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Educação UFSM

versión impresa ISSN 0101-9031versión On-line ISSN 1984-6444

Educação. Santa Maria vol.46  Santa Maria ene./dic 2021  Epub 02-Oct-2023

https://doi.org/10.5902/1984644441338 

Artigo Demanda Contínua

Notas sobre os saberes disciplinares do Curso Normal da Escola Superior de Educação Física do Rio Grande do Sul (1940-1956)

Notes on the disciplinary knowledge of the Normal Course of the School of Physical Education of Rio Grande do Sul

Tuany Defaveri Begossi1  , Doutoranda
http://orcid.org/0000-0002-2596-5963

Janice Zarpellon Mazo2  , Professora Doutora
http://orcid.org/0000-0002-8215-0058

Cibele Biehl Bossle3  , Docente
http://orcid.org/0000-0003-3633-3483

Vanessa Bellani Lyra4  , Professora Doutora
http://orcid.org/0000-0001-9653-2930

1Doutoranda da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. tuany_begossi@hotmail.com

2Professora Doutora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. janice.mazo@ufrgs.br

3Docente do Sistema de Ensino Gaúcho, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. cibele.bossle@terra.com.br

4Professora Doutora do Centro Universitário Estácio de Santa Catarina. São José, Santa Catarina, Brasil. vblyra@ucs.br


RESUMO

O presente estudo tem por objetivo compreender como ocorreu a organização dos saberes disciplinares do Curso Normal, da Escola Superior de Educação Física (ESEF), do estado do Rio Grande do Sul, durante o período em que este permaneceu em atividade (1940-1956). A narrativa historiográfica, guiada por Certeau (2017) e Chartier (2017), foi sustentada pelos pressupostos teórico-metodológicos dos saberes docentes, especialmente aqueles compreendidos por Desbiens (2005) e Tardif (2014) como saberes disciplinares e saberes curriculares. Este referencial foi articulado com a bibliografia sobre planejamento pedagógico, sobretudo aquela empregada por Libâneo (2012). O processo de análise e enfrentamento dos distintos documentos históricos utilizados pela pesquisa foi orientado pela técnica de análise documental, conforme descrita por Cellard (2012). Os resultados obtidos sustentaram a construção de uma leitura sobre a organização dos saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF, os quais foram diferenciados, inicialmente, por suas características de ensino prático e teórico. Intrinsecamente a essas diferenciações, foi possível demarcar características do perfil profissional forjado pelo referido curso. Neste cenário, os(as) professores(as) que frequentaram e concluíram o Curso Normal de Educação Física na ESEF, ao inserirem-se nas escolas primárias, conduziram o ensino de uma Educação Física voltada ao saber fazer, característica esta que permeava a formação profissional da área, durante o período (1940-1957).

Palavras-chave: História da Educação Física; História da Educação; Ensino teórico e prático

ABSTRACT

The present study aims to understand how an organization of disciplinary disciplines of the Normal Course, of the Escola Superior de Educação Física (ESEF), of the state of Rio Grande do Sul, occurred during the period in which the active activity (1940-1956). The historiographical narrative, guided by Certeau (2017) and Chartier (2017) was supported by the theoretical-methodological assumptions of teaching knowledge, especially those understood by Desbiens (2005) and Tardif (2014) as disciplinary knowledge and curricular knowledge. This reference was articulated with the bibliography on pedagogical planning, especially that used by Libâneo (2012). The analysis and confrontation process of the different historical documents used by the research was guided by the document analysis technique, as described by Cellard (2012). The results obtained supported the construction of a reading about an organization of the disciplinary knowledge of the Normal Physical Education Course of ESEF, which were differentiated by their practical and theoretical teaching characteristics. Intrinsically, these differentiations were possible to mark characteristics of the professional profile forged by the referred course. In this scenario, the teachers who attended and completed the Normal Course of Physical Education at ESEF, when inserting themselves in primary schools, led the teaching of a Physical Education focused on know how, a characteristic that permeated the professional training of the area, during the period (1940-1957).

Keywords: History of Physical Education; History of Education; Theoretical and practical teaching

Introdução

A Escola Superior de Educação Física (ESEF), do estado do Rio Grande do Sul, atual Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança (ESEFID), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, foi criada e vinculada ao Departamento estadual de Educação Física (DEEF), no ano de 1940. O DEEF subordinava-se a, então, denominada Secretaria de Educação e Cultura do estado (SEC), e suas ações foram orientadas, inicialmente, pelo Regimento Interno2, aprovado pelo Decreto nº 811, de 2 de agosto de 1943 (RIO GRANDE DO SUL, 1943). Este documento, além de prever as responsabilidades do DEEF perante a administração da ESEF, também enunciava em suas linhas, orientações destinadas à organização do ensino da referida instituição.

