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Educação UFSM

versão impressa ISSN 0101-9031versão On-line ISSN 1984-6444

Educação. Santa Maria vol.46  Santa Maria jan./dez 2021  Epub 27-Set-2023

https://doi.org/10.5902/1984644448198 

Artigo Demanda Contínua

O financiamento da alimentação escolar em tempo integral: o real em pratos limpos

The financing full-time school meals: the real in clean dishes

Francisco Adaylson Abreu Oliveira1  , Professor
http://orcid.org/0000-0001-6580-2715

Fabrício Aarão Freire Carvalho2  , Professor doutor
http://orcid.org/0000-0002-4753-2560

1Professor da Educação Básica da rede municipal de Igarapé-Açu, Pará, Brasil. adaylsonwork@yahoo.com.br

2Professor doutor na Universidade Federal do Pará, Belém, Pará. fafc33@gmail.com


RESU MO

O presente trabalho, que traz, em seu título, a metáfora “o real em pratos limpos” como forma provocativa de evidenciar conhecimentos sobre a política de financiamento da alimentação escolar no Brasil, analisa o processo de correção do valor per capita do Programa Nacional de Alimentação escolar - PNAE, na Educação Básica pública brasileira em tempo integral (2013/2018). Foi elaborado, a partir da análise de dados dos valores per capita do PNAE repassados aos entes federados, conforme o número de matrículas nas escolas públicas e conveniadas em tempo integral, um estudo documental da legislação educacional brasileira para a alimentação escolar, para isso, recorreu-se a autores do campo da política de financiamento da alimentação escolar. Constatou-se que há a necessidade de um maior valor financeiro per capita ao PNAE para a educação em tempo integral, com correção anual e definição/regulamentação clara da complementação por parte dos estados, Distrito Federal e municípios.

Palavras-chave: PNAE; Valor per capita;Tempo integral

ABSTRACT

The present work that brings in its title the analogy "the real in clean dishes", as a provocative way of evidencing knowledge about the financing policy of school feeding in Brazil, analyzes the process of correction of the per capita values of the National School Feeding Program - NSFP, in Brazilian public basic education, full-time (2013/2018). It was elaborated from the data analysis of the NSFP per capita values, passed on to public schools and full time agreements, according to the number of enrollments, the documentary study of the Brazilian educational legislation for school feeding, and authors of education funding. It was found that there is a need for a higher per capita value to the NSFP for full-time education, with annual correction and definition /regulation of the minimum value of the complementation by the federated entities.

Keywords: PNAE; Per capita value;Full-time

Introdução

O presente trabalho traz, em seu título, a metáfora “o real em pratos limpos” como uma forma provocativa de evidenciar os conhecimentos acerca da política de alimentação escolar no Brasil. Assim, analisa como ocorre o processo de correção dos valores per capita do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) na Educação Básica pública brasileira em tempo integral, objetivando evidenciar falhas nesse processo de financiamento da alimentação escolar, as quais podem comprometer a oferta da educação em tempo integral.

Este estudo foi elaborado a partir da análise de dados do valor per capita do PNAE (BRASIL, 2013) repassado às escolas de Educação Básica públicas municipais, estaduais, distrital e privadas conveniadas de tempo integral, conforme o número de matrículas, entre os anos de 2013 e 2018, período em que se desenvolveu o estudo documental da legislação educacional brasileira para a alimentação escolar (BRASIL, 1988; BRASIL, 2009; BRASIL, 2011; BRASIL, 2013; BRASIL, 2017). Recorreu-se também a dados fornecidos pela Controladoria Geral da União (CGU). Dentre os autores do campo da política educacional, ancoramo-nos, fundamentalmente, nos estudos de Chaves (2006), Gomes (2010), Pipitone (2003) e Martínez (2016).

O texto está estruturado em duas seções principais, que abordam a história da implementação da alimentação escolar no Brasil e sua importância para o desenvolvimento biopsicossocial do educando, construindo uma reflexão acerca do processo de correção do valor per capita do financiamento da alimentação escolar, o que pode ajudar a compreender a perspectiva do investimento financeiro do PNAE, na escola em tempo integral, e (re)pensar sua política e gestão, a fim de que esta possa tornar-se um subsídio importante na vida de milhões de educandos que fazem parte do sistema educacional público.

Nesse sentido, o presente artigo pretende analisar o financiamento da alimentação destinada às escolas de tempo integral, a alunos que passam quase 1/3 de suas vidas sob responsabilidade do Estado, em um período de desenvolvimento biopsíquico, para o qual, há a obrigação legal do ente que possui esta matrícula de ofertar uma alimentação que cumpra padrões mínimos de nutrientes já consolidados mundialmente, por meio de estudos científicos da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, 2001), da Organização Mundial de Saúde (OMS), do Instituto de Medicina Americano (IOM) e adotados pelo próprio Ministério da Educação.

Retrospectiva Histórica do Financiamento da Alimentação Escolar no Brasil

Antes de adentrarmos ao financiamento da alimentação escolar no Brasil, ressaltamos que os principais recursos financeiros destinados à Educação Básica pública têm origem em receitas de impostos próprios da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, estando os principais listados na lei do FUNDEB (BRASIL, 2007) e na receita da contribuição social do salário-educação.

A Constituição Federal (CF) de 1988, no Art. 2012, determina que a União aplique, no mínimo, 18% de sua receita na educação; e os estados, o Distrito Federal e os municípios, 25%. Neste aspecto, a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios têm a incumbência de organizar, em regime de colaboração, os seus respectivos sistemas de ensino.

