vários quadros que demonstram a evolução da formação dos agentes da educação pré-escolar, levando em conta as instituições, os efetivos e tipos de curso oferecidos

Quadro 4: Alunos matriculados no curso de Capacitação em educação de infância No Centro de Ensino de Assomada 

Anos letivos Número de orientadores matriculados Observações
Capacitação de 10 meses Essa formação de capacitação tem a finalidade de ajudar as orientadoras nos aspetos sobre a psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem, planificação e avaliação dentre outras disciplinas básicas para a educação de infância.
2010/2011 30
Total 30

Fonte: Construção própria com dados da secretaria da referida escola

Pela análise do quadro 4 é possível verificar a existência de cursos de capacitação de curta duração (10 meses) em Escola Secundária e de formação profissional privada, isto mostra que devido à necessidade de pessoal formado ou capacitado na área de educação de infância, outras entidades tomaram a iniciativa de formação.

Quadro 5: Alunos matriculados no curso de educação de infância na Escola de Formação de Professores do Ensino Básico do Mindelo- EFPEBM 

Anos letivos Número de Formandos matriculados Número de Formandos aprovados Número de formandos reprovados
Inicial2 Capacitação3 Exercício4
98 a 2001 25 22 3
2005 a 2008 37 37 0
2006 a 2009 32 25 7
2007 a 2010 61 50 11
2008 a 2011 26 26
Total 25 156 134 22
Total geral 181

Fonte: Construção própria com dados da secretaria da referida escola

Pela análise deste quadro (5) fica evidente que na Escola de Formação de Professores do Ensino Básico do Mindelo, não se ministrou a formação de curta duração, e que o número de formandos em exercício é superior à todas as escolas, já que esta escola foi a pioneira em ministrar o curso de nível médio de educadores-de-infância em Cabo Verde.

Quadro 6: Alunos matriculados no curso de educação de infância na Escola de Formação de Professores do Ensino Básico de Assomada- EFPEBA 

Anos letivos Número de FORMANDOS matriculados
Inicial 5Curso especial de formação monitores de infância Exercício
2008 - 2011 60
2009 - 2012 32
2012/2013 17 25
Total 17 117

Fonte: Construção própria com dados da secretaria da referida escola

O quadro 6 expressa a particularidade da oferta de um curso especial de formação de Monitores de Infância que se iniciou em 2012/2013 com um total de 17 formandas, curso esse criado para dar resposta as necessidades de um concelho da ilha de Santiago, isso também mostra que devido ao perfil variado dos formandos fica difícil montar planos de estudos. É interessante também ver que esta escola de formação apostou mais na formação em exercício abarcando um total de 117 monitores e orientadores de vários concelhos de Santiago Norte.

Quadro 7: Alunos matriculados no curso de educação de infância na Escola de Formação de professores do Ensino Básico Hermínia Cardoso da Praia- EFPEB-HC 

Anos letivos Número de Formandos matriculados Número de Formandos aprovados Número de formandos reprovados
INICIAL CAPACITAÇÃO EXERCICIO
98 a 2001          
2005 a 2008   96   96  
2006 a 2009 24   27 47 4
2007 a 2010 35   25 5 (outros cinco desistiram ou anularam a matrícula.)
2008 a 2011     35  
2009 a 2012 29
Total 79 96 91 72 9

Fonte: Construção própria com dados da secretaria da referida escola.

O Quadro anterior demonstra que escola de Formação de Professores do Ensino Básico da Praia iniciou o curso de orientadores de infância em exercício desde o ano letivo 2005 a 2008 abarcando um total de 96 agentes do Pré-escolar da ilha de Santiago. Por conseguinte a partir do ano letivo 2006 a 2009 formou jovens a procura do primeiro emprego bem como o pessoal que estava em exercícios de funções em educação de infância num total de 47 profissionais, apenas quatro reprovaram.

Por outro lado no ano letivo 2007 a 2010 houve um total de 35 inscritos para a formação inicial, mas apenas 25 concluíram os estudos, sendo que cinco reprovaram e outros cinco anularam a matrícula ou desistiram de acordo com as informações dos serviços académicos da escola.