A ESEF foi a primeira instituição de ensino superior a formar professores(as) civis de Educação Física, no estado do Rio Grande do Sul (MAZO, 2005a). As atividades acadêmicas iniciaram com o oferecimento do Curso Normal de Educação Física, cujo período de vigência compreendeu os anos de 1940 a 1956 (BEGOSSI, 2017). O referido curso pretendia especializar normalistas, ou seja, professores(as) que haviam obtido uma formação via Escola Normal, para trabalhar com a matéria3 de Educação Física no ensino primário. Assinalamos que, para além do Curso Normal de Educação Física, a ESEF passou a oferecer, a partir do ano de 1941, o Curso de Medicina de Educação Física e dos Desportos, o Curso de Técnica Desportiva e o Curso de Treinamento e Massagem, todos com duração de um ano cada, e o Curso Superior de Educação Física, com duração de dois anos (MAZO, 2005a).

A ESEF permaneceu sendo a única instituição de ensino superior, no estado, a formar professores(as) de Educação Física pelos 30 anos que se seguiram a sua fundação (LYRA, 2013). Nesta mesma direção, torna-se necessário destacarmos a significativa contribuição da ESEF para a construção do campo da formação de professores(as) da área, no Rio Grande do Sul, a partir do momento em que fora reconhecida, pelo governo federal, em 1939, como a única instituição apta, no estado, a emitir diplomas de formação profissional em Educação Física. Esta medida, segundo Lyra (2013, p. 149), “contribuiu para a construção da ideia de que a Educação Física era uma área de conhecimento que possuía seus próprios saberes”. Diante disso, tão importante quanto a criação de instituições para formar professores(as) estava o estabelecimento de saberes disciplinares que demarcariam os modos de fazer e ensinar esta matéria nas escolas.

Diante do exposto, o objetivo do presente estudo foi compreender como ocorreu a organização dos saberes disciplinares do Curso Normal da Escola Superior de Educação Física (ESEF), do estado do Rio Grande do Sul, durante o período em que este permaneceu em atividade (1940-1956). Ressaltamos que o recorte temporal da pesquisa parte do ano de 1940, quando o Curso Normal de Educação Física entrou em funcionamento juntamente com as demais atividades da ESEF, e encerra-se no ano de 1956, último ano de ocorrência do mencionado curso, visto que, em 1957, fora substituído pelo Curso de Educação Física Infantil.

Referencial Teórico-Metodológico

A narrativa historiográfica apresentada neste estudo foi construída a partir do cotejamento de documentos históricos - programas de ensino das disciplinas do Curso Normal de Educação Física da ESEF e Regimento Interno do DEEF -, para os quais se lançou um olhar analítico, sustentado pelos referenciais teórico-metodológicos eleitos ao estudo. Deste modo, o discurso histórico produzido buscou apresentar uma leitura acerca da organização dos saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF, na perspectiva de Certeau (2017) e Chartier (2017). De acordo com Certeau (2017, p. 8), a produção de um texto historiográfico, além de fabricar uma realidade, também faz parte desta, uma vez que “uma leitura do passado, por mais controlada que seja pela análise dos documentos, é sempre dirigida por uma leitura do presente”. Nesta direção, também alicerçadas nas noções teóricas de Chartier (2017), compreendemos que a construção de uma narrativa historiográfica é sempre localizada social e culturalmente e, deste modo, é em função deste lugar que se “delineia uma topografia de interesses” (CERTEAU, 2017, p. 47), cuja subjetividade do pesquisador torna-se indissociável da escrita.

Assim, a construção da presente investigação foi norteada pelo contato com os documentos de pesquisa, bem como pelas análises que estes nos permitiram delinear acerca da realidade demarcada à investigação. A fim de guiar nosso olhar pelos documentos históricos, apoiamo-nos, inicialmente, na obra de Maurice Tardif, intitulada “Saberes docentes e formação profissional” (2014). O saber docente, segundo Tardif (2014), é composto de vários outros tipos de saberes, podendo ser estes disciplinares, curriculares, profissionais e experienciais. Ao presente estudo interessaram, sobretudo, aqueles conceituados como disciplinares e curriculares. O primeiro corresponde aos diversos campos de conhecimento da sociedade que são integrados à universidade na forma de disciplinas; o segundo, por sua vez, apresenta-se, de modo concreto, na forma de programas de ensino, sistematizando os elementos necessários ao ensino (BORGES, 2005; TARDIF, 2014).

Para Tardif (2014, p. 38), os programas de ensino são saberes curriculares que constituem a representação concreta dos “discursos, objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e apresenta os saberes disciplinares”. Desbiens (2005, p. 90), por sua vez, assinala que a importância dos programas de ensino é “imensa” em razão de “consistirem em prescrições que o docente deve considerar para a concepção, o planejamento e a avaliação dos aprendizados”. Em vista do exposto, recorremos, de modo complementar, a bibliografia que trata sobre planejamento pedagógico para também orientar o nosso olhar aos documentos de pesquisa.

