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Educação UFSM

versión impresa ISSN 0101-9031versión On-line ISSN 1984-6444

Educação. Santa Maria vol.46  Santa Maria ene./dic 2021  Epub 05-Oct-2023

https://doi.org/10.5902/1984644442721 

Artigo Demanda Contínua

Infraestrutura das creches e pré-escolas em Belo Horizonte: condições de oferta e distribuição territorial

Early childhood education infrastructure in Belo Horizonte: offer conditions and territorial distribution

Franceline Rodrigues Silva1 
http://orcid.org/0000-0003-0213-3192

Daniel Santos Braga2 
http://orcid.org/0000-0001-5075-4570

Lívia Maria Fraga Vieira3 

1Doutoranda na Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. franceline.rodrigues30@gmail.com

2Doutorando na Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. danielsantosbraga@gmail.com

3Professora doutora na Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. liviafraga59@gmail.com


RESUMO

Este artigo tem como objetivo discutir as condições de oferta da educação infantil em Belo Horizonte no tocante à sua estrutura física e distribuição territorial. Foram utilizados como fontes de dados o Censo Escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira do ano de 2018 e o Atlas Brasil. A construção dos indicadores de adequação das condições de oferta foi feita por uma escala numérica contínua aferida para melhor se adequar aos propósitos deste estudo tendo como unidade de análise as escolas de educação infantil públicas e privadas (conveniadas ao poder público ou não) e sua relação com a Unidade de Desenvolvimento Humano à qual pertencia. Este trabalho tem como principais achados a constatação da precariedade das condições de oferta das escolas de educação infantil de Belo Horizonte. Por outro lado, evidenciou-se que a distribuição territorial das creches e pré-escolas corresponde satisfatoriamente a demanda assim como as escolas públicas estão presentes nas áreas com maiores necessidades de atendimento por parte do Estado.

Palavras-chave: Educação infantil; Condições de oferta educacional; Infraestrutura de escolas.

ABSTRACT

This article aims at discussing the offer conditions for early childhood education in Belo Horizonte concerning its physical structure and territorial distribution. The National Institute of Educational Studies and Research's 2018 School Census and Atlas Brasil were used as data sources. The construction of the supply conditions adequacy indicators was made by a continuous numerical scale measured to better fit the purposes of this study having as unit of analysis the public and private schools of infant education (convened to the public power or not) and its relationship with the Human Development Unit to which it belonged. The main findings of this study are the evidence of the Belo Horizonte' early childhood education precarious supply conditions schools, as well as their unequal territorial distribution, taking into account the needs of the population of regulatory age for this stage.

Keywords: Child education; Conditions of educational offer; School infrastructure.

Introdução

A Constituição Federal de 1988 em seus artigos relacionados à educação (205 a 214) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 9.394/96 de 15 de outubro de 1996, são importantes marcos na trajetória histórica pela democratização do acesso à educação escolar no Brasil. Nessas legislações, pela primeira vez na história do país, a educação é estabelecida como um direito público subjetivo, tendo o Estado um dever para com a sua oferta. Além disso, também pela primeira vez a educação escolar de crianças de zero a cinco anos, a educação infantil, é colocada como parte do ensino oficial, compondo com o ensino fundamental e médio, a educação básica. Os Planos Nacionais de Educação - PNEs - de 2001 (Lei 10.172) e 2014 (Lei 13.005), formulados conforme exigência da LDB buscaram corroborar com esse ideal, traçando objetivos decenais para ampliação da oferta e do acesso a essa etapa de ensino.

Entretanto, estudos apontam que o país está longe de cumprir as metas estabelecidas pelos planos decenais (OCDE, 2017; OBSERVATÓRIO, 2018) permanecendo excluídas da educação escolar em 2017 um número significativo de crianças de quatro e cinco anos (cerca de 9,5% - 500 mil crianças) e um número ainda maior de crianças de zero a três anos (cerca de 69,6% - déficit de 2,4 milhões de vagas). Ainda que nas últimas décadas tenha existido um esforço no sentido de se superar os obstáculos da universalização da educação infantil, pesquisas revelam o tamanho dos desafios da ampliação dessa etapa da educação básica (SILVA, 2017). O diagnóstico do PNE de 2001 já apontava que a maioria dos estabelecimentos não contava com profissionais qualificados e não dispunham de mobiliário, brinquedos e outros materiais pedagógicos adequados (BRASIL, 2001). Esse diagnóstico foi repetido quase que na íntegra no documento de referência do PNE de 2014, aprovado pela Conferência Nacional de Educação (BRASIL, 2010), sugerindo a permanência das dificuldades da expansão da educação infantil.

Belo Horizonte também foi palco de discussões sobre a oferta de educação escolar para crianças de zero a cinco anos no esteio da promulgação da Constituição de 1988 e da LDB/1996 que consolidaram a educação infantil como etapa da educação básica. Esses debates se intensificaram no final dos anos de 1990 com emergência de governos ligados à setores do campo democrático-popular, que chegaram ao poder com o discurso de atender às reivindicações de ampliação de vagas na escola pública. Em 1998, foi instituído o Sistema Municipal de Ensino, composto por instituições de educação infantil, ensino fundamental e médio, mantidas pelo Poder Público Municipal, instituições de Educação infantil criadas e mantidas pela iniciativa privada e órgãos municipais de educação através da Lei 7.543/98. A mesma lei criou o Conselho Municipal de Educação de Belo Horizonte (CME/BH), órgão de caráter deliberativo, normativo e consultivo, que tinha por objetivo assegurar aos grupos representativos da sociedade o direito de participar da definição das diretrizes da educação no âmbito municipal.

