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Motrivivência

versión On-line ISSN 2175-8042

Rev. Motriviv. vol.31 no.58 Florianópolis abr./jun 2019  Epub 11-Sep-2019

https://doi.org/10.5007/2175-8042.2019e56991 

Porta Aberta

Ética, autonomia e pensamento crítico nas aulas de Educação Física no ensino médio

Ethics, autonomy and critical thinking in the High School Physical Education classes

Ética, autonomía y pensamiento crítico en las clases de Educación Física en la Escuela Secundaria

Fabiana Celente Montiel1 
http://orcid.org/0000-0002-9921-6703

Mariângela da Rosa Afonso2 
http://orcid.org/0000-0002-8853-719X

Leontine Lima dos Santos3 
http://orcid.org/0000-0002-9686-2339

Patrícia da Rosa Louzada da Silva4 
http://orcid.org/0000-0002-0259-299X

1Doutoranda em Educação Física Instituto Federal de Educação - IFSul, Ciência e Tecnologia, Campus Pelotas, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. montielfabi@msn.com

2Doutora em Educação Universidade Federal de Pelotas - UFPel, Escola Superior de Educação Física, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. mrafonso.ufpel@gmail.com

3Mestre em Educação Física Universidade Federal de Pelotas - UFPel, Escola Superior de Educação Física, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. leozinhaesef@hotmail.com

4Mestre em Educação Física Universidade Federal de Pelotas, Escola Superior de Educação Física, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. patrícia_prls@hotmail.com


RESUMO

Os temas ética, autonomia e pensamento crítico em práticas de Educação Física (EF) no Ensino Médio (EM) necessitam maiores discussões no campo acadêmico, já que a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação prevê o desenvolvimento dessas temáticas como uma das finalidades desse nível de ensino. O objetivo do estudo foi mapear, em artigos de alguns periódicos nacionais da área, a produção do conhecimento sobre as práticas pedagógicas dos professores de EF. Foi realizado um estado de estado da arte em seis periódicos, a partir do descritor “ensino médio” no resumo; foram encontrados 93 artigos, sendo que 25 abordavam os temas em questão e apenas 9 tratavam de um ação, aplicação e/ou intervenção prática nas aulas de EF no EM. Portanto, faz-se necessário incorporar práticas pedagógicas a partir desses temas, com estratégias que valorizem a área, cumpram a legislação e contemplem uma formação integral e cidadã do educando.

PALAVRAS-CHAVE: Educação física; Ensino médio; Ética; Pensamento crítico; Autonomia

ABSTRACT

The issues of ethics, autonomy and critical thinking in Physical Education (PE) practices in High School (HS) require discussions in the academic field, since the current Law on Guidelines and Bases of Education foresees the development of these themes as one of the purposes of HS. This study objective was to map, in articles from national journals, the knowledge production about the PE teacher’s pedagogical practices. A state-of-the-art review was carried out in six journals, looking for the descriptor "high school" in the abstract. In this research, 93 articles were found, 25 dealing with these themes, and only 9 dealing with practical action, application and/or intervention in classes. Therefore, it is necessary to incorporate pedagogical practices based on these themes, with strategies that value the area, compassing the legislation and contemplating an integral and citizenly education of the student.

KEYWORDS: Physical education; High school; Ethic; Critical thinking; Autonomy

RESUMEN

Los temas ética, autonomía y pensamiento crítico, en las prácticas de Educación Física (EF) en la Escuela Secundaria (ES), requieren mayores discusiones en el ámbito académico, ya que la actual Ley de Directrices y Bases de la Educación prevé el desarrollo de estas temáticas como uno de los propósitos de la ES. El objetivo de este estudio fue mapear, en artículos de algunos periódicos nacionales, la producción de conocimiento sobre las prácticas pedagógicas de los docentes de EF. Se realizó un estado del arte en seis periódicos, a partir del descriptor "escuela secundaria" en el resumen, donde se encontraron 93 artículos, siendo que 25 abordaban los temas en cuestión, y 9 trataban de una acción, aplicación y/o intervención práctica. Por lo tanto es necesario incorporar prácticas educativas a partir de estos temas, con estrategias que valoren el área, cumplan la legislación y contemplen una formación integral y ciudadana del educando.

PALABRAS-CLAVE: Educación física; Escuela secundaria; Ética; Pensamiento crítico; Autonomía

INTRODUÇÃO

As reformas nas políticas educacionais, ocorridas ao longo do tempo no Brasil, têm produzido mudanças no que se refere à atuação docente, as quais têm se dado em decorrência das modificações curriculares dos cursos de formação de professores de Educação Física (EF) e também das alterações nas políticas educacionais para a Educação Básica, as quais influenciam diretamente a forma de atuação e desenvolvimento desse profissional (BRASIL, 1996; 2012; 2017).

A Educação Básica vem sendo discutida em seus diferentes níveis, sendo o Ensino Médio (EM) o que tem recebido as maiores críticas, bem como apontamentos para necessidades de mudanças. Esse fato pode ser percebido pela forma como se deu a reforma desse nível de ensino, instituída através de uma medida provisória, a atual Lei nº 13.415 (BRASIL, 2017). Entre outras determinações, esse dispositivo legal altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (BRASIL, 1996).

