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Motrivivência

versão On-line ISSN 2175-8042

Rev. Motriviv. vol.33 no.64 Florianópolis  2021  Epub 10-Set-2021

https://doi.org/10.5007/2175-8042.2021.e82681 

Artigo Original

Educação Física e Cinema: problematizando a figura do coach-teacher entre professores e professoras da rede pública da cidade do Rio Grande - RS

Physical Education and Cinema: problematizing the coach-teacher figure among the schoolteachers from Rio Grande - RS

Educación Física y Cine: problematizando la figura del coach-teacher entre profesores y profesoras de la red escolar pública de la ciudad de Rio Grande - RS

Charles da Costa Bandeira1 
http://orcid.org/0000-0002-4652-5510

Arisson Vinícius Landgraf Gonçalves2 
http://orcid.org/0000-0001-7635-7733

1Universidade Federal do Rio Grande, Ensino Básico, Rio Grande, RS, Brasil.

2Universidade Federal do Rio Grande, Instituto de Educação, Rio Grande, RS, Brasil.


RESUMO

O presente artigo objetiva descrever como duas produções cinematográficas norte-americanas são problematizadas por docentes de Educação Física atuantes nos anos finais do ensino fundamental na rede pública de Rio Grande - RS. Para isso, lançamos mão do método do grupo focal. Como disparador da discussão temática, foi utilizado material audiovisual produzido com fragmentos de obras cinematográficas Coach Carter e Remember The Titans, exibido para os participantes da pesquisa. A análise dos dados se deu através da Análise Textual Discursiva, possibilitando a criação de quatro categorias: 1) o professor de Educação Física brasileiro e a figura do coach-teacher; 2) esporte na escola; 3) potencialidade do cinema na Educação Física escolar; 4) o professor de Educação Física e seu papel social. Como resultado, observou-se a consolidação da compreensão do coach-teacher enquanto um agregado de características e atitudes pedagógicas e sociais exercidas no cotidiano dos participantes da pesquisa em sua atuação docente.

PALAVRAS-CHAVE: Educação Física escolar; Cinema; Esporte; Coach-teacher

ABSTRACT

This article aims to describe how North American cinematographic productions are problematized by Physical Education teachers from public schools located in Rio Grande city. Therefore, we performed the focus group method composed of teachers linked to the final years from elementary school. As a trigger for the thematic discussion, audiovisual material produced based fragments of Coach Carter and Remember the Titans, exhibited to the research group. Data analysis was carried out through the methodological tool of Discursive Textual Analysis: 1) the brazilian physical education teacher and coach-teacher’s figure; 2) sport at school; 3) cinema potential in physical education at school; 4) physical education teacher and his social role. The results point to the consolidation of the coach-teacher understanding as an aggregate of pedagogical and social characteristics and attitudes exercised in the daily lives of research participants in their teaching activities.

KEYWORDS: School physical education; Cinema; Sports; Coach-teacher

RESUMEN

El presente artículo objetiva describir como algunas producciones cinematográficas norteamericanas son problematizadas por profesores y profesoras de Educación Física que actúan en la red escolar pública del municipio de Rio Grande - RS. Para esto, acudimos al método de grupo focal, compuesto por docentes que actúan en los años finales de la educación primaria. Como disparador de la discusión temática, fue utilizado material audiovisual producido con fragmentos de las obras cinematográficas Coach Carter y Remember the Titans, exhibido a los participantes de la investigación. El análisis de los datos se dio a través de la herramienta metodológica del Análisis Textual del Discurso. Los datos producidos posibilitaron la creación de cuatro categorías: 1) el profesor de Educación Física brasileño y la figura del coach-teacher; 2) deporte en la escuela; 3) potencialidad del cine en la Educación Física escolar; 4) el profesor de Educación Física y su papel social. Los resultados apuntan a la consolidación de la comprensión coach-teacher como un agregado de características y actitudes pedagógicas y sociales ejercidas en la vida cotidiana de los participantes en sus actividades docentes.