Com base nessas atribuições, em 2000, o CME/BH regulamentou a educação infantil no município, e, a partir daí, as instituições de cuidado e educação da criança de zero a cinco anos deveriam cumprir as normas estabelecidas pela Resolução CME/BH 01/2000, relativos ao quadro de profissionais, aos espaços, instalações e equipamentos, à proposta pedagógica, à documentação, entre outras. Embora as creches e pré-escolas tivessem autonomia na formulação de suas propostas pedagógicas, estas precisavam estar de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação infantil, definidas pelo Conselho Nacional de Educação (2009).

A partir de 2003, a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte iniciou um processo de implementação de Unidades Municipais de Educação infantil (UMEIs) que se tornaram referência de qualidade na oferta de ensino dessa etapa. Assim, a educação infantil em Belo Horizonte passou a ser ofertada por diferentes tipos de instituições, tais como UMEIs, escolas de ensino fundamental com turmas de educação infantil, creches e pré-escolas conveniadas com a prefeitura além de instituições privadas (particulares, confessionais e filantrópicas).

Diante de um contexto de grande déficit de vagas em escolas para crianças de zero a cinco anos, o PNE 2014-2024 estabeleceu em sua meta 1 a universalização do acesso às pré-escolas e a ampliação da oferta de vagas nas creches de forma a atender, no mínimo, 50% das crianças de zero a três anos até 2024. Além disso, a meta 7 definiu o fomento à qualidade em todas as etapas da educação básica, incluindo a educação infantil. Uma das estratégias para esse esforço seria a determinação de padrões mínimos de qualidade dos serviços da educação básica, a serem utilizados como referência para infraestrutura das escolas, recursos pedagógicos, entre outros insumos relevantes (estratégia 7.21).

Dada a coexistência de diferentes estabelecimentos de educação infantil em Belo Horizonte, o objetivo deste artigo é analisar as condições de oferta das creches e pré-escolas no município. Para isso, foram utilizados os dados do Censo Escolar (formulário das turmas e das escolas) do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) do ano de 2016. O artigo foi dividido em duas partes. Na primeira, foi feito uma discussão sobre a especificidade jurídica da educação infantil assim como o seu desenvolvimento histórico no município de Belo Horizonte. Na segunda parte, foi traçado o perfil das condições de oferta da educação infantil no município em dois parâmetros: infraestrutura dos estabelecimentos e sua distribuição territorial.

A educação infantil e sua trajetória em Belo Horizonte

A educação infantil, hoje composta pelos segmentos de creches e pré-escolas estabelecida no espaço escolar e no sistema educacional, é uma construção social e histórica. Para se concretizar como tal, teve que em sua trajetória forjar uma nova possibilidade de educação da criança pequena que se dá também no espaço público, não restrito apenas à responsabilidade do núcleo familiar. Em estudos que se propõem a resgatar a história da creche e pré-escola no país (KUHLMANN JR., 2000; CAMPOS et al., 1981; SILVA, 2008) esse processo de construção e institucionalização da educação infantil fica evidente como um histórico de um entrelaçar de vários sujeitos e contextos que tem seus significados revisados: do núcleo familiar como não sendo mais o único espaço destinado a educar e cuidar da criança; da mulher que passa a acumular o trabalho doméstico com o extra doméstico para participar das despesas do lar ou para arcar com a subsistência familiar na lógica do sistema de produção capitalista e, por fim a um novo paradigma sobre a infância, que enxerga a criança dissociada daquela do adulto em miniatura ou de uma imagem universal de fragilidade, concebendo a criança como um sujeito de direitos, histórico e cultural.

Os próprios movimentos reivindicatórios da expansão do atendimento da primeira infância no espaço da creche e pré-escola passam a inserir na sua discussão outras contribuições para se pensar a educação infantil como é tida hoje, as quais já caminham para a noção de direito. Essa concepção distancia-se, em certa medida, de uma noção de educação compensatória e assistencialista presente no final do século XIX no Brasil, ou seja, aquela que visava atender apenas àqueles mais pobres, muitas vezes ofertando o atendimento em condições bem precárias perante o exíguo investimento, quando existia, por parte do poder público e sem referências de caráter educacional (CAMPOS et al., 1981; ROSEMBERG, 1984).

O atendimento público na Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte (RME/BH) fora iniciado em 1957, quando da inauguraçãodo Jardim Municipal da Renascença (BELO HORIZONTE, 2016). De 1957 até o ano de 2003, o atendimento proporcionado às crianças pequenas na RME/BH se deu apenas para a faixa etária de quatro a seis anos, em horário parcial, nas escolas municipais de educação infantil e em escolas municipais do ensino fundamental, nas quais funcionavam algumas turmas de educação infantil.

Para se ter uma ideia em termos numéricos dessa cobertura, a educação pré-escolar realizada pela rede pública municipal, segundo Silva (2002, p.66) “até 1975 o ensino pré-escolar municipal atendia apenas 602 crianças entre quatro e seis anos em jardins de infância e classes anexas ao ensino fundamental”. Com o transcorrer dos anos, especificamente no período de 1983 a 1992, o atendimento na rede pública municipal, na faixa etária de quatro a seis anos, apresenta um crescimento progressivo, sendo atendidas em 1983 três mil e quinhentas e sessenta uma (3.561) crianças, chegando em 1992 a seis mil duzentas e trinta e nove (6.239) crianças matriculadas (SILVA, 2002). O que à primeira vista pode ser considerado como grande avanço o aumento de quase 100% na oferta pública do segmento da pré-escola no município. Todavia, numa análise mais acurada feita por Silva (2002), é evidenciada uma cobertura não só insuficiente como bem aquém da demanda do município de BH, pois “em 1991, o município contava com 267.168 habitantes entre zero a seis anos (segundo dados do IBGE), sendo que apenas 4.259, entre quatro e seis anos, estavam matriculados na rede pública municipal”.