De acordo com a LDB (BRASIL, 1996), o EM é a etapa final da Educação Básica, que "tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores" (Artigo 22). O Artigo 35 da LDB (BRASIL, 1996) trata das finalidades deste nível de ensino, que são as seguintes:

  • I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

  • II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;

  • III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;

  • IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

Partindo do questionamento central de uma tese em desenvolvimento, a qual se propõe a compreender em que medida a EF, enquanto componente curricular, tem atendido às finalidades do EM dispostas na LDB (BRASIL, 1996), o presente artigo tem como objetivo realizar um estudo do tipo estado da arte, no sentido de mapear, em artigos de alguns periódicos nacionais da área, a produção do conhecimento sobre as práticas pedagógicas dos professores de EF que tinham como foco a promoção da ética, da autonomia e/ou do pensamento crítico, atendendo assim o que está disposto na LDB sobre este nível de ensino. A análise dessas três categorias tem como referência a teoria de Paulo Freire.

Acredita-se que uma prática pedagógica da EF pautada na humanidade, no diálogo e na criticidade favorece o desenvolvimento da ética, da autonomia e do pensamento crítico no âmbito escolar. Tais práticas pedagógicas trariam legitimidade para o campo da EF escolar, tendo em vista a constante desvalorização pela qual passa essa área (BETTI; ZULIANI, 2002; JARDIM et al., 2014).

Como destacam Jardim et al., (2014, p. 152), “a educação física perde sua centralidade na escola, sendo até mesmo descartada, sob a premissa utilitarista, que acaba por valorizar outras disciplinas, que são consideradas com enfoque de conteúdos cognitivos e interacionais”.

CAMINHOS METODOLÓGICOS

Este trabalho caracteriza-se como qualitativo do tipo descritivo e delineado por meio do estado da arte. As pesquisas do tipo estado da arte têm como objetivo, de acordo com Romanowski e Ens (2006, p. 39), “a sistematização da produção numa determinada área do conhecimento”. Para Ramos Vosgerau e Romanowski (2014), este tipo de pesquisa serve como uma referência para preencher lacunas de um determinado conhecimento.

Salienta-se que o foco de análise está centrado especificamente no que está descrito no inciso III do Artigo 35 da LBD (BRASIL, 1996), com aporte teórico em Freire (1996; 2011a; 2011b), que destaca a importância de conduzir as práticas pedagógicas com estímulo à autonomia e reflexão crítica do jovem. A escolha do referido autor decorre da perspectiva educativa que busca agregar à área de EF seus conceitos e discussões, indispensáveis à prática educativa.

Para este estudo de estado da arte realizou-se uma busca online, sem delimitação de período temporal, em algumas revistas nacionais da área 21 da CAPES, de extrato A2, B1 e B2 no WebQualis1, sendo elas: Movimento (UFRGS. Online); Revista Brasileira de Ciências do Esporte (Online) - RBCE; Revista Brasileira de Educação Física e Esporte - RBEFE; Revista da Educação Física (UEM. Online); Motrivivência (Florianópolis); e Pensar a Prática (Online).

A escolha desses periódicos se deu por sua abrangência e representação nacional, bem como por terem como característica a publicação de artigos numa perspectiva escolar, contemplando o amplo campo da EF. O quadro a seguir apresenta, de forma resumida, o foco e/ou escopo dos periódicos analisados2.

Mesmo considerando que existem outras revistas da área que se aproximam das discussões sobre a EF no EM, optou-se por trazer neste espaço, aquelas que sistematicamente trazem as discussões acima referidas.

Quadro 1 Escopo dos periódicos analisados 

Revista Escopo
Movimento (UFRGS. Online) - Extrato A2 Aborda temas relacionados ao campo da EF em interface com as Ciências Humanas e Sociais, em seus aspectos pedagógicos, históricos, políticos e culturais.
Revista Brasileira de Ciências do Esporte (Online) - Extrato B1 Publica pesquisas originais sobre os diferentes temas que compõem a área de EF/Ciências do Esporte. Divulga a diversidade e variedade teórica, metodológica, disciplinar e interdisciplinar das pesquisas nacionais e internacionais.
Revista Brasileira de Educação Física e Esporte - Extrato B1 Discute temáticas que contribuam para o avanço do conhecimento nas áreas de EF, Esporte e afins.
Revista da Educação Física (UEM. Online) - Extrato B1 Promove o debate teórico e prático visando contribuir para o desenvolvimento acadêmico da EF.
Motrivivência (Florianópolis) - Extrato B2 Apresenta a cultura corporal na sua interface com as ciências humanas e sociais, abordagens socioculturais, filosóficas e pedagógicas na EF e áreas afins.
Pensar a Prática (Online) - Extrato B2 Enfoca as questões referentes à cultura corporal e do movimento humano, proporcionando o debate do campo acadêmico e profissional da EF.

Fonte: Elaborado pelos autores (2017).

Após a delimitação dos periódicos a serem consultados, o caminho percorrido compreendeu duas fases: 1ª) estabelecimento de critérios para a busca e seleção de artigos; busca dos artigos em cada um dos periódicos; leitura dos títulos e resumos para seleção dos artigos; exclusão de artigos que não contemplassem os critérios estabelecidos; 2ª) leitura completa dos artigos selecionados na primeira fase; exclusão de artigos que não se relacionavam com a ação, intervenção e/ou prática pedagógica nas aulas de EF no EM.

Na primeira fase, que estabelecia os critérios para busca de artigos, foram selecionados artigos, nacionais ou não, que contemplassem o tema ética, autonomia e/ou pensamento crítico, trabalhados no ambiente escolar e em aulas regulares de EF no EM. O campo utilizado para a pesquisa na plataforma de dados das revistas foi o resumo, onde utilizou-se o descritor “ensino médio”. Conforme explicitado na Figura 1, a seguir, foram encontrados, inicialmente, um total de 93 artigos.

