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Motrivivência

versão On-line ISSN 2175-8042

Rev. Motriviv. vol.31 no.59 Florianópolis jul./set 2019  Epub 03-Dez-2019

https://doi.org/10.5007/2175-8042.2019e58147 

Artigo Original

Jogos e brincadeiras: o ensino mediado pelas tecnologias da informação e comunicação

Games and games: education mediated by information and comunication technologies

Juegos y juegos: la enseñanza mediada por las tecnologías de la información y la comunicación

Tiago Aparecido Nardon1 
http://orcid.org/0000-0002-7127-7715

Fernando Jaime González2 
http://orcid.org/0000-0002-7033-663X

1Mestre em Desenvolvimento Humano e Tecnologias Universidade Estadual Paulista - UNESP Departamento de Educação Física Rio Claro, São Paulo, Brasil nardont@gmail.com

2Doutor em Ciências do Movimento Humano Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ Departamento de Humanidades e Educação Ijuí, Rio Grande do Sul, Brasil fjg@unijui.edu.br


RESUMO

As Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) na educação se justificam na medida em que podem propiciar condições que potencializem as aprendizagens. Os estudos que embasam esta premissa estão majoritariamente direcionados ao final do Ensino Fundamental e Médio. Assim, este estudo objetivou verificar alterações no processo de ensino de conteúdos da Educação Física nos anos iniciais do Ensino Fundamental com o uso das TIC. Para isso foi implementada uma unidade didática sobre jogos populares e tradicionais para duas turmas do terceiro ano, onde para uma delas foram usadas as TIC e para a outra não. O registro das aulas foi feito por meio de diário de campo. Os resultados culminaram em quatro categorias de análise, sendo elas: a) organização do trabalho docente; b) limitações das TIC nas aulas; c) potencialidades das TIC nas aulas; d) as TIC no ensino da Educação Física na perspectiva do professor.

PALAVRAS-CHAVE: Educação física escolar; Anos iniciais do ensino fundamental; Tecnologias da informação e comunicação; Jogo

ABSTRACT

The Information and Communication Technologies (ICT) in education are justified to the extent that they can provide conditions that enhance learning. The studies that support this premise are mostly directed toward the end of Primary and Secondary Education. Thus, this study aimed to verify changes in the teaching process of Physical Education contents in the initial years of Elementary Education with the use of ICT. For this, a didactic unit was implemented on popular and traditional games for two classes of the third year, where one of them was used ICT and for the other it was not. Class registration was done through a field diary. The results culminated in four categories of analysis, being: a) organization of teaching work; b) limitations of ICT in class; c) the potential of ICT in class; d) ICT in the teaching of Physical Education from the perspective of the teacher.

KEYWORDS: School physical education; Early years of elementary school; Information and communication technologies; Game

RESUMEN

Las Tecnologías de Información y Comunicación (TIC) en la educación se justifican en la medida en que pueden propiciar condiciones que potencien los aprendizajes. Los estudios que fundamentan esta premisa están mayoritariamente dirigidos al final de la Enseñanza Fundamental y Medio. Así, este estudio objetivó verificar alteraciones en el proceso de enseñanza de contenidos de la Educación Física en los años iniciales de la Enseñanza Fundamental con el uso de las TIC. Para ello se implementó una unidad didáctica sobre juegos populares y tradicionales para dos grupos del tercer año, donde para una de ellas se utilizaron las TIC y para la otra no. El registro de las clases se hizo por medio de diario de campo. Los resultados culminaron en cuatro categorías de análisis, siendo ellas: a) organización del trabajo docente; b) limitaciones de las TIC en las clases; c) el potencial de las TIC en las clases; d) las TIC en la enseñanza de la Educación Física en la perspectiva del profesor.