Com relação às condições de funcionamento desses estabelecimentos de ensino fundamental, que ofertavam em seus espaços anexos a educação infantil à época, o documento das Proposições Curriculares para a educação infantil descreve:

Muitas vezes, o atendimento da educação infantil em escolas de ensino fundamental era realizado em condições inadequadas: ausência de espaços e mobiliário apropriados, falta de banheiros e refeitório adaptados, alimentação igual à das crianças mais velhas. Não existia, também, uma proposta pedagógica que apresentasse concepções coerentes com as necessidades e especificidades das crianças de três a seis anos. Os profissionais que atuavam na Educação infantil eram professores concursados para o Ensino fundamental (BELO HORIZONTE, 2016, grifo nosso).

O atendimento das crianças de zero a três anos, por sua vez, não fugia à regra das dificuldades enfrentadas pelo segmento da pré-escola, podendo julgar que seus desafios para se sustentar eram até maiores, pois o atendimento dessas crianças não era contemplado pela rede pública municipal de Belo Horizonte. Inicialmente, nas décadas de 1950 e 1960, esse atendimento realizava-se em creches de origem filantrópica, surgindo nos anos de 1970 creches comunitárias para somar o atendimento nessa faixa etária (TERRA, 2008). O surgimento das creches comunitárias encontra justificativa no movimento de mães trabalhadoras que reivindicavam um lugar de guarda e educação para os seus filhos, como podemos apreender nas palavras do estudo empenhado por Isa Silva (2002):

Data desse período, final da década de 1970 e início da de 1980, a eclosão de um amplo movimento social, de mães trabalhadoras, na busca não só de um espaço de guarda, mas também educativo para seus filhos. Com a ausência de uma rede pública de atendimento à criança pequena na Região Metropolitana de Belo Horizonte, começaram a ser criadas as creches comunitárias (SILVA, 2002, p. 69).

Muitas dessas instituições comunitárias mantinham o seu funcionamento graças ao empenho das mulheres moradoras dos bairros das periferias da cidade, por vezes voluntárias nessas instituições, a Igreja e outras organizações (SILVA, 2008). Os esforços dessas mulheres e grupos de apoio, sem o suporte do poder público, porém ainda era incapaz de munir a creche comunitária de tudo o que ela necessitava para oferecer um serviço de qualidade de atendimento educacional ao público infantil (SILVA, 2002):

As primeiras creches apresentavam características de atendimento que se assemelhavam ao modelo familiar, com o trabalho sendo realizado em espaços domiciliares improvisados, pouco adequados a um atendimento coletivo. As professoras, até então denominadas crecheiras ou educadoras, não mantinham vínculo empregatício com as creches, realizando um trabalho voluntário ou recebendo pequenas gratificações. Como não contavam com experiências anteriores de trabalhos institucionais ou com habilitação específica para o trabalho em creche, pautavam-se, para a realização das atividades com as crianças, pelas suas referências como mães ou pelas lembranças fragmentadas do período em que frequentavam a escola. Desse modo, a atuação delas oscilava entre as referências familiares e as tentativas de reprodução do modelo escolar (SILVA, 2002, p. 73, grifo nosso).

A precariedade de políticas públicas educacionais para as crianças pequenas da cidade e a escassez de recursos para as creches comunitárias levou a mobilização - de mães, mulheres e grupos de apoio como a comunidade eclesial de base e outros setores sociais - à criação do Movimento de Luta Pró-Creche (MLPC), que objetivava, em um primeiro momento, obter recursos financeiros para manter o funcionamento das atividades dessas creches (SILVA, 2008). Com sua atuação voltada à obtenção de recursos públicos para propiciar a manutenção das creches comunitárias, após mais de uma década da trajetória, o Movimento de Luta Pró-Creches conseguiu no ano de 1983 a assinatura do primeiro convênio com a Prefeitura de Belo Horizonte, por intermédio da Secretaria de Saúde (VEIGA, 2005). É importante ressaltar que, mesmo depois de firmado os primeiros convênios entre a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e as creches comunitárias, essas instituições enfrentaram problemas com atrasos no repasse de recursos financeiros, sem a devida correção monetária em um período de alto índice de inflação (SILVA, 2002).

Além disso, na perspectiva de recuperar a noção de atendimento educacional para as crianças pequenas à época dos primeiros convênios firmados pela PBH, vale destacar que estes estavam orientados por uma concepção assistencialista, visando ao atendimento das crianças mais pobres, filhos de mães com trabalho extradomiciliar, ou seja, a finalidade da contribuição financeira da Prefeitura de Belo Horizonte para com as creches comunitárias não se pautava na perspectiva do direito da criança à educação, mas na noção de amparo às mães mais necessitadas que não tivessem onde deixar seus filhos durante sua jornada de trabalho.

O início do desenvolvimento da política pública da educação infantil no município coincide com as mudanças no ordenamento jurídico nacional que passa a reconhecer a educação infantil como a primeira etapa da educação básica e a sua oferta como a efetivação do direito constitucional do acesso de toda a população à educação (BRASIL, 1996; BRASIL, 1988), como pode ser visto a seguir no documento das Proposições Curriculares para a educação infantil.

A partir de 1993, surgiram ações políticas municipais mais sistematizadas que buscaram melhorar as condições de atendimento e implementar diretrizes específicas para a Educação infantil. Com a publicação da LDBEN 9.394, em 1996, e o status de primeira etapa da educação básica, a educação infantil começa a ter, nacionalmente e também em Belo Horizonte, o reconhecimento de sua importância e o direcionamento político necessário à sua consolidação (BELO HORIZONTE, 2016).

Dialogando com os avanços da legislação nacional em relação às creches e pré-escolas e em direção ao reconhecimento da educação infantil como uma etapa da educação básica, ainda na década de 1990, especificamente em 21 de março de 1990 é promulgada a Lei Orgânica do Município de Belo Horizontee, posteriormente em 1998, é constituído o Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte (SME/BH) com a sanção feita pelo prefeito Célio de Castro por meio da Lei nº 7543, de 30 de junho de 1998. Um impacto direto da criação do Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte na educação infantilé a transferência do gerenciamento, no ano de 2002, de 176 creches conveniadas da Secretaria Municipal de Assistência Social para a Secretaria Municipal de Educação (TERRA, 2008). Além da instituição do SME/BH, a Lei nº 7543/1998 foi responsável por criar o Conselho Municipal de Educação (CME/BH), órgão de caráter deliberativo, normativo e consultivo, tendo este como objetivo assegurar a participação de grupos representativos da comunidade na definição de diretrizes educacionais para o município.