Após a leitura do título e do resumo dos mesmos, 68 artigos foram excluídos, porque apesar de tratarem, em sua grande maioria, do ambiente escolar e do EM, não contemplavam o tema em questão, estando relacionados, de forma geral, às seguintes temáticas: estudo do perfil dos professores; conteúdo e estruturação das aulas; currículo de EF com base nos Parâmetros Curriculares Nacionais; discussões referentes à análise da Base Nacional Comum Curricular; políticas públicas de EM; saúde, qualidade e projetos de vida a partir das aulas de EF; percepção, participação e dispensa nas aulas; saberes dos discentes referentes à EF; atividades realizadas no extraclasse e pesquisas bibliográficas.

A segunda fase foi realizada a partir da leitura completa dos 25 artigos selecionados na primeira fase. Nessa etapa, foi possível verificar aqueles que contemplavam, em sua essência, uma ação, intervenção e/ou prática nas aulas de EF no EM. Então, 16 artigos foram excluídos, por não tratarem de uma pesquisa a partir de uma intervenção ou por não estarem investigando a prática pedagógica de professores de EF. Os mesmos apresentavam discussões, de forma geral, acerca de propostas de trabalhos pedagógicos, conteúdos e finalidade das aulas, políticas educacionais, exclusão de alunos na aula de EF, currículo e estrutura de aula, legitimação da EF no espaço escolar, narrativa dos alunos, possibilidades e desafios da EF.

Restaram desta segunda análise apenas nove artigos, os quais compõem o presente estudo de estado da arte. Os mesmos foram analisados de forma detalhada, buscando seu objetivo, metodologia e principais resultados, relacionando com as temáticas, ética, autonomia e pensamento crítico, categorias de análise propostas para esse estudo.

A figura a seguir apresenta o fluxograma dos artigos encontrados e analisados em cada uma das fases propostas.

Fonte: Elaborada pelos autores (2017).

Figura 1 Fluxograma dos artigos encontrados 

A fim de garantir qualidade e validade metodológica, a busca dos artigos em cada um dos periódicos foi realizada por dois pesquisadores, no segundo semestre de 2017. Por tratar-se de pesquisa realizada exclusivamente em periódicos online, de acesso livre e público, a mesma não foi submetida ao Comitê de Ética, tampouco previu assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido.

RESULTADOS

Os achados referentes a cada um dos periódicos analisados podem ser visualizados na tabela a seguir, a qual representa o quantitativo encontrado e incluído para análise final.

Tabela 1 Relação de artigos encontrados e incluídos nos periódicos 

Nome da Revista de forma abreviada Nº de artigos encontrados Nº de artigos incluídos na 1ª análise Nº de artigos incluídos após leitura completa
Movimento 28 6 3
RBCE 1 0 0
RBEFE 2 0 0
Revista da EF 21 4 0
Motrivivência 19 8 3
Pensar a Prática 22 7 3
Total de Artigos 93 25 9

Fonte: Dados coletados pelos autores (2017).

Foi encontrado um número reduzido de publicações, mesmo sem a delimitação de um período específico para a busca dos artigos. Salienta-se que na RBCE e RBEFE, apenas três artigos foram encontrados a partir do descritor “ensino médio”, mesmo os periódicos apresentando em seu foco e/ou escopo a possibilidade de veicular pesquisas sobre os diferentes temas da EF, contemplando a diversidade de conhecimento dessa área.

O Quadro 2 apresenta a relação dos nove artigos encontrados, que atendiam aos critérios estabelecidos para esta investigação, os quais vinculam-se à temática “ética, autonomia e pensamento crítico” e que possuíam relação com a prática pedagógica dos professores de EF no EM.

Quadro 2 Sistematização dos artigos selecionados 

Revista Titulo Autores / Ano
Movimento A Educação Física no Ensino Médio - período noturno: um estudo participante OLIVEIRA, Amauri Aparecido Bássoli de. 2000
Implantação de uma proposta de sistematização e desenvolvimento da Educação Física do Ensino Médio KRAVCHYCHYN, Cláudio; OLIVEIRA, Amauri Aparecido Bássoli; CARDOSO, Sônia Maria Vicente. 2008
Desarrollo de valores y actitudes a través de la clase de Educación Física CORTES, Didier F. Gaviria; OLIVA, Francisco J. Castejón. 2016
Motrivivência Tematizando o discurso da mídia sobre saúde com alunos do Ensino Médio SILVA, Angélica Caetano da. 2011
Construindo diálogos entre a mídia-educação e a Educação Física: uma experiência na escola CHAVES, Paula Nunes et al. 2015
Contribuição da Educação Física para o Ensino Médio: estudo a partir da prática docente de professores de Institutos Federais METZNER, Andreia Cristina et al. 2017
Pensar a Prática A dança na perspectiva crítico-emancipatória: uma experiência no contexto do Ensino Médio KLEINUBING, Neusa et al. 2012
Dois pra lá e dois pra cá: as possibilidades da dança de salão nas aulas de Educação Física no Ensino Médio CIN, Jamile Dal; KLEINUBING, Neusa Dendena. 2015
Da ação pedagógica à mudança da prática docente: os jogos e as brincadeiras em uma experiência com o Ensino Médio SOUZA, Vânia de Fátima Matias et al. 2017

Fonte: Dados coletados pelos autores (2017).

