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Motrivivência

versión On-line ISSN 2175-8042

Rev. Motriviv. vol.32 no.62 Florianópolis abr./jun 2020  Epub 01-Mayo-2020

https://doi.org/10.5007/2175-8042.2020.e67312 

Artigo Original

Educação Física escolar e inclusão: um estudo de caso no Brasil sob a óptica do modelo bioecológico

School Physical Education and inclusion: a case study in Brazil from the perspective of the bioecological model

Educación Física e inclusión escolar: un estudio de caso en Brasil desde la perspectiva del modelo bioecológico

Mariselma Oliveira dos Santos1 
http://orcid.org/0000-0001-9060-0541

Camila Lopes de Carvalho2 
http://orcid.org/0000-0001-8770-6062

Paulo Ferreira de Araújo2 
http://orcid.org/0000-0001-7805-578X

Marina Brasiliano Salerno1 
http://orcid.org/0000-0003-3736-4740

1Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS, Faculdade de Educação, Curso de Educação Física, Campo Grande, Mato Grosso do Sul, Brasil

2Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Faculdade de Educação Física, Campinas, São Paulo, Brasil.


RESUMO

A inclusão escolar de alunos com deficiência abarca múltiplas variáveis, personagens e contextos. Este estudo analisou a inclusão em aulas de Educação Física de uma escola regular do Mato Grosso do Sul, Brasil, a partir do modelo bioecológico. Desenvolveu-se um estudo de caso por observação de 15 aulas de Educação Física de uma turma do 3° ano do ensino fundamental que possuía uma aluna com deficiência. Para coleta de dados, utilizou-se o “Instrumento de avaliação da interação entre alunos com e sem deficiência na educação física escolar”, com dados apreciados por categorização. O sistema escolar tem se adaptado para atuar conjuntamente ao familiar e cultural, de forma consonante às promulgações políticas. Houve aspectos favoráveis ao processo inclusivo - interações positivas e participação ativa dos alunos -, entremeados por dificultadores - fragilidades arquitetônicas em relação à acessibilidade. A inclusão na Educação Física Escolar pode ser facilitada pela compreensão da complexidade dos aspectos abarcados.

PALAVRAS-CHAVE: Educação física e treinamento; Inclusão educacional; Modelo bioecológico

ABSTRACT

School inclusion of students with disabilities encompasses multiple variables, characters, and contexts. This study analyzed the inclusion in Physical Education classes of a regular state school in Mato Grosso do Sul, Brazil, from the bioecological model. A case study was developed through the observation of 15 Physical Education sessions of a 3rd grade elementary school, which had a student with disability. For data collection, we used the “Instrument to evaluate the interaction between students with and without disabilities in school physical education”, with data appreciated by categorization. The school system has been adapting to act in conjunction with the family and cultural systems, in line with the determinations of political promulgations. There were aspects favorable to the inclusion - positive interactions of students -, interspersed with difficult aspects - architectural weaknesses regarding accessibility. Inclusion in school physical education can be made easier by understanding the complexity of the multiple covered aspects.

KEYWORDS: Physical education and training; Educational inclusion; Bioecological model

RESUMEN

La inclusión escolar de estudiantes con discapacidades abarca variables, personajes y contextos. Este estudio analizó el inclusión en las clases de educación física de una escuela regular en Mato Grosso do Sul, Brasil, a partir del modelo bioecológico. Se desarrolló un estudio de caso a través de la observación de 15 clases de Educación Física de una escuela primaria de tercer grado, que tenía una estudiante con discapacidad. Para recopilación de datos, utilizamos el "Instrumento para evaluar la interacción entre estudiantes con y sin discapacidades en la educación física escolar", con los datos apreciados por categorización. Lo sistema escolar buscó adaptarse para actuar conjuntamente con el familiar y cultural, en línea con las determinaciones impuestas en promulgaciones políticas. Hubo aspectos favorables para el inclusión - interacciones positivas - intercalados con aspectos difíciles - debilidades en la accesibilidad arquitectónica. La inclusión escolar se puede realizar mediante la comprensión del aspectos cubiertos.

PALABRAS-CLAVE: Educación y entrenamiento físico; Propensión (educación); Modelo bioecológico

INTRODUÇÃO

O termo inclusão refere-se a um conjunto de ações direcionadas a garantir a participação de todos na sociedade com equidade, independentemente da classe social, da condição física, do gênero, ou da orientação sexual. Inclusão é o ato de aceitar o outro em sua plenitude, organizando e disponibilizando formas e atitudes para que esse indivíduo atue e seja respeitado em todas as suas capacidades (SILVA; SEABRA JUNIOR; ARAÚJO, 2008). Na perspectiva escolar, o processo inclusivo visa meios de abranger a todos no processo de escolarização, intencionando proporcionar a cada aluno condições de acesso e de permanência com participação efetiva na instituição em que está inserido (SEABRA JUNIOR, 2012).