Libâneo (2012, p. 222) descreve planejamento como “um processo de racionalização, organização e coordenação da ação docente”, que articula a atividade escolar com a problemática do contexto social. Para Fonseca (2015), o plano (programa de ensino)4 é a sistematização do planejamento. Desta forma, enquanto o plano (programa de ensino) pode ser compreendido como um produto provisório, passível de receber alterações, o planejamento vincula-se ao processo de permanente reflexão e tomada de decisão (VASCONCELOS, 2008).

Em relação ao documento que sistematiza o planejamento do ensino, Libâneo (2012, p. 232) menciona que este constitui-se em um “roteiro organizado das unidades didáticas para um ano ou semestre”. De maneira detalhada, Fonseca (2015) evidencia que, no plano de ensino (programa de ensino), figuraram os objetivos educacionais, os conteúdos, os procedimentos de ensino e as formas de avaliação. Desta forma, os programas de ensino analisados no presente estudo são portadores de orientações de ordem pedagógica e, portanto, a semelhança do evidenciado nos conceitos teóricos descritos, apresentam elementos que sistematizaram a ação docente no Curso Normal de Educação Física da ESEF (1940-1956).

Os programas de ensino e o Regimento Interno do DEEF foram interpretados por meio da técnica de análise documental, conforme descrita por Cellard (2012). Em seguida, os resultados obtidos foram interpretados e apresentados através de uma narrativa historiográfica, organizada nos tópicos que seguem.

A disposição dos saberes disciplinares em práticos e teóricos

A fim de compreendermos a disposição dos saberes disciplinares fez-se necessário visualizar como estava estruturado o DEEF e, para tanto, analisar seu Regimento Interno. Em tal documento, consta que o DEEF estruturava-se em seis principais órgãos, a saber: I - Diretoria; II - Divisão de Ensino; III - Divisão de Biologia; IV - Divisão Técnica; V - Divisão Administrativa e VI - Escola de Educação Física (RIO GRANDE DO SUL, 1943). Para a presente investigação, dedicamo-nos a analisar as Divisões de Biologia e Divisão Técnica, visto que eram a esses órgãos e as suas respectivas seções que se vinculavam os(as) professores(as) catedráticos responsáveis pelo ensino dos saberes da ESEF. A composição de ambas as divisões encontram-se apresentadas na figura abaixo.

Fonte: Adaptado de Begossi (2017), elaborado com base no Regimento Interno do DEEF (RIO GRANDE DO SUL, 1943)

Figura 1 Composição da Divisão de Biologia e da Divisão Técnica do DEEF 

Importa destacarmos que esta disposição foi apresentada, inicialmente, no Título II, mais especificamente nos Capítulos IV e V, do Regimento Interno do DEEF (RIO GRANDE DO SUL, 1943). Essa mesma organização foi retomada no Título III, Capítulo II, do referido documento, para referir-se aos “funcionários e suas atribuições”. Neste espaço, por sua vez, foi destacado no Artigo 56, que “Os Adjuntos das secções5 de Biometria, Cinesiologia, Fisiologia aplicada, Psicologia experimental e Fisioterapia serão os professores catedráticos das respectivas cadeiras6”. Ainda, no Artigo 58, evidenciava-se que “O Adjunto da secção de Educação Física e o da secção de Desportos serão escolhidos entre os professores catedráticos das cadeiras práticas” (RIO GRANDE DO SUL, 1943, p.5).

A análise ao conteúdo descrito sugere uma divisão entre os saberes que compunham o Curso Normal de Educação Física da ESEF, sobretudo ao que concerne às suas características de ensino. Conforme demonstrado no conteúdo explicitado no Artigo 58, havia uma relação de saberes portadores de um caráter de ensino classificado como prático. Essa assertiva faz-nos conceber, consequentemente, que os saberes elencados no Artigo 56, pertenceriam a um conjunto de cadeiras possuidoras de um viés teórico. Por este motivo, provavelmente, estavam localizadas em Divisões distintas dentro do DEEF.

De outro modo, tanto na figura trazida pelo presente estudo quanto na descrição dos conteúdos dos Artigos 56 e 58, do Regimento Interno do DEEF, demonstrou-se que os(as) professores(as) responsáveis pelo andamento dos saberes de caráter biológico vinculavam-se à Divisão de Biologia do DEEF. Por sua vez, aqueles responsáveis pelos saberes disciplinares caracterizados por um caráter prático ligavam-se à Divisão Técnica do DEEF, mais especificamente às seções de Educação Física e de Desportos (RIO GRANDE DO SUL, 1943). Com base nas informações apresentadas, podemos organizar os saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF em dois eixos: a) Disciplinas biológicas, possuidoras de um caráter teórico e b) Disciplinas técnicas, dotadas de um caráter prático.