Os temas, ética, autonomia e pensamento crítico não aparecem de forma direta em muitos artigos, porém é possível identificá-los ao longo da leitura. O tema “ética” está presente em dois artigos, relacionado a valores e atitudes. Já o tema autonomia aparece em três estudos, sinalizando a importância da participação dos jovens nas escolhas e decisões na aula de EF. Por fim, o pensamento crítico foi o que mais apareceu nos artigos, muito relacionado ao significado do aprendizado que está sendo proposto aos alunos.

RESULTADOS

A discussão dos resultados está organizada segundo as três categorias elencadas para esse artigo. Inicia-se pelo tema “ética” já que este é o primeiro que aparece no inciso III do Artigo 35 da LDB (BRASIL, 1996), seguindo-se o tema autonomia e, por fim, o pensamento crítico. Em cada uma das análises buscou-se suporte nas obras de Freire, relacionando os achados com o pensamento do autor.

Categoria Ética

Para a análise dessa categoria, tomaram-se como base as aproximações de Freire em relação à ética, entendendo que as práticas analisadas nos artigos devem levar em consideração a formação moral do educando. Freire (1996) propõe uma ética universal do ser humano, indispensável à convivência humana, pautada na verdade e no conhecimento profundo dos conteúdos. Nessa categoria foram encontrados dois artigos que abordavam o tema ética na perspectiva mencionada, os quais estão listados no Quadro 2 (CIN; KLEINUBING, 2015; CORTES; OLIVA, 2016).

O primeiro estudo, realizado por Cin e Kleinubing (2015), apresenta uma intervenção realizada durante o estágio curricular obrigatório na disciplina de EF numa escola estadual no município de Chapecó, em Santa Catarina. O artigo teve como objetivo analisar as possibilidades de ensino e aprendizagem da dança no EM, já que as autoras identificaram “a dança de salão como conteúdo que oportuniza aos jovens um espaço/tempo de trocas e compartilhamentos de ‘seres’ e saberes, contribuindo para a formação de sujeitos que compreendem melhor a si mesmos e aos outros” (p. 805).

Na intervenção, caracterizada como uma pesquisa-ação, as autoras utilizaram como instrumento o plano de ação, com nove encontros, construído coletivamente com os alunos. O plano considerou as ideias e interesses dos participantes, além dos registros realizados no diário de campo, no qual eram anotados tanto os acontecimentos das intervenções quanto as falas pertinentes de cada um dos encontros, falas estas estimuladas durante espaço de tempo destinado à reflexão sobre o que foi vivenciado e aprendido. Para as autoras:

[...] ao dançar, o sujeito pode vivenciar uma nova forma de ser, construindo, pelos movimentos de dança, novas sensibilidades tanto em relação a si mesmo quanto aos outros. Também ao dançar, se mediados pelos entendimentos da educação estética, os sujeitos são capazes de realizar leituras diferenciadas do mundo, já que nesta perspectiva “as sensibilidades” são ampliadas: ver, ouvir, tocar e sentir o outro na dança nos impõe a necessidade de construção de outros referenciais, diferentes daqueles impostos pela mídia, por exemplo (CIN; KLEINUBING, 2015, p. 802).

A partir de Freire, é possível pensar uma educação ética, pautada no respeito e cuidado com o outro, práticas essas potencializadas a partir de propostas educativas que vinculem o sensível com o cognitivo e com o motor.

A pesquisa acima sinalizou a possibilidade de trabalhar com um conteúdo diferente dos tradicionais nas aulas de EF no EM, que são muito mais relacionados aos esportes do que aos outros conteúdos da cultura corporal. O conteúdo dança é uma oportunidade de trabalhar com atitudes de respeito a si e ao próximo, entendendo que cada indivíduo é um, com seus potenciais e limitações.

O artigo de Cortes e Oliva (2016) apresenta a observação realizada em um Instituto de Madrid, na Espanha, onde foi possível perceber o desenvolvimento de valores nas aulas de EF, considerando-se o potencial dessa disciplina para trabalhar todas as dimensões do ser humano. Na pesquisa, os autores utilizaram a observação participante das aulas e o grupo focal com os jovens, no qual faziam relações com as observações realizadas. De acordo com os autores, a partir desse delineamento, foi possível identificar os valores e atitudes potencializados pelas aulas de EF nos alunos, assim como as suas percepções, sentimentos e preocupações em relação a essas práticas.

Foram identificados como valores desenvolvidos nas aulas, a cooperação, o companheirismo, o conflito e a competição. A competição, nesse estudo, é vista ora de forma positiva, ora de forma negativa, já que por vezes pode gerar a exclusão, bem como provocar a agressividade nos alunos. Positivamente, o conflito gerado pela competição é visto como uma forma de fazer emergir e estimular o diálogo e as negociações no ambiente, mediados, na maioria das vezes, pelo professor. A aula de EF é considerada pelos jovens como um momento de relaxamento e desinibição, ao mesmo tempo em que ressaltam que esta é um mecanismo para formar atitudes para a vida adulta. Para os autores, as aulas de EF são “un espacio donde se pretende la formación integral del ser humano, se develan procesos de socialización y buenas relaciones entre los actores (estudiantes-profesor)” (p.260).