As instituições de ensino escolarizantes são os principais locais em que as crianças iniciam o contato com pessoas diferentes daquelas do seu convívio familiar, principiando interações com grupos que podem apresentar entendimentos de mundo diversos e sem a supervisão direta dos pais (BRONFENBRENNER, 1995). No processo de educação da pessoa com deficiência, houve precedentes históricos que a distanciaram da sociedade e restringiram a sua interação e atuação com as demais pessoas durante a sua permanência nas instituições especializadas que se organizavam. Por condições de deficiência, a convivência permanecia restrita aos familiares e profissionais desses espaços (GLAT, 1989).

O caminhar inicial para a superação dessa conjuntura e da consequente inclusão dessa população no ensino regular foi possível devido a diversas influências de movimentos populacionais e político-internacionais que se atentaram aos direitos humanos de todos e instigaram a implantação de ações no Brasil em todo o contexto social e, por sequência, de medidas específicas para o cenário educacional (SILVA; SEABRA JUNIOR; ARAÚJO, 2008; CARVALHO; SALERNO; ARAÚJO, 2015). Ações legais passaram a garantir métodos, estruturas físicas e recursos materiais adaptados às demandas de cada aluno. Com a obrigatoriedade de todas as escolas de disponibilizarem condições para receber pessoas com deficiência, houve também a necessidade de preparação de profissionais da área da educação para orientarem esses novos alunos no seu trajeto educacional, revelando uma vez mais o papel fundamental do docente que atua diretamente com turmas inclusivas (SALERNO, 2014).

A Educação Física, enquanto um dos componentes curriculares da Educação Básica, necessitou se adequar às exigências vigentes. Segundo Silva (2005), ações governamentais e acadêmicas se direcionaram para assegurar ao aluno com deficiência a efetiva participação nas aulas de Educação Física, orientando os professores para que moldassem as suas práticas educativas segundo as necessidades de seu novo alunado. Assim, as discussões inclusivas incidiram sobre a área através da Resolução n° 03 de 1987 do Conselho Federal de Educação por meio da qual o tema “Educação Física Adaptada” passou a integrar oficialmente cursos superiores, associada à sequente implantação de programas de Pós-Graduação Nível Stricto Sensu na Educação Física com temas direcionados à pessoa com deficiência (SILVA; SEABRA JUNIOR; ARAÚJO, 2008).

O processo de inclusão escolar, por conseguinte, abarca múltiplas variáveis, personagens e contextos, que podem ser observados sob a óptica do modelo Ecológico do Desenvolvimento Humano, de Brofenbrenner, renomeado de modelo bioecológico. Esse modelo consiste de uma abordagem dialética que considera o desenvolvimento individual como possível de ser facilitado ou inibido por fatores intraindividuais ou extraindividuais, ponderando que o sujeito não pode se separar do contexto durante o seu desenvolvimento. Essa interação entre os indivíduos e seus contextos é influenciada por múltiplos fatores e auxilia na transformação de características pessoais, conduzindo a alterações nas formas de participação social.

Considerando os aspectos biopsicossociais do indivíduo, Brofenbrenner (1995) elencou que o desenvolvimento envolve quatro aspectos, sendo eles: o processo (abarcando as interações do indivíduo com as variáveis do seu contexto); as pessoas (conduzindo seus aspectos biológicos e genéticos nas interações a realizar); o ambiente (o contexto em que se encontra e que influencia o indivíduo); e o tempo. Em relação ao contexto, o indivíduo pode participar de ambientes denominados de exossistema, mesossistema, e microssistema, além de um quarto sistema que engloba os três anteriores, chamado de macrossistema (BRONFENBRENNER, 2002, p. 18-21):

Um microssistema é um padrão de atividades, papéis e relações interpessoais experenciados pela pessoa em desenvolvimento num dado ambiente com características físicas e materiais específicos.

O mesossistema inclui as interrelações entre dois ou mais ambientes nos quais a pessoa em desenvolvimento participa ativamente (tais como, para uma criança, as relações em casa, na escola e com amigos da vizinhança; para um adulto, as relações na família, no trabalho e na vida social.

O macrossistema se refere a consistências, na forma e conteúdo de sistemas de ordem inferior (micro-, meso- e exo-) que existem, ou poderiam existir, no nível da subcultura ou da cultura como um todo, juntamente com qualquer sistema de crença ou ideologia subjacente a essas consistências.

Exossistema [...] se refere a um ou mais ambientes que não envolvem a pessoa em desenvolvimento como um participante ativo, mas no qual ocorrem eventos que afetam, ou são afetados, por aquilo que acontece no ambiente contendo a pessoa em desenvolvimento.

Fonte: Elaborado pelos autores

Figura 1 Modelo Ecológico de Brofenbrenner 

A partir da perspectiva bioecológica, compreende-se que o processo de inclusão escolar abarca aspectos referentes ao processo de interações de um indivíduo com as variáveis de seu contexto, associando-se às pessoas, aos ambientes em que se encontram, e às suas relações ao longo do tempo. Imerso nesta multiplicidade de sistemas, para além da sua localidade direta, a efetivação do processo inclusivo nos variados cenários sociais, como a escola, mostrou-se complexa e entremeada por obstáculos e conflitos.