Ao primeiro eixo, referente às disciplinas teóricas, figuravam os saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física, organizados a partir da Divisão de Biologia, a saber: a) Anatomia Humana Aplicada; b) Biometria; c) Cinesiologia Aplicada; d) Fisioterapia; e) Higiene Aplicada e f) Socorros de Urgência (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940). Ao segundo eixo, ou seja, aquele possuidor de características de ensino prático e vinculado à Divisão Técnica, figuraram os seguintes saberes disciplinares: a) Canto Coral; b) Desportos Aquáticos; c) Desportos de Ataque e Defesa; d) Desportos Terrestres Coletivos; e) Desportos Terrestres Individuais; f) Educação Física Geral - Feminina; g) Ginástica Rítmica; h) História da Educação Física e dos Desportos; i) Metodologia da Educação Física; j) Organização da Educação Física e dos Desportos; k) Ritmo e l) Tênis Feminino (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940).

A partir desta organização dos saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF foi possível compreendermos determinadas questões que se encontravam intrínsecas a esta disposição. A divisão dos saberes disciplinares em dois grupos distintos - teóricos e práticos - permitiu-nos o delineamento de questões estruturais vinculadas aos saberes disciplinares de cada um dos grupos, por meio da análise de seus programas de ensino. Tais características possibilitaram que adentrássemos espaços simbólicos estabelecidos por esta categorização, a fim de compreender nuances vinculadas às características estruturais demarcadas.

De modo específico, o delineamento das estruturas de cada um dos saberes disciplinares somente foi possível de ser realizado através da análise aos programas de ensino. Estes documentos pedagógicos dividiam-se em quatro partes. A primeira, apresentada sob a forma de cabeçalho, destacava o nome da instituição de ensino (Escola Superior de Educação Física), o Curso em questão (Curso Normal de Educação Física), seguido da escrita “Conteúdo Programático de x”, no qual “x” referia-se ao saber disciplinar a que o programa de ensino tratava. Posteriormente, a segunda parte destinava-se a apresentar o(s) objetivo(s). Em seguida, na terceira parte, apresentava-se uma relação pormenorizada do conteúdo programático a ser desenvolvido. Na quarta e última parte, situada ao final do documento pedagógico, evidenciava-se o número de aulas, o material didático utilizado, os meios de verificação do aprendizado, os locais de realização das aulas, bem como a bibliografia utilizada para embasar os estudos (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940).

Ressaltamos que, para esta investigação, detivemo-nos a analisar a estruturação dos programas de ensino focalizando, sobretudo, o número de grupos de conteúdos programáticos estabelecidos a cada saber, bem como a carga horária ou o número de aulas/sessões estabelecidos a cada um. Iniciemos, assim, tratando de especificidades acerca do primeiro eixo, relacionado às disciplinas biológicas, atravessadas por um caráter teórico.

Ao analisarmos a composição dos programas de ensino, dos saberes disciplinares que compõem o referido eixo, foi possível observarmos que apenas no documento pedagógico de Anatomia Humana Aplicada os objetivos não foram explicitados. Além disso, as informações relacionadas ao material didático, aos meios de verificação do aprendizado, aos locais das aulas, bem como à bibliografia, também não foram descritas. Constavam apenas os conteúdos programáticos a serem desenvolvidos, os quais totalizavam 14 grupos, bem como o total de 24 aulas/sessões, sendo este o menor número dentre os saberes orientados pela Divisão de Biologia do DEEF (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940; RIO GRANDE DO SUL, 1943).

Nos programas de ensino dos saberes disciplinares de Biometria, Cinesiologia Aplicada e Fisioterapia, foi explicitada a totalidade de informações solicitadas. Todavia, diferiram no que concerne ao número de grupos de conteúdos programáticos, bem como no total de aulas/sessões. Enquanto os saberes de Biometria e Fisioterapia organizavam-se em torno de 19 grupos, a disciplina de Cinesiologia Aplicada era constituída por cinco. Apesar disso, o número de aulas de Cinesiologia Aplicada era superior ao de Biometria e Fisioterapia. Assim, enquanto o saber de Cinesiologia Aplicada contava com um total de 32 aulas e, portanto, caracterizava-se como a disciplina com o maior número de aulas deste eixo, as disciplinas de Biometria e Fisioterapia eram ambas compostas por 30 aulas. Ressaltamos ainda que o saber de Biometria, de modo específico, era orientado através de 17 aulas teóricas e 13 práticas (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940).

Ainda tratando de caracterizar os saberes disciplinares do eixo vinculado à Divisão de Biologia foi possível localizarmos proximidades entre saberes disciplinares de Higiene Aplicada e Socorros de Urgência. Com exceção dos locais de realização das aulas, os programas de ensino de ambas as disciplinas apresentaram todas as demais informações solicitadas. Tais saberes disciplinares diferiram, por sua vez, no número de grupos de conteúdos programáticos e também no total de aulas/sessões. Enquanto a disciplina de Higiene Aplicada contava com 14 grupos e o total de 29 aulas/sessões, Socorros de Urgência compunha-se de 13 grupos de conteúdos programáticos e de 30 sessões/aulas (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940).