La EF debe ser algo más que simple actividad física, los medios con los que cuenta (juegos, ejercicios, danzas, deportes, actividades en el medio natural, la expresión corporal), son un potencial que van más allá del desarrollo de las condiciones físicas de las personas, sino que pueden afianzar el carácter; en este sentido, la EF considera las interrelaciones de las dimensiones del ser humano, haciendo un aporte a la formación integral de la persona (CORTES; OLIVA, 2016, p. 254).

Nesse artigo, é possível ver o potencial da EF para trabalhar com o tema ética. Freire (1996, p. 37) destaca que “o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do educando”, é preciso fazer com que os alunos reflitam criticamente sobre suas atitudes, de forma que o aprendizado e a vivência das aulas possam contribuir para um comportamento cidadão em suas vidas. Essa sinalização de Freire está de acordo com o disposto nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio - DCNEM (BRASIL, 2012, p. 195), em seu Artigo 6º, quando afirma que o currículo deve ser formado por “conhecimentos relevantes e pertinentes, permeados pelas relações sociais, articulando vivências e saberes dos estudantes e contribuindo para o desenvolvimento de suas identidades e condições cognitivas e sócio-afetivas”.

Acredita-se no potencial da EF para o desenvolvimento de aspectos relacionados à ética, aos valores morais e às atitudes dos jovens. Desta forma, no planejamento das aulas torna-se fundamental a previsão de estratégias que contemplem também objetivos atitudinais, através das diferentes práticas que cotidianamente já são realizadas nas aulas, muitas vezes sem o foco e intencionalidade para com a temática.

Categoria Autonomia

Compreende-se autonomia como “um processo de decisão e de humanização que vamos construindo historicamente, a partir de várias, inúmeras decisões que vamos tomando ao longo de nossa existência” (MACHADO, 2017 p. 53). Para Freire (1996), autonomia é um processo, um vir a ser, é a experiência da liberdade. Tendo como premissa essa compreensão de autonomia, nessa categoria foram analisados três artigos (OLIVEIRA, 2000; SOUZA et al., 2017; METZNER et al., 2017), os quais encontram-se relacionados no Quadro 2, apresentado anteriormente.

Oliveira (2000) apresenta a construção de uma proposta participativa para a disciplina de EF, junto com o pesquisador e discentes do segundo ano de EM do período noturno do Centro de Atenção Integral à Criança (CAIC) da Universidade Estadual de Maringá (UEM). O trabalho foi desenvolvido a partir do diagnóstico geral realizado pelo pesquisador através da observação de dez aulas e da realização de entrevista semiestruturada com o docente, os discentes das turmas e com a coordenação pedagógica da instituição de ensino.

Após a realização da intervenção, com duração de um semestre, que contemplou aulas teóricas e práticas sobre as temáticas sugeridas pelos discentes durante o processo de planejamento das ações e análise do discurso das entrevistas, o autor percebeu que os mesmos valorizaram o convívio grupal proposto no desenvolvimento do trabalho, destacando a integração e o respeito ao próximo. Ademais, deram destaque à possibilidade de compartilhar os trabalhos durante a Semana de Ciências do Esporte, na qual os grupos apresentaram suas produções relacionadas ao que foi discutido em sala de aula.

Ao avaliar a intervenção realizada, o docente da escola refletiu sobre a sua ação cotidiana, verificando, na prática, uma possibilidade de construir uma alternativa de estímulo e incentivo para trilhar novos caminhos com a EF escolar, a partir da adoção de procedimentos que viabilizem a utilização de estratégias participativas e de valorização aos conteúdos discutidos, aprendidos e compartilhados com a comunidade escolar. A proposta de EF desenvolvida no estudo em questão se baseou na metodologia de ensino aberto, possibilitando a existência da cogestão, fundamental para o sucesso da proposta. Para o autor,

[os] discentes tiveram a chance de opinar, criar, discutir, falar, criticar, sugerir novos enfoques e sentirem-se partes atuantes do todo. O envolvimento do docente (pesquisador) com os problemas dos grupos facilitou e integrou simbioticamente (sic) docente e discentes. Esse pacto de cumplicidade é importante ser firmado na ação docente que se diz participativa. Não o pacto da mediocridade, mas o pacto da ajuda mútua, da conquista, da busca por melhores condições, do ensino de qualidade, do respeito, da cooperação, da integração. Ao se conquistar esse pacto, os avanços interativos são evidentes e positivos (OLIVEIRA, 2000, p. 12).

Essa prática, desenvolvida e analisada no estudo de Oliveira (2000), mostra que utilizar estratégias participativas nas aulas de EF pode levar os alunos ao desenvolvimento de sua autonomia, pois os mesmos, de acordo com o próprio autor, tiveram oportunidade de opinar, criar, discutir e sugerir, sentindo-se parte do processo de ensino e aprendizagem. Freire (1996, p. 78) ressalta que o docente não pode negar o seu papel fundamental que é “contribuir positivamente para que o educando vá sendo o artífice de sua formação com a ajuda necessária do educador”.

O artigo de Souza et al. (2017) relata uma intervenção interdisciplinar que utilizou jogos e brincadeiras, no ensino de outras disciplinas, como função educativa, possibilitando aos jovens sua integração e inserção nas discussões dos conteúdos. O trabalho foi desenvolvido a partir de um grupo focal com os professores que atuam nas disciplinas de Educação Física, Biologia, Administração, Arte, Filosofia, História e Pedagogia do Ensino Médio e Ensino Médio Profissionalizante, e aplicação de questionário semiestruturado e rodas de conversa com os alunos, onde apontaram as mudanças no desenvolvimento dos conteúdos a partir dos jogos e brincadeiras.