Nessa perspectiva, houve o movimento para que a formação docente fosse efetivada de modo a criar mecanismos para facilitar o processo de inclusão da população com deficiência no contexto estabelecido por esta pesquisa - a Educação Física Escolar. Entretanto, há a demanda de avaliação dessas ações como modo de verificar a sua eficácia (CARVALHO; SALERNO, SILVA; ARAÚJO, 2017), tendo em vista o relato constante sobre dificuldades docentes centradas na ausência de infraestrutura e materiais adequados. Essa percepção oscila positiva e negativamente em relação à auto-eficácia docente para trabalhar com esse público e uma formação inicial precária, apesar do relato frequente sobre a atitude positiva frente ao processo de inclusão (DURÁN MARTÍN; SANZ SERRANO, 2007; ÁVILA; TACHIBANA; VAINSBERG, 2008; BARRETO et. al., 2013; SANCHES JUNIOR; CARVALHO; SALERNO; ARAÚJO, 2015).

Isso posto, a presente pesquisa objetivou investigar o processo de inclusão de uma aluna com deficiência nas aulas de Educação Física Escolar em seus múltiplos aspectos, de forma respaldada pelo modelo bioecológico de Brofenbrenner.

MATERIAL E MÉTODOS

De acordo com o modelo bioecológico de Brofenbrenner (2002, p.06), o desenvolvimento dos indivíduos ocorre por meio de trocas, tanto entre os mesmos quanto destes em relação direta com os seus ambientes. Assim sendo, é significativo que uma pesquisa sobre a inclusão escolar considere e participe da dinâmica envolvida nesse processo:

Embora a literatura sobre a psicologia desenvolvimental faça freqüentes referências às díades como estruturas caracterizadas por relações recíprocas, nós veremos que, na prática, este princípio muitas vezes é desconsiderado. De acordo com o foco tradicional do procedimento de laboratório num único sujeito experimental, os dados costumam ser coletados acerca de uma pessoa por vez, por exemplo, ou em relação à mãe ou em relação à criança, mas raramente para as duas ao mesmo tempo. Nos poucos casos em que isso ocorre, o quadro emergente revela possibilidades novas e mais dinâmicas para ambas as partes. Por exemplo, a partir de dados diádicos parece que, se um dos membros do par passa por processo de desenvolvimento, o outro também passa.

Portanto, o presente estudo foi realizado em ambiente real em que as pessoas com deficiência participaram diretamente por meio da inserção ecológica. A inserção ecológica, segundo Cecconello e Koller (2003), é baseada no modelo bioecológico por meio da presença física do pesquisador no ambiente da pesquisa. Assim, foi realizada a inserção ecológica da pesquisadora no microssistema de uma sala de Educação Física Escolar, localizada no município de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul (MS), Brasil, observando os processos inclusivos estabelecidos nesse sistema. Para isso, realizou-se uma pesquisa de caráter qualitativo, especificada como estudo de caso, em que, com uma análise predominantemente descritiva e interpretativa, um grupo é delimitado dentro de um ambiente amplo para ter suas características investigadas, visando uma compreensão de dada realidade e sua ocorrência na sociedade (LUDKE; ANDRÉ, 1986).

Para início desta pesquisa, o projeto foi encaminhado à Secretaria de Educação do Estado de MS, a fim de se obter permissão para a sua realização. Concedida a autorização, uma escola em que alunos com deficiência estavam matriculados foi contatada. Concordante em participar do estudo, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi assinado. Essa investigação foi submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, e aprovada sob o parecer número 1.842.977.

A escola foi escolhida devido à presença de alunos com deficiência, além da facilidade de acesso dos pesquisadores. A escola investigada disponibilizava Ensino Fundamental I e II, dividindo-os em períodos matutino e vespertino. Nessa instituição, a equipe gestora sugeriu uma turma de alunos a ser acompanhada - o 3° ano do Ensino Fundamental I, que possuía uma aluna de 13 anos de idade com paralisia cerebral. A aluna dispunha do acompanhamento de uma professora de apoio durante o tempo de permanência na escola. Entretanto, a docente não permanecia nas aulas de Educação Física, sob justificativa de não carecer de auxílio para essa disciplina especificamente. Optou-se por esse recorte de uma turma para possibilitar a ampliação do período de observação e análise dos aspectos envolvendo o processo inclusivo. Nessa classe, duas aulas semanais de Educação Física foram acompanhadas, sendo que cada aula consistia em um período de 50 minutos, perfazendo, assim, o total de 15 aulas em observação.