O ápice dessas políticas municipais que buscavam melhorar as condições de atendimento da educação infantil de Belo Horizonte articulada aos avanços no campo normativo nacional em relação à primeira etapa da educação básica é a aprovação em 11 de novembro de 2003 da Lei nº 8.679/2003. Por meio da legislação são criadas as UMEIs e o cargo de Educador Infantil (BELO HORIZONTE, 2003). Até essa data, a ampliação do atendimento às crianças na faixa etária da educação infantil no município de Belo Horizonte, basicamente centralizava-se nas instituições conveniadas com a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte (PINTO, 2009). As UMEIs, como indica a legislação municipal, foram criadas com a finalidade "de garantir pleno atendimento educacional às crianças de até 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de idade, bem como, são consideradas um projeto arquitetônico referência no país, como destaca a publicação do jornal Pensar a Educação em Pauta, no dia 17 de agosto de 2017:

O projeto arquitetônico das UMEIs se conforma como um projeto arrojado: sua importância está comprovada pelo fato de ele ser referência no Estado de Minas Gerais (e quiçá no país). Isso se dá em função de que, pela primeira vez no município, uma equipe interdisciplinar (formada por arquitetos, engenheiros, pedagogos e outros profissionais) se reuniu para pensar, arquitetar e construir um padrão de instituição que fosse sensível às necessidades das crianças em termos de cuidado e educação. Exemplo maior da grandeza desse programa de construção de instituições de Educação infantil é o fato de que ele se tornou referência obrigatória no Ministério da Educação, tanto que o projeto arquitetônico das UMEIs de Belo Horizonte está presente nos Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação infantil como exemplo de construção para todo o país (SANTOS, 2017, n.p, grifo nosso).

Em consonância com o processo de consolidação da educação infantil em Belo Horizonte, três anos antes da criação das UMEIs, o Conselho Municipal de Educação vota a Resolução CME/BH nº 01/2000, substituída, em 2015, pela Resolução nº 001/2015, fixando as normas para a educação infantil no Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte (BELO HORIZONTE, 2015). Ambas as resoluções trazem determinações para os espaços, instalações e equipamentos das instituições de educação infantil no Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte, disponíveis no quadro abaixo:

Quadro 1 Determinações legais para os espaços, instalações e equipamentos de instituições de educação infantil de Belo Horizonte 

Resolução CME/BH nº 01/2000 (art. 14) Resolução CME/BH nº 001/2015 (art. 50)
Espaço para recepção; Recepção;
Sala de professores, para serviço administrativo-pedagógico e de apoio; Sala própria para atividades administrativas e pedagógicas/ sala de professores;
Salas para as atividades das crianças, com ventilação adequada, iluminação natural e artificial e visão para o ambiente externo, com mobiliário e equipamentos adequados; Salas para atividade das crianças, com dimensões que garantam, no mínimo, 1m² (um metro quadrado) por criança, com ventilação direta e iluminação natural, que podem ser complementadas com a artificial;
Refeitório, instalações e equipamentos para o preparo de alimentos, que atendam às exigências de nutrição, saúde, higiene e segurança, nos casos de oferta de alimentação; Refeitório/ Instalações, equipamentos e condições para o preparo e/ou fornecimento de alimentos, que atendam às exigências de nutrição, saúde, higiene e segurança;
Disponibilidade de água potável para consumo e higienização; Instalação de água potável para consumo e higienização, acessível às crianças;
Instalações sanitárias completas, adequadas e suficientes para atender separadamente crianças e adultos; Banheiros infantis adequados às faixas etárias atendidas, com portas desprovidas de chaves e trincos, que garantam a proporção de: 1 (um) vaso sanitário para cada 20 (vinte) crianças; 1 (um) lavatório para cada 20 (vinte) crianças; chuveiros em quantidade suficiente para atender a rotina de banho definida pela instituição, tendo como parâmetro 1 (um) chuveiro para cada 20 (vinte) crianças;/ Banheiros, para uso exclusivo de adultos, com instalações sanitárias completas;/
Área com incidência direta de raios de sol ou espaço externo que atenda a essa necessidade; Mobiliário e equipamentos adequados às atividades pedagógicas, em quantidade suficiente e tamanho proporcional à faixa etária atendida, não se constituindo em obstáculo nem cerceamento à liberdade de movimento das crianças/ Banheiro infantil equipado para atender crianças com deficiência ou adaptações nos banheiros existentes;
Área de serviço, lavanderia; Área de serviço/lavanderia devidamente equipada com tanque; depósito de material de limpeza e armário para guardar vassouras, rodos e similares, adequados e em bom estado de conservação e segurança; local adequado para depósito de lixo, que não permita o acesso das crianças;
Área coberta para atividades externas compatível
com a capacidade de atendimento, por turno, da instituição.
Espaço externo organizado com:
a) área com incidência direta de raios solares;
b) área coberta;
c) área verde;
d) parque infantil.
Berçário provido de berços individuais, com espaço mínimo de meio metro entre eles, dentro das normas de segurança específicas para este mobiliário, com área livre para movimentação das crianças, locais para amamentação e para higienização de utensílios, com balcão e pia, espaço próprio para banho das crianças; __
__ Sala multiuso destinada a atividades diferenciadas, planejadas de acordo com a proposta pedagógica, com equipamentos e acessórios adequados;
__ Biblioteca ou cantinhos de leitura nas salas de atividade ou sala multiuso.
__ Materialidade, jogos e brinquedos adequados à faixa etária atendida, em boas condições de uso e segurança incluindo os que valorizem a diversidade étnico racial.
ESPAÇOS PRÓPRIOS PARA INSTITUIÇÃO QUE ATENDER CRIANÇAS DE 0 (ZERO) A 2 (DOIS) ANOS DE IDADE
___ Ambiente para repouso provido de berços individuais ou similares, que respeitem a distância mínima de 50 (cinquenta) centímetros entre eles e as paredes;
___ Ambiente que possibilite a movimentação e estimulação das crianças;
___ Solário próprio ou área livre para o banho de sol
___ Local para banho e de troca de roupa das crianças, com lavatório para utilização dos adultos;
___ Local para guardar os materiais de higiene de uso individual das crianças;
___ Lactário;
___ Materialidade e brinquedos adequados à faixa etária atendida, em boas condições de uso e segurança incluindo os que valorizam a diversidade étnico racial.