O estudo demonstrou que houve manifestações positivas sobre a proposta, pois os jovens participaram ativamente da mesma, sentindo-se mais agentes no processo de ensino e aprendizagem. De acordo com as autoras, o trabalho com jogos e brincadeiras possibilita “o desenvolvimento da imaginação, estimulando a criatividade, facilitando o aprendizado por meio da interação com o outro, uma vez que passamos a incentivar o aluno a se tornar protagonista de sua ação” (SOUZA et al., 2017, p. 6). As autoras destacam a função educativa e lúdica do jogo, em que as ações desenvolvidas auxiliam o educando no autoconhecimento e na apreensão do mundo. Outro ponto ressaltado na pesquisa é o desejo dos alunos por aulas mais dinâmicas e interativas, onde seja possível a participação dos mesmos em todo o processo de ensino e aprendizagem.

Mais uma vez é possível verificar uma prática que possibilitou aos alunos o sentimento de serem, de fato, pertencentes ao processo educativo. Nessa prática, os estudantes foram ouvidos e participaram de forma mais ativa de toda a proposta, aproximando-se da pedagogia da autonomia que Freire (1996, p. 121) defende, como sendo a que “tem que estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade”.

Metzner et al. (2017) em seu estudo identificaram e analisaram elementos que contribuem para a consolidação da EF no EM Integrado, a partir de diários de aulas e registros de atividades coordenadas por professores de Institutos Federais, apresentando algumas experiências realizadas. Dentre as atividades apresentadas no artigo destaca-se a criação de jogos, em que o professor desafiou os jovens a reformularem jogos virtuais, previamente vivenciados no laboratório de informática, com a tarefa de contextualizá-los e adaptá-los a novas possibilidades de prática no mundo real. Após a experimentação dos mesmos, as discussões da turma incidiram sobre as semelhanças e diferenças entre os jogos virtuais e a experiência corporal vivenciada.

Em outra experiência pedagógica em destaque no mesmo artigo, os alunos vivenciaram nas aulas de EF práticas circenses e acrobacias de solo, com o objetivo de explorar os movimentos acrobáticos em grupo. A turma participante do estudo produziu uma coreografia em grupo, aplicando os movimentos vivenciados, favorecendo, como destacado pelos autores, a criatividade e autonomia dos estudantes, ao pensar, debater, superar adversidades e finalizar o desafio coreográfico.

Essas duas práticas pedagógicas apresentam a estratégia escolhida pelos professores de dar oportunidade de autonomia e criatividade aos alunos. Os mesmos tiveram oportunidade de tomada de decisões, sentindo-se, de acordo com os autores, pertencentes ao espaço de aula, contribuindo com a EF, com a escola e expandindo seus aprendizados para além do espaço escolar, ou seja, para suas vidas.

Destaca-se aqui a direta relação da autonomia com a criatividade, pois as práticas que desenvolveram a autonomia dos alunos também estimularam o processo de criação. Assim, percebe-se que é preciso buscar estratégias nas aulas que permitam despertar nos alunos a autonomia para a tomada de decisões, ao mesmo tempo para que tenham sentimento de pertencimento e capacidade de iniciativa, contribuindo, assim, com o processo de ensino e aprendizagem. Para Freire (2011a), em todo o indivíduo existe um ímpeto criador, que está ligado à sua inconclusão. Para o autor, somos seres em construção, somos seres de possibilidades. Freire (2011a, p. 41) destaca que é preciso dar “oportunidade para que os educandos sejam eles mesmos”, a partir de uma educação que não iniba o aluno e não o restrinja, mas sim, dê voz e vez aos alunos, estimulando a autonomia e a criatividade.

Para Betti e Zuliani (2002), o pensamento lógico e abstrato juntamente com a capacidade de análise e de crítica estão consolidados nessa faixa etária do EM. Portanto, uma intervenção mais complexa pode ser necessária para a formação de um cidadão capaz de “usufruir, de maneira plena e autônoma, a cultura corporal” (p. 76).

Quando alguém se propõe a trabalhar a EF para a autonomia dos alunos é preciso pensar, como bem alertam Araujo e Grumennvaldt (2017, p. 206), que “não é só discutir regra de jogo, contudo, entender porque que a regra existe e como pode ser modificada para atender interesses, bem como, proporcionar uma leitura do esporte numa perspectiva ampliada”. Pode-se dizer que com essa prática pedagógica os professores passam a “promover aprendizagens significativas e duradouras” (FREIRE, 1996, p. 110).

Categoria Pensamento Crítico

A última análise buscou aqueles artigos que apresentavam práticas pedagógicas desenvolvidas tendo como referência o pensamento crítico, compreendido aqui como a capacidade de pensar criticamente a realidade onde educador e educando estão inseridos, a fim de dialogar, refletir e transformar essa realidade (FREIRE, 1996). Foram identificados cinco artigos (elencados no Quadro 2 deste artigo) que tratavam dessa temática nas aulas de EF (CHAVES et al., 2015; KLEINUBING et al., 2012; KRAVCHYCHYN; OLIVEIRA; CARDOSO, 2008; METZNER et al., 2017; SILVA, 2011).

Kravchychyn, Oliveira e Cardoso (2008) relatam uma intervenção ocorrida numa escola particular de EM de Maringá, no Paraná, onde os alunos, mais do que apenas vivenciar as atividades, tiveram a oportunidade de opinar, criticar, sugerir e reivindicar no processo de sistematização dos conteúdos da EF, comprometendo-se com o processo ensino e aprendizagem.