Para a coleta de dados, foi utilizado o “Instrumento de avaliação da interação entre alunos com e sem deficiência na educação física escolar”, elaborado por Salerno, Araújo e Silva (SALERNO, 2009). Tal ficha foi elaborada de forma fundamentada no modelo bioecológico de Brofenbrenner. Ela é composta por cinco blocos temáticos de forma a ampliar as possibilidades de análise referentes ao processo inclusivo de um aluno com deficiência. Os blocos são:

  • • Identificação do aluno, incluindo itens como idade, condição de deficiência e tempo em que está na escola;

  • • Acessibilidade da escola, identificando elementos presentes ou ausentes na instituição observada (como corrimão nas escadas, obstáculos pelo caminho, rampas, piso regular e tátil, bebedouros adaptados, sinais sonoros e visuais, mesas e banheiros adaptados);

  • • O professor de Educação Física e suas atitudes frente ao aluno com deficiência (se elaborou atividades de que todos pudessem participar, ajudou fisicamente o aluno com deficiência, estimulou a cooperação e o diálogo, ouviu e aceitou a opinião dos alunos, infantilizou o aluno com deficiência, propôs atividades paralelas para o aluno com deficiência ou colocou o aluno com deficiência em posição de auxiliar);

  • • Atividades realizadas na aula observada (Dança, Luta, Esporte, Jogo, Ginástica, ou outras), refletindo sobre a didática empregada (competitiva ou cooperativa, com caráter de vivência ou treinamento, em grupo ou individual, com momentos de criação, uso de materiais adaptados, aulas livres, dirigidas, com texto ou pesquisas);

  • • Interação entre alunos com e sem deficiência, havendo um setor para interações iniciadas pelos alunos com deficiência (se participou das aulas ativa ou passivamente ou não participou, “aceitou” permanecer fora da atividade, fez outra atividade por conta própria ou como proposta do professor, expôs suas ideias, interagiu com seus colegas de forma positiva ou negativa, iniciou interação com seus colegas, respondeu às iniciativas de interação de seus colegas, pediu ajuda aos colegas ou ao professor para realizar a atividade, apresentou prontidão para participar da atividade) e outro para as interações iniciadas pelos alunos sem deficiência (se interagiram com o aluno com deficiência de forma positiva ou negativa, iniciaram interações com o colega com deficiência, responderam à iniciativa do colega com deficiência, infantilizaram o colega com deficiência, ofereceram ajuda ou ajudaram quando solicitada pelo colega com deficiência, fizeram a atividade pelo aluno com deficiência).

O preenchimento do instrumento ocorreu ao longo da aula, pela própria pesquisadora, e o foco se voltou ao processo inclusivo, considerando não apenas a aluna com deficiência, mas as variadas personagens e situações envolvidas que poderiam influenciar a prática. Para cada aula observada, uma ficha de observação foi preenchida, a partir das quais observou-se o delineamento dos conteúdos trabalhados e das atitudes presentes.

Para a apreciação dos dados, foi realizada a análise por categorização que, segundo Ludke e André (1986), refere-se à organização dos resultados obtidos por meio de categorias ou temas de análise. As categorias foram definidas como: acessibilidade (aspectos estruturais da escola); atuação docente (atitude frente ao aluno com deficiência e tratamento do conteúdo da Educação Física Escolar); e interação entre os alunos com e sem deficiência, delimitados a partir dos blocos temáticos indicados pelo instrumento de coleta utilizado.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O desenvolvimento humano se dá por processos de interações que ocorrem de forma regular ao longo de um período de tempo, permeados por tensões nas estruturas e nas relações entre as pessoas e o seu meio (BROFENBRENNER; EVANS, 2000). Alicerçado nessas concepções, infere-se que a inclusão escolar ocorreu por um processo de adaptação das mentalidades dos indivíduos e do ambiente que, aos poucos, considerou a possibilidade de participação social daqueles com condições consideradas diferenciadas. Essas adaptações incidiram sobre aspectos estruturais, de formação profissional, de definição de educação e de seu currículo, bem como na forma de interagir com as diversidades, que se delineiam nas categorias de acessibilidade, atuação docente e interação entre os alunos com e sem deficiência.

Acessibilidade

O termo acessibilidade diz respeito aos aspectos arquitetônicos, de conhecimento e atitudinais para garantir o acesso aos serviços, locais e direitos por meio de normas que objetivam harmonizar práticas de modo que as pessoas tenham a mesma expectativa em relação a um dado produto ou serviço. No caso da escola, é concernente às adequações para permitir a inserção, a permanência e o bem-estar das pessoas que utilizam o espaço (SILVA, 2005).

Em relação à acessibilidade arquitetônica, tais normas são constantemente estabelecidas em nível nacional e revisitadas para que possam ser atualizadas de acordo com as demandas sociais emergentes. Nesse exossistema - ambiente externo em que a pessoa a ser incluída não está diretamente localizada, mas que a influencia (BROFENBRENNER, 2002) -, normas e promulgações dispenderam-se, com atuação significativa da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), ao indicar as diretrizes de acessibilidade a serem seguidas dentro dos diversos espaços - entre eles, os escolares. Alicerçado nas diretrizes mencionadas, o Ministério de Educação e Cultura (MEC) definiu algumas condições essenciais para que o ambiente escolar fosse considerado acessível e inclusivo, requisitando o acesso e a participação autônoma de todos os alunos às suas dependências e atividades de formação:

Ambientes escolares inclusivos devem possibilitar não só o acesso físico, como permitir a participação nas diversas atividades escolares para todos - alunos, professores, familiares e também funcionários da escola. As características dos espaços escolares e do mobiliário podem aumentar as dificuldades para a realização de atividades, o que leva a situações de exclusão. Um simples degrau, por exemplo, impede o acesso à sala de aula para um aluno que utiliza cadeira de rodas. A colocação de uma rampa, com inclinação apropriada, elimina essa barreira física e permite o deslocamento desse aluno. A colocação, nessa rampa, de sinalização tátil, a fim de avisar o início e fim da rampa, permite, por sua vez, que um aluno cego se desloque com segurança (BRASIL, 2009, p.15).