Para fins de maior compreensão do financiamento da alimentação escolar, ressaltamos que o Art. 212 da CF/1988 define: “§4º Os programas suplementares de alimentação e assistência à saúde previstos no art. 208, VII, serão financiados com recursos provenientes de contribuições sociais e outros recursos orçamentários” (BRASIL, 1988). Também foi definido, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) (BRASIL, 1996), Art. 71, que a alimentação escolar não pode ser considerada despesa de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE), não podendo, portanto, ser financiada com recursos das receitas resultantes de impostos dos 18% da União e 25% dos estados, DF e municípios.

Art. 71. Não constituirão despesas de manutenção e desenvolvimento do ensino aquelas realizadas com: IV - programas suplementares de alimentação, assistência médico-odontológica, farmacêutica e psicológica, e outras formas de assistência social (BRASIL, 1996, art. 71).

O PNAE é um dos programas educacionais mais sólidos do Ministério da Educação (MEC):

A reconstrução da trajetória histórica do programa de alimentação escolar no Brasil exige um grande fôlego, tamanha extensão temporal, territorial, enorme grupo de atendidos e diversidade de rumos políticos, os quais somam uma grande quantidade de informações e uma trajetória histórica em contínua construção (MARTÍNEZ, 2016, p. 4).

Informações da cartilha “Políticas de Alimentação Escolar”, disponíveis no Portal do MEC, indicam que, por volta de 1940, as escolas, por iniciativa própria, começaram a organizar a merenda em espaço escolar, elaborando-se, nos estabelecimentos de ensino, iniciativas voluntárias que foram chamadas de “caixas escolares”, que, naquele momento, tinham como objetivo arrecadar recursos junto à comunidade, para fornecer alimentação aos estudantes.

Nesse período, não existia nenhuma política pública para este fim, ou seja, o Governo Federal não participava dessas ações, pois os alimentos eram doados por organizações internacionais, mas devido às repercussões positivas, e observando o resultado dessas iniciativas, o poder público notou a importância da alimentação escolar para um melhor desempenho dos alunos, bem como para a redução da desnutrição infantil no país (CHAVES, 2006).

De forma institucional, o Estado brasileiro implementa, em âmbito nacional, na década de 1950, uma política de alimentação escolar, por meio do decreto presidencial (BRASIL, 1955), criando a Campanha da Merenda Escolar (CME). Duas décadas após esta implementação, sofrendo algumas modificações, a campanha assume um caráter de Programa, passando a ser denominado, no ano de 1979, de Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), popularmente chamada de “merenda escolar”. De acordo com Chaves (2006, p. 16):

Desde a década de 1950, as crianças começaram a receber alimentação no período em que estavam estudando, claro que nem todas as crianças, pois o governo não estava organizado para alimentar todos os estudantes do Brasil devido ao fato de que, no início do programa, os alimentos eram oferecidos por organismos internacionais, sendo assim, o Governo Federal não comprava alimentos e, sim, recebia doações.

A conquista do PNAE, ou merenda escolar, é mantida como programa de Estado e consolidada, posteriormente, na CF de 1988, a qual é concebida como dever do Estado para com a educação. A manutenção da política de alimentação escolar, no texto constitucional, reafirma sua importância como mecanismo auxiliar fundamental, durante o horário escolar e na oferta de uma educação para o desenvolvimento do aluno em suas múltiplas dimensões. Entendemos que a ausência da merenda escolar, numa comunidade carente, pode interferir nas condições de acesso e permanência dos alunos na escola, minimizando garantias fundamentais, princípios e fatores de desempenho educacional dispostos nos Artigos 205, 206, 208 e 213 da Constituição, que expressam:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: III - Atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; V - Acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um VII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde (item introduzido em 2009 pela EC53) (BRASIL, 1988, Art. 205; 206; 208).

Nos termos da política de organização administrativa do Governo Federal (BRASIL, 1969), o FNDE foi instituído em substituição ao Fundo de Amparo ao Educando (FAE), pela Lei nº 9.649/1998, que, em seu Art. 17, transfere as atribuições do FAE para o FNDE, autarquia federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), cuja missão é financiar a maioria dos programas públicos educacionais, entre eles, o PNAE, sendo, no âmbito nacional, responsável pela distribuição e transferência de recursos financeiros aos estados, municípios e o Distrito Federal, estes, por sua vez, devem complementá-lo para subsidiar a compra da alimentação escolar. Conforme nos aponta a Resolução FNDE nº 26/2013,

Para repassar o dinheiro, o FNDE abre contas para cada estado, município, Distrito Federal e para as escolas Federais, e assim, é depositado o dinheiro mensalmente. O recurso federal é transferido em dez parcelas para as entidades executoras, cada parcela corresponde a 200 dias letivos (BRASIL, 2013).

O FNDE é uma autarquia vinculada ao Ministério da Educação, que tem como objetivo o repasse de recursos financeiros para alguns projetos e programas, entre eles, o da merenda escolar (PNAE) e outros projetos ligados à educação básica dos entes federados. Ressaltamos, ainda, como mecanismo importante à consecução do trabalho desta autarquia, a edição da Lei Federal (BRASIL, 2006), que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), estabelecendo as definições, princípios, diretrizes, objetivos e composição do SISAN, visando a ações com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada.

O SISAN é um mecanismo de grande importância no combate à fome, que pode contribuir indiretamente no combate à evasão escolar, à desnutrição, entre outros fatores que concorrem para cercear o direito à educação, muitas vezes, associados à fome e satisfação de nutrientes em si, que são indispensáveis à promoção de operacionalização do corpo humano, na efetivação das funções vitais, como pensamento, reflexão, memória e assimilação no ambiente escolar.