PALABRAS-CLAVE: Educación física en la escuela; Cine; Deporte; Coach-teacher

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa possui como tema a relação entre Educação Física e Cinema. Em especial, toma-se aquelas produções vinculadas à cultura norte-americana com grande alcance global e que abordam o esporte em contexto escolar. Nesse sentido, destaca-se como problema de pesquisa a relação estabelecida entre a figura do coach-teacher1, enquanto personagem marcante neste tipo de produção cinematográfica, e suas supostas implicações na atuação docente em Educação Física no contexto escolar brasileiro, tendo em vista a seguinte pergunta: considerando o alcance de tais produções, quais efeitos se desdobram na constituição e atuação de professores de Educação Física brasileiros? Qual jogo de problematizações é provocado pelo encontro entre tais produções e um grupo de professores da rede pública de ensino em uma cidade do extremo sul brasileiro?

Logo, a pesquisa se justificou pela pertinência em dar visibilidade à potencialidade educativa do cinema, entendido como artefato cultural que aciona representações e produções de sentidos, por sua vez, transpostas para diferentes contextos sociais. Portanto, destaca-se a pertinência do exercício de estranhamento acerca da figura do coach-teacher, apropriado como um agregado de características, entre elas, a demarcação de certa indissociabilidade da composição/fusão professor-treinador. Fusão necessária de ser explorada, tendo em vista a Educação Física escolar como espaço predominante do desenvolvimento de práticas esportivas. Para Vago (1996, p.8) “o esporte é legitimado pela sociedade e é exatamente isso que garantiria legitimidade para o ensino de Educação Física na escola: ensinar esporte”. Esta afirmação leva a crer que “o esporte que penetra o espaço escolar é o esporte criado e praticado culturalmente na sociedade, com interesses diversos e conflituosos, certamente. Esse esporte é escolarizado e incorporado à cultura escolar” (Idem, p.11).

O cenário apresentado justifica a relevância de uma pesquisa que investe em pesquisar as relações estabelecidas entre o cinema e a construção social, pedagógico e cultural do professor de Educação Física. Assumido enquanto um instrumento de composição social, o cinema dialoga com todo indivíduo pertencente à sociedade que, por sua vez, exerce uma relação de troca e de enfrentamentos de significados entre o sujeito que é exposto a obra cinematográfica e os significados que a mesma carrega. Duarte (2002, p.56), diz que “o olhar do espectador nunca é neutro, nem vazio de significados” e também afirma que “o cinema tem a seu dispor infinitas possibilidades de produzir significados” (2002, p.33). Desta forma caracterizando um processo de construção coletiva de significações, cujos telespectadores possuem papel ativo na produção dos significados atribuídos às obras assistidas.

Com base no problema apresentado, o objetivo geral da pesquisa se firma em descrever como tais produções cinematográficas norte-americanas2 são problematizadas por professores e professoras de Educação Física brasileiros, especialmente, atuantes em escolas públicas do município do Rio Grande - RS. Como objetivos específicos, destaca-se: promover um espaço-tempo adequado à problematização do campo de significações e sentidos que a figura do Coach-teacheré capaz de despertar a um grupo de professores de Educação Física, atuantes na educação básica; provocar o posicionamento dos participantes acerca da predominância do esporte, enquanto conteúdo da Educação Física escolar, a partir de fragmentos de dois longas-metragens; explorar a potencialidade do cinema como experiência de produção de conhecimento.

Desse modo, é preciso destacar que a relação da sociedade brasileira com o cinema, possui como característica principal o consumo de obras cinematográficas Hollywoodianas. Através desses artefatos culturais o público brasileiro acaba consumindo muitos aspectos da cultura norte-americana, o que gera efeitos diretos nos contextos sociais do país. Em relação à Educação Física e ao cinema, é comum observar comportamentos, situações e atitudes as quais estão presentes nos filmes citados e no cotidiano escolar brasileiro. Dessa maneira, é possível observar aspectos culturais norte-americanos ligados à figura do coach-teacherpassíveis de aproximação ao contexto de atuação de professores e professoras no Brasil.