Um dos instrumentos de pesquisa utilizados foram entrevistas semiestruturadas com a diretora, a coordenadora pedagógica e o docente da disciplina de EF. Já os discentes do EM responderam a um questionário. Com a análise da coleta de dados foi possível, de acordo com os autores, evidenciar uma realidade de aulas do EM voltadas ao conhecimento das regras e prática de esportes.

Como passos seguintes, a pesquisa adotou uma metodologia de ensino histórico-crítica - baseada na realidade do aluno, construção de um novo currículo de EF que atendesse a proposta do processo, planejamento e aplicação das unidades e aulas. Após a intervenção, as aulas se transformaram e passaram a abordar e problematizar conteúdos diretamente relacionados à realidade e interesse dos alunos, tais como nutrição, musculação, emagrecimento, entre outros.

De acordo com os autores, a possibilidade de opinar, os acordos firmados com o professor, o estímulo à cooparticipação e os conhecimentos adquiridos promoveram uma maior conscientização crítica dos alunos e, sobretudo, o reconhecimento da ação educativa como caminho para transformar a vida das pessoas. Assim, “todos os alunos declararam que vão utilizar ou que já estão utilizando os conhecimentos gerados pelos conteúdos estudados” (Kravchychyn, Oliveira e Cardoso, 2008, p. 55).

Para Freire (2011a), é urgente o desenvolvimento da consciência crítica dos indivíduos, para que possam transformar suas realidades. As práticas pedagógicas devem promover, a todo instante, a reflexão crítica do aluno, o refletir a partir da sua prática para compreender e, aí sim, modificar o meio em que está inserido. Para isso são necessárias práticas que contextualizem o que está sendo abordado, para assim dar significado ao aprendizado e tornar possível o transcender para o dia-a-dia dos alunos.

A intervenção realizada por Silva (2011) com alunos do EM se deu através da mídia-educação. A proposta foi que os alunos refletissem sobre o discurso midiático a respeito de saúde e atividade física, percebendo-se e reconhecendo-se como sujeitos pertencentes a uma cultura, a qual podem reconstruir criticamente. Para a coleta de dados a pesquisadora utilizou diário de campo, filmagens de algumas das intervenções realizadas, textos e produções midiáticas que foram utilizadas como tarefas para os alunos, além de entrevistas em grupos.

De acordo com a autora a pesquisa realizada proporcionou a análise da relação teoria e prática, restando evidente a concepção dos alunos em relação à EF, representada enquanto “prática coisificada, resistindo à necessária abstração e adotando comportamentos que meramente reproduzem as manifestações culturais” (SILVA, 2011, p. 119). A autora destaca a necessidade de trabalhar com os conteúdos midiáticos no ambiente escolar, ressaltando que a intenção da intervenção foi “possibilitar ao aluno, a partir deste componente curricular escolar, refletir, se perceber, se reconhecer enquanto sujeito pertencente a uma cultura e saber-se capaz também de reconstruí-la criticamente, a partir dos discursos midiáticos vigentes que se relacionam com o campo da Educação Física” (SILVA, 2011, p. 121).

Mais uma vez, fica evidente a necessidade de, a todo momento, fazer com que o aluno compreenda que ele é sujeito do processo de ensino e aprendizagem, como já anunciado anteriormente. Para Freire (2011a), é preciso negar a educação bancária, que vê os alunos apenas como um depósito de conhecimentos. É preciso compreender, de acordo com o autor, que a vocação do homem é criar e transformar o mundo, ou seja, na escola o aluno deve ser sujeito de sua ação.

O artigo de Kleinubing et al. (2012) apresenta uma proposta de ensino da dança para o EM, com base na abordagem crítico-emancipatória, utilizando como estratégias discussões a respeito de como a dança pode se constituir num espaço de expressão e comunicação de ideias e sentimentos, e também num espaço de oportunidade de escolha e decisão, seguido de problematizações mediadas pelo professor, o qual estimulou a reflexão sobre os motivos e percepções que levaram à escolha.

Os autores sinalizam, como um dos resultados, que aprender elementos básicos da dança - estabelecidos a partir das relações com os saberes construídos e suas experiências vividas, assim como tematizá-los a partir do universo juvenil - possibilitou aos envolvidos discutir e refletir acerca da dança no contexto escolar, além de evidenciarem que

[e]star abertos aos questionamentos e comentários dos estudantes favoreceu a criação de uma atmosfera de segurança com relação àquilo no que estávamos trabalhando. Aprender elementos básicos da dança possibilitou aos envolvidos discutir e refletir acerca desse fenômeno no contexto escolar e não escolar, bem como ampliou a ideia sobre a própria dança, pensando-a para além da simples execução de passos (KLEINUBING et al., 2012, p. 724).

Ademais, os autores reiteram a importância do trabalho desenvolvido, pois a dança “na perspectiva crítico-emancipatória permite assumir o compromisso de olharmos para o universo juvenil e articularmos os conteúdos e objetivos da EF, a fim de que essa prática possa se tornar mais significativa para os jovens” (KLEINUBING et al., 2012, p. 724).

Freire (2011b) defende uma educação problematizadora, diferente da educação bancária, uma educação que problematize “a relação do homem com o mundo” (p.94). Isso intensifica a importância de trabalhar nas aulas de EF conteúdos que tenham significados para a vida dos jovens, ainda mais quando se trabalha com adolescentes, que estão a todo instante em constante interação com meios de comunicação, com as mídias, cuja informação chega rapidamente, mas nem sempre com uma abordagem crítica.