Fonte: Elaboração própria a partir das informações disponíveis nas Resoluções do Conselho Municipal de Educação (2000, 2015).

Percebe-se que ambas as resoluções (2000, 2015) compartilham a maior parte dos espaços físicos enumerados e considerados básicos para atender funções que são próprias das creches e pré-escolas, a saber: recepção, sala de professores, de serviço administrativo-pedagógico, sala para atividade das crianças, refeitório, água potável para consumo e higienização, banheiros adequados às crianças e para uso exclusivo dos adultos, jogos, brinquedos, lavanderia, área para atividade externa (coberto, área verde, parque infantil). Na Resolução CME/BH nº 001/2015 são arrolados ainda os espaços de multiuso, biblioteca ou cantinhos de leitura, bem como, espaços próprios para as instituições que atendem crianças de 0 a 2 anos de idade, como ambiente de repouso provido de berços ou similares, solário, local para banho, para guardar materiais de higiene, bem como brinquedos e materialidade adequada à faixa etária.

O respeito a tal normativa do CM/BH (2015) pelas instituições de educação infantil do Sistema Municipal de Ensino de Belo Horizonte não poderia ser mera formalidade ou uma alternativa a ser seguida pelas escolas a fim de evitar as sanções da sua inobservância. O espaço escolar é elemento-chave a ser observado no planejamento do desenvolvimento integral da criança, uma forma silenciosa de ensino. O espaço físico é um ingrediente que potencializa (ou restringe) a expressão da criança, bem como revela a pedagogia adotada pelas instituições escolares (NASCIMENTO; FIRME; CUNHA, 2015).

Infraestrutura e distribuição territorial das escolas de educação infantil em Belo Horizonte

Para mensurar a infraestrutura das escolas de educação infantil em Belo Horizonte, foram utilizados os dados do Censo Escolar de 2018. O Censo é uma pesquisa declaratória realizada todos os anos pelo INEP e que abrange todas as escolas do país. Os gestores das escolas preenchem quatro formulários informando aspectos das escolas, das turmas, dos alunos e dos profissionais que atuam naquele estabelecimento (BRASIL, 2018). No formulário das escolas constam elementos como o atendimento de serviços públicos de alimentação, água, luz e saneamento básico; arquitetura do prédio e suas diversas dependências; e equipamentos para o desenvolvimento de práticas didático-pedagógicas. Já no formulário das matrículas constam informações sobre cada estudante matriculado no ano do recenseamento. A pesquisa se utilizou desses componentes para avaliar a adequação das condições de oferta das escolas de educação infantil de Belo Horizonte quanto à infraestrutura.

Para delimitar a espacialidade dentro do município, a pesquisa se utilizou das Unidades de Desenvolvimento Humano (UDH) catalogadas pelo Atlas Brasil, a partir de dados do Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010. A UDH é um recorte espacial construído com o objetivo de captar a diversidade de situações relacionadas com o desenvolvimento humano no interior dos espaços intrametropolitanos, especialmente em seus grandes municípios (ATLAS, 2014). Foi proposta uma configuração desses espaços intrametropolitanos, respeitando os critérios e exigências do IBGE, os quais deveriam ser os mais homogêneos possíveis, em termos socioeconômicos (homogeneidade), contíguos (contiguidade) e que fossem reconhecidos por parte da população residente (identidade) (ATLAS, 2014). O município de Belo Horizonte constava em 2010 com 277 UDH. Como descrito acima, as fronteiras das UDH não coincidem com as dos bairros uma vez que seus autores desejavam agregar características mais homogêneas das regiões.

De acordo com as informações do Censo Escolar, Belo Horizonte contava em 2018 com 873 escolas ativas com oferta de educação infantil. A frequência das escolas quanto à dependência administrativa está distribuída da seguinte forma:

Tabela 1 Distribuição de frequência das escolas de educação infantil em Belo Horizonte quanto à dependência administrativa, 2016 

Dependência Administrativa Frequência %
Municipal 186 21,3%
Privada 687 78,7%
Total 873 100%

Fonte: Censo Escolar/INEP, 2018

Dessa maneira, 21,3% das escolas de educação infantil em Belo Horizonte são públicas, sendo mantidas pela rede municipal de ensino, como previsto pela Constituição Federal. Das 186 escolas municipais, 131 são UMEIs, 14 são escolas que atendem exclusivamente educação infantil e 12 são escolas multietapas que atendem tanto à educação infantil quanto aos anos iniciais do ensino fundamental e 29 atendem educação infantil e outras etapas e modalidades de ensino.