Na instituição investigada por este estudo, constatou-se a existência de adaptações pontuais indicadas no instrumento de coleta de dados, a saber: rampas adequadas, bebedouros, balcões, mesas e banheiros adaptados. Observa-se que essas adequações visavam garantir o acesso de crianças e adolescentes com condição específica de deficiência física ou alunos com menor estatura. No tocante aos itens não encontrados, observou-se a ausência de corrimão nas escadas ou elevador, por se tratar de uma escola térrea; o piso mostrou-se irregular em diferentes espaços da escola, principalmente pela presença de árvores e suas raízes; não foram escutados sinais sonoros; e não havia piso tátil.

A escola detinha de adaptações que auxiliavam o atendimento acessível a condições específicas de deficiências - como a física -, não abrangendo as necessidades de todos os alunos. Tal indicador reflete uma tendência em efetuar as adaptações mais comumente utilizadas, com defasagem da instituição educacional e do sistema público em se empenharem na implantação de medidas de forma antecedente à chegada de alunos com as diversas possibilidades de comprometimento, ainda não se encontrando de todo acessíveis. Aproximando dois microssistemas imediatos, a retomada do estudo de Carvalho e Araújo (2018) torna-se pertinente. Investigando o contexto inclusivo por meio de um estudo de caso em uma escola do estado de São Paulo, no Brasil, os autores identificaram resultados similares, com a instituição apresentando corrimões nas escadas e banheiros adaptados como itens de acessibilidade, mas se ausentando dos demais necessários às outras condições de deficiência.

Pondera-se que a fragilidade estrutural não se restringe aos contextos locais específicos, mas ilustra uma ocorrência de fatores oriundos de um exossistema, em que ambientes onde o aluno não atua diretamente estabelecem decisões e ações que influenciam a sua realidade (BRONFENBRENNER, 2002). Elucidando essa reflexão, retoma-se que o estabelecimento de políticas inclusivas nacionais se deu recentemente, não havendo ainda tempo hábil para a adequação de todos os microssistemas em sua totalidade. Assim sendo, as adequações passam a se ocorrer de acordo com a demanda, ou seja, com a presença real de um aluno que apresenta uma demanda específica. Essas políticas advieram subsequentemente aos eventos mundiais em que foram sugeridas a valorização e a implantação de uma educação adequada para receber a todos com qualidade, independentemente das suas diferenças, como a Declaração de Salamanca, ratificada legalmente no Brasil somente na década de 1990 (BRASIL, 1994). Ademais, fatores concernentes a outros sistemas e aspectos podem ser associados a esse resultado, como o aspecto temporal de sucateamento histórico dos prédios escolares, e o macrossistema composto por lenta reconstrução cultural da valorização da diversidade, o que ocasionou uma desconsideração das necessidades dos grupos minoritários ao longo dos anos, entre outros.

Ainda que a fragilidade estrutural possa ter as suas raízes desveladas pela compreensão dos fatores acima mencionados, a sua manutenção não pode ser consentida. Para Aguiar e Duarte (2005), ao receber alunos com alguma condição de deficiência, a acessibilidade favorece o desenvolvimento de uma prática inclusiva. Contudo, em uma escola sem as estruturas necessárias, pode-se reforçar a exclusão. Observar esses elementos traz à tona aspectos pertencentes ao acesso e à permanência dos alunos com deficiência, já que não basta chegar à escola, mas se deve utilizar, com qualidade, os diversos espaços por ela oferecidos.

Para além dos quesitos arquitetônicos, Glat (2007) nos remete que a acessibilidade de um aluno também depende de como a escola promove meios para que se possa atingir seus objetivos educacionais, propiciando ao educando recursos didáticos apropriados, adequando o planejamento das aulas, com seus recursos, estratégias e materiais de forma compatível com as potencialidades e respeitando as necessidades de cada aluno. A esse respeito, Maciel (2000) corroborou ao argumentar que incluir crianças com deficiência não depende tão somente do fator estrutural da instituição. Acima de tudo, decorre de uma mudança de atitudes, compromissos e disposição dos envolvidos. Ao falar sobre a escola, a autora mencionou que o processo inclusivo resulta de três estruturas distintas: o ambiente de aprendizagem, a interação professor-aluno (abrangidos pela atuação docente), e a interação aluno-aluno.

Atuação docente

Durante o período observado, a turma contou predominantemente com a presença de uma mesma professora de Educação Física, efetiva do estado. Apenas uma aula foi ministrada por um profissional substituto, que foi bem recebido por todos, não havendo interferências na execução da aula. Tal fator é significativo para a qualidade a ser oferecida, posto que um docente permanente possui conhecimentos sobre seu alunado que facilitam o processo de elaboração de atividades e metodologias adequadas às necessidades de cada um.