PALABRAS-CLAVE: Educación física escolar; Años iniciales de la enseñanza fundamental; Tecnologías de la información y la comunicación; Juego

INTRODUÇÃO

A educação é alvo de inúmeros estudos, debates e reflexões que, em linhas gerais, caminham na direção de encontrar maneiras de aumentar a qualidade do trabalho docente e do processo de ensino-aprendizagem. Dentre as várias temáticas abordadas pelas pesquisas educacionais, o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC)1 como ferramentas educacionais tem sido pauta em muitos estudos. Considerando que as tecnologias estão presentes na vida dos estudantes, investigar como estes recursos podem influenciar a forma de elaboração do conhecimento destes jovens tem sido objeto de pesquisa. Vários estudiosos têm se ocupado em examinar e compreender a utilização das TIC no contexto escolar, bem como seu potencial pedagógico (SANCHO, 2006; BIANCHI; HATJE, 2007; KENSKI, 2010; ECHALAR; PEIXOTO, 2016; LIMA; NASCIMENTO, 2016; LUCENA, 2016), para citar alguns.

A inserção das tecnologias na educação tem como premissa potencializar as experiências de aprendizagem. O uso das TIC pode promover maior motivação para os estudos e aprendizagens, bem como a interação de ideias e conhecimentos (SANCHO, 2006; BIANCHI, 2008, BELLONI, 2012). Por outro lado, essa utilização em ambiente escolar enfrenta obstáculos como a falta de formação adequada dos professores para o uso de tais recursos, falta de metodologias que favoreçam as aprendizagens por meio das TIC e ausência de estrutura física apropriada nas escolas (SEBRIAM, 2009; CUNHA, 2014; FERREIRA, 2014).

No que se refere ao campo da Educação Física, estudos relacionados ao uso das TIC têm sido desenvolvidos. Estes sugerem que as tecnologias digitais são um importante recurso pedagógico para as aulas de Educação Física, uma vez que os estudantes (participantes destes estudos) julgaram as aulas mais significativas para a aprendizagem (CAMILO; BETTI, 2010; BARACHO; GRIPP; LIMA, 2012; DINIZ; RODRIGUES; DARIDO, 2012; FERREIRA, 2014).

Pensando na presença das TICs no espaço escolar, entende-se que ainda há uma carência de estudos relacionando o uso destes recursos às práticas pedagógicas, principalmente na Educação Física escolar. Com o intuito de averiguar quantitativamente o número de estudos acerca desta temática, realizamos uma busca em seis periódicos on-line classificados com os estratos mais elevados (A2, B1 e B2) pelo Qualis CAPES2 na área de Educação Física3. Para a busca dos artigos dentro de cada revista, foram consideradas as publicações entre 2007 e 2017. Os termos adotados para a busca foram: tecnologia, TIC, Educação Física, Educação Física escolar.

Após a leitura dos resumos constatou-se que quase a totalidade dos artigos encontrados referia-se ao uso das tecnologias para o treinamento desportivo, reabilitação para idosos, coleta de dados indicadores de doenças hipocinéticas, índices glicêmicos e dislipidemias, formação de professores. Aqueles que se vinculavam a Educação Física escolar estavam majoritariamente voltados às séries finais do Ensino Fundamental e Ensino Médio.

Assim, podemos salientar a escassez de estudos que se ocupam em discutir e/ou retratar experiências envolvendo TIC e Educação Física nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Deste modo o presente estudo teve por objetivo verificar possíveis alterações nos processos de ensino de conteúdos específicos da Educação Física nos anos iniciais do Ensino Fundamental quando incorporadas para seu ensino estratégias mediadas pelo uso das TIC.

MATERIAL E MÉTODOS

Participaram do estudo quarenta crianças com idades entre 8 e 9 anos, estudantes do terceiro ano do Ensino Fundamental, numa escola pública municipal da cidade de Porto Ferreira, interior do estado de São Paulo. Por conta de disponibilidade de horários na sala de vídeo e informática no turno matutino, as experiências envolvendo o uso das TIC foram implementadas com a turma desse período, (3° ano A). As experiências sem o uso das TIC foram implementadas com a turmas do turno vespertino (3° ano B).