Art. 2o A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população. § 1oA adoção dessas políticas e ações deverá levar em conta as dimensões ambientais, culturais, econômicas, regionais e sociais. § 2oÉ dever do poder público respeitar, proteger, promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização do direito humano à alimentação adequada, bem como garantir os mecanismos para sua exigibilidade (BRASIL, 2006, não paginado).

Outro aspecto importante no percurso histórico de conquistas desta política de alimentação escolar ocorrera, ainda na década de 1990, mais precisamente com a publicação da Lei de Municipalização da Merenda Escolar (BRASIL, 1994), a qual previa a garantia de criação/obrigação dos Conselhos de controle social na alimentação escolar nos municípios, inclusive, como condicionante para liberação de recursos:

Art. 2º Os recursos só serão repassados aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios que tenham, em funcionamento, Conselhos de Alimentação Escolar, constituídos de representantes da administração pública local, responsável pela área da educação; dos professores; dos pais de alunos; e de trabalhadores rurais (BRASIL, 1994, Art. 2º).

Quanto à importância da atuação do Conselho de Alimentação Escolar (CAE), bem como ao seu fortalecimento, “pode ser uma garantia de que os recursos destinados à alimentação escolar não sejam apenas “prefeiturizados.” (PIPITONE, 2003, p. 145). Ainda, segundo esta autora,

As funções de orientar, fiscalizar e controlar a aplicação dos recursos destinados à merenda, bem como a prerrogativa de interferir nas decisões de compra de produtos e na composição dos cardápios, devem ser exercidas sob pena de comprometer os princípios da descentralização e fragilizar o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PIPITONE, 2003, p. 145).

Verifica-se, posteriormente, com a lei que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar (BRASIL, 2009), que houve mudanças na política do PNAE, que a consolidaram no seio da sociedade civil, no que tange à composição do CAE, entidade fiscalizadora do PNAE, com aumento significativo no número de representações da sociedade civil, corroborando com o controle social por parte da comunidade:

O Conselho de Alimentação Escolar é formado por sete (7) titulares e sete (7) suplentes que representam diferentes categorias da sociedade e da comunidade educativa. Se a EEx. tiver mais que 100 escolas de Educação Básica, o CAE poderá também ter 14 ou 21 titulares (e os respectivos suplentes). Cartilha para conselheiros do PNAE (BRASIL, 2009).

Um fator que também evidencia os avanços no percurso histórico desta política diz respeito à implementação da lei que dispõe sobre os padrões nutricionais da alimentação escolar e considera as particularidades alimentares das crianças com restrição a certos tipos de alimentos (BRASIL, 2014), prevendo, assim, as exigências a uma alimentação especial, recomendando que a presença de necessidades alimentares especiais seja questionada, no momento da matrícula na escola, cujo atendimento deve ocorrer por meio de um cardápio especial.

A educação brasileira, a partir da implementação da Meta 6 do Plano Nacional de Educação (PNE) (BRASIL, 2014), passa a prever a ampliação da educação em tempo integral para escolas públicas de Educação Básica, o que certamente desperta um olhar especial no debate da responsabilidade do Estado sobre a nutrição deste novo público, que passa a integrar esta política. Neste aspecto, a meta reflete o objetivo de ampliar gradativamente o tempo de permanência de crianças, adolescentes e jovens matriculados nas escolas públicas para, no mínimo, 7 horas (BRASIL, 2010), evidenciando a importância de se debater o papel do PNAE no alcance da Meta 06 e 20 (financiamento educacional) do PNE.

O Financiamento da Alimentação Escolar na Educação Brasileira em Tempo Integral

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996) prevê a oferta de educação em turno parcial e jornada integral.

Art. 31. A educação infantil será organizada de acordo com as seguintes regras comuns:

III - atendimento à criança de, no mínimo, 4 (quatro) horas diárias para o turno parcial e de 7 (sete) horas para a jornada integral; (BRASIL, 1996, Art. 31).

Percebe-se que o turno ou tempo parcial de 4 horas,na escola,é que tem predominado na recente história de educação voltada para as classes populares brasileiras, de poucas horas diárias, pouco espaço e poucos profissionais a sua realização. Já a escola/educação de jornada ou tempo integral é um processo ainda em construção, inclusive tendo em sua base legal, a Constituição Federal (CF/1988), promulgada em 05 de outubro de 1988 (BRASIL, 1988); o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990 (BRASIL, 1990); e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/96), Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (BRASIL, 1996).

A ampliação da jornada escolar foi regulamentada pela Resolução nº. 4, de 13 de julho de 2010, a qual define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Segundo esta Resolução, no Art.12:

Cabe aos sistemas educacionais, em geral, definir o programa de escolas de tempo parcial diurno (matutino ou vespertino), tempo parcial noturno, e tempo integral (turno e contra-turno ou turno único com jornada escolar de 7 horas, no mínimo, durante todo o período letivo), tendo em vista a amplitude do papel socioeducativo atribuído ao conjunto orgânico da Educação Básica, o que requer outra organização. (BRASIL, 2010a).

O PNE/2014/2024 (Lei Federal nº 13.005/2014), em sua META 6 (“Oferecer Educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% dos(as) alunos(as) da Educação Básica”), acaba por normatizar os direitos de proteção integral de crianças e adolescentes no momento em que estiverem sob responsabilidade do Estado, o que requer dos entes federados, maiores investimentos, principalmente na oferta da alimentação escolar, já garantida no Art. 208, VII (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009).