Com relação às atitudes da docente acerca dos itens indicados pelo instrumento de coleta de dados, em todas as aulas a professora elaborou atividades de forma que todos participassem, incentivou a aluna com deficiência e estimulou a cooperação entre os partícipes da turma. A professora não infantilizou a aluna com deficiência, tampouco lhe propôs atividades paralelas ou a colocou em posição de auxiliar. A aluna não demonstrou necessidade e, portanto, não recebeu auxílio físico. Contudo, a professora não estimulou o diálogo e a reflexão sobre e durante as aulas, nem disponibilizou espaço para a exposição de opiniões dos alunos. Entendendo que a inclusão se refere não apenas a possibilitar a realização de uma atividade em específico, mas também em propiciar um meio acolhedor, o diálogo é indispensável para que possa haver a construção de conhecimento sobre as condições de deficiência, gerando respeito às individualidades. Afinal, conforme Duarte e Lima (2003), o conhecimento é o fator principal para a superação de preconceitos e a aceitação das diferenças.

Verifica-se que a atuação docente se encontra em transformação perante a nova realidade inclusiva. Tendo em vista que, segundo Brofenbrenner e Morris (1998), os processos proximais em que há interação entre as pessoas e os objetos e ambientes impulsionam seu desenvolvimento, a atuação docente aos poucos mostrou-se em reconstrução a partir das novas teorias elaboradas e das diferentes realidades educacionais vivenciadas. Essa transformação pareceu ocorrer de forma mais incisiva em relação a alguns itens analisados, como na elaboração de atividades permissivas da participação de todos, mas com discrição em tópicos como em relação aos conteúdos trabalhados pela docente, conforme exposto na Figura 2:

Fonte: Os próprios autores

Figura 2 Conteúdos trabalhados pela professora de Educação Física 

A prevalência do conteúdo Jogo sobre os demais ficou evidente. Sabendo que o estudo envolveu apenas um bimestre, essa poderia ser uma justificativa para a manutenção de uma única temática. Contudo, quando se recorre ao Referencial Curricular do Estado de Mato Grosso do Sul (BRASIL, 2012), averígua-se que, no período letivo em questão, o Jogo poderia compartilhar espaço com atividades atinentes à Luta, à Ginástica e ao Esporte durante as aulas. Em conformidade com esses resultados, o estudo de Silva e Silva (2015) atestou que no ensino fundamental, o Jogo tem se apresentado comumente como principal conteúdo explorado, mesmo havendo interesse dos alunos por outros temas, como a Luta e a Ginástica.

O que se nota é que o conteúdo Jogo, permeado pelo Esporte, manteve-se prevalecente nas aulas como consequência de fatores histórico-formativos e culturais. Para Darido et al. (2001), há uma grande hesitação do professor em promover atividades que não façam parte do tradicionalismo a que estão acostumados, dificultando aos alunos ter uma experimentação em todos os conteúdos da área. Formação precária ainda moldada nos temas esportivizadores de décadas passadas, falta de conhecimento dos professores para trabalhar com as diferentes temáticas e, até mesmo, exigência da própria escola em ofertar e privilegiar conteúdos com caráter de jogos esportivos podem contribuir com o estabelecimento desse cenário (CARVALHO; SALERNO; SILVA; ARAÚJO, 2017).

A importância do Jogo não deve ser negada, já que o mesmo se mostra como um elemento favorável à inclusão. Segundo Scaglia et al. (2013), esse conteúdo possui características mais flexíveis acerca das regras e de suas estruturas, possibilitando trabalhos com diferentes objetivos e facilitando a participação com êxito por todos. O que se contesta, neste momento, é a sua utilização como temática única da área, área esta ampla em suas possibilidades de conteúdos:

A Educação Física enquanto componente curricular da Educação básica deve ter então outra tarefa: introduzir e integrar o aluno na cultura corporal de movimento, formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir do jogo, do esporte, das atividades rítmicas e dança, das ginásticas e práticas de aptidão física, em benefício da qualidade da vida (BETIII; ZULIANI, 2002, p.75).

Esses entendimentos foram corroborados por Fiorini e Manzini (2016, p.57-58), ao declamarem que:

Apesar dessa variedade de possibilidades, a Educação Física Escolar ainda apresenta fortes traços da cultura competitivista e esportivizadora, que significa, entre outras coisas, enfatizar o mais forte, o mais rápido, o mais habilidoso. Em contrapartida, a Educação Física Escolar precisaria ser aquela que prima pelo universo das potencialidades de todos os alunos.