Por fim, para atingir os objetivos propostos, lançamos mão do grupo focal como ferramenta para produção de dados (GONDIN, 2003). Sua realização se deu a partir de duas obras cinematográficas norte-americanas tomadas como disparadores das discussões.

ESCOLHAS PROCEDIMENTAIS

Durante a realização da pesquisa foi utilizada duas etapas procedimentais para produção dos dados. Primeiro foi necessário definir mecanismos para a constituição de um espaço de discussão, o qual foi composto por professores e professoras de Educação Física, atuantes nos anos finais do ensino fundamental da rede pública municipal de Rio Grande - RS. Em um segundo momento foi realizado o processo de classificação e seleção dos filmes a serem exibidos.

Com a finalidade de estabelecer o espaço de discussão, foi preciso definir os métodos utilizados para a produção dos dados da pesquisa. Deste modo durante o processo da produção dos dados, foi utilizado o método do grupo focal com os professores da rede municipal de ensino. Nesta perspectiva, os critérios de inclusão para a formação do grupo participante da discussão foram: possuir formação superior em Educação Física; atuar na rede pública de ensino no município do Rio Grande - RS; ministrar aulas para os anos finais do ensino fundamental3. Por outro lado, os critérios de exclusão levaram em conta as seguintes categorias: professores e professoras dos anos iniciais atuantes no município; atuar apenas na rede estadual ou privada de ensino da cidade do Rio Grande - RS.

O grupo de participantes foi formalizado através de apresentação e aprovação do projeto de pesquisa na Secretaria de Município da Educação (SMED). Em seguida, ocorreu o chamamento para adesão no grupo, disparado via e-mail institucional pelo órgão municipal responsável. Logo, o grupo focal foi formado por cinco docentes, atendendo o número estimado pelos pesquisadores durante a construção do projeto de pesquisa, tendo em vista um grupo formado por no mínimo cinco e no máximo dez participantes. Dimensão idealizada para que dessa forma, atendesse os padrões pensados para a análise e discussão dos dados produzidos. O grupo foi composto por quatro professores e uma professora. Neste trabalho cada participante teve sua identidade preservada, sendo substituídas pelas seguintes siglas: AD, DM, HG, HP e RW. Ainda é preciso salientar que o registro aconteceu através da utilização de dois gravadores de voz e transcrição dos áudios.

Após a formação do grupo, a discussão temática foi promovida a partir da exibição de fragmentos de obras cinematográficas previamente selecionadas e editadas em formato de videoclipe. O material audiovisual foi utilizado como ponto de ancoragem temático, orientando as discussões do grupo focal. De acordo com Gondin (2003, p.152), “o uso dos grupos focais está relacionado com os pressupostos e premissas do pesquisador”. Desta forma, entende-se o grupo focal como:

[...] uma técnica de coleta de dados de pesquisa qualitativa de uso apropriado quando os fenômenos em estudos são complexos, de natureza social [...]. É utilizada quando necessária a compreensão de um contexto social do qual derivam significados atribuídos pelas pessoas e que representam elementos importantes para pesquisa (CUNHA; AMARAL; DANTAS, 2015. p.234).

Diante disso, o método citado em tela foi utilizado como ferramenta produtora de dados, ativando o campo de significações e sentidos que tornam a figura do coach-teacher passível de problematização entre professores e professoras de Educação Física brasileiros. O material fílmico foi composto por fragmentos de obras cinematográficas que atendiam a aspectos indispensáveis para o tema abordado. A escolha por tal procedimento se deu em consideração ao público-alvo trabalhar entre quarenta e sessenta horas semanais. Essa condição, priorizou o aproveitamento do tempo efetivo de realização do grupo, tendo em vista a disponibilidade dos participantes e tornando sua adesão o mais simples possível.