Já nos anos letivos 2008 até o ano letivo 2012 apenas se fez a formação em exercícios com um total de 54 formandos e todos concluíram o curso.

Quadro 8: Alunos matriculados no curso de licenciatura em educação de infância na Universidade de Cabo Verde (pólos da praia e do Mindelo) 

Anos letivos Número de Formandos matriculados Número de Formandos APROVADOS Número de Formandos REPROVADOS
Licenciatura
Praia Mindelo Praia e Mindelo Praia e Mindelo
2005- 2009 56 30
2006-2010 36 27
Total 92 57
Total geral 149 Obs.: a universidade não revelou os números totais de aprovados e reprovados uma vez que nem todos os formandos ainda tinham defendido o trabalho de fim de curso.

Fonte: Construção própria com dados da secretaria da referida escola.

Observando o quadro 8 fica evidente um aumento de número de formandos em Educação de Infância na Universidade de Cabo Verde nos pólos da Praia e também do Mindelo na ilha de São Vicente, sendo que a Praia com um total de 56 nos anos letivos 2005 a 2009 e também 36 formandos nos anos 2006 a 2010 e no Mindelo com um total de 57 formandos nos mesmos anos letivos.

Não sabemos ao certo quantos realmente terminaram a formação uma vez que a universidade de Cabo Verde não disponibilizou todos os dados já que alguns formandos ainda não tinham defendido os seus trabalhos de conclusão do curso. Resumindo, A partir de 2005 houve uma forte preocupação com a formação de orientadores de infância tanto em número como de instituições de formação.

Nota-se que durante cinco anos houve um aumento significativo de número de formandos nas três escolas de formação de professores. Estima-se que até 2012 teremos um total 412 monitoras e educadores de infância com diferentes níveis (desde uma capacitação até ao nível superior). Importa realçar que apenas a EFPEBHC na Praia, EFPEBA e o Centro de Ensino de Assomada ministram cursos de capacitação.

A nova lei de bases decreto lei nº2/2010 de 7 de maio P.3 exige que “a formação de qualquer agente educativo deve ser superior mesmo não conferindo grau de licenciatura”, exigência que, ainda assim, está longe do nível habilitacional exigido em países de sistemas educativos mais avançados, como países europeus (A Bélgica, Alemanha, Irlanda do norte e Países Baixos e da América do Norte) segundo (Varela, 2015, p.10).

Na maioria dos cursos acima referidos apenas o da Universidade de Cabo verde exige o Ensino Secundário (fim do ciclo) como critério para o acesso. No antigo Instituto Pedagógico de Cabo Verde o acesso mínimo era de 10ºano de escolaridade, pois tratava-se de um Curso de nível Médio.

Por outro lado, para as formações de capacitações, qualquer outra habilitação é aceite, bastando para isso, estar em exercício de funções com “vista a atualização, aperfeiçoamento, a reconversão e o completamento dos conhecimentos” (Cabo Verde, 1990).

Por conseguinte, em 2013/2014, o Ministério da Educação anunciou um concurso para recrutar educadores de infância para o subsistema do Ensino Básico tendo acolhido muitos educadores de infância com licenciatura. Como se não bastasse já no ano letivo seguinte 2014/2015- O Ministério da Educação e Desporto, devido a falta de professores do Ensino Básico, continuou recrutando educadores de infância desta vez com curso médio, deixando o subsistema da educação pré-escolar sem o seu pessoal ora formado. Mais se acrescenta que os educadores com curso médio estavam em exercício de funções, algumas já com mais de 20 anos de serviço.

Face a isso as Câmaras Municipais avançaram com novos concursos de recrutamento que em alguns concelhos demoraram mais de 6 meses. As perguntas que surgem são: como ficaram as crianças dos jardins-de-infância cujas educadoras de infância foram recrutadas para o Ensino Básico? Será que durante este tempo as crianças continuaram a frequentar os jardins-de-infância? Outra questão talvez a mais intrigante é as duas entidades que na realidade são responsáveis uma pela parte administrativa e a outra com a parte pedagógica como menciona o artigo 15º da LBSE de 1990, não dialogaram sobre esta decisão? Isto levanta mais uma questão ou mesmo afirmar que a educação pré-escolar precisa de legislação própria quanto à tutela.