Outrossim, a estratégia 6.3 do PNE/2014 visa institucionalizar e manter, em regime de colaboração, programas que visem ampliação e reestruturação das escolas públicas, como a reforma ou construção de cozinhas e refeitórios para garantir a educação em tempo integral. Contudo, o financiamento relacionado à viabilidade econômica da alimentação escolar do público que frequenta a educação em tempo integral ainda não conseguiu lograr espaço e êxito na agenda política do financiamento da Educação Básica pública brasileira, principalmente tendo o Ministério da Educação como centro indutor de políticas sociais, que busquem a equidade no direito a alimentação servida nas escolas públicas.

Parece não restar dúvida quanto à necessidade de suplemento adicional de alimentação escolar pelas horas adicionais implementadas pela educação de tempo integral. O que necessita aporte financeiro robusto dos entes federados, fato, até então, fora da agenda política, e problema certamente vivenciado por aqueles que frequentam a educação em tempo integral. Tal fato expõe a incapacidade de essa normatização em garantir direitos mínimos expressos na Resolução/CD/FNDE nº 38/2009, a qual estabelece a necessidade de três refeições diárias com percentuais mínimos de nutrientes.

A Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) mensura a percepção das famílias em relação ao acesso aos alimentos. Ela foi elaborada na década de 1990, como uma metodologia de avaliação de severidade de segurança alimentar, pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA). Este método foi adaptado e validado pela UNICAMP (Universidade Estadual de Campinas/ SP), estabelecendo-se a EBIA, muito utilizada também em diversas pesquisas sobre a percepção das pessoas em relação à segurança alimentar, principalmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que na PNAD sobre Segurança Alimentar (BRASIL, 2013), por meio desta metodologia, evidenciou que 22,6% das residências viviam em estado de insegurança alimentar, sendo que, dessas, 14,8% a situação era considerada leve; 4,6%, moderada; e 3,2%, grave.

Os dados do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE, 2009) constatam que, nos lares brasileiros, 87% do valor recebido pelo Bolsa Família são gastos com alimentação (no Nordeste, chega a 91%; enquanto que no Sul, estima-se em 73%), daí a importância da alimentação nas escolas em tempo integral.

Neste aspecto, adquirem importância a fonte e os recursos financeiros do PNAE transferidos pelo governo federal aos entes federados, por meio de prestação de assistência financeira e técnica, em caráter suplementar. O PNAE tem como fonte de receita a contribuição social do salário-educação (a alíquota é de 2,5%, incidente sobre o valor total das remunerações pagas ou creditadas a qualquer título, no mês, aos empregados), prevista no Art. 212 da CF/1988, recolhida pelas empresas na forma da lei (BRASIL, 2006), conforme o Decreto nº 6.003, de 2006, visando garantir a alimentação escolar, como expresso no Art. 208 da CF/1988.

Os repasses financeiros do PNAE, encaminhados aos estados, DF e municípios têm como base o quantitativo de dias letivos estabelecido na LDB/1996, número de alunos do ano anterior ao do exercício financeiro, constante no censo escolar realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), sendo o valor per capita final para cada aluno definido de acordo com a etapa e modalidade de ensino.

O FNDE, por meio do Art. 1º da Resolução CD/FNDE nº 1/2017, depois de 4 anos, alterou o valor per capita (por aluno) para oferta da alimentação escolar na educação em tempo integral. Atualmente, o valor per capita para o aluno em tempo integral, com permanência mínima de 7 horas na escola, ou em atividades escolares é definido conforme quadro a seguir:

Quadro 1 Valor per capita do PNAE educação tempo integral - Brasil, 2017. 

e) R$ 1,07 (um real e sete centavos de real) para os alunos matriculados em escolas de tempo integral, com permanência mínima de 7h (sete horas) na escola ou em atividades escolares, de acordo com o Censo Escolar do INEP/MEC;
OBS.: III- A - para os estudantes contemplados no Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, haverá complementação financeira de forma a totalizar o valor per capita de R$ 2,00 (dois reais);

Fonte: Elaborado pelos autores, com base na Resolução nº 1/2017 FNDE.

De posse do valor per capita praticado na alimentação da educação em tempo integral, fica fácil compreendermos como ocorre o cálculo para se chegar ao montante que será destinado a cada ente federado, por meio da metodologia disposta abaixo, conforme Resolução CD/FNDE nº 26/2013,Capítulo VIII, da Execução dos Recursos Financeiros do PNAE:

Art. 38 O FNDE transferirá recursos financeiros de forma automática, sem necessidade de convênio, ajuste, acordo, contrato ou instrumento congênere, nos termos do disposto na Lei n° 11.947/2009, para aquisição exclusiva de gêneros alimentícios, processando-se da seguinte forma: I - o montante de recursos financeiros destinados a cada EEx., para atender aos alunos definidos no art. 4° desta Resolução, será o resultado da soma dos valores a serem repassados para cada aluno atendido e será calculado utilizando-se a seguinte fórmula: VT = A x D x C Sendo: VT = Valor a ser transferido; A = Número de alunos; D = Número de dias de atendimento; C = Valor per capita para a aquisição de gêneros para o alunado (BRASIL, 2013).

Observa-se que esses valores repassados aos entes federados pelo Governo Federal, com base no censo escolar do ano anterior, e efetuados em 10 parcelas mensais, para a cobertura de 200 dias letivos, conforme dispõe a Resolução FNDE nº 26/2013, são suplementares, significando que precisam de complementação para a oferta de uma alimentação adequada às necessidades nutricionais dos alunos. Contudo, na ausência de dispositivos legais, determinando valores da complementação do ente, esta poderá resumir-se, simplesmente, ao pagamento dos servidores de apoio (operacional), responsáveis pela elaboração da alimentação, ficando o aumento da per capita, dependendo da boa vontade dos gestores ou das cobranças das instâncias de controle social, o que, em muitos casos, não atende a esta necessidade imediata.