No quadro abaixo, é possível observarmos a relação de saberes disciplinares que compunham este eixo, bem como o respectivo número de grupos de conteúdos programáticos, seguido da quantidade de aulas/sessões de cada um.

Quadro 1 Características estruturais dos programas de ensino orientados pela Divisão de Biologia do DEEF 

Saberes disciplinares Nº de grupos de conteúdos programáticos Nº de aulas/sessões
Total Teóricas Práticas
Anatomia Humana Aplicada 14 24 - -
Biometria 19 30 17 13
Cinesiologia Aplicada 5 32 - -
Fisioterapia 19 30 - -
Higiene Aplicada 14 29 - -
Socorros de Urgência 13 30 - -

Fonte: Adaptado de Begossi (2017), com base nos programas de ensino (1940)

Com relação à composição dos programas de ensino, dos saberes disciplinares que compunham o segundo eixo relacionado aos saberes técnicos, dotados de um caráter prático de ensino, foi possível demarcarmos que Canto Coral e Metodologia da Educação Física, apenas não descreveram em seus documentos pedagógicos o material didático utilizado para o desenvolvimento das aulas. Todas as demais informações (objetivos, número de grupos de conteúdos programáticos, número de aulas/sessões, meios de verificação do aprendizado, locais das aulas e bibliografia) foram evidenciadas. Com relação aos demais saberes disciplinares que compunham este eixo de análise, notamos que todos apresentaram a totalidade de informações elencadas (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940).

Para além de auxiliar no destaque com relação à presença ou não de determinadas informações nos programas de ensino, a análise da estrutura destes documentos possibilitou compreendermos os tempos que cada disciplina ocupou na formação empreendida pelo Curso Normal de Educação Física da ESEF. Diante disso, ao determo-nos na análise das informações contidas no espaço referente ao “número de aulas/sessões”, demarcamos que o saber disciplinar de Canto Coral contava com um total de 10 aulas para o desenvolvimento de 18 segmentos de conteúdos. De forma significativamente distinta, a disciplina de Educação Física Geral - Feminina, contava com 129 aulas para o cumprimento de seu programa de ensino, composto por 20 grupos de conteúdos. De modo similar, o saber de Ginástica Rítmica contava com 96 aulas, para o desenvolvimento de seu programa, composto por 13 segmentos de conteúdo.

Diante do exposto, podemos ressaltar que, apesar de a disciplina de Canto Coral ser a que menos dispunha de aulas para o cumprimento de seu programa, era, ao mesmo tempo, a que possuía o maior número de grupos de conteúdos programáticos pré-estabelecidos. Abaixo, da mesma forma que o quadro sistematizado para o primeiro eixo, elaboramos outro para melhor visualizarmos os dados acima descritos.

Quadro 2 Características estruturais dos Programas de Ensino orientados pela Divisão Técnica do DEEF 

Saberes disciplinares Nº de grupos de conteúdos programáticos Nº de aulas/ sessões
Canto Coral 18 10
Desportos Aquáticos - Remo 5 15
Desportos Ataque e Defesa 8 65
Desportos Terrestres Coletivos Basquetebol 4 45
Futebol 6 30
Volibol 5 45
Desportos Terrestres Individuais Corridas 5 15
Ginástica de aparelhos e levantamento de pesos e halteres 2 30
Lançamentos 6 17
Saltos femininos 5 15
Educação Física Geral - Feminina 20 129
Ginástica Rítmica 13 96
História da Educação Física e dos Desportos 10 24
Metodologia da Educação Física 3 45
Organização da Educação Física e dos Desportos 15 20
Ritmo 4 15
Tênis Feminino 3 30

Fonte: Adaptado de Begossi (2017), com base nos programas de ensino (1940)

Conforme foi possível percebermos, nos programas de ensino de ambos os grupos de saberes disciplinares, existem distinções, especialmente, no que concerne à organização de sua estrutura. Este fato justifica-se, sobretudo, em razão de não haver um órgão, no interior do DEEF, responsável pela elaboração de tais documentos pedagógicos. Ao invés disso, destacamos que eram os(as) próprios(as) professores(as) catedráticos(as) das disciplinas que planejavam suas cadeiras e aulas, disponibilizando esta estruturação por meio dos programas de ensino (RIO GRANDE DO SUL, 1943; BRASIL, 1939). Portanto, era compreensível que a lógica interna de cada um desses materiais diferisse.

A partir das considerações de Borges (2005), Desbiens (2005), Tardif (2014) e Fonseca (2015), é possível demarcarmos o papel significativo que um planejamento, sistematizado na forma de programas de ensino, representa para a organização do ensino de uma instituição. Tais documentos de orientação pedagógica possibilitam a articulação interna dos saberes disciplinares, por meio da relação entre seus conteúdos programáticos e também uma articulação externa, ou seja, a relação que estes saberes estabelecem com os demais que compõem o currículo de um curso de formação.

