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Educação UFSM

versión impresa ISSN 0101-9031versión On-line ISSN 1984-6444

Educação. Santa Maria vol.44  Santa Maria  2019  Epub 11-Nov-2020

https://doi.org/10.5902/1984644437930 

Resenha

LDB 1996 vinte anos depois: projetos educacionais em disputa

LDB 1996 twenty years later: educational projects in dispute

*Doutoranda na Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, São Paulo, Brasil. angelahessufgd@gmail.com

BRZEZINSKI, Iria. LDB/1996 vinte anos depois: projetos educacionais em disputa. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2018.


O livro “LDB 1996 vinte anos depois: projetos educacionais em disputa”, publicado pela editora Cortez, em 2018, foi organizado pela Professora Doutora Iria Brzezinski e tem como objetivo apresentar um panorama crítico da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, tendo por eixo norteador a análise minuciosa da agenda de disputas do campo na materialização deste dispositivo legal.

É apresentado de forma clara e consistente em 358 páginas, com dez capítulos, que abordam resultados de estudos e pesquisas sobre o processo de materialização da LDB nestes últimos vinte anos. Educadores de referência em diferentes especialidades retomam a lei e suas alterações no transcorrer dos anos, e a confrontam com uma visão política clara e estruturada em prol do desenvolvimento do país.

A coletânea engloba um conjunto articulado de temáticas: o sistema nacional de educação e regime de colaboração; a aproximação filosófica da LDB; a base nacional comum curricular; a formação de profissionais da educação, professores e funcionários da educação básica; a educação básica; a educação infantil; a educação de jovens e adultos; a educação superior; e, o financiamento da educação.

No primeiro capítulo, intitulado Sistema Nacional de Educação Nacional e regime de colaboração, Dermeval Saviani fala sobre construir um conjunto unificado que articula todos os aspectos da educação no país inteiro, com normas válidas para todo o território nacional e com procedimentos também comuns, visando a assegurar educação com o mesmo padrão de qualidade a todos.

O autor diz que o Sistema Nacional de Educação é “[...] a organização intencional e planejada de todos os aspectos da educação efetivada em regime de colaboração pela União, Estados, Distrito federal e Municípios” (SAVIANI, 2019, p. 44). Termina o capítulo criticando o atual momento do país de retrocesso político “em que está em curso o desmonte até mesmo das ainda limitadas conquistas educacionais obtidas nos últimos anos” (SAVIANI, 2019, p. 45), comprometendo a implementação do Plano Nacional de Educação.

O segundo capítulo de autoria de Antônio Joaquim Severino tem o título Por uma aproximação filosófica da LDB/1996: a difícil construção da cidadania. O autor apresenta a construção da cidadania proposta pela LDB/1996 em seu art. 2º, realiza uma retrospectiva histórica das múltiplas modificações feitas durante os vinte anos de LDB/1996. Reconhece que o texto final da LDB/1996 é resultado histórico possível frente ao jogo de interesses em conflito no contexto da conjuntura política da sociedade brasileira, na época de sua aprovação.

O terceiro capítulo, Vinte anos da LDB: da base nacional comum à base nacional comum curricular, de Márcia Ângela Aguiar, tem por objeto a Base Nacional Comum Curricular (BNCC). A autora analisa o contexto educacional durante a elaboração das três versões da BNCC e destaca que, pelo menos, três protagonistas estão no campo da disputa quanto ao estabelecimento da BNCC para a Educação Básica, que são os reformadores liberais, em seus diversos matizes; os reacionários, que se identificam com as posições da Escola sem Partido; os defensores de uma educação pública, gratuita, laica e de qualidade social. Comenta sobre as críticas que marcaram o processo de elaboração da BNCC e encerra o capítulo com duas perguntas: “Qual o destino da BNCC no chão da escola? O direito à educação básica será materializado?” (AGUIAR, 2019, p. 60).