Conforme a Resolução/CD/FNDE nº 38/2009, os alunos, quando em período integral, incluindo os alunos do programa “Novo Mais Educação”, deverão ter atendidas, no mínimo, 70% (setenta por cento) das necessidades nutricionais diárias, por meio de, no mínimo, 3 (três) refeições diárias. No entanto, ao analisarmos o valor repassado pelo FNDE, sem correção anual, conclui-se que é tarefa quase impossível de cumprir, principalmente, porque não há nenhum instrumento legal, até o momento, para garantir a atualização/correção dos valores per capita anualmente.

A problemática acima põe em xeque a eficácia do CAE, que é uma instância de controle social deliberativo, fiscalizador e de assessoramento ao bom funcionamento do PNAE, instituído no âmbito dos estados e municípios, criado para acompanhar e monitorar a utilização dos recursos financeiros transferidos pelo FNDE para a alimentação escolar, zelando pela qualidade dessa alimentação, desde a compra dos mantimentos, até a oferta da refeição aos alunos. Este colegiado analisa também toda a documentação relativa à Prestação de Contas e elabora o parecer conclusivo, que é encaminhado ao FNDE. Contudo, tal instância de controle social, legalmente, não possui instrumentos capazes de garantir maior volume de recursos à alimentação, principalmente da escola em tempo integral, para a qual as necessidades nutricionais diárias são maiores (BRASIL, 2009). Neste aspecto,

Os conselhos ainda são mecanismos, não os únicos, de participação. Porém, não como se apresentam hoje, em sua maioria sem espaço para o debate político, a deliberação e o controle social, caracterizando-se como espaços formais ou de faz de conta de participação (AVRITZER, 2009, p. 138).

Visando atender à demanda por correção dos valores per capita da alimentação escolar, à qual o CAE não suportou, foi apresentado pelo Deputado Manoel Junior, na Câmara dos Deputados Federais, no dia 5 de agosto de 2009, o Projeto de Lei (PL) nº 5.690/2009 (acrescenta o § 2º ao Art. 6º da Lei nº 11.947), objetivando a correção anual do valor per capita do PNAE, pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), apurado pelo IBGE, ou índice equivalente que venha a sucedê-lo, uma vez que:

Tem sido frequente que os valores per capita para repasse de recursos financeiros aos entes federados, do Programa Nacional de Alimentação Escolar, fiquem sem nenhum tipo de atualização ou sejam apenas levemente corrigidos. Assim foi no período de 1994 a 2003, durante o qual os valores permaneceram inalterados. De 2003 a 2006, os reajustes somaram nove centavos. De 2006 até o presente momento, os valores não foram modificados. Obviamente os custos da alimentação escolar crescem, reduzindo-se assim, ao longo do tempo, a participação relativa da União no financiamento deste indispensável programa de apoio à educação básica. É preciso assegurar que tal programa atenda de fato às suas finalidades, em quantidade e qualidade. É importante, portanto, que a devida correção dos valores per capita esteja prevista em lei, sobretudo a partir desse momento histórico, em que também os alunos do ensino médio público passam a ser beneficiários. Estou convencido de que a relevância da proposição haverá de assegurar o apoio dos ilustres Pares para sua aprovação (BRASIL, 2009).

Apesar da importância do projeto dispondo sobre a correção anual dos valores per capita do Programa Nacional de Alimentação Escolar, que tramitava no Congresso, desde 2009, este foi arquivado, no dia 31 de janeiro de 2019, depois de tramitar por quase 10 anos pela Mesa Diretora da Câmara dos Deputados Federais.

De acordo com o relatório Aspectos Fiscais da Educação no Brasil, de 2018, publicado pela Secretaria do Tesouro Nacional do Ministério da Fazenda:

Dessa forma, ao contrário da saúde e da previdência social, onde a transição demográfica tende a elevar o gasto público, no caso da educação, a demografia atua favoravelmente, reduzindo a população em idade escolar, o que tende a reduzir a despesa total em educação, notadamente no caso das despesas ligadas à alimentação e transporte escolar (...), entre outras (BRASIL, 2018, p. 9).

Observa-se, na tabela a seguir, com relação à série histórica de número de matrículas gerais na educação básica (estadual, distrital, municipal, privada conveniada) e dados populacionais, que a demografia no Estado brasileiro pode estar atuando favoravelmente na redução da população em idade escolar, o que, de fato, tende a reduzir a despesa total do PNAE, uma vez que este programa não dispõe de mecanismos de correção/atualização anual de seus per capita.

Tabela 1 Número de Matrículas total da educação básica pública, dependência administrativa (estadual, distrital, municipal, privada conveniada) e população brasileira - Brasil, 2014 a 2018 

ANO 2014 2015 2016 2017 2018
MATRÍCULA 42.149.860 40.915.799 40.951.568 40.747.264 40.319.466
POPULAÇÃO 202.768.562 204.450.649 206.081.432 206.804.741 208.494.900

Fonte: Elaborado pelos autores, com base em informações do Laboratório de Dados Educacionais, a partir dos microdados do Censo Escolar/INEP 2014 - 2018.