Fundamentado nos pressupostos da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), optou-se pela tematização dos Jogos e brincadeiras, que em nosso entendimento, ao desenvolver um estudo com crianças com idades entre 8 e 9 anos, o jogo podia ser um conteúdo atrativo para a faixa etária.

Desta maneira, foi planejada e implementada uma unidade didática de ensino sobre brincadeiras e jogos populares e tradicionais para duas turmas de estudantes do terceiro ano do Ensino Fundamental, sendo que para uma delas (turma A) foram utilizadas TIC para seu ensino e a outra (turma B) não.

A unidade didática foi composta por doze aulas e teve como objetivos possibilitar que cada aluno, até o final da mesma fosse capaz de: a) reconhecer e saber como jogar os jogos populares da comunidade; b) identificar jogos de diferentes regiões do Brasil, compreendendo suas regras e funcionamento; c) diferenciar jogos populares de jogos tradicionais; d) compreender os jogos como construção histórica pertencente ao patrimônio cultural da humanidade.

O desenvolvimento das aulas sem TIC

As aulas aconteceram semanalmente nas segundas, quintas e sextas-feiras com a duração de cinquenta minutos. Para as duas turmas do terceiro ano foi planejada uma unidade didática para o ensino do conteúdo jogo, especificamente, em concordância com a Base Nacional Comum Curricular, brincadeiras e jogos populares e tradicionais.

Obedecendo uma sequência estabelecida, primeiramente foram apresentados aos estudantes os objetivos traçados para a unidade didática. Foram listados e, durante duas experimentados os jogos por eles conhecidos. Foi solicitado também que, juntamente com os familiares, deveriam pesquisar quais jogos estes costumavam jogar na infância. Os resultados foram igualmente listados e os jogos vivenciados nas duas aulas seguintes. Só então, num terceiro momento, os jogos característicos de cada região brasileira se tornaram tema das aulas.

Para tematizar os jogos regionais brasileiros e facilitar a compreensão dos alunos foram elaboradas apostilas impressas contendo aproximadamente quatro jogos de cada região. O objetivo era que a turma, dividida em grupos, escolhesse uma região e pesquisasse os jogos correspondentes a sua região na apostila e posteriormente os apresentasse aos demais colegas. Sobre suas experiências nas aulas as crianças produziram registros por meio de desenhos e pequenas produções de texto.

O desenvolvimento das aulas com TIC

As aulas também aconteceram semanalmente nas segundas, quintas e sextas-feiras com duração de cinquenta minutos. Seguiram a mesma sequência: jogos que os próprios alunos conheciam, jogos que os familiares jogavam e os jogos regionais brasileiros. No entanto foram pensadas estratégias com o uso das TIC que pudessem enriquecer as aprendizagens dos alunos. Importante salientar que antes do planejamento das unidades didáticas foi realizada uma investigação, por meio de questionário enviado às famílias, para averiguar a disponibilidade de recursos e internet por parte das crianças. Dos quarenta estudantes que participaram do estudo, apenas dois informaram não dispor de computador ou outro dispositivo com acesso à internet em casa. No que se refere ao Facebook, oito crianças não possuíam Vale ressaltar que, embora as famílias tenham recebido e assinado o termo de consentimento livre e esclarecido com todas as informações pertinentes ao estudo, foi realizada reunião com os pais e responsáveis para que esclarecer quaisquer dúvidas remanescentes e, principalmente, explicar em quais situações o Facebook e outros recursos seriam utilizados. Aos responsáveis pelos alunos que não possuíam acesso à rede social foi salientado que seria importante que criassem um perfil, contudo a escolha caberia às famílias e as crianças não seriam prejudicadas caso decidissem postergar o ingresso ao Facebook.

Inicialmente as informações acerca dos jogos conhecidos pelas crianças, a princípio seriam usadas para elaborar mapa conceitual com o auxílio da lousa digital. Durante o planejamento este equipamento estava em condições de ser utilizado. Contudo, na implementação das aulas o mesmo não estava funcionando adequadamente e necessitava manutenção. Assim optou-se por usar o quadro branco e confecção de cartazes.