Acerca do papel desempenhado pelos(as) docentes na elaboração e também na aplicação/ensino dos conteúdos elencados, destacamos que esta orientação foi prevista, inicialmente, por meio do Decreto-Lei 1.212, de 19397. No Artigo 29 da referida normativa, estava posto que “para cada disciplina haverá um programa que será elaborado pelo professor catedrático dela encarregado e deverá ter a aprovação do Conselho Técnico Administrativo8” (BRASIL, 1939, p. 5, grifo nosso). De maneira complementar, o Regimento Interno do DEEF (RIO GRANDE DO SUL, 1943) previa um ato de fiscalização para averiguação do cumprimento das informações contidas no planejamento e, especialmente, das sequências de aprendizado. A responsabilidade deste ato, por conseguinte, recaía sobre a Divisão de Ensino do DEEF, mais especificamente a Seção Didática. No Artigo 12, parágrafo IX, destacava-se que:

A Secção Didática, dirigida pelo respectivo adjunto, compete organizar e manter em dia, em livros especiais, quadros demonstrativos da progressão das aulas teóricas e práticas, com um mapa alterado diariamente, de maneira a poder informar o Chefe da Divisão do adiantamento do ensino em determinada matéria, para efeito de fiscalização do cumprimento dos programas (RIO GRANDE DO SUL, 1943, p. 3, grifos nossos).

O trecho do Regimento Interno do DEEF exposto acima, para além de reafirmar a divisão dos saberes disciplinares em teóricos e práticos, ainda traz, intrinsecamente ao seu discurso, a demarcação de um tempo para o cumprimento dos conteúdos a serem ensinados. Diante deste ponto, torna-se perceptível que, apesar de a organização interna dos conteúdos não seguir uma única lógica, visto que cada professor(a) organizava seu próprio programa de aulas, os tempos que cada saber disciplinar dispunha eram previamente demarcados. Portanto, por meio da análise específica ao número de aulas/sessões que cada saber disciplinar dispunha foi possível estabelecermos sua representatividade no interior do Curso Normal de Educação Física da ESEF.

Orientação prática e teórica dos saberes disciplinares

O delineamento das considerações apresentadas no tópico anterior, para além de analisar a estrutura proposta nos programas de ensino, dos saberes disciplinares do Curso Normal da ESEF, também evidenciou que o número de aulas que compunha a Divisão Técnica era significativamente superior ao da Divisão de Biologia. Os saberes disciplinares que compuseram o segundo eixo e, portanto, possuidores de um caráter de ensino predominantemente prático perfaziam um total de 646 aulas/sessões. De forma distinta, os saberes de caráter dominantemente teórico, orientados pela Divisão de Biologia, computavam um total de 175 aulas/sessões (PROGRAMAS DE ENSINO, 1940). Esta informação demonstra que a formação de professores(as) sucedida no Curso Normal de Educação Física da ESEF era composta por saberes disciplinares prevalentemente técnicos, no qual os conteúdos procedimentais, ou seja, aqueles relacionados a dimensão do fazer eram superiores a aqueles conteúdos conceituais, vinculados aos saberes teóricos.

Corroborando com as informações que emergiram da análise aos documentos históricos consultados, Borges (2005, p. 157), em seu estudo sobre a formação dos docentes de Educação Física e seus saberes profissionais, evidenciou que “no Brasil, um modelo disciplinar técnico ou “aplicacionista” é onipresente nos programas de formação dos educadores físicos”. Esta característica, segundo a autora, permeia o campo desde o seu processo de conformação. Acerca deste aspecto, recordemos que as bases da formação civil de professores(as) de Educação Física, em território nacional, têm como alicerces as instituições médica e militar. Para Castellani Filho (1988), tanto os militares quanto a categoria profissional dos médicos contribuíram para a construção do campo da Educação Física no Brasil, em diferentes momentos históricos.

De modo particular, na ESEF, tais influências também foram possíveis de serem demarcadas. Conforme vimos, a Divisão de Biologia e a Divisão Técnica do DEEF eram portadoras de características internas singulares. Dentre as distinções, está o fato de os professores médicos estarem vinculados à Divisão de Biologia e os professores militares estarem ligados a Divisão Técnica (RIO GRANDE DO SUL, 1943). Intrinsecamente a esta separação, figurava o caráter de ensino das disciplinas vinculadas a cada uma dessas Divisões. Enquanto os saberes disciplinares, predominantemente teóricos, orientavam-se pela Divisão de Biologia e eram lecionados, desta forma, por médicos; aqueles saberes possuidores de um caráter dominantemente prático, dirigidos pela Divisão Técnica, tinham como docentes responsáveis os militares.

Conforme sublinhado, os conteúdos vinculados à dimensão prática perfaziam um total de aulas superior a aqueles compreendidos como teóricos. Esta característica manifesta, de certa forma, que a formação de professores(as), empreendida no Curso Normal de Educação Física da ESEF, preparava profissionais dotando-os de ferramentas de ensino vinculadas a perspectiva do saber fazer para ensinar. Todavia, não era apenas através dos saberes disciplinares que este perfil estava evidente, visto que o valor dado à dimensão prática fazia-se presente na ESEF antes mesmo do ingresso dos(as) alunos(as) ao Curso.