Evidencia-se, na série histórica acima, que há um quadro decrescente em números consolidados de matrículas na educação básica brasileira, mesmo havendo crescimento populacional. No entanto, esta redução no número de matrículas não tem se revertido em maior valorização da per capita da alimentação escolar. A ausência de índice de correção anual no PNAE tem contribuído para a depreciação dos cardápios das escolas de entes, que sobrevivem basicamente dos repasses constitucionais, localizados principalmente nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.

Os dados do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 2013, com base no Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, revelam que, dentre as cidades brasileiras, 74% encontram-se nas faixas de “médio” e “alto desenvolvimento”; e cerca de 25% delas estão na faixa de “baixo desenvolvimento”. Contudo, o Nordeste ainda tem 61,3% dos municípios na faixa de “baixo desenvolvimento humano”; e o Norte, 40,1% também nesta classificação. Neste aspecto, evidencia-se que essas duas regiões não possuem nenhum município nas faixas de “muito alto” e “alto” desenvolvimento. No entanto, o FNDE/MEC não tem reconhecido tais disparidades no valor per capita do PNAE, tratando de maneira análoga municípios que apresentam índices desiguais, o que pode contribuir para a disparidade neste programa, já que municípios com maior IDHM tendem a investir mais no PNAE.

As disposições legais contidas no Art. 212, § 3º da CF/1988 (que visa assegurar, entre outras coisas, garantia de padrão de qualidade e equidade) fornecem-nos subsídios para a compreensão da contradição existente no PNAE, uma vez que esta política trata igualmente entes com necessidades financeiras desiguais, pois os valores per capita uniformes de distribuição de recursos do PNAE a todos os entes com IDHM diferentes parecem contradizer a garantia da qualidade e equidade da CF/1988.

É notório que a política do PNAE detém um avanço significativo no texto legal, servindo, inclusive, de modelo a outras nações. Contudo, tais avanços parecem não ter se revestido em práticas relevantes aos entes federados com baixa capacidade de arrecadação financeira. Tal fator tem afetado, principalmente, o financiamento da educação em tempo integral, que necessita de maior execução orçamentária, uma vez que passa a responsabilidade para o Estado (BRASIL, 2009) de cuidar da nutrição dos alunos que passarão, no mínimo, sete (7) horas em ambientes escolares. Assim, esta modalidade de ensino, tão debatida nos últimos anos e implementada no PNE 2014/2024 e no PNAE, urge de equidade: “há necessidade de distribuições desiguais para colocar os primeiros ao mesmo nível de partida; são necessários privilégios jurídicos e benefícios materiais para os economicamente não privilegiados” (BOBBIO, 1986, p. 604).

O baixo valor financeiro e a demora na correção da per capita do PNAE na educação em tempo integral são fatores que podem gerar ameaças ao bom desempenho deste programa, pois o reajuste feito em 2013, só voltou a ocorrer em 2017, assim, observa-se um longo período sem que houvesse atualização financeira, em que o aumento da cesta básica anual pode ter gerado depreciação no cardápio dos alunos matriculados no sistema integral de educação, estando, pois, sob a responsabilidade do Estado.

Neste aspecto, segue a tabela com número de matrículas por ano (2013/2018), o respectivo valor per capita definido e pago pelo FNDE no período (Resoluções nº 26/2013 e nº 1/2018, respectivamente), o montante/ano repassado e per capita (2013/2018) atualizados anualmente pelo INPC/IBGE, caso houvesse correção por este índice.

Tabela 2 PNAE Brasil, educação em Tempo Integral (2013/2018): demonstrativo de valores repassados pelo FNDE e montante atualizado conforme previa proposta do PL nº 5.690/2009. 

ANO Nº MATRÍCULAS TEMPO INTEGRAL/ BRASIL VALOR PER CAPITA/FNDE LIQUIDADO MONTANTE REPASSADO PELO FNDE *PER CAPITA ATUALIZADA PELO INPC/IBGE MONTANTE ATUALIZADO PELO INPC/IBGE
2013 2.347.344 R$ 1,00 R$ 2.347.344,00 R$ 1,00 R$ 2.347.344,00
2014 2.946.707 R$ 1,00 R$ 2.946.707,00 R$ 1,06 R$ 3.123.509,42
2015 3.079.179 R$ 1,00 R$ 3.079.179,00 R$ 1,15 R$ 3.541.055,85
2016 2.889.940 R$ 1,00 R$ 2.889.940,00 R$ 1,27 R$ 3.670.223,08
2017 3.231.226 R$ 1,07 R$ 3.457.411,82 R$ 1,32 R$ 4.265.218,32
2018 3.245.317 R$ 1,07 R$ 3.472.489,19 R$ 1,38 R$ 4.478.537,46‬

Fonte: Elaborado pelo autor a partir dos dados coletados junto ao laboratório de dados educacionais/UFPR. * Caso o PL nº 5.690/2009 arquivado em 2019, depois de tramitar por 10 anos na Câmara Federal, tivesse em vigor.

Verifica-se, pois, a disparidade entre o valor pago e o que deveria ser repassado, se houvesse correção anual com base no INPC/IBGE (conforme previa o PL nº 5.690/2009). Dessa forma, o próprio FNDE/MEC, contrariando o Plano Nacional de Educação, dificulta o atendimento do ensino em tempo integral, uma vez que um maior valor neste período poderia ter sido um dos fatores a ter contribuído para melhores refeições e desenvolvimento biopsicossocial de milhões de alunos.