Os computadores da sala de informática se encontravam também com problemas, o que inviabilizou ações de pesquisa na Internet. Assim, com o objetivo de compartilhar informações e estabelecer comunicação foi criado um grupo fechado no Facebook chamado Jogos Populares e Tradicionais, onde foi compartilhado o material da apostila impressa.

Apresentados os objetivos da unidade didática, os estudantes foram orientados a realizar a pesquisa com os familiares sobre os jogos que costumavam brincar na infância. Contudo, ao contrário da turma sem TIC, estes alunos deveriam apresentar estas informações por meio de um vídeo, elaborados por eles mesmos. Com a ajuda de smartphones e auxílio dos familiares as crianças produziram alguns vídeos contendo a explicação e demonstração de alguns dos jogos apontados pelos familiares. Os vídeos, depois de concluídos, foram compartilhados com os demais colegas por meio do grupo no Facebook. Importante destacar que as atividades que as atividades que requeriam o uso do Facebook foram organizadas em grupo, de modo que aqueles alunos que não tinham acesso à rede social também pudessem realizá-las.

Como já mencionado, o material da apostila impressa foi disponibilizado em formato digital. Postei no grupo imagens relacionadas aos jogos de cada região e, ao clicar sobre as mesmas, os alunos tinham acesso a descrição dos jogos na legenda da imagem. Foi organizada também uma videoconferência sobre os jogos da região Nordeste. Com a colaboração de um colega também professor, natural do estado do Ceará, e o recurso de vídeo chamada do Facebook, os alunos conversaram e fizeram perguntas sobre os jogos da região Nordeste.

Vale ainda destacar que foi realizado trabalho conjunto com a professora regente da turma. Nas aulas de Educação Física os jogos regionais foram tematizados e em sala de aula a professora explorou com os alunos, cada uma das regiões e suas características, costumes, comidas típicas e localização geográfica.

Importante salientar que por se tratar de uma pesquisa do tipo qualitativo, a captação dos dados foi realizada por meio de elaboração de diário de campo. Todos os acontecimentos, fatos e ocorrências foram nele registrados. De acordo com Bogdan e Biklen (1994), tal instrumento é composto por descrições que o pesquisador realiza sobre os sujeitos, lugares, acontecimentos, atividades desenvolvidas e diálogos. Soma-se a isso o registro de ideias, reflexões ou qualquer outro elemento que possa surgir durante o processo de observação. Em outras palavras, o diário de campo se refere ao registro escrito de tudo aquilo que o pesquisador vê, ouve e pensa durante a coleta de dados. Os dados obtidos foram analisados a partir do método de análise de conteúdo proposto por Bardin (2009). Tal método consiste em um conjunto de técnicas de análise que visa interpretar os dados obtidos. Deste modo, a partir da exploração dos registros, foram estabelecidas as categorias de análise de acordo com os temas (semânticas) presentes nos registros, seguindo os critérios de exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objetividade e fidelidade, e produtividade (BARDIN, 2009).

Assim foram estabelecidas cinco categorias de análise referentes ao uso das TIC nos anos iniciais do Ensino Fundamental: a) organização do trabalho docente; b) limitações das TIC nas aulas; c) potencialidades das TIC nas aulas; d) as TIC no ensino da Educação Física na perspectiva do professor; e) diferenças entre a turma sem TIC e a turma com TIC.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

a) Organização do trabalho docente

Esta categoria não está diretamente vinculada às alterações na dinâmica das aulas e ensino dos conteúdos, contudo, é parte importante para entender este processo. O primeiro movimento necessário à incorporação das TIC nas aulas foi a revisão e reformulação do plano de ensino do componente curricular. Posteriormente foram organizadas as unidades didáticas, estabelecendo objetivos específicos à cada uma delas e principalmente verificando quais recursos tecnológicos estavam à disposição e poderiam ser usados com o intuito de potencializar o processo de ensino da turma com TIC.