No estudo de Mazo (2005a), é destacado que o processo seletivo para ingresso de alunos(as), na ESEF, era composto de exames físicos. Aos(as) candidatos(as) ao Curso Normal de Educação Física eram aplicadas provas de avaliação da condição física, tais como a capacidade de nadar a distância de 25 metros. Para viabilizar a participação dos(as) candidatos(as) na prova de natação, por exemplo, a ESEF oferecia, anualmente, durante o mês de fevereiro, um curso de preparação para aqueles que não sabiam nadar. Esta prática permaneceu nas rotinas de ingresso da instituição até fins da década de 1980. Para Bossle (2014), a extinção das provas práticas para o ingresso na Escola pode estar relacionada à progressiva perda de força das disciplinas técnico-esportivas em detrimento da valorização dos saberes vinculados ao fazer científico. Deste modo, para a autora (2014), o saber fazer para ensinar foi paulatinamente perdendo força e cedendo espaço para o fazer científico no currículo da instituição. De forma complementar, Darido (1995) afirma que a formação profissional em Educação Física no Brasil voltou-se da prática para a teoria, especialmente, através da valorização do conhecimento científico, a partir de meados da década de 1980.

Contudo, durante o período em que o Curso Normal de Educação Física da ESEF permaneceu em atividade (1940-1956), os saberes disciplinares de caráter prático é que ditavam, majoritariamente, a formação profissional. Deste modo, conforme sublinhado, os responsáveis pelo ensino destes conteúdos práticos eram, em sua maioria, professores militares. Todavia, o corpo docente da instituição viu outro grupo de professores(as) ingressar e responsabilizar-se pelo ensino destes saberes, a partir da década de 1950.

Ao compararmos o corpo docente da ESEF estabelecido na década de 1940 com aquele disposto na década de 1950, percebermos que, neste último, ocorreu um aumento no número de professores(as) com formação específica em Educação Física: de 16, na década de 1940, para 24, na década de 1950 (BEGOSSI, 2017). Os(as) docentes que ingressaram, posteriormente, passaram a atuar como responsáveis e/ou auxiliares de determinadas disciplinas da ESEF.

Uma das justificativas para que novos(as) professores(as) passassem a compor o grupo de docente da instituição encontra-se no estudo de Mazo (2005b). A autora registrou que grande parte desses(as) professores(as) havia se formado nos cursos oferecidos pela própria instituição e foram convidados(as) a compor o quadro docente. Como traço comum desse grupo destacava-se o percurso esportivo e a atuação enquanto atletas em clubes do estado do Rio Grande do Sul. Esta característica de ter vivenciado um passado esportivo, por consequência, remete-nos ao conceito de “saberes experienciais”, abordado por Maurice Tardif (2014, p. 38). Para o autor, os saberes experienciais podem ser traduzidos como aqueles saberes ligados ao trabalho prático. Estes, por sua vez, são temporais, pois “são construídos e dominados progressivamente durante um período de aprendizagem variável, de acordo com cada ocupação” (TARDIF, 2014, p. 58).

Em sua obra “Saberes docentes e formação profissional”, Tardif (2014) reserva o segundo capítulo para tratar dos saberes do tempo e da aprendizagem vinculados, de modo particular, ao trabalho do professor. Nesta direção, ao dar destaque às principais características do saber experiencial, o autor evidencia a relação de dependência deste com a atuação prática. Segundo Tardif (2014, p. 109), o saber experiencial é adquirido por meio dos aprendizados obtidos nas distintas vivências pelas quais o professor passou em momentos diferentes de sua trajetória, seja através da “história de vida, da carreira ou mesmo de outros trabalhos efetuados”.

Diante disso, sugere-se que as alterações ocorridas no currículo da ESEF podem ter configurado uma das motivações para a inserção de docentes que já possuíssem em seu repertório determinados saberes experienciais obtidos, especialmente, por meio da vivência com a educação física e com o esporte, na condição de atletas. As experiências anteriormente obtidas também podem ter auxiliado os(as) próprios(as) professores(as) contratados na concepção de seu trabalho enquanto docentes da ESEF. Assim, mesmo que a lógica ocorrida na ESEF, neste caso, tenha sido a inversa daquela proposta por Tardif (2014), na qual o autor destaca que a formação teórica antecede a formação prática, acreditamos que os saberes experienciais selecionados e inseridos na grade disciplinar através de seus(uas) docentes tenham sido interessantes tanto para a instituição quanto para os(as) próprios(as) professores(as) e alunos(as).