As escolas privadas são distribuídas quanto ao tipo da seguinte forma:

Tabela 2 Distribuição das escolas privadas de educação infantil de Belo Horizonte quanto à categoria, 2018 

Categoria Frequência %
Particular 456 66,4%
Filantrópica 151 22,0%
Comunitária 73 10,6%
Confessional 7 1,0%
Total 687 100%

Fonte: Censo Escolar/INEP, 2018

As escolas privadas ainda podem ser classificadas quanto à presença de convênio com o poder público, sendo a distribuição de frequência em Belo Horizonte disposta da seguinte forma:

Tabela 3 Distribuição das escolas privadas de educação infantil de Belo Horizonte quanto à presença de convênio, 2018 

Convênio Frequência %
Não conveniada 483 70,3%
Conveniada 204 29,7%
Total 687 100%

Fonte: Censo Escolar/INEP, 2018

Ao associar as informações extraídas do Censo Escolar nas UDH, inserindo as escolas nas respectivas unidades (Figura 1), a sua distribuição territorial acompanha a população em idade escolar para a educação infantil, de 0 a 5 anos. Ou seja, com poucas exceções, o número de escolas é maior nas UDH com maior população na idade correspondente. Isso não significa que o atendimento é suficiente, uma vez que 111 UDH não tem nenhuma escola, mesmo tendo uma população de 251.529 crianças de zero a cinco anos. Além disso, a média de crianças por escola é 115,43, revelando o grande déficit de vagas para essa etapa da educação básica.

Fonte: Censo Escolar/INEP, 2018; Atlas Brasil, 2014

Figura1 Mapa temático de Belo Horizonte da população de 0 a 5 anos e do número de escolas por UDH 

Em relação às escolas públicas, elas estão bem distribuídas territorialmente, podendo ser encontradas em todas as regionais. Com poucas exceções, o maior número de escolas públicas também coincide com as UDH da cidade com maior população de 0 a 5 anos. Sua localização também está distribuída em consonância com a renda per capta na cidade, estando presentes em áreas de maior vulnerabilidade social, como pode ser visto no Mapa 2. Porém, o alcance da rede pública de educação infantil de Belo Horizonte também é limitado, atendendo no ano de 2018, segundo dados do Censo, 46.108 crianças, o que representa 45,75% das crianças que frequentam a escola. Considerando ainda as matrículas conveniadas (24.811), isto é, asseguradas por recursos públicos, do total de crianças em idade de zero a cinco anos, o poder público responde por somente 70.919 matrículas, ou seja, 2,3% das crianças.

Fonte: Censo Escolar/INEP, 2018; Atlas Brasil, 2014

Figura2 Mapa temático de Belo Horizonte de localização de escolas públicas em relação à renda per capta em R$ (deflacionada) por UDH 

Em relação à infraestrutura das escolas de educação infantil, a fim de se dialogar com a literatura que trata do tema, a pesquisa considerou uma escala construída por Duarte, Gomes e Gotelipe (2019), de medição da adequação da escola. Nessa escala, os critérios estabelecidos para a construção das variáveis de referência objetivaram ponderar a qualidade do serviço, dependência ou equipamento, que compõem a infraestrutura das escolas através da articulação dos componentes do Censo (DUARTE; GOMES; GOTELIPE, 2019).

Os autores selecionaram 32 variáveis de interesse no formulário das escolas do Censo que foram agrupadas em três conjuntos: atendimento de serviços públicos; instalações (subdividido em dependências da escola e dependências de uso educacional); e equipamentos. Após a ponderação pela complementaridade dos itens, os valores atribuídos geraram 16 variáveis de referência numéricas, discretas e ordinais (DUARTE; GOMES; GOTELIPE, 2019). Com a aplicação da análise fatorial, pelo método das componentes principais, com rotação ortogonal (varimax) e método de k-médias, os pesquisadores obtiveram três fatores para explicação de variância, sendo que o primeiro, por responder por 44,2% da variância foi utilizado como índice de avaliação da infraestrutura.

No entanto, a escala elaborada por Duarte, Gomes e Gotelipe se referia ao ensino fundamental, o que levou os autores a excluírem itens específicos de outras etapas, como os relativos à educação infantil. Nesse sentido, esta pesquisa adaptou a escala para analisar aspectos da educação infantil, tais como presença de berçários e parques infantis, a partir dos elementos presentes no artigo 50 da Resolução CME/BH nº 001/2015. Dessa forma, as variáveis de interesses estão divididas em três grupos: quanto aos serviços públicos, instalações e dependências e quanto aos equipamentos.

Quadro 2 Variáveis de interesse da infraestrutura das creches e pré-escolas 

Serviços públicos Instalações e dependências Equipamentos
Abastecimento de água Local de funcionamento TV e DVD
Energia elétrica Sanitários Copiadora e Impressora
Saneamento básico Dependências administrativas Som e multimídia
Tratamento de esgoto Dependências complementares Computador e internet
Coleta seletiva de lixo Dependências esportivas e lazer -
Alimentação Parque infantil, área verde e berçário -
- Atendimento especializado -

Fonte: Duarte, Gomes e Gotelipe, 2019 (adaptada).

A análise da infraestrutura dessas escolas a partir das dezesseis variáveis de interesse organizadas nos três grupos conforme descrito acima possibilitou uma avaliação das condições de oferta da educação infantil em Belo Horizonte quanto à infraestrutura. Em relação às condições de infraestrutura do atendimento de serviços públicos, o fornecimento de água, energia elétrica e saneamento foram as variáveis de interesse que representaram o maior percentual de adequação de infraestrutura das escolas belo-horizontinas. Todas as 873 escolas de educação infantil têm o fornecimento de água em nível adequado. Apenas 3 escolas públicas e 9 privadas têm fornecimento de energia elétrica abaixo do básico, o mesmo ocorrendo para 3 escolas privadas quanto ao saneamento básico. Nesse quesito, todas as 186 escolas públicas estão no nível adequado de saneamento. Do primeiro grupo de variáveis, somente a alimentação representa desigualdades de condições, 73,2% têm condições de alimentação adequadas, 3,8% das escolas públicas e 4,4% das privadas têm nível abaixo do básico, e um número expressivo de escolas (24 públicas e 173 privadas) estão no nível básico, perfazendo 22,6% do total. Quando se consideram apenas as UMEIs, 100% delas têm as variáveis abastecimento de água, energia elétrica e saneamento básico em nível adequado. Quanto à alimentação, sete delas estão abaixo do básico, 10 estão em nível básico.