No quarto capítulo, Formação de Profissionais do Magistério na LDB/1996: a disputa entre projetos educacionais antagônicos, Iria Brzezinski, organizadora deste livro, trata das alterações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, ocorridas em duas décadas, as quais impactaram direta ou indiretamente a formação e valorização dos profissionais do magistério. Desvela a existência de dois projetos antagônicos: um do mundo do sistema, originário do jogo das interações inerentes à sociedade moderna racional e dessacralizada, e outro procedente do mundo vivido dos educadores. A autora foca em várias alterações na LDB/1996, no entanto faz um recorte temporal que abrange de julho de 2013 a agosto de 2017. Ressalta, por um lado, um avanço na concepção de profissionais da educação a existência no Título V - “Dos Profissionais da Educação” (art. 61 a 67). Por outro lado, comenta o retrocesso conceitual na Lei n. 13.415 de 16/2/2017.

O capítulo quinto, Políticas de formação de profissionais da educação: funcionários da educação básica e a LDB/1996 vinte anos, das autoras Iria Brzezinski e Juçara Vieira, destaca-se pelas análises das políticas de formação de profissionais da educação, especificamente, dos funcionários da educação básica, provocadas por modificações na LDB/1996. As autoras realizam a reflexão sobre a identidade profissional dos funcionários, configurada na luta pelo reconhecimento de seu significativo papel de educador nos espaços educacionais.

No sexto capítulo, intitulado Educação Infantil: vinte anos de mudanças desde a LDB/1996, de Maria Malta Campos, ressalta-se que com a LDB/1996 e com a aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB, Lei n. 11.494/2007) houve um ganho no ordenamento legal e institucional para a educação infantil. A autora termina o capítulo destacando as mudanças ocorridas na conjuntura política e os retrocessos no financiamento da educação que podem colocar limites aos progressos registrados nos últimos vinte anos.

O sétimo capítulo, de Eva Wairos Pereira e Zuleide Araújo Teixeira, A LDB e os novos contornos da educação básica, traz a análise sobre a educação básica e críticas à inexistente identidade do ensino médio, que se apresentou e ainda se apresenta no contexto educacional brasileiro com uma cruel dualidade: ensino propedêutico como privilégio da classe hegemônica, que visa ao ingresso no ensino superior e ensino técnico-profissional reservado à classe popular, a fim de o jovem lançar-se prematuramente no mercado de trabalho. Nas conclusões, as autoras desafiam a lutar para que o Plano Nacional de Educação (2014-2024) seja posto em prática, como forma de enfrentamento da atual conjuntura nacional.

No oitavo capítulo, Educação Superior no Brasil: disputas e tensões no processo de expansão pós-LDB, de autoria de Antônio Cabral Neto e Alda Maria Duarte Araújo Castro, tem-se como embasamento inicial a análise da globalização como um cenário que impõe graus crescentes de qualificação da força de trabalho em todos os níveis, o que tem contribuído para a massificação do ensino superior; e posteriormente, a reflexão sobre a expansão do ensino superior no Brasil. Sobre o conjunto dos dados analisados pelos autores sobre o ensino superior, em nível de graduação, na modalidade presencial no Brasil, indica que vem se delineando um processo de expansão desde 1996 até o ano de 2014, e que essa tendência de crescimento vem passando gradativamente por um processo de desaceleração. Os autores dizem que as modificações na LDB/2016 durante duas décadas imprimem ao ensino superior ora avanços, ora retrocessos que causam estranhamento aos seus estudiosos.

O nono capítulo, intitulado A educação de pessoas jovens e adultas na LDB: um olhar passados 20 anos, de Salomão Ximenes e Sérgio Haddad, apresenta as muitas mudanças ocorridas na LDB/1996 em decorrência da EC n. 95/2016 e da MP n. 746/2016 que reestruturou o currículo do ensino médio. Os autores realizam uma inserção na história da educação brasileira para focalizar o direito de pessoas jovens e adultas se escolarizarem. O autores falam que, passados mais de vinte anos de promulgação da LDB, surgiram novas normas jurídicas, além das alterações legais na própria LDB, que deram conteúdo ao direito à educação de jovens e adultos previsto na Constituição; as principais são os planos nacionais de educação - PNE 2001 - 2011 e PNE 2014 - 2024, além da Emendas Constitucionais n. 53, de 2006, e n. 59, de 2009. Assinalam, em suas análises, que a Lei da reforma do ensino médio reforça a segregação da população jovem e adulta e o desprestígio da modalidade EJA.