É de realçar que a maioria das educadoras formadas pelo antigo Instituto Superior de Educação (núcleo que começou por constituir a Universidade de Cabo Verde) e o antigo Instituto Pedagógico (atual Faculdade de Educação e Desporto da Unicv) já estão a trabalhar no Ensino Básico. Importa referir que dos esforços feitos para melhorar a educação pré-escolar tudo ou quase tudo ficou em papel de acordo como a leitura do quadro abaixo:

Quadro 9: Profissionais de infância por ano letivo 

Ano/profinf 2010/2011 2011/2012 2012/2013 2013/2014 2014/2015 2015/2016
Educadoras 91 194 250 259 175 131
Monitoras 268 314 321 348 311 259
Orientadoras 757 605 641 644 748 893
Total 1116 1113 1212 1251 1234 1283

Fonte: Construção própria com dados dos anuários da educação dos anos letivos acima mencionados

Pela leitura do quadro 9, observamos que durante os anos letivos 2010/2011 até o ano letivo 2013/2014 houve aumento dos educadores de infância, não obstante vê-se claramente a caída dos números nos anos letivos 2014/2015 e 2015/2016 com o aumento claro das orientadoras, facto que afirmamos anteriormente, dizendo que com a saída das educadoras entraram novas e estas, com certeza, não tinham nenhuma formação, e caso tivessem não entrariam no subsistema. Nota-se uma descida de pelo menos 84 educadoras em 2014/2015 e 44 educadoras no ano letivo seguinte. Dados que ainda poderão estar longe do que realmente é a realidade uma vez que apenas num dos concelhos de Santiago 19 educadoras foram para o Ensino Básico segundo informações da coordenadora do pré-escolar avançadas na entrevista concedida para esse estudo.

Ora, os que formaram, partiram, desde então nenhum curso de educação de infância foi aberto, pergunta-se: será que o pessoal deste subsistema não precisa ou não merece formação?

De acordo com a Lei-mãe que é a Constituição da República de Cabo Verde que no seu artigo 78º refere que “ todos tem direito à educação” afirmando ainda que deve i) “ser integral e contribuir para a promoção humana, moral, social, cultural e económica dos cidadãos”; (ii) “contribuir para a igualdade de oportunidade no acesso a bens materiais, sociais e culturais”; (iii)“estimular o desenvolvimento da personalidade, da autonomia, do espírito de empreendimento e da criatividade, bem como da sensibilidade artística e do interesse pelo conhecimento e pelo saber”; (iv) “promover os valores da democracia, o espírito de tolerância, de solidariedade, de responsabilidade e de participação”.

Apesar das situações referidas anteriormente, cada concelho tem um poder autónomo, estes são regidos pela Constituição da República que, até ao presente, ainda não perspetiva nem determinou uma política global para a Educação de Infância. Consequentemente, não existe articulação entre os demais sectores, há indefinições relativamente às competências de cada instituição (Câmara Municipal, Ministério da Educação, ONGs), entre outros. Mesmo no campo da formação, sabemos que é o Instituto Pedagógico, a instituição que tem essa missão conforme o artigo 64 ponto 2 da LBSE de 1990. Mas como podemos ver nos quadros anteriores vários outros intervenientes promoveram a formação na área.

Assim, esta situação transporta para problemas a nível institucional, operacional e legislativo. De salientar (Cabo Verde, 2002):

Quadro 10: Problemas a nível institucional, operacional e legislativo na Educação Pré-escolar 

Nível Institucional Falta de articulação entre os diferentes departamentos e dos programas destinados às crianças; deficiente articulação entre a educação pré-escolar e o ensino básico; assimetrias no acesso à educação pré-escolar; rede de jardins caótica, insuficientemente integrada na realidade geográfica e social; deficientes mecanismos de acompanhamento pedagógico e do funcionamento dos jardins;
Nível Operacional Deficiente animação comunitária, intervenção concertada junto das famílias e ao maior envolvimento na defesa das crianças; deficiências graves na gestão de um grande número de jardins-de-infância.
Nível Legislativo Insuficiente regulamentação das disposições legais referentes a menores e de mecanismos eficazes para a sua aplicabilidade; Necessidade de revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo, em termos de definição das responsabilidades do Ministério da Educação na educação pré-escolar, da sua integração no sistema educativo, da clarificação de competências dos intervenientes, em particular na transferência de responsabilidades e de recursos para os concelhos.

