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Motrivivência

versão On-line ISSN 2175-8042

Rev. Motriviv. vol.31 no.57 Florianópolis jan./mar 2019  Epub 15-Out-2019

https://doi.org/10.5007/2175-8042.2019e54308 

Artigo Original

A abordagem da competição esportiva na escola: uma pesquisa-ação com professores de Educação Física

The approach of sports competition in school: an action research with Physical Education teachers

El abordage de la competición deportiva en la escuela: una investigación-acción con profesores de Educación Física

Valéria Gonçalves1 
lattes: 4195330257527964

Fernando Jaime González2 
lattes: 2914978770769541

Robson Machado Borges3 
lattes: 1364784429383778

1Mestranda em Ciências do Movimento Humano Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Escola de Educação Física, Fisioterapia e Dança, Porto Alegre/RS, Brasil valeriagoncalvesedf@gmail.com

2Doutor Unijuí - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Departamento de Humanidades e Educação, Ijuí/RS, Brasil fjg@unijui.edu.br

3Doutor Unijuí - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Departamento de Humanidades e Educação, Ijuí/RS, Brasil robson.borges@unijui.edu.br


RESUMO

O esporte e a competição são assuntos completamente interligados e que estão presentes na sociedade de diferentes formas. Contudo, professores de Educação Física (EF) escolar têm dificuldades em contextualizar a competição em suas aulas, muitas vezes por desconhecerem propostas que abordam o assunto de forma significativa para eles. Nesse contexto, esta investigação tem como objetivo principal descrever as decorrências de uma pesquisa-ação com docentes de EF, acerca do tratamento da competição esportiva na escola. Em oito encontros, um dos pesquisadores e duas professoras se reuniram para estudar a aplicação do Sport Education. Os resultados apontam uma mudança na concepção das docentes sobre a contextualização da competição esportiva nas aulas de EF, uma vez que elas compreenderam a possibilidade de se trabalhar com essa temática a partir dos princípios do Sport Education.

PALAVRAS-CHAVE: Competição; Sport education; Formação continuada

ABSTRACT

Sport and competition are completely interconnected issues and are present in society in different ways. However, teachers of Physical Education (EF) at school have difficulties in contextualizing the competition in their classes, often for not knowing proposals that approach the subject in a significant way for them. In this context, this research has as main objective to describe the consequences of an action research with teachers of EF, about the treatment of sports competition in school. In eight meetings, one of the researchers and two teachers met to study the application of Sport Education. The results point to a change in the teachers' conception about the contextualization of sports competition in EF classes, since they understood the possibility of working with this theme from the principles of Sport Education.

KEYWORDS: Competition; Sport education; Continuing education

RESUMEN

El deporte y la competición son asuntos completamente interconectados y que están presentes en la sociedad de diferentes formas. Sin embargo, los profesores de Educación Física (EF) tienen dificultades para contextualizar la competencia en sus clases, muchas veces por desconocer propuestas que abordan el tema de forma significativa para ellos. En este contexto, esta investigación tiene como objetivo principal describir las consecuencias de una investigación-acción con docentes de EF, acerca del tratamiento de la competición deportiva en la escuela. En ocho encuentros, uno de los investigadores y dos profesoras se reunieron para estudiar la aplicación del Sport Education. Los resultados apuntan a un cambio en la concepción de los docentes sobre la contextualización de la competición deportiva en las clases de EF, ya que ellas comprendieron la posibilidad de trabajar con esa temática a partir de los principios del Sport Education.

PALABRAS-CLAVE: Competición; Sport education; Formación continua

INTRODUÇÃO

O esporte é uma prática corporal bastante apreciada em diversos locais do planeta. Trata-se de uma criação social interessante e de grande significado para muitas pessoas, de forma especial para crianças e jovens (MARQUES, 2004).

No Brasil um dos principais espaços em que esses jovens tomam contato com o esporte1 é a escola, sendo sua tematização prevista no componente curricular Educação Física. Nessa disciplina, é comum que o ensino de esportes ocupe grande parte do tempo curricular, particularmente, nos anos finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

Assim, durante o ensino do esporte na escola um tema intrínseco a ele - pela ótica da lógica interna (GONZÁLEZ; BRACHT, 2012) - é a competição, ou seja, a comparação de desempenho entre os participantes. Pode se dizer que “a competição é a essência do desporto, sem a qual este próprio deixa de o ser, de existir” (MARQUES, 2004, p. 76). Dito de outra forma, não há esporte sem competição.

No entanto, ao mesmo tempo em que se reconhece a necessidade da competição no ensino do esporte, também se nota que a condução ao ensinar modalidades esportivas para crianças e jovens é idêntica ao modelo adulto. Fato que é considerado um problema, como apontam De Rose Jr. e Korsakas (2006, p. 253):

Se observarmos as competições infantis, na maioria das vezes, elas pouco diferem da estrutura esportiva dos adultos [...]. Repetem-se comportamentos condenáveis de pais e técnicos que exigem um desempenho voltado exclusivamente para o resultado do jogo. Esse quadro que, a princípio, seria exclusivamente dos clubes esportivos tem-se reproduzido também no ambiente escolar, no qual as escolas com o objetivo de terem equipes esportivas competitivas repetem o modelo de especialização e seleção, deixando de lado o aspecto participativo e educativo que deveria ser o principal objetivo no ambiente educacional.

Nessa linha, o tema competição nas aulas de Educação Física passou a ser objeto de estudo de diversos pesquisadores. Por um lado, alguns têm apontando apenas aspectos negativos, enquanto outros somente pontos positivos de sua inclusão (ARRUDA JÚNIOR, 2009). Entretanto, é possível afirmar que o esporte é uma construção humana que pode gerar consequências positivas ou negativas, dependendo da abordagem (MARQUES, 2004). Ou seja, o esporte não é por si só educativo, é preciso torná-lo.

Neste cenário, boa parte dos professores de Educação Física que atuam nas escolas têm dificuldades em contextualizar a competição em suas aulas, muitas vezes por desconhecerem propostas que abordam o tema. Não raramente ocorrem falas do tipo: é preciso tirar a competição do esporte ou tem que trabalhar o esporte sem a competição.

Sobre isso, entendemos que a competição precisa ser contemplada como um aspecto importante no ensino dos esportes, sendo necessário buscar alternativas para sua contextualização. Entre as formas de contemplá-la na escola algumas possibilidades têm sido objeto de pesquisa, como por exemplo o Sport Education.

Criada por Daryl Siedentop, a proposta do Sport Education - também identificada em países língua portuguesa como Modelo de Educação Esportiva - permite pensar a competição esportiva como ferramenta educativa. De forma resumida, propõe que os alunos participem de um campeonato da modalidade estudada ao longo de uma unidade didática, desempenhando papéis para além de jogador (capitão, técnico, observador/scout, árbitro, secretário/súmula, assessor de imprensa, responsável pelo material e “gandulas”). Nesse modelo, há seis características2 que propõem a todos os alunos - independentemente da condição atlética ou da habilidade motora - a participação em experiências esportivas autênticas, recuperando os elementos do esporte institucionalizado com maior potencial educativo. Para participar do campeonato, a turma é dividida em pelo menos três equipes equilibradas, das quais duas participam a cada aula de uma rodada da competição, enquanto a terceira assume a responsabilidade pela arbitragem, organização, registro estatístico (scout), etc. (GONZÁLEZ, 2017).

Apesar de ser pouco conhecida no Brasil, essa proposta é muito utilizada em outros países. Além dos Estados Unidos da América, diversos professores e pesquisadores de países europeus, da Austrália e do Japão relatam experiências de aulas bem-sucedidas com a utilização desse modelo, com ganhos significativos na motivação e na aprendizagem dos alunos (GONZÁLEZ; FRAGA, 2012).

Acerca disso, Mesquita et al. (2014) desenvolveram um estudo que teve como objetivo examinar a percepção de estudantes de Educação Física sobre o valor educativo do Sport Education, pelo confronto entre a vivência do modelo enquanto alunos e como professores-estagiários. A pesquisa evidenciou que o Sport Education foi considerado “um modelo de ensino com elevado valor educativo respondendo a propósitos de uma formação eclética que considera, para além da aquisição de competências motoras, o desenvolvimento pessoal e social de crianças e jovens” (MESQUITA et al., 2014, p. 12).

No mesmo viés, ao aplicar o Sport Education no ensino do atletismo para uma turma do 5º ano do Ensino Fundamental, Coelho (2001) destaca o “[...] grande interesse e entusiasmo pela aula de educação física bem como o seu potencial para o desenvolvimento da interdisciplinaridade”. Assim como Vargas, Morisso e González (2017), quando apontam a proposta como uma boa alternativa para que o ensino do esporte supere sua visão tradicional nas aulas de Educação Física.

Refletindo acerca desse contexto chegamos a três aspectos importantes: (1) a competição esportiva - inerente ao esporte - precisa ser contemplada na Educação Física escolar, (2) boa parte dos professores desconhecem formas de trabalhar esse assunto em suas aulas e (3) o Sport Education é uma proposta interessante para tematizar a competição esportiva. Com isso, pensamos que uma ação interessante é a realização de ações de formação continuada de professores, com caráter colaborativo, que possibilitem o estudo do desenvolvimento da competição esportiva - através do Sport Education - ao tratar o esporte na Educação Física escolar.

Pontualmente, a pesquisa-ação tem sido percebida como uma ferramenta de reflexão e modificação na concepção de ensino de docentes e aparece como uma boa opção para alteração na situação atual. Segundo Tripp (2005), ela é vista como uma alternativa de sucesso pois possibilita alterações de sentido ao que fazemos ou pensamos sendo uma estratégia para o aperfeiçoamento de professores. No entanto, parecem raros os estudos que utilizaram a pesquisa-ação para investigar a competição esportiva na escola, a partir do Sport Education.

Com base nesse contexto, desenvolvemos uma investigação que teve como objetivo analisar as decorrências de um estudo colaborativo com professores de Educação Física, acerca do tratamento da competição esportiva na escola.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Este estudo está pautado em uma abordagem qualitativa e caracteriza-se numa pesquisa-ação, entendida como uma “[...] pesquisa na qual as pessoas envolvidas têm participação ativa, e na qual há uma exigência de conhecimento a ser produzido” (BETTI, 2010, p. 142).

Após todos os docentes que atuam em escolas da rede estadual de ensino da região noroeste do Rio Grande do Sul - aproximadamente 80 - terem sido convidados para participar deste estudo, os sujeitos participantes foram duas professoras com formação em Educação Física, que juntamente com um dos pesquisadores constituíram um grupo de estudos3.

O processo de investigação ocorreu em oito encontros, entre setembro e novembro de 2016, das 20h às 21h e 30min. Nos encontros, realizados numa sala de uma instituição de ensino superior da região, as participantes estabeleciam diálogos críticos-reflexivos sobre a competição esportiva nas aulas de Educação Física, com a mediação do pesquisador participante. Para facilitar a identificação dos temas estudados nos encontros, apresentamos o Quadro 1.

Quadro 1 Temas estudados nos encontros 

Encontro Tema central
Apresentação da proposta
Preenchimento de um questionário sobre atitudes em relação ao fair play no futebol
Diálogo sobre a relação entre esporte e competição
Estudo inicial do funcionamento do Sport Education
Estudo das seis principais características do Sport Education
Continuação do estudo sobre as características do Sport Education
Reflexão acerca do fair play no esporte
Análise dos papéis desempenhados pelos alunos no Sport Education: jogador, capitão, técnico, árbitro, assessor de imprensa, responsável pelo material e “gandulas”
Análise dos papéis desempenhados pelos alunos: secretário e observador
Estudo da ficha de avaliação de desempenho individual
Reflexão sobre como dividir/organizar as equipes segundo o Sport Education
Debate sobre como organizar o campeonato e os jogos
Elaboração de uma temporada
Sistematização final (revisão de todos os temas discutidos)
Preenchimento de um novo questionário sobre atitudes em relação ao fair play no futebol

Fonte: os autores (2019)

Durante as reuniões do grupo de estudo, utilizamos os seguintes recursos para a produção de dados: a) gravações das falas dos participantes, posteriormente transcritas na íntegra; b) anotações e proposições didáticas elaboradas pelas docentes, recolhidas ao final das reuniões; c) dois questionários, um aplicado antes e outro após a realização dos encontros de estudos; d) registros sobre o desenrolar dos encontros, realizados em um diário de campo.

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

No esforço de realizar uma interpretação dos dados que garantisse apresentar e discutir os achados dessa investigação optamos por realizar uma análise de conteúdo com base em Bardin (2011). Inicialmente, fizemos uma leitura - e releitura - atenta das transcrições de cada um dos oito encontros, destacando trechos/falas que consideramos marcantes durante o processo. Essa ação nos permitiu criar três categorias: (1) o desconhecimento das docentes sobre o trato da competição esportiva nas aulas e do funcionamento do Sport Education; (2) a inquietação e a angústia como consequência do desconhecimento; (3) a mudança de concepção acerca da abordagem da competição esportiva na Educação Física escolar utilizando a perspectiva do Sport Education.

Acerca da primeira categoria, interpretamos que as docentes não compreendiam temas relevantes ao abordar a competição esportiva na Educação Física, como se percebe em falas como:

“Como vou dividir eles em equipes equilibradas? Eu tenho dificuldade nisso, porque normalmente eu deixo eles escolherem em que time vão ficar” (Prof. Marina); “Eu nunca tinha ouvido falar no fair play, primeira vez que tive contato foi aqui” (Prof. Ana); “Eu não sabia que o fair play envolvia tudo isso” (Prof. Marina).

Tampouco, compreendiam o Sport Education:

“Eu ouvi falar nesse nome Sport Education quando um acadêmico foi realizar um estágio na escola, daí eu pensei: ai meu Deus o que é isso?” (Prof. Ana); “Eu fui numa palestra de um professor e ele trabalha assim, [...] mas não sabia que era o Sport Education que ele desenvolvia. Eu até pensei em tentar desenvolver com minhas turmas o que ele faz, mas só visualizando não tem como” (Prof. Marina).

Essa situação incomoda e deixa as docentes angustiadas, como humildemente elas relatam:

“Cada vez que eu vejo trabalhos bacanas, acabo me angustiando mais, porque vejo que eu tenho que fazer alguma coisa, mas sozinha não consigo dar conta, me sinto perdida e isso me incomoda muito” (Prof. Marina); “[...] apesar de trabalhar somente com o Ensino Médio me sinto insegura com essa etapa, não sei o que trabalhar” (Prof. Marina); “[..] não sei se fico feliz em aprender algo novo ou se fico triste em perceber o quanto estou perdida [...]” (Prof. Ana).

Nesse sentido, as participantes apontam a necessidade de planejar/estudar com os pares nas escolas de modo contínuo. Possivelmente a formação do grupo de estudos acentuou isso, como se identifica nas falas de Marina e Ana respectivamente:

“Estudar com os colegas da área é uma coisa que sinto falta, planejar junto, trocar as coisas, a gente se vê só pelos corredores, eu sinto falta disso”; “Eu acho que tinha que ter um grupo de estudos assim nas escolas, o ano inteiro”.

Em relação a isso, Gatti (2008) aponta que apesar de existirem muitas ações - postas sob o grande guarda-chuva do termo formação continuada - a ação de estudar com os pares pouco ou raramente ocorre.

Para verificar uma possível mudança na concepção das docentes acerca da abordagem da competição esportiva na Educação Física escolar, na perspectiva do Sport Education, apresentamos análises comparativas - antes e após os estudos - em dois momentos. No primeiro, analisamos os questionários realizados no início do primeiro encontro e ao final do último. No segundo, buscamos averiguar as falas/manifestações das professoras durante as reuniões.

Para análise dos questionários, confeccionamos um quadro para comparar as respostas. Mais especificamente, montamos três colunas nas quais definimos espaços para identificar as atitudes em relação ao fair play e as opções de acordo com o questionário, antes e após o estudo. Os espaços para respostas das professoras seguiram a proposta de Cruz et. al. (apud GONZÁLEZ; FRAGA, 2009b), utilizando os termos: Discordo Plenamente; Discordo; Indiferente; Concordo; Concordo plenamente.

Quadro 2 Comparação entre os questionários respondidos pela professora Ana antes e após o estudo 

Atitude analisada Questionário antes do estudo Questionário após o estudo
É normal uma equipe tentar desestabilizar um jogador temperamental da equipe adversária Discordo Discordo Plenamente
No futebol, o resultado final é o que mais importa Concordo Discordo Plenamente
Um jogador, ao perceber que cometeu uma falta que o árbitro não viu, deve continuar jogando normalmente como se nada tivesse acontecido Indiferente Discordo
Em qualquer categoria, jogar por diversão deveria ser o objetivo principal Discordo Concordo
Mesmo depois de uma equipe ter realizado todas as substituições possíveis, deveria ser permitido a alteração de um jogador que venha a se machucar Discordo Concordo plenamente
Admitir que uma equipe faça “cera” para garantir a vitória Discordo Discordo plenamente
No futebol, jogar por diversão é o que mais importa Discordo Concordo
O jogador deve aceitar sempre a decisão do árbitro sem reclamar Indiferente Concordo
É aceitável que se jogue de forma “dura” desde que o adversário jogue assim Concordo Discordo plenamente
O mais importante em um campeonato é ser o primeiro na tabela de classificação Indiferente Discordo plenamente
No futebol desfrutar do jogo é mais importante do que o resultado Concordo Concordo plenamente
Os jogadores devem priorizar “firulas” e “pedaladas” em busca de aplausos do público Discordo Discordo plenamente

Fonte: os autores (2019)

Quadro 3 Comparação entre os questionários respondidos pela professora Marina antes e após o estudo 

Atitude analisada Questionário antes do estudo Questionário após o estudo
O mais importante no futebol é fazer gols e não como eles são feitos Discordo Discordo Plenamente
É normal tentar desestabilizar um jogador temperamental da equipe adversária Concordo Discordo Plenamente
O treinador deveria proibir seus jogadores de realizarem faltas “duras” nos jogos Concordo Concordo Plenamente
Um jogador, ao perceber que cometeu uma falta que o árbitro não viu, deve continuar jogando normalmente como se nada tivesse acontecido Indiferente Discordo Plenamente
Em qualquer categoria, jogar por diversão deveria ser o objetivo principal Discordo Concordo
Mesmo depois de uma equipe ter realizado todas as substituições possíveis, deveria ser permitido a alteração de um jogador que venha a se machucar Discordo Concordo plenamente
Admitir que uma equipe faça “cera” para garantir a vitória Concordo Discordo plenamente
Admitir que o jogador “cave” um pênalti para confundir a arbitragem Discordo Discordo plenamente
No futebol, jogar por diversão é o que mais importa Discordo Concordo plenamente
É aceitável que se jogue de forma "dura" desde que o adversário jogue assim Discordo Discordo plenamente
Dá para admitir que um jogador de linha use a mão se não der para alcançar a bola com o pé ou com a cabeça Discordo Discordo plenamente
É aceitável que um jogador questione a decisão do árbitro Concordo Discordo
O mais importante em um campeonato é ser o primeiro na tabela de classificação Discordo Discordo plenamente

Fonte: os autores (2019)

Analisando os questionários respondidos por Ana e Marina, é possível identificar uma alteração nas compreensões das professoras com relação ao fair play no futebol. A título de exemplo, nota-se nas respostas à afirmação “um jogador, ao perceber que cometeu uma falta que o árbitro não viu, deve continuar jogando normalmente como se nada tivesse acontecido”, que ambas se mostraram indiferentes à situação no questionário inicial. No entanto, no segundo optaram pela resposta discordo plenamente.

O mesmo pode ser observado em outra afirmação: “mesmo depois de uma equipe ter realizado todas as substituições possíveis, deveria ser permitido a alteração de um jogador que venha a se machucar”. Pois, no primeiro questionário as professoras afirmaram discordar da afirmativa e no segundo marcaram concordo plenamente.

Acerca da terceira categoria, interpretamos que após o estudo as docentes compreenderam temas relacionados à competição esportiva e ao Sport Education:

“Parece que agora ficou mais claro, estou entendendo como desenvolver essa proposta”.

Pontualmente, reconheceram a importância da separação das equipes de modo equilibrado, conforme mencionaram:

“Essa foi a parte que eu mais gostei, porque eu tinha dificuldade nisso, me angustiava ver sempre os mesmos sendo escolhidos por último” (Prof. Ana); “Eu ainda não fiz isso na minha aula, mas estou louca pra fazer, acho que vai me dar um sentimento de alívio sabe, em saber que não vai ter aquele sentimento de ficar sempre por último” (Prof. Marina).

Antes de estudar os papéis sugeridos no Sport Education, a professora Marina comentou que essa proposta funcionaria apenas com o Ensino Fundamental, pois os alunos do Ensino Médio não se interessariam:

“A ideia é bacana, mas eu acho que só funcionaria no ensino fundamental, no médio eles não tem o mesmo entusiasmo”.

No entanto, após o estudo ela desenvolveu o Sport Education com uma turma e mudou seu entendimento. Relatou não ter sido difícil inserir os papéis e que os alunos se envolveram na proposta, o que surpreendeu positivamente a docente.

“Eles adoraram. Até as meninas que não participam quase das atividades se envolveram e na aula seguinte eles me pediram para fazer os papéis de novo”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Descrever as decorrências de um estudo colaborativo com docentes de Educação Física acerca do tratamento da competição esportiva na escola não é algo simples, uma vez que são inúmeros elementos a serem considerados para análise. Contudo, os achados nos levam a defender a possibilidade de mudança na concepção de ensino de professores, a partir do esforço empregado em pesquisas colaborativas.

Nesse sentido, foi possível identificar que as professoras não tinham conhecimento do Sport Education. No entanto, após as reuniões de estudos elas passaram a compreender o funcionamento dessa proposta, seus objetivos e a forma de organização. Para além disso, uma das docentes realizou a aplicação do Sport Education, surpreendendo-se com a aceitação dos alunos do Ensino Médio, ao contrário do que previa antes do estudo.

A mudança de percepção das educadoras ocorreu também em relação à abordagem da competição esportiva nas aulas de Educação Física, mais especificamente no que se refere ao fair play. Pois, antes do estudo as docentes demonstraram não ter conhecimento do amplo significado que envolve a expressão. Tampouco, reconheciam as atitudes esperadas em sua lógica. Entretanto, após as reflexões no grupo, passaram a perceber uma série de ações vinculadas aos aspectos atitudinais que podem ser contempladas quando se trabalhada a competição esportiva nas aulas de Educação Física.

Na mesma linha, a pesquisa-ação mostrou-se útil não somente para os docentes aprenderem sobre uma nova possibilidade de trabalho, mas também como uma experiência que pode potencializar o exercício de estudar e refletir coletivamente sobre sua própria prática. Assim, é preciso que a formação continuada invista fortemente em estudos colaborativos que possibilitem diálogos entre professores com distintos saberes e experiências.

REFERÊNCIAS

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PUBLISHER Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Educação Física. LaboMídia - Laboratório e Observatório da Mídia Esportiva. Publicado no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

1Trabalhamos com o conceito de esporte na perspectiva de González e Fraga (2009a, p. 62): “manifestação da cultura corporal de movimento, orientada pela comparação de um determinado desempenho entre indivíduos ou grupos (adversários); regida por um conjunto de regras institucionalizadas por organizações (associações, federações e confederações esportivas), as quais definem as normas de disputa e promovem o desenvolvimento da modalidade em todos os níveis de competição”.

2Temporada, Filiação, Cronograma, Registro do desempenho, Festividade e Evento culminante. Ver detalhes em González (2017).

3Para preservar as identidades das professoras seus nomes foram substituídos pelos nomes fictícios Ana e Marina. Cabe ressaltar que as docentes autorizaram a divulgação dos resultados da pesquisa mediante o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Recebido: 01 de Novembro de 2017; Aceito: 01 de Abril de 2018

EDITORES

Mauricio Roberto da Silva, Giovani de Lorenzi Pires, Rogério Santos Pereira.

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