Em linhas gerais pode-se dizer que a organização das aulas exigiu pesquisas sobre jogos populares e tradicionais, bem como os jogos característicos de cada região brasileira. Essa pesquisa se materializou na confecção de apostilas impressas para a turma sem TIC. Para a turma com TIC o mesmo conteúdo foi disponibilizado em formato digital por meio da criação e utilização de grupo fechado no Facebook.

No que se refere ao uso das tecnologias, houve intensificação do trabalho docente, isto é, verificar, montar e testar tais recursos, exigiu horas extras de trabalho. Nesse sentido, ainda que alguns professores mencionem a facilitação e agilidade do trabalho, a agregação das TIC resultou no o aumento da carga de trabalho em virtude das alterações e planejamento que a incorporação destes recursos exige. Importante ressaltar que muitos professores não dispõem desse tempo extra em virtude das longas jornadas de trabalho a que são submetidos. Em última instância tal fato culmina na recusa destes em inserir as TIC nas aulas (OLIVEIRA, 2007; LEITE; RIBEIRO, 2012).

b) Limitações das TIC nas aulas

Se por um lado a incorporação das TIC nas aulas pode ser benéfica, por outro lado essa inserção enfrenta dificuldades e obstáculos (SEBRIAM, 2009; CHAMPAGNATTE; NUNES, 2011; CUNHA, 2014; LUCENA, 2016). Tais entraves também foram detectados neste estudo e merecem ser destacados.

Algumas estratégias planejadas envolviam pesquisas na Internet com o uso dos computadores e lousa digital. Contudo, no laboratório de informática da escola, apenas três computadores estavam em funcionamento. Como usá-los quando a turma era composta por vinte alunos? Sobre a lousa digital a situação não foi diferente. Estava inativa por falta de atualização e manutenção. Neste ponto um questionamento pode ser suscitado: levando em consideração o que aponta a literatura, por que isso não foi considerado no planejamento?

Estas questões foram consideradas. Antes de adotar as estratégias, o funcionamento dos equipamentos foi checado. Todos estavam em condições de serem usados. Dias antes do início do estudo houve nova conferência a fim de diminuir o risco de imprevistos. Entretanto, os equipamentos da escola são de uso coletivo e, nem sempre há o cuidado ou a preocupação com a utilização adequada destes. Lamentavelmente, durante o estudo de campo alguns recursos necessários não estavam em funcionamento.

Outra estratégia planejada consistia na utilização de smartphones para pesquisas na Internet e produção de vídeos nas aulas. O uso dos aparelhos foi vetado pela direção da escola sob a alegação de que a escola poderia enfrentar problemas com as famílias caso algum destes fosse danificado. Outra justificativa dizia respeito ao fato de que portar estes dispositivos poderia atrapalhar o andamento das aulas em sala. O fato da escola se preocupar muito mais com os problemas que com as possibilidades decorrentes do uso dos dispositivos foi certamente um complicador no processo. A esse respeito vale destacar que uma discussão democrática acerca de quando, onde e em que circunstâncias usar os smartphones no espaço escolar pode ser mais efetiva que normas restritivas. Antes de impedir que os estudantes tenham acesso a todo tipo de informação pelo aparelho, é necessário que se dê condições para que os alunos aprendam a navegar com consciência pela Internet (BATISTA; BARCELOS, 2013; NAGUMO, 2014).

c) Potencialidades das TIC nas aulas

A incorporação das TIC na educação está ancorada na premissa de que as mesmas podem propiciar condições que potencializem as aprendizagens dos estudantes. Muitos são os estudos que embasam essa ideia e justificam o uso dos dispositivos tecnológicos no contexto educacional (SANCHO, 2006; BIANCHI, 2008; BARACHO; LIMA; GRIPP, 2012; BELLONI, 2012; GARCIA; MALACARNE; TOLENTINO-NETO, 2013; CAMAS, 2014; LUCENA, 2016). Neste estudo podemos apontar algumas vantagens relativas ao emprego das TIC nas aulas de Educação Física.