Fonte: Cabo Verde, 2002

Não obstante a educação Infância como primeira etapa no processo da educação ao longo da vida (Lei 103/III/90 de Cabo Verde) e lei-quadro da educação pré-escolar de Portugal (lei nº 4/97 de 10 de fevereiro) deve merecer muita atenção dos decisores políticos e não só, daí que estudos têm demonstrado que os primeiros anos de vida da criança são decisivos para o seu desenvolvimento físico, mental e emocional, sendo inegável o papel decisivo da educação da infância na construção de estruturas fundadoras de suporte às aprendizagens futuras promotoras da aquisição de conhecimentos, capacidades e atitudes ulteriores.

Apresentação e Discussão de Resultados

Ciente de que a educação pré-escolar é uma das fases de sustentabilidade de todas as outras que vem a seguir, e porque é ali que se desenvolvem determinadas competências que vão servir de base para o desenvolvimento da aprendizagem durante toda a vida, não se pode ignorar a sua qualidade e a sua contribuição para crescimento de forma integral de todas as crianças.

Foi notável ver a evolução da educação em Cabo Verde e especial a educação pré-escolar pelos passos que deu, desde não existência até a afirmação do subsistema mesmo passando por diversas barreiras.

A partir da análise documental realizada verificamos que houve muitos esforços para que a educação pré-escolar se afirmasse mesmo indo contra alguns princípios como por exemplo igualdade de oportunidades como foi o caso do artigo 72º da lei nº103/III/90 de 29 de dezembro na nova redação dada pela lei nº113/V/99 de 18 de Outubro que incentivou a frequência da educação pré-escolar durante 18 anos dizendo que «ingressa no ensino básico com 6 anos as crianças que tiverem frequentado pelo menos dois anos da educação pré-escolar caso contrário ingressaria com 7 anos». A nível das dificuldades enfrentadas pela educação pré-escolar o plano estratégico para a educação (MEVRH, 2002) identificou que existe «Baixo nível de qualificação das monitoras/ orientadoras; material didático insatisfatório; enquadramento e acompanhamento da área deficiente, condicionando a preparação para o ensino básico.

No questionário aplicado aos profissionais de educação de infância verificamos que existe um público com pouca formação desejada na área, uma vez que apenas 2,4% possui uma formação Superior em educação de infância e 23,2% possui uma formação média ou profissional. Fica evidente que existe um público com habilitações Baixas ou ainda com apenas o ensino secundário, e ainda 27,6% é considerado educador de infância. Conforme se pode ver no gráfico 1 e 2, respetivamente:

Fonte: Construção Própria com dados do questionário

Gráfico 1: Habilitações Literárias 

Fonte: Construção Própria com dados do questionário

Gráfico 2: Categoria Profissional 

Na entrevista aos diversos atores da sociedade civil ficou patente que a nível do pessoal docente existem vários constrangimentos como se pode verificar na tabela 1 abaixo:

Tabela 3 Constrangimentos a nível do pessoal docente 

Pessoal docente F
Pessoal docente sem qualificação 8
Falta de enquadramento do pessoal docente formado e os do terreno 8
Demasiada atenção ao ensino superior em detrimento deste subsistema 1
Dificuldade de Montagem de planos curriculares de formação 1

Fonte: construção própria com dados da entrevista.

Ainda foi possível perceber a partir dos questionários e entrevistas, que a medida política de aceitar todas as crianças matricularem no ensino básico independentemente de frequentarem os jardins-de-infância afetaram a frequência normal das crianças aos jardins-de-infância, como se pode notar nas expressões dos nossos entrevistados TME1 afirma :

No ano seguinte algumas crianças não foram para os jardins principalmente no primeiro trimestre e não foram para os jardins. A TME2 conta As crianças continuaram a ir ao jardim. A TME3 descortina dizendo: Essa lei trouxe outras desvantagens aos jardins. Os pais deixaram de pagar os jardins e as crianças mudam constantemente de jardim.