Desse modo, o processo de seleção dos filmes e produção dos fragmentos tomou como imprescindível a constatação de três elementos específicos:

1 - A presença do coach-teacher como protagonista da trama;

2 - A instituição escolar tomada como um delimitador do estudo em função do problema de pesquisa e os objetivos elencados;

3 - Classificação no ranking do Internet MovieDatabase (IMDb): o IMDb se caracteriza por ser um sítio de grande procura digital, onde é possível verificar, pesquisar e dar notas para os filmes assistidos. Tal instrumento foi escolhido em detrimento a outros indicadores, visto que se configura como veículo midiático que contém um elevado número de usuários. O IMDb conta atualmente com um giro de usuário mensal que supera os 250 milhões de perfis.

Posteriormente a definição dos critérios, a escolha dos filmes ocorreu através da utilização de listas cinematográficas, ranqueadas a partir das notas do IMDb. Produções que continham o esporte como elemento central em sua trama, e o ambiente escolar como cenário principal do enredo fílmico. O segundo passo consistiu em assistir as obras mais bem ranqueadas a partir do IMDb, observar quais delas apresentavam a figura do coach-teacher e estavam dentro do delimitador escolar. Com base nos filmes analisados foi definido que os fragmentos utilizados para a construção do material fílmico seriam retirados das seguintes obras: Coach Carter [Coach Carter - Treino Para a Vida] e Remember the Titans [Duelo de Titãs].

Em seguida, o processo de produção dos dados seguiu como metodologia a análise textual discursiva que segundo Moraes e Galiazzi (2006, p.118) “[...] é uma abordagem de análise de dados que transita entre duas formas consagradas de análise na pesquisa qualitativa que são a análise de conteúdo e a análise de discurso”. Nesse contexto, pode-se caracterizar a análise discursiva dos dados como:

[...] um processo que se inicia com uma unitarização em que os textos são separados em unidades de significado. Estas unidades por si mesmas podem gerar outros conjuntos de unidades oriundas da interlocução empírica, da interlocução teórica e das interpretações feitas pelo pesquisador. Neste movimento de interpretação do significado atribuído pelo autor exercita-se a apropriação das palavras de outras vozes para compreender melhor o texto. Depois da realização desta unitarização, que precisa ser feita com intensidade e profundidade, passa-se a fazer a articulação de significados semelhantes em um processo denominado de categorização. Neste processo reúnem-se as unidades de significado semelhantes, podendo gerar vários níveis de categorias de análise. A análise textual discursiva tem no exercício da escrita seu fundamento enquanto ferramenta mediadora na produção de significados e por isso, em processos recursivos, a análise se desloca do empírico para a abstração teórica, que só pode ser alcançada se o pesquisador fizer um movimento intenso de interpretação e produção de argumentos (MORAES; GALIAZZI, 2006, p.118).

É importante ressaltar que durante a produção dos dados, foi utilizado como material a discussão produzida juntamente com os professores no grupo focal. Entretanto o material cinematográfico não é apenas uma ferramenta disparadora da discussão, mas se configura como outro elemento utilizado para a materialização dos resultados da pesquisa.

O grupo focal foi realizado na Universidade Federal do Rio Grande, no Instituto de Educação, nas dependências do Centro Esportivo. O desenvolvimento desta pesquisa está balizado em seus princípios éticos na resolução 510/2016 a qual se refere às especificidades éticas relacionadas às pesquisas no âmbito das Ciências Humanas e Sociais, do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2016). Tal pesquisa foi aprovada, conforme parecer consubstanciado do CEP, número 3.694.731.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com o advento do mundo moderno, a tecnologia cada vez mais ocupa espaço no cotidiano social, uma vez que a sociedade está abarrotada de máquinas e aparelhos nos quais sistemas tecnológicos estão sempre presentes. A tecnologia mudou a maneira do indivíduo ver o mundo e, também, potencializou o modo como se conta histórias. O recente surgimento do cinema, tendo sua primeira exibição datada em 1895, contribuiu de maneira significativa com os métodos de se contar histórias e de se produzir conhecimentos.