A análise das instalações e dependências escolares revela maiores desigualdades entre as escolas de educação infantil de Belo Horizonte. 8,2% das escolas não funcionam em locais adequados, o que significa em números absolutos 72 escolas, todas privadas. Desse total, 2 funcionam em salas de empresas, 19 funcionam em templos de igrejas, 3 em casa de professores(as), 2 em galpões e 46 em outros tipos de locais que não prédios escolares. Somente 18,6% das escolas estão providas de bibliotecas e quase a metade (49,5%) das escolas não têm almoxarifado, despensa e lavanderia, quadra esportiva e pátio. Menos da metade das escolas (34% do total) estão equipadas com parques infantis e berçário. Em relação ao Atendimento Educacional Especializado (AEE), somente 21 escolas contam com AEE em dependência especificamente destinada a esse fim, 362 escolas têm AEE que ocorre sem uma sala própria e a maioria das escolas, 56,1% (490 escolas), não tem nem sala e nem atendimento para os(as) estudantes com deficiência, sendo que destas, 467 são privadas.

Quando analisadas somente as escolas públicas, todas as 186 escolas de educação infantil de Belo Horizonte funcionam em locais adequados. 91 escolas (48,9% do total) não têm instalações sanitárias adequadas. 106 escolas (57%) não têm dependências complementares como almoxarifado, despensa e lavanderia. 169 escolas (90,9%) não têm dependências esportivas e para lazer. 82 escolas (44,1%) não têm estrutura adequada de biblioteca e sala de leitura. 147 escolas (98,6%) não têm atendimento adequado de AEE. Além disso, somente 53 escolas públicas que ofertam educação infantil em Belo Horizonte têm nível adequado em relação à infraestrutura de parque infantil e berçário, perfazendo 28,5% do total.

Quando analisadas apenas as UMEIs, menos da metade delas (45,8%) têm instalações sanitárias adequadas. 71,8% das UMEIs não estão com condições abaixo do básico em relação às dependências complementares, o mesmo ocorrendo com 61,1% em relação à biblioteca, 16,8% em relação à elementos como parque infantil e berçário e 17,6% à atendimento educacional especializado. Mais de 90% das UMEIs não têm espaços esportivos e de lazer adequados.

O último grupo de variáveis de interesse relativo aos equipamentos diz respeito à presença de televisores, aparelhos multimídias, de reprodução de DVD, copiadoras, impressoras e computadores com acesso à internet. A maioria das escolas (90,8%) tem aparelho de televisão e DVD. Apesar de, em números relativos, somente 2,5% das escolas não estarem providas desses recursos (nível abaixo do básico), em números absolutos esse valor representa 22 escolas, sendo todas privadas. 58 escolas (6,6% do total) se encontram no nível básico, somente com aparelho televisor. 29% das escolas públicas e 14,3% das privadas não têm copiadora e impressoras para reproduzirem materiais para os(as) estudantes (equipamentos presentes em 50,9% das escolas). Apenas 61,6% das escolas possui aparelhagem de som e equipamento multimídia, sendo que uma escola pública e 29 estabelecimentos privados não têm nem um nem outro. 99,5% das escolas públicas de educação infantil constam de computadores e internet banda larga, e apenas uma consta de computador e internet discada. Já para as privadas, 25 escolas não contam com computadores e 17 contam apenas com a internet discada para seus computadores. A grande maioria desses estabelecimentos (93,9%) têm nível adequado de equipamentos de informática e acesso à internet. Somente 59 escolas têm computadores para uso dos(as) estudantes com internet banda larga. 91,7% das unidades escolares não têm nem ao menos computadores assim como internet para utilização seja dos(as) alunos(as), seja para professores(as) e funcionários(as).

Quando levadas em conta apenas as UMEIs, todas constam de aparelhos de TV e DVD. Já para copiadora e impressora, 38,2% estão em nível abaixo do básico. Em relação à equipamentos de som e multimídia, 1 UMEI está em nível abaixo do básico e 25 UMEIs estão em nível básico, significando em termos relativos 0,8% e 19,1% respectivamente.

Após a descrição das características de infraestrutura das escolas de educação infantil de Belo Horizonte a partir dos três grupos de variáveis de interesse, construiu-se um índice do Nível de Adequação de Infraestrutura (NAI), indo de 0 a 1. Ou seja, quanto mais o NAI de uma escola for próximo de 0 pior a infraestrutura dessa escola e quanto mais próximo de 1, melhor a infraestrutura. O NAI foi construído a partir da soma da pontuação em cada item, dividido por 32 (pontuação máxima). Nesse sentido, foi possível estabelecer um grau de comparação entre as escolas de educação infantil de Belo Horizonte, onde as estatísticas descritivas das infraestruturas podem ser assim resumidas:

Tabela 4 Estatísticas descritivas do Nível de Adequação de Infraestrutura das escolas de educação infantil de Belo Horizonte, 2018 

Escolas n amplitude Mínimo máximo média CV
Belo Horizonte (total) 873 0,72 0,25 0,97 0,6746 16,5%
Escolas Públicas 186 0,50 0,44 0,94 0,6924 12,1%
UMEI 131 0,41 0,44 0,84 0,6670 11,9%
Públicas EI exclusivas 145 0,41 0,44 0,84 0,6748 11,9%
Públicas multietapas 41 0,34 0,59 0,94 0,7546 9%
Privadas (total) 687 0,72 0,25 0,97 0,6699 17,5%
Privadas Particulares 456 0,69 0,25 0,94 0,6543 18,6%
Privadas Comunitárias 73 0,47 0,44 0,91 0,6533 14,3%
Privadas Confessionais 7 0,41 0,47 0,88 0,6384 21,1%
Privadas Filantrópicas 151 0,44 0,53 0,97 0,7262 13,1%
Não conveniadas 483 0,72 0,25 0,97 0,6615 18,9%
Conveniadas 204 0,53 0,44 0,97 0,6896 13,4%