Para confrontar as informações questionamos aos profissionais de infância e vejamos o que responderam no gráfico 3 abaixo:

Fonte: construção própria com dados do questionário.

Gráfico 3 efeitos do decreto lei nº43/2008 de 24 de outubro. 

Conforme o gráfico anterior, 44,3% dos inquiridos concordam que essa medida política afetou a frequência das crianças e 24,4% concorda totalmente, por conseguinte apenas 15% e 5,2 discorda e discorda totalmente, respetivamente.

No que tange à medida de transferir os profissionais de educação de infância formados para o ensino básico os entrevistados são da opinião que isso irá dificultar o desenvolvimento da educação pré-escolar e também do ensino básico conforme as palavras dos técnicos TME1: “Esse recrutamento afetou-nos muito porque as que tinham formação davam suporte as que não tinham”. E ainda acrescenta “Poderá penalizar a educação” TME2 e TME3 não tem dúvidas e afirmam “É claro que essa saída vai influenciar a qualidade tanto da educação pré-escolar como no básico”.

Ora, com a análise documental percebemos também que o Estado se responsabiliza pela definição de políticas e criar as condições para a sua implementação, apoiando iniciativas públicas e privadas relativamente à criação de jardins-de-infância e a fiscalização do seu funcionamento. Particularmente, quando fala das atribuições dos coordenadores no artigo 4º do decreto-lei nº5/2001 de 1 de fevereiro alínea i) “cooperar com a Direção geral do ensino básico e secundário (DGBES) e a inspeção Geral na supervisão do cumprimento das orientações emanadas superiormente

Por outro lado, ficou evidente também nos documentos oficiais como o guia de atividades curriculares para o jardim-de-infância (2001) que a “criação de espaços sem condições prejudicará o desenvolvimento das crianças.

Ainda o Art 5º ponto 2 do decreto lei nº4/2001 de 1 de fevereiro diz « todas as instituições que fazem parte da rede pré-escolar devem ser previamente oficializadas pelos serviços competentes do departamento governamental responsável pela educação, através da concepção de um alvará isso é contrario aquilo que nós observamos no gráfico 4.

Fonte: Construção Própria com dados do questionário

Gráfico 4 o jardim-de-infância onde trabalha possui alvará? 

O gráfico 4 nos salienta que 47,2% dos jardins-de-infância dos nossos inquiridos possui o alvará de funcionamento, 19, 9% dos jardins-de-infância não possui, 28,5% dos inquiridos dizem que não sabem se o jardim de infância possui o alvará e 4,4% são aqueles que não responderam a essa questão.

No que concerne às práticas pedagógicas, os resultados apontam para o facto de nossos inquiridos concordarem que devem ser eles a dirigir e a decidir sobre o que as crianças fazem 45% e 9% concordam e concordam totalmente conforme se pode ver no gráfico 5. Isto vai contra o que o guia de atividades para a educação pré-escolar p.14 diz que se deve “Utilizar metodologias globalizantes centradas na criança”. E isso permitirá que a criança descubra o meio que a cerca e tenha uma aprendizagem significativa.

Fonte: Construção própria com dados do questionário.

Gráfico 5 Direção e decisão sobre as atividades das crianças 

Quanto às formações que devem possuir, os nossos inquiridos são de opinião que todo profissional deve ter uma formação universitária, conforme podemos observar no gráfico a seguir:

Os educadores de infância devem ter preparação universitária e experiência supervisionada.

Fonte: Construção própria com dados do questionário

Gráfico 6 Os educadores de infância devem ter preparação universitária e experiência supervisionada. 

Embora a maioria dos nossos inquiridos não possuírem formação na área, consideram importante ter uma formação universitária e um estágio antes de ingressarem na vida profissional. Fica evidente pelas respostas que 73,6% (se juntarmos os que concordam e os que concordam totalmente) acham essencial ter uma formação especializada na área em que labuta.