Para Fabris (2008), é impossível quantificar a mudança que o cinema trouxe no modo de contar histórias e de produzir conhecimento:

Hoje, não podemos avaliar o quanto essa nova forma de contar histórias modificou a relação das pessoas com o conhecimento. Assistir a um filme no cinema, na televisão ou em DVD, por exemplo, são práticas incorporadas de tal modo ao cotidiano de muitas pessoas que parecem estar aí desde sempre. Porém, essas práticas foram apreendidas. Nas primeiras projeções, não dispúnhamos de legendas nem de som, apenas de imagens em movimento para contar as histórias. As reações da plateia eram as mais diversas - confusão, medo, curiosidade - diante desse novo conhecimento (p.118).

A arte cinematográfica por possuir imagens e sons é capaz de construir significados de uma maneira completa, visto que o decorrer de cada cena é capaz de despertar no telespectador inúmeros significados, de acordo com suas experiências, contexto social e oportunidades de vivenciar opções culturais durante a vida. A relação entre o texto do filme e as interpretações dos telespectadores, abrem-se para um universo múltiplo de possibilidades. São modos de endereçamento, aqui definidos como sistema ou evento de significação presentes em obras cinematográficas, que buscam direcionar cada obra para atingir um público consumidor específico, que se identifiquem com as personagens, suas crenças e estilo de vida. Para Ellsworth (2001), os modos de endereçamento se configuram como:

[...] um conceito que se refere a algo que está no texto do filme e que, então, age, de alguma forma, sobre seus espectadores imaginados ou reais, ou sobre ambos. Existe, depois, um momento, na lógica da teoria do cinema, em que os teóricos do cinema começam a ver o modo de endereçamento menos como algo que está em um filme e mais como um evento que ocorre em algum lugar entre o social e o individual. Aqui, o evento do endereçamento ocorre. num espaço que é social, psíquico, ou ambos, entre o texto do filme e os usos que o espectador faz dele (Idem, p.14).

Deste modo é possível observar que toda obra possui uma intencionalidade, assim como busca atingir uma relação entre o filme e os indivíduos que o assistem, sendo direcionadas em sua construção a um público específico, mesmo que o direcionamento não impeça que sujeitos fora dos padrões pensados para o público-alvo, se relacionem com o filme.

Ancorados nesse conceito, as discussões geradas no grupo focal foram categorizadas através da análise textual discursiva do seguinte modo: O professor de Educação Física brasileiro e a figura do coach-teacher; Esporte na escola; Potencialidade do cinema na Educação Física escolar: O professor de Educação Física e seu papel social.

Professor/a de educação física brasileiro e a figura do coach-teacher

O “coach-teacher” é uma designação presente neste estudo em referência às personagens que agrupam características passíveis de aproximação ou transposição ao contexto de atuação de professores e professoras de Educação Física em ambientes escolares brasileiros. A utilização da expressão “coach-teacher” é necessária, pois ancora uma noção de fusão entre a figura do professor e do treinador, exploradas por diversas produções norte-americanas. O que pode ser observado através da fala de HG:

Quando tu falou no cinema e o coach, eu fui procurar o que era coach. É uma pessoa que é específica pra te ajudar, te orientar e te treinar em alguma coisa. Eu acho que tem muita diferença para o professor. E aí fica bem claro que o professor é uma coisa e o coach é outra. O treinador é aquela coisa séria, quer só resultados, e a gente viu aí [material exibido] só professores que se envolveram com a vida dos alunos, que tentaram resolver os problemas. (HG professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

A fala do participante mostra a fusão entre a figura do treinador da equipe escolar com o que na realidade brasileira, se configura em diversos momentos como parte da atuação do professor da Educação Física escolar. Além disso, tal noção possibilita o estranhamento frente ao entendimento atribuído por diversos docentes às práticas realizadas em seu cotidiano de trabalho. Por vezes, sua atuação é resumida ao caráter predominantemente esportivo. A figura do professor acaba sendo esportivizada ao se vincular a um campo de sentido e significados, comumente, atribuídos a imagem do treinador de equipes competitivas no ambiente escolar. Ainda que alguns participantes do grupo não tenham realizado uma identificação imediata com o material exibido, foi possível perceber que no decorrer da conversa muitos relatos utilizados para ilustrar o dia a dia em suas escolas, eram contextualizados em situações decorrentes de suas participações em competições escolares.