Para o estímulo às potencialidades individuais, para além dos conteúdos, as atividades ministradas em cada tema podem convergir em uma atuação facilitadora ou dificultadora dessa função. Logo, ilustrou-se na Figura 3 a forma de trabalho desempenhada pela professora durante a exploração dos conteúdos:

Fonte: Os próprios autores

Figura 3 Atividades desenvolvidas pela professora de Educação Física 

Em todas as aulas, o caráter da vivência predominou, sem enaltecer o aspecto competitivo. A vivência exprime-se como a experimentação e a exploração de um conteúdo sem a necessidade de rendimento específico, o que pode ser um elemento favorável à efetivação da inclusão do aluno com deficiência nas aulas. Flexibilizar regras pode estimular a participação não apenas de pessoas com essa condição, mas também daquelas que apresentam dificuldades permanentes ou transitórias dentro de determinada habilidade específica.

Ademais, 93,33% das atividades aconteceu em grupo, estimulando a socialização e a interação entre todos. Nesse momento, o estímulo ao diálogo e a inserção de momentos de reflexão entre todos - ausentes nessas aulas conforme mencionado anteriormente - contribuiria para que a docente mediasse a construção de conhecimentos sobre as diversidades e estabelecimento de interações positivas. Para Darido e Souza Junior (2007), através de incentivos verbais e atitudinais, o docente pode utilizar de sua influência para mostrar as potencialidades de cada aluno e a possibilidade de participação de todos com qualidade nas aulas.

O desenvolvimento de uma criança não é afetado apenas pelo seu ambiente local (microssistema), mas é dependente e influenciado por todos os demais sistemas nos quais está inserido (BROFENRENNER, 1995). Aspectos temporais de construção histórica da área da Educação Física enquanto ciência - multiplicando as suas possibilidades de conteúdo - e elementos de um exossistema de formação docente - com reconstrução recente do currículo acadêmico e de uma ainda presente fragilidade em capacitação dos futuros profissionais (SALERNO, 2014) -, dentre outros, reiteram a complexidade de relações estabelecidas entre diferentes aspectos e sistemas para transformar um cenário em prol dos ideais inclusivistas.

Interação entre os alunos com e sem deficiência

As interações dos alunos sem deficiência em direção à aluna com essa condição foram expostas na Figura 4, enquanto as iniciadas pela aluna com deficiência, na Figura 5:

Fonte: Os próprios autores

Figura 4 Atitudes dos alunos em relação à aluna com deficiência 

Fonte: Os próprios autores

Figura 5 Atitudes da aluna com deficiência 

Uma averiguação comparativa entre ambos os gráficos fornece a compreensão de que não houve atitudes que demonstrassem negações à inclusão. Ou seja, os alunos não tiveram interações negativas, ainda que esses aspectos pertençam ao mundo infantil em formas de disputas e de descobertas pessoais (CHAKON, 2003).

Os alunos também não realizaram as atividades pela aluna com deficiência, mas forneceram auxílio quando necessário, além de a terem estimulado a participar mais intensamente das atividades e torcerem por seus feitos. A receptividade da turma em direção à aluna com deficiência pode ter sido favorecida pelo fato da mesma estar presente na instituição há vários anos, o que propiciou o conhecimento e a aceitação dos alunos sobre a sua condição e o seu sentido de pertencimento, ainda que tal percepção seja pessoal e mutável (SPENCER-CAVALIERE; WATKINSON, 2010). Além disso, Doulkeridou et al.(2011) reiteraram que interações positivas em direção ao aluno com deficiência pode ser um reflexo das atitudes positivas de docentes e outros funcionários da escola em direção ao aluno, que os estimulam a acolher e facilitam sua compreensão sobre como interagir e respeitar as diferenças.

No que condiz à atuação da aluna com deficiência, ela buscou superar as dificuldades decorrentes da condição, mantendo-se ativa em todas as propostas, com participação constante e sem o aspecto passivo ou de auxiliar. A aluna se mostrou receptiva às interações desde que partissem de seus colegas, notando-se uma ausência de iniciativa própria em iniciar trocas de experiências com os demais. Houve também vísível necessidade de estímulo e mediação dos professores para contribuir com a construção de possibilidades de iniciativa da aluna com deficiência durante as interações.

Brofenbrenner e Morris (1998) afirmaram que cada pessoa se desenvolve e interage com os demais a partir de três aspectos: a disposição em estabelecer e manter uma interação, conhecimentos para iniciar e responder às interações, e as demandas que correspondem a estímulos que podem favorecer as interações ao atuarem como atrativos ou dificultá-las ao atuar como rejeitores. Nessa conjuntura, quando há enfoque direcionado às suas limitações, a pessoa com deficiência pode ser submetida aos estímulos de rejeição oriundos do desconhecimento de suas capacidades, o que atua como um recurso negativo ao estabelecimento de processos de interações. Por outro lado, a mediação docente transfigura-se como significativa para proporcionar a visualização das potencialidades desses alunos e tornar as diferenças um atrativo às relações, ao invés de rejeitoras.