O décimo e último capítulo, Financiamento da Educação na Constituição e na LDB Emendadas, de autoria de João Antônio Cabral de Monlevade, versa sobre a história do que foi outorgado ou proclamado nas Constituições brasileiras a respeito do financiamento da educação. Destaca que, na contemporaneidade, o governo Temer não nega a importância da educação básica, gratuita e estatal para todos os cidadãos brasileiros, mas, arbitrariamente, impôs a EC n. 95/2016, em que os gastos federais foram congelados por vinte anos, até mesmo os recursos oriundos de impostos vinculados à educação e à saúde, o que fere dispositivos constitucionais.

O processo analítico da LDB/1996 desenvolvido pelos treze autores nos dez capítulos da obra “LDB/1996 vinte anos depois: projetos educacionais em disputa” abriga uma dialética intrínseca. No decorrer dos textos encontramos a construção que resulta de pesquisas no campo das políticas educacionais articuladas na sistematização das disputas existentes nesse campo. Tratam-se dos embates entre os atores de dois mundos com ideários conflitantes sobre as concepções de sociedade, cidadania, educação, escola e ensino: o mundo real, dos educadores, e o oficial, o mundo do sistema educativo.

Cury (2016) ao colocar em tela os vinte anos de promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/1996, ressalta a importância dessa data, da seguinte forma:

Ela é uma oportunidade para se refletir sobre uma lei importante como um momento de recuo na história da educação, quanto de uma visada da situação atual. Pelo recuo é oportuno rever caminhos feitos, uma espécie de balanço e, abastecidos por este dobrar-se sobre si mesmo (re-flexão), pensar no quadro atual e em perspectivas desafiadoras que mantenha caminhos exitosos já trilhados, repense vias derreadas e anuncie vias novas (CURY, 2016, p. 4).

Ao envolver pesquisadores de diversas Universidades brasileiras, a obra reúne trabalhos acadêmicos que carregam em si uma forte conotação política, com reflexões e análises que objetivam interpretar as tensões existentes nas políticas educacionais brasileiras. Desencadeia-se em um convite aos leitores e leitoras a constatar na leitura da LDB/1996, vinte anos depois, as contradições nas políticas educacionais desveladas pelos projetos educacionais em disputa.

Por fim, pode-se afirmar que a obra constitui-se em uma contribuição de qualidade para as discussões acerca do cenário da proposição que resultou na LDB/1996 e no embate entre os diferentes atores (nacionais e transnacionais) envolvendo concepções distintas de sociedade e educação. Também apreendendo os avanços alcançados e, paradoxalmente, situando limites e retrocessos que permearam a agenda da materialização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira. Representa uma contribuição a todos os que se interessam pesquisar a temática e para gestores educacionais, coordenadores de cursos, docentes, pós-graduandos e discentes de cursos no ensino superior.

Referências

BRZEZINSKI, Iria (Org.). LDB/1996 vinte anos depois: projetos educacionais em disputa. 1. ed. São Paulo: Cortez, 2018. [ Links ]

CURY, Carlos Roberto Jamil. Vinte Anos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN). Jornal de Políticas Educacionais. v.10, n.20, julho-dezembro de 2016. p. 03-17. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/jpe/article/download/49964/32 545. Acesso em: 14 jul. 2019. [ Links ]

Recebido: 01 de Maio de 2019; Aceito: 22 de Julho de 2019; Publicado: 09 de Outubro de 2019

Correspondência Angela Hess Gumieiro - Universidade Estadual Paulista - R. Roberto Símonsen, 305 - Centro Educacional, CEP 19060-900, Presidente Prudente, São Paulo, Brasil.

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