Chaves et al. (2015) também apresenta uma intervenção realizada, através da mídia-educação, propondo esse trabalho a partir de momentos pedagógicos, levando os alunos a uma constante reflexão sobre a realidade midiática. A pesquisa foi realizada numa escola estadual de Natal, Rio Grande do Norte, onde foram desenvolvidos encontros, embasados na mídia-educação, para refletir sobre o tema “corpo belo e seus padrões estabelecidos pela mídia”, dentro do bloco de conteúdos “conhecimento sobre o corpo”.

Os autores destacam como resultados positivos a apropriação do conteúdo “conhecimento sobre o corpo” nas aulas de EF, assim como a produção midiática dos alunos, que proporcionou uma discussão crítica. É ressaltada, assim como no trabalho de Silva (2011) “a relevância de se apropriar da mídia-educação para fomentar as discussões no campo da Educação Física escolar e usá-la para além da perspectiva instrumental, contribuindo assim no processo de reflexão crítica dos alunos e na desmistificação dos estereótipos corporais” (CHAVES et al., 2015, p. 161), destacando essa como uma nova possibilidade para a EF na escola.

O último artigo analisado é o de Metzner et al. (2017), o qual apresenta uma experiência relacionada ao desenvolvimento da criticidade dos educandos. No seu estudo, uma das estratégias para identificar quais aspectos pedagógicos eram valorizados pelos discentes foi a realização de uma avaliação, por meio de questionário, no início e no final do ano letivo. Na avaliação inicial os discentes afirmaram perceber a disciplina EF como sendo voltada para aprendizados motores, esportivos ou de saúde. No entanto, na avaliação final valorizaram também a disciplina como promotora de um espaço de socialização e do pensamento crítico.

É fundamental que as disciplinas - neste caso específico, a EF - trabalhem com a criticidade dos jovens, refletindo sobre o ambiente escolar e a sociedade em que estão inseridos, para que, desta forma, como diz Freire (1996), consiga-se a transformação da realidade. Destaca-se que são inúmeras as possibilidades de desenvolver a criticidade dos alunos nas aulas de EF. Algumas foram sinalizadas nos artigos analisados no presente estudo, porém, estima-se que outras tantas estão presentes no cotidiano da EF escolar, que por diversos motivos não estão sistematizadas na forma de artigos científicos.

CONCLUSÕES

Os artigos analisados apresentam possibilidades pedagógicas de atividades, conteúdos, práticas e/ou intervenções para serem desenvolvidas nas aulas de EF no EM, as quais abordam os temas ética, autonomia e pensamento crítico. Tais possibilidades, embora possam não expressar de forma explícita o pensamento de Freire com relação às temáticas abordadas, estão tomadas dos ideais de uma educação emancipadora e transformadora, tal como proposta por Freire.

Dessa forma, faz-se necessário que os docentes de EF reflitam sobre e a partir de suas práticas, com o intuito de encontrar possibilidades para o desenvolvimento do aluno em todas as suas potencialidades, estimulando uma formação humana que tenha como base a reflexão crítica e contextualizada, a fim de conquistar uma transformação da realidade onde vivem.

A realização desse estado da arte sobre a temática em questão permite sinalizar que há um número reduzido de artigos que abordaram a ética, a autonomia e o pensamento crítico em práticas de EF no EM, revelando um distanciamento entre as demandas legais previstas na LDB (BRASIL, 1996) e as práticas pedagógicas dos professores de EF.

O atendimento dessa política educacional é considerado aqui urgente, já que o acolhimento a esta finalidade do EM, disposta no inciso III do Artigo 35, é uma das formas de garantir o desenvolvimento dos jovens enquanto pessoas humanas, tão necessário para a sua atuação na sociedade.

Ademais, os três temas - “ética, autonomia e pensamento crítico” - podem ser trabalhados de forma conjunta, potencializando a prática pedagógica para o aprimoramento do educando, no que diz respeito à formação para a cidadania. Dessa forma, percebe-se que o atendimento a um marco legal é uma das formas de legitimar o espaço da EF no ambiente escolar, como sinalizado do início desse artigo, um campo que vem sofrendo constante desvalorização, fato destacado por muitos dos artigos aqui analisados.

Por fim, destaca-se a importância do trabalho dos professores do EM, a partir desses temas, numa aproximação com a teoria de Freire (1996; 2011a; 2011b), por meio de estratégias pedagógicas que contemplem uma formação integral do educando, na busca de que este torne-se um indivíduo atuante na sociedade em que está inserido.

AGRADECIMENTOS

Não se aplica.

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1Disponível em: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/veiculoPublicacaoQualis/listaConsultaGeralPeriodicos.jsf

2As informações contidas no Quadro 1 foram obtidas a partir dos portais eletrônicos de cada periódico.

FINANCIAMENTO Não se aplica.

CONSENTIMENTO DE USO DE IMAGEM Não se aplica.

APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA Não se aplica.

PUBLISHER Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Educação Física. LaboMídia - Laboratório e Observatório da Mídia Esportiva. Publicado no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

Recebido: 10 de Maio de 2018; Aceito: 17 de Outubro de 2018

CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA

Não se aplica.

CONFLITO DE INTERESSES

Não se aplica.

EDITORES

Mauricio Roberto da Silva, Giovani de Lorenzi Pires, Rogério Santos Pereira.

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