Uma reflexão sobre esses dados conduz à compreensão da significância no que tange a formação docente para conduzir esse processo inclusivo, não apenas adaptando as atividades e recursos, mas também instruindo os alunos a conhecer e lidar com as diferenças, bem como auxiliando no desenvolvimento de autoconceito positivo do aluno com deficiência que impacta a sua iniciativa em estabelecer interações com os demais. Segundo o modelo bioecológico de Bronfrenbrenner (2002), para que se efetive uma interação entre duas pessoas, é fundamental a participação de uma terceira pessoa, que, se ausente ou atuante de forma negativa, pode interromper o desenvolvimento da díade, mas que, se positiva, pode motivar o desenvolvimento de ambos, culminando em alterações de conhecimento e de atitude duradouros.

Para se alcançar essa atuação, é importante que haja uma visão ampla dos professores em relação às especificidades de cada aluno, que eles visualizem a capacidade de aprendizado de cada educando, e que procurem exaltar as individualidades, ampliando suas perspectivas e fortalecendo sua confiança em si mesmo (MANTOAN, 2008). O docente necessita estimular o desenvolvimento de interações positivas, possibilitando que o aluno com deficiência se sinta aceito, reconhecido por suas capacidades de desempenhar um papel importante no grupo, que haja um senso de pertencimento ao seu grupo social, já que, segundo Maciel (2000), é a partir do momento quando o aluno passa a se sentir pertencente ao ambiente em que está inserido que o processo de inclusão se inicia.

Conforme exposto por Silva e Galuch (2009), os documentos legais estabeleceram os direitos inclusivos no ambiente educacional, mas a sua efetivação depende da construção de um contexto acolhedor e capacitado para atender às necessidades de cada aluno e estimular as trocas interpessoais de forma a favorecer a tolerância às diferenças. Alves e Duarte (2014) corroboram afirmando que a inclusão deve ser compreendida como uma experiência intrínseca, associada às interpretações, sentimentos, crenças e compreensões individuais que são delineadas por fatores como as interações sociais estabelecidas entre o aluno com deficiência e os demais durante as aulas. Com essa atuação, Omote (2018) afirmou que a escola, quando da presença de um aluno com deficiência entre os demais, possui significância na transformação da mentalidade das novas gerações, contribuindo com a construção de ambientes sociais mais inclusivos por meio do convívio entre as pessoas e suas diversidades.

Cônscios de que os contrastes em relação aos grupos sociais existem e são os próprios grupos que os criam, o novo e o diferente pode ser tratado com desconfiança, medo e até mesmo antipatia (AMARAL, 1994). Por isso, uma mediação docente torna-se indispensável para que a recusa inicial se transforme em aceitação, e a timidez e o receio da pessoa com deficiência, em segurança e valorização das suas potencialidades, uma vez que as interações escolares entre alunos com deficiência e os demais se refletirão nos demais contextos da sociedade (BATISTA; ENUMO, 2004).

CONCLUSÕES

Os dados apresentados fazem referência a um microssistema - uma escola do estado do MS, no Brasil - e não nos permitem generalizar descobertas. Entretanto, são um recurso eficaz para analisar elementos possíveis de ocorrência nos demais sistemas da sociedade. Os resultados evidenciaram um microssistema escolar se adaptando para atuar conjuntamente ao mesossistema familiar e ao macrossistema cultural, de forma consonante às determinações impostas ao exossistema das promulgações políticas.

Mais especificamente, notou-se a predominância de aspectos favoráveis ao estabelecimento do processo inclusivo, com interações positivas dos alunos durante as aulas e atuação docente direcionada a possibilitar a participação de todos durante as atividades sem infantilizar o aluno com deficiência. Por outro lado, aspectos dificultadores de inclusão foram notados em relação a questões de acessibilidade (com adequações pontuais direcionadas apenas à condição de deficiência física) e à atitude docente (como ao oferecer um trabalho desigual com os conteúdos da Educação Física, com espaço predominante ao Jogo, e negligenciar momentos de diálogo e reflexão entre os alunos, além da ausência de mediação docente para superar a dificuldade da iniciação de interações pela aluna com deficiência).

Constatou-se que a inclusão nas aulas de Educação Física escolar podem ser executáveis, desde que se tenha a compreensão da complexidade e dos múltiplos aspectos e sistemas que permeiam tal processo, o que requer investimento e comprometimento, não apenas por parte do professor, mas também por parte da comunidade escolar, dos agentes político-sociais e de todos os envolvidos no processo. Conscientes das limitações do estudo, os indicadores aqui identificados colaboram para potencializar discussões e se mostram relevantes quando se pretende avaliar um processo que apresenta diferentes vertentes de análise. Foi possível notar uma atual necessidade de investigação de aspectos específicos do processo inclusivo referentes a implantações de acessibilidade, à didática docente e ao estabelecimento de interações por iniciativa dos alunos com deficiência, bem como de ampliação das discussões a respeito da influência dos variados sistemas no processo inclusivo, segundo a perspectiva bioecológica de Brofenbrenner.

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CONFLITO DE INTERESSES Não se aplica.

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PUBLISHER Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Educação Física. LaboMídia - Laboratório e Observatório da Mídia Esportiva. Publicado no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade.

9EDITORES Mauricio Roberto da Silva, Giovani De Lorenzi Pires, Rogério Santos Pereira

Recebido: 30 de Agosto de 2019; Aceito: 10 de Março de 2020

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