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir dos dados coletados junto ao laboratório de dados educacionais/UFPR e com base na proposta do PL nº 5.690/2009 (arquivado em janeiro de 2019, depois de tramitar por 10 anos na Câmara Federal)

Gráfico 1 PNAE Brasil, educação em Tempo Integral (2013/2018): demonstrativo de valores repassados pelo FNDE e montante atualizado, de acordo com número de matrículas no ano e conforme previa proposta do PL nº 5.690/2009 

O gráfico acima apresenta duas linhas referentes aos valores do PNAE. Na linha azul (série 1), estão os valores pagos à educação em tempo integral/Brasil (2013 a 2018), de acordo com o ano e número de matrículas (estadual, distrital, municipal, privada conveniada). Já na linha alaranjada (série 2), com base nas mesmas informações (ano e número de matrículas), há uma projeção dos valores do PNAE atualizados pelo INPC/IBGE, apresentando o montante que poderia ser pago, caso houvesse correção anual da per capita, conforme previa o PL nº 5.690/2009.

O montante de recurso financeiro atualizado do PNAE - linha alaranjada do gráfico 1-, certamente, é um volume significativo, mas que caberia no orçamento público, uma vez que o Estado brasileiro tomou uma decisão política (PNE 2014/2024) de ampliar o investimento em educação pública, de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do produto interno bruto - PIB do país no 5º (quinto) ano de vigência do PNE.

Evidencia-se também, no gráfico, que a ausência de regulamentação com critérios claros, dispondo sobre a correção anual do valor per capita da alimentação escolar na educação em tempo integral tem causado uma defasagem, que só aumenta a cada ano, no montante financeiro que cada ente federado recebe para ofertar alimentação dentro dos padrões exigidos na política do PNAE (Resolução/CD/FNDE nº 38/2009). Isso pode implicar em possível descumprimento de orientações nutricionais indispensáveis a cada aluno na produção do conhecimento, uma vez que não há obrigação legal sobre percentual de contrapartida do ente que recebe tais valores do FNDE/MEC.

Para ilustrar melhor a ausência de complementação aos valores per capita no PNAE, por parte dos entes federados que o recebem, e a quais esta política atribui o dever de complementá-los (BRASIL, 2009), dando assim sua contrapartida a estes recursos encaminhados pelo FNDE/MEC, citamos dados conseguidos junto à Controladoria Geral da União (CGU), por meio da lei de acesso à informação (BRASIL, 2011), talvez inéditos em trabalhos acadêmicos, sobre a quantidade de municípios, no Brasil, que complementaram, com algum valor, entre os anos de 2013 a 2018, os recursos do PNAE.

Tabela 3 Entes Federados que complementaram, ou deixaram de complementar os valores per capita do PNAE/FNDE/MEC entre 2013 a 2018. 

Nº DE ENTES FEDERADOS (ESTADOS, DF, MUNICÍPIOS) BRASILEIROS (2013 a 2018) QUE FIZERAM, OU NÃO, COMPLEMENTAÇÃO FINANCEIRA AO VALOR PER CAPITA DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR (PNAE/FNDE/MEC).
ANO TOTAL DE ENTES SIM NÃO %
2013 5554 4.685 869 19%
2014 5523 4.610 913 20%
2015 5467 4.483 984 22%
2016 5482 4.528 954 21%
2017 5520 4.729 791 17%
2018 4777 4.036 741 18%

Fonte: Elaborado pelo autor com dados fornecidos pela CGU/junho de 2019, via esic.cgu.gov.br (SIC 23480012664201980).

Os dados, acima, correspondem às informações prestadas pelos gestores (CAE) na pergunta 1 do questionário sobre a Execução Física do PNAE, no Sistema de Gestão de Prestação de Contas (SIGPC). Os números totais correspondem à quantidade de Entidades Executoras que responderam à questão no ano de referência (2013 a 2018) (BRASIL, 2013): “Questão 1 - O município/estado/DF ofereceu complementação dos recursos financeiros transferidos pelo FNDE?”. Neste aspecto, ao considerarmos que, neste período, segundo dados do IBGE, o Brasil possuía cerca de 5.570 municípios, evidencia-se um percentual muito alto de municípios aplicando valores à alimentação escolar que, possivelmente, não estejam cumprindo os padrões nutricionais desta política, principalmente, a da educação em tempo integral.

As revelações dispostas na tabela 3 demonstram um percentual, que deveria ser zero, muito alto de entes federados aplicando apenas o valor per capita de R$ 1,07, para ofertar, no mínimo, 3 refeições diárias aos alunos da educação em tempo integral. Tais revelações (cerca de 17% a 22% de municípios, entre 2013 e 2018, deixaram de cumprir o PNAE) podem ser mais graves que o simples descumprimento legal de um programa, uma vez que atenta contra a vida de milhões de crianças e adolescentes estudantes de instituições públicas de tempo integral.

A necessidade de apoio aos sistemas públicos de ensino que oferecem educação em tempo integral visa atender à Meta 6 do Plano Nacional de Educação: “oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% (vinte e cinco por cento) dos (as) alunos (as) da educação básica” (BRASIL, 2014). Neste aspecto, é necessário suporte aos alunos que permanecerão longas jornadas na escola, por estarem em desenvolvimento biopsicossocial, e, principalmente, por vivermos em uma sociedade marcada por grandes desigualdades sociais, em que há desigualdade de renda e falta de alimentação em muitos lares. Para Gomes, Cavalcanti e Magalhães (2010, p. 165):

A preocupação com a garantia de alimentação suficiente para a manutenção de uma vida saudável tem suscitado diversos estudos que têm apontado para grande conexão entre o nível nutricional, produtividade, renda familiar e o desempenho escolar.