Lá na escola mesmo, a gente tem horário de treinamento, então claro a gente tem que ir para os campeonatos (HG professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

Tem gente que gosta de treinar e não gosta de jogar. Tem aluno que treina, treina, treina, chega na hora do jogo e não quer jogar (RW professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

Deste modo as falas geradas pelo grupo aproximaram diretamente o cotidiano escolar dos professores riograndinos à área de trabalho das personagens protagonistas das obras cinematográficas exploradas. Portanto, foi possível observar que, embora os professores não se entendessem como treinadores de equipes escolares, o exercício proposto para o grupo, fundamentado no espelhamento entre a figura do coach-teacher e a atuação deles enquanto professores e professoras de Educação Física brasileiros, motivou o reconhecimento e os destaques de muitos elementos naturalizados em suas práticas diárias:

Eu consigo ver muita coisa do filme, o filme é de 2005, mas ele é atemporal. Pode passar daqui 10 anos, o que importa são as pessoas. No caso, nos Estados Unidos e aqui existe uma lógica muito parecida, principalmente em periferia. Por mais que os sistemas sejam diferentes, estamos falando de pessoas. A realidade do filme lembra muito a realidade que eu vivo lá na escola. (HP professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

Da mesma forma, através dos depoimentos dos docentes e de trechos retirados das obras cinematográficas, fica explícito que a figura do coach-teacher é vista como um ideal de atuação profissional. Uma vez que o personagem cinematográfico se caracteriza por criar um universo de significações que podem ser aproximadas do contexto vivenciado pelos participantes da pesquisa. Foi possível observar, além das similaridades elencadas acerca dos ambientes escolares como cenário de atuação, a utilização de abordagens pedagógica e a priorização do conteúdo considerado como um dos pilares da Educação Física, o esporte. É através do acontecimento esportivo que as personagens se constituem exemplos de inspiração, símbolos ligados às perspectivas de mudança na vida de cada discente que participa do contexto social em que atua o coach-teacher.

- Senhores eu trouxe contratos, se vocês assinarem e fizerem a parte de vocês, nós teremos sucesso.

- Recebo gratificação por assinar o contrato?

- Sim senhor! O senhor se torna um vencedor, porque se tem uma coisa que eu sei, as derrotas vão acabar agora. A partir de hoje vocês vão jogar como vencedores, agir como vencedores, e o que é mais importante, vão ser vencedores. Se ouvirem eaprenderem, vão vencer os jogos de basquete, e senhores, vencer aqui, é a chave para vencer lá fora. Esse contrato estabelece que terão que manter uma média de 5,75 pontos, terão que frequentar todas as aulas e vão ter que sentar na frente durante as aulas.” (Trecho retirado do filme Coach Carter- Treino Para a Vida.)

Além disso, verifica-se através da fala dos participantes que a figura do coach-teacher afeta, em alguma medida, a constituição do professor de Educação Física brasileiro, servindo em alguns casos de inspiração na formação docente. Como fica evidenciado no trecho a seguir:

Esse filme o Coach Carter- que eu até falei antes sem saber que era um dos filmes - é um filme que eu uso desde sempre, porque sou novo e faz pouco tempo que eu trabalho. Comecei trabalhando com Ensino Médio, então a primeira coisa que eu pensei, vou querer disciplina. Então eu sempre uso o Coach Carter como um quebra gelo, para eles se ligarem mais ou menos como eu vou agir com eles. (DM professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

Em diversos momentos as falas dos professores reforçam a ideia de que a Educação Física embora seja uma área que abrange inúmeros aspectos da cultura corporal, ainda é um espaço, sobretudo na escola, onde a área do conhecimento é predominante vinculada ao esporte. Visto que é possível