Durante todo o estudo de campo buscamos utilizar tecnologias já conhecidas pelas crianças. O Facebook possibilitou a criação de grupo fechado onde foram compartilhados vídeos, imagens e informações acerca do conteúdo tematizado, tornando-se uma extensão das aulas.

O experimento com videoconferência e a produção de vídeos possibilitou o contato com outros jogos e costumes, além de permitir aos estudantes o uso de suas habilidades de comunicação ao dialogar sobre os jogos. Nesse contexto houve também a aproximação das famílias à vida escolar dos alunos por ocasião da elaboração dos vídeos. Estas são experiências de aprendizagem que não poderiam ser propiciadas sem o auxílio das tecnologias. A esse respeito Coll, Mauri e Onrubia (2010), afirmam que a combinação das tecnologias multimídia e Internet permite a criação de contextos propícios para a formação e o aprendizado, transformando cenários educacionais tradicionais, propiciando um papel mais ativo aos estudantes. Tradicionalmente, a escola promove atividades e estratégias que mantém os alunos numa postura passiva, de simples receptores de informações e conhecimento (COLL; MAURI; ORNUBIA, 2010).

Por meio da utilização das TIC e a disponibilização de material didático digital, foi possível delegar aos alunos um papel mais ativo no desenvolvimento do conteúdo proposto.

d) As TIC no ensino da Educação Física na perspectiva do professor

Neste momento considera-se válido ressaltar que o trabalho de campo configurou-se numa oportunidade de aprendizagem para estes pesquisadores. Ainda que as unidades didáticas tenham sido planejadas com minúcia, tentando prever todas as variáveis, houve erros e acertos. Algumas estratégias adotadas foram satisfatórias, enquanto outras deveriam ter sido melhor exploradas. Não se trata de negar os fracassos, mas de reconhecer as limitações deste estudo e compreender que a temática da incorporação das TIC nas aulas ainda apresenta lacunas que merecem ser discutidas.

Seguramente se tivéssemos a oportunidade replicar o estudo de campo, novas estratégias seriam adotadas e outras melhor utilizadas. Neste sentido, coincidimos com Camas (2014), quando afirma que apesar das tecnologias terem um papel importante no processo de ensino e aprendizagem, é o professor, de posse de metodologias adequadas, que possibilita experiências de maior ou menor impacto na transformação do ensino e na melhora da aprendizagem.

e) Diferenças entre a turma sem TIC e a turma com TIC.

O objetivo desta categoria é apontar os resultados que o estudo mostrou no que se refere às experiências de ensino com ambas as turmas, que possam ir além do relato das dificuldades em propor estratégias mediadas pelas tecnologias. Ambas as turmas tiveram acesso ao mesmo conteúdo de jogos e brincadeiras, entretanto alguns aspectos necessitam ser considerados.

Sobre as aulas das turmas a principal diferença se deu em relação à dinâmica delas, isto é, para a turma sem TIC as aulas não apresentaram grandes novidades além da rotina com a qual já estavam habituados (o que não significa que não tenha havido a preocupação com o conteúdo, metodologias e a condução da aula), enquanto que para a turma com TIC houve a novidade da introdução de recursos, como o Facebook e elaboração de vídeos, com os quais os estudantes não estavam tão habituados, pelo menos não com a finalidade pedagógica. Neste sentido podemos salientar que o uso das TIC contribuiu para um ensino contextualizado, menos tradicional, modificando as formas de interação entre professor e aluno (MORISSO; VARGAS; GONZÁLEZ, 2017).

Outra diferença está relacionada a duração da aula. Isto é, para a turma sem TIC o encontro presencial e as discussões sobre a temática terminavam ao final dos cinquenta minutos, enquanto que para a turma com TIC a aula continuava por meio das interações no grupo do Facebook. A esse respeito Diniz et al. (2012) apontam que o uso das tecnologias nas aulas de Educação Física pode prolongar o aprendizado dos estudantes para além do encontro presencial na escola, uma vez que a comunicação continua quando a aula termina.