Fonte: Censo Escolas/ INEP, 2018

Tendo em vista esses dados, pode-se concluir que o grupo de escolas que apresenta maior média de NAI é o de escolas públicas multietapas (0,75) seguida das escolas privadas filantrópicas (0,72). Ainda em relação às escolas privadas, as particulares são as que apresentam segunda maior média desse grupo (0,65) seguida das escolas comunitárias (0,65). As confessionais apresentam a menor média do grupo (0,63) e a maior desigualdade entre as escolas, com um coeficiente de variação de 21,1%. Em relação à presença de convênio com o poder público, as escolas conveniadas apresentam média de NAI mais alta do que escolas não conveniadas (0,68 contra 0,66). As UMEIs aparecem com NAI em média 0,66. No tocante à desigualdade, as escolas com menor variação de NAI são as escolas públicas multietapas, com coeficiente de variação de 9%.

As médias das NAI das escolas de educação infantil das redes pública e privada estão territorialmente distribuídas da seguinte maneira:

Fonte: Elaboração própria a partir do Censo Escolar/ INEP, 2018

Figura3 Mapa temático de Belo Horizonte de Nível de Adequação de Infraestrutura das escolas de educação infantil públicas e privadas por UDH, 2018 

Considerações finais

Por quase cinco décadas, de 1957 a 2003, o atendimento da educação infantil em Belo Horizonte restringia-se a faixa etária de quatro a seis anos, em horário parcial, nas escolas municipais de educação infantil, em escolas municipais de ensino fundamental com algumas turmas da pré-escola ou ainda por meio de convênios firmados entre a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e as creches comunitárias. Essas primeiras instituições no que diz respeito a sua estrutura física, ao que indicam as produções teóricas ou mesmo os documentos oficiais são bem distintas, mas por outro lado compartilham alguns adjetivos similares entre si: prédio sem acomodações, baixo, mal ventilado, salas escuras, condição antipedagógica e inadequada, espaços e mobiliário inapropriado, falta de banheiro e refeitório adaptado, alimentação igual à das crianças mais velhas e espaços domiciliares improvisados.

Com o transcorrer do tempo, principalmente a partir de avanços no campo normativo, especificamente com a promulgação da Constituição Federal (1988) e aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) mesclado à demanda popular por acesso à educação infantil, ocorrem mudanças significativas nas condições de oferta da educação infantil em Belo Horizonte. Um exemplo, considerado um projeto arrojado, as UMEIs são tidas como referência em Minas Gerais e no país ao buscar contemplar no desenho de uma instituição escolar as necessidades de desenvolvimento das crianças pequenas.

Partindo desse pressuposto ou mesmo a hipótese da qualidade das condições de infraestrutura das instituições de educação infantil belo-horizontinas, sobretudo das EMEI, a análise de dados do Censo Escolar 2018, porém elucidam alguns achados problemáticos que já de antemão demandam a continuidade da investigação. De maneira geral, apenas no tocante aos serviços públicos (abastecimento de água, eletricidade, esgoto e saneamento básico) as creches e pré-escolas alcançam níveis satisfatórios de adequação. A precariedade da infraestrutura se manifesta na permanência do atendimento de crianças em templos de igreja, casa de professores, galpões e outros tipos locais que não prédios escolares. Da mesma forma, grande parte das escolas carecem de espaços de leitura, parques infantis, áreas verdes e banheiros adaptados para as necessidades das crianças. O atendimento de crianças com deficiência também é insuficiente na maioria das escolas, sejam públicas ou privadas.

O índice do Nível de Adequação de Infraestrutura (NAI), também segue na contramão de algumas das hipóteses iniciais, por exemplo, as escolas do tipo públicas multietapas são as que apresentam o maior NAI, isto é, a melhor infraestrutura. Todavia, sabe-se que um dos questionamentos em relação a essas instituições é justamente não apresentarem uma estrutura adequada às necessidades de desenvolvimento das crianças pequenas, dado a sua característica de atender outras etapas de ensino além da educação infantil e crianças com idades acima de cinco anos. As UMEIs por sua vez, conhecidas como instituições referências, inclusive pelo Ministério da Educação apresentam o pior NAI entre todos os outros tipos de escolas.

Por outro lado, ao observarmos o desvio padrão dos NAI de cada escola, percebemos que entre as escolas públicas, as UMEIs são as que apresentam o maior grau de variação entre as instituições públicas, revelando que no universo de EMEI há desigualdade nas condições de infraestrutura, isto é, nem todas dispõem de uma estrutura adequada. Tal achado, nos leva a relativizar tal índice interpretado de forma isolada e revela a necessidade de articulá-lo a outros dados para ampliação da capacidade de compreensão da realidade da educação infantil em Belo Horizonte.

Em suma, a expansão da oferta da educação infantil no município de Belo Horizonte nas últimas décadas é um avanço na consolidação do direito à educação das crianças pequenas. Apesar disso, ainda é preciso um esforço por parte do poder público no sentido do cumprimento da Meta 1. Esse esforço se torna ainda mais evidente em relação à meta 7, no tocante às condições de oferta de uma educação infantil de qualidade.Haja vista tais achados, fazem-se necessários estudos mais aprofundados sobre a adequação da infraestrutura das escolas de educação infantil, sobretudo das UMEIs a fim de se verificar in loco as condições de oferta, cotejando-se esses estudos com as informações fornecidas pelo Censo Escolar.

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Recebido: 09 de Abril de 2019; Aceito: 04 de Março de 2020; Publicado: 31 de Janeiro de 2021

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