Deste modo, a dimensão prática dos saberes disciplinares parece ter assumido, na formação de professores(as) da ESEF e, de modo específico, no Curso Normal de Educação Física, um lugar privilegiado. Se inicialmente foi possível assinalarmos a superioridade de aulas destinadas a estes conteúdos em detrimento daqueles caracterizados como teóricos, o que percebemos ao longo da construção deste estudo foi a consolidação de uma formação técnico-prática. Esta característica da formação foi uma constante em diversos aspectos da Escola e manifestou-se, entre outras ocasiões, através da demarcação de normas, como os exames práticos para ingresso, ou mesmo por meio da inclusão de professores(as) atletas no quadro docente. Assim, tais elementos sustentaram um discurso que já havia sido anunciado através da predominância do ensino de determinados saberes disciplinares permeados por tal peculiaridade.

Considerações finais

O presente estudo buscou compreender como ocorreu a organização dos saberes disciplinares do Curso Normal da Escola Superior de Educação Física (ESEF), do estado do Rio Grande do Sul, durante o período em que este permaneceu em atividade (1940-1956). A partir da análise aos documentos históricos, construímos uma narrativa historiográfica, sustentada pelos pressupostos teórico-metodológicos dos saberes docentes, especialmente daqueles identificados como disciplinares e curriculares (BORGES, 2005; DESBIENS, 2005; TARDIF, 2014) e articulada com a bibliografia sobre planejamento pedagógico (LIBÂNEO, 2012; VASCONCELOS, 2008; FONSECA, 2015). Ao contrapor os distintos materiais de pesquisa, tornou-se possível construir uma leitura acerca da organização dos saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF.

Os indícios apresentados pelos documentos históricos demarcaram a organização dos saberes em dois eixos: um composto por disciplinas biológicas, possuidoras de um caráter de ensino teórico e o outro, constituído por disciplinas técnicas, dotadas de um caráter prático de ensino. Os mencionados grupos, para além de diferenciarem-se em suas formas de ensino, também distinguiam os docentes responsáveis em duas categorias. Desse modo, professores médicos e militares encarregavam-se de arquitetar os programas de ensino e, ao mesmo tempo, lecionar os saberes teóricos e práticos, respectivamente.

Intrinsecamente a tais diferenciações estruturais, circunscreviam-se, nos programas de ensino, os tempos destinados a cada um dos saberes disciplinares, os quais, em sua totalidade, compunham o arranjo mais geral da formação empreendida pelo Curso Normal de Educação Física da ESEF. Assim, a superioridade de aulas/sessões destinadas aos saberes técnicos determinava, consequentemente, o próprio perfil da formação de professores(as) empreendida pelo referido curso, o qual alocava aos conteúdos relacionados a dimensão do fazer um lugar de proeminência frente àqueles caracterizados como teóricos.

Destarte, a compreensão de elementos relacionados à organização dos saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF permitiu-nos adentrar em um espaço educacional e demarcar, para além de suas formas de ensino, os próprios contornos que balizavam a formação profissional que estava sendo forjada. Desse modo, os(as) docentes formados(as) pelo referido Curso levavam, às escolas primárias, o ensino de uma Educação Física voltada ao saber fazer, característica que demarcava a própria formação profissional da área naquele período (1940-1957). Diante disso, nossos esforços foram concebidos no sentido de registrar, mesmo que de modo parcial e lacunar (CERTEAU, 2017), características da arquitetura de saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF, buscando construir um discurso histórico e almejando contribuir para com a História da Educação e História da Educação Física brasileira.

Referências

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2 Disponível em: (https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/110300). Acesso em: 30 out. 2019.

3 O termo matéria era empregado para designar o que chamamos de disciplina. No tempo presente, o termo empregado na área da Educação é componente curricular.

4 Os documentos históricos eleitos para pesquisa foram interpretados enquanto produções históricas e culturais, concebidas em determinado tempo e espaço. Desta forma, a análise destes documentos deu-se sem perder a perspectiva de que qualquer discurso é datado e, portanto, julgamos necessário mantermo-nos fiéis às terminologias empregadas, para evitarmos anacronismos na construção do discurso. Assim, optamos por manter o termo programas de ensino para denominar o documento que traz a relação de conteúdos programáticos, objetivos, métodos, número de aulas, materiais didáticos, meios de verificação de aprendizado e bibliografia de cada um dos saberes disciplinares do Curso Normal de Educação Física da ESEF. Sublinhamos que, no tempo presente, tais documentos denominam-se planos de ensino.

5 Ressaltamos que optamos por manter a grafia das palavras conforme aparecem nos documentos históricos consultados.

6 O termo cadeira era empregado para designar o que chamamos no tempo presente de disciplina ou de componente curricular.

7 O referido Decreto-Lei criou, na Universidade do Brasil, a Escola Nacional de Educação Física e Desportos e deu outras providências (

8 O Conselho Técnico Administrativo era um órgão consultivo do DEEF para o estudo e solução de questões administrativas e financeiras, devendo colaborar em todas as demais atribuições da Diretoria da Escola.

Recebido: 26 de Novembro de 2019; Aceito: 03 de Julho de 2020; Publicado: 28 de Maio de 2021

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