Por último destacamos o protagonismo e motivação dos estudantes. A turma com TIC teve a oportunidade de produzir vídeos, participar de videoconferência, interagir na rede social, estratégias que deram condições para que as crianças pudessem participar de maneira mais ativa, mas principalmente de se mostrarem motivadas durante as aulas. De acordo com Ferreira e Darido (2014), o uso das tecnologias nas aulas promove um ensino contextualizado e motiva os alunos para a aprendizagem dos conteúdos escolares. A turma sem TIC, embora em contato com o mesmo conteúdo, não vivenciou as mesmas experiências e por conta disso nem sempre se mostrava tão motivada nas aulas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo nos permite dizer que a incorporação das TIC alterou significativamente a dinâmica das aulas e o ensino dos conteúdos de Educação Física para alunos das séries iniciais do Ensino Fundamental. Tais modificações se materializaram tanto na revisão e reestruturação do plano de ensino do componente curricular e adoção de estratégias de ensino que pudessem ser melhoradas com as tecnologias, quanto nas experiências dos próprios alunos, que por meio da TIC, tiveram um papel mais ativo neste processo, seja na realização dos temas de casa ou nas próprias aulas.

Em suma, a utilização das TIC de modo articulado com o plano e objetivos deste nível de ensino, expandiram as possibilidades de ensino e propiciaram experiências de aprendizagem aos alunos que dificilmente seriam exequíveis sem tal suporte. Também permitiram a aproximação entre aluno e família na realização dos temas de casa.

Vale destacar que também esbarramos em alguns obstáculos já apontados pela literatura, como a falta de manutenção e funcionamento dos recursos oferecidos pela escola, o que limitou as possibilidades de uso das TIC dos alunos nas aulas. Obviamente apenas a disponibilidade de recursos não é suficiente para garantir o uso efetivo de tais dispositivos, ou seja, há também a necessidade da adoção de metodologias de ensino adequadas, que permeadas pelas TIC, possam contribuir no processo de ensino dos conteúdos. O estudo também nos mostrou os desafios que professor e alunos precisam superar, mas também evidenciou aspectos positivos que decorrem da incorporação das TIC nas aulas e que se espera que possam motivar outros professores.

AGRADECIMENTOS

Não se aplica.

REFERÊNCIAS

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FINANCIAMENTO Não se aplica.

CONSENTIMENTO DE USO DE IMAGEM Não se aplica.

1As Tecnologias da Informação e comunicação podem ser definidas como um conjunto de equipamentos reais e virtuais, cujo principal objetivo é proporcionar e facilitar a comunicação e troca de informações entre as pessoas. Se fundamentam na linguagem oral, escrita, e a proveniente da fusão entre o som, imagem e movimento (KENSKI, 2010; BELLONI, 2012).

2O Qualis afere a qualidade dos artigos e de outros tipos de produção, a partir da análise da qualidade dos veículos de divulgação, ou seja, periódicos científicos (texto extraído de: http://www.capes.gov.br/avaliacao/qualis).

3Revista Movimento (UFRGS), Motriz (Unesp), Revista Brasileira de Ciências do Esporte (CBCE), Revista Brasileira de Educação Física e Esporte (USP), Revista Pensar a Prática (UFG) e Revista Motrivivência (UFSC).

APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA Cabe salientar que diante das especificidades do presente estudo, o mesmo foi encaminhado para apreciação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP-IB-UNESP) via Plataforma Brasil, obtendo aprovação sob o número 1.779.104.

PUBLISHER Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Educação Física. LaboMídia - Laboratório e Observatório da Mídia Esportiva. Publicado no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

Recebido: 11 de Julho de 2018; Aceito: 08 de Janeiro de 2019

CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA

Não se aplica.

CONFLITO DE INTERESSES

Salientamos que não houve conflito de interesses de nenhuma natureza nessa pesquisa.

EDITORES

Mauricio Roberto da Silva, Giovani de Lorenzi Pires, Rogério Santos Pereira.

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