Isto também vai de acordo com aquilo que comunga a o decreto legislativo nº2/2010 de 7 de maio que diz que “a formação dos agentes do pré-escolar também deve ser superior”.

Este fato é questionável, sendo que desde do ano letivo 2012/2013 terminaram todas as formações de educadores de infância no país. Como é que se vai fazer isso?

Conclusões

Cabo Verde teve o seu primeiro Ministério da Educação e Cultura no Governo de transição para a Independência (janeiro a Julho de 1975). A partir desta data até ao momento, a educação em Cabo Verde tem vindo a evoluir de uma forma gradual e consciente, contornando sistematicamente “ (…) os desafios [para o sector educativo], exigindo o aprofundamento das reformas, a alteração ou a afirmação de claras orientações estratégicas e uma maior unidade de princípios para se conseguir um desenvolvimento equilibrado e sustentável para todo o sistema.” (Cabo Verde, 2003, p.11).

Acompanhando o movimento de massa de consciencialização sobre a importância e o papel da educação no desenvolvimento da sociedade, Cabo Verde tem-se tornado num país regenerador e partidário acerca das questões que a educação abrange, em todos os seus sectores, desde a educação de infância à extra-escolar.

Não obstante, a criança tem ocupado um lugar de destaque no quadro dos programas sociais levados a cabo por departamentos Governamentais, organizações diversas da sociedade civil, por iniciativas de carácter nacional, local e individual, de modo a promover, cada vez mais, o desenvolvimento integral da criança.

Neste sentido que consideramos que este estudo poderá trazer alguns benefícios para Cabo Verde, na medida em que durante esta pesquisa foram destacados os benefícios da independência para a educação, a evolução da educação pré-escolar após independência, e ainda o estudo frisou a infância como um dos períodos marcantes para vida do ser humano.

Consequentemente durante este estudo foi considerado pelos entrevistados que a educação pré-escolar tem tido uma evolução lenta no nosso país e que só a partir 1990, se foram desenhando políticas de expansão. No entanto, nos últimos anos, assistiu-se um grande esforço de valorização do subsistema sobretudo com a preocupação que o estado tem na formação do pessoal docente desta área conforme demonstrada no decreto lei nº 2/2010 de 7 de maio.

Entretanto a partir dos questionários ficou patente que é necessário investir na formação do pessoal docente, uma vez que a maioria dos nossos inquiridos consideram que o pessoal afeto à educação pré-escolar deve possuir uma formação universitária, que algumas medidas políticas desfavorecem a educação pré-escolar como por exemplo a saída do pessoal formado para o Ensino Básico bem como a lei que permite que todos tem acesso ao ensino básico com 6 anos independentemente da frequência à Educação Pré-escolar, foi possível perceber que os jardins de infância funcionam sem alvará o que permite que alguns espaços funcionem sem condições, no que tange a prática pedagógica dos profissionais ficou evidente que alguns profissionais tem uma prática inadequada uma vez que possuem uma metodologia centrada nelas em vez centrar nas crianças.

Apesar da sensibilização para esta etapa educativa, concluímos que há necessidade de ação por parte do Estado, e outras entidades e investir na educação pré-escolar como fator de desenvolvimento sustentável.

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1Cabo Verde tomou Independência de Portugal em 1975

2formação média de três anos para todos interessados habilitados com o 10ºano.

3formação de curta duração (10 meses) de apoio a prática pedagógica para todas as orientadoras em exercício de funções.

4formação média para as orientadoras e monitoras com pelo menos 10ºano de escolaridade em exercício de funções.

5Esse curso especial foi destinado apenas as orientadoras de educação de infância do concelho de São Miguel com apoio da Bornefonden. E foi desenvolvido em duas fases (a 1ª fase para aquelas com menos habilitações literárias com intuito de elevar o nível académico e a segunda fase para todas as orientadoras que não tinham nenhuma capacitação na área incluído as que que frequentaram a primeira fase).

Recebido: 26 de Julho de 2019; Aceito: 30 de Outubro de 2019; Publicado: 17 de Dezembro de 2019

Correspondência Catarina Fernandes Delgado - Universidade de Cabo Verde - Palmarejo, 7600, Praia, Cabo Verde.

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