A implementação de uma alimentação escolar em patamares próximos ou condizentes com as necessidades nutricionais de alunos da educação em tempo integral depende, também, do sucesso da implementação da Meta 20 do PNE 2014/2024, a qual se destina a garantir recursos necessários à consecução, entre as diversas metas do PNE, da alimentação escolar, cujo principal objetivo é de:

(...) ampliar o investimento público em educação pública de forma a atingir, no mínimo, o patamar de 7% (sete por cento) do produto interno bruto - PIB do país no 5º (quinto) ano de vigência desta lei e, no mínimo, o equivalente a 10% (dez por cento) do PIB ao final do decênio (BRASIL, 2014, não paginado).

Contudo, ao considerarmos a conjuntura política e legislativa atual, partindo da implementação da EC nº 95/2016 (PEC do teto dos gastos públicos) e as medidas de contingenciamento de gastos no orçamento do MEC para a educação em 2019, a meta 20 torna-se mais difícil de ser alcançada, o que dificulta ainda mais os processos de correção e ampliação de valores da per capita do PNAE para a educação em tempo integral, uma vez que as estratégias que envolvem maior gasto com alimentação escolar podem tornar-se inviáveis, ao não ocorrer a ampliação progressiva do investimento público em educação, não atingindo, assim, o patamar mínimo de 7% (em 2019) do PIB do país, e progressivamente 10% (em 2024).

20.7- implementar o Custo Aluno Qualidade - CAQ como parâmetro para o financiamento da educação de todas etapas e modalidades da educação básica (...) aquisição, manutenção, construção e conservação de instalações e equipamentos necessários ao ensino e em aquisição de material didático-escolar, alimentação e transporte escolar (BRASIL, 2014, não paginado).

Verifica-se que, recentemente (2019), a Câmara Federal dos deputados recebeu dois Projetos de Lei, o primeiro de nº 3086/2019, dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica, para determinar a atualização monetária anual das transferências do PNAE e para ampliar o valor per capita transferido aos municípios em situação de extrema pobreza. Já o segundo, de nº 2572/2019, altera a lei que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica (BRASIL, 2009), para adequar o valor do parâmetro per capita utilizado para calcular o valor do repasse às especificidades regionais. Neste aspecto, nenhum dos PLs trata especificamente da per capita da educação em tempo integral, contudo, pelo conteúdo das suas propostas, caso um dia sejam aprovados, podem a ela trazer contribuição.

Em um país com grande desigualdade social, em que a fome e a desnutrição ainda são graves e sérios problemas sociais, o tema da educação alimentar e nutricional é central, principalmente, na educação em tempo integral, uma vez que, certamente, para milhares de alunos que a frequentam, esta será fonte de suas principais refeições e nutrição, quando não as únicas, sendo o Estado por meio da escola, um agente fundamental nesse sentido para o sucesso escolar desses alunos.

Considerações finais

Com base no estudo realizado, verifica-se que a execução orçamentária do PNAE não tem recebido as atualizações monetárias necessárias e, conforme os percentuais estabelecidos nos índices oficiais de atualização monetária utilizados pelo Governo Federal, percebe-se que este poderia ser um fator a contribuir para o pleno desenvolvimento do educando, principalmente, da educação em tempo integral. Neste aspecto, fornecer alimentação saudável com atendimento mínimo de 70% (setenta por cento) das necessidades nutricionais diárias para o educando que passa, no mínimo, sete (7) horas em atividades escolares (BRASIL, 2009) pode ser fundamental para o seu pleno desenvolvimento, porém é um grande desafio mediante o baixo valor financeiro repassado, e a demora na correção do valor per capita.

Verifica-se que, para haver o cumprimento da Meta 6 do PNE, é necessário o estabelecimento de um suporte aos alunos que permanecerão longas jornadas na escola, uma vez que vivemos em uma sociedade marcada por grande desigualdade social. Portanto, faz-se necessário, na oferta de educação em tempo integral, o pleno funcionamento do PNAE, pois uma alimentação saudável e balanceada é indispensável aos alunos em desenvolvimento biopsicossocial.

Observa-se que, apesar da importância do PNAE, já mencionado, alguns entraves ao fornecimento de alimentação escolar, principalmente para a educação em tempo integral, condizentes com os padrões e orientações desta política, podem estar relacionados ao baixo valor financeiro da per capita, à longa demora na sua atualização/correção e à ausência, em muitos casos, de complementação financeira por parte dos entes, o que tem sido ocasionado por falta de regulamentação dispondo sobre datas, valores ou formas de contrapartida dos entes federados.

Dessa forma, mesmo com diversos avanços legais no PNAE, verificado nos últimos anos, é necessário que haja maior empenho por parte das instâncias de controle social desta política, buscando garantir, junto ao Estado, as melhorias indispensáveis na alimentação dos alunos da escola pública em tempo integral, tais como insumos básicos, inscritos na CF/1988 e no PNAE, pois está provado cientificamente que um aluno nutrido consegue ter melhor aproveitamento durante sua jornada escolar.

Mesmo diante das conquistas sociais obtidas na política de alimentação escolar e do controle desses gastos públicos nas últimas décadas, ainda se percebe a necessidade de maior participação da sociedade civil, nas instâncias de controle social, principalmente, com forte participação de pais de alunos e alunos, visando aos avanços ainda mais significativos no PNAE. Dada a grande desigualdade social existente no Brasil, onde muitos cidadãos ainda lutam por alimentação, certamente, o ambiente escolar pode expressar-se como local onde o aluno, em primeiro lugar, acessa-o pela garantia, talvez, da única refeição com nutrientes necessários ao desenvolvimento das suas demandas orgânicas.

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Recebido: 16 de Julho de 2019; Aceito: 26 de Agosto de 2020; Publicado: 05 de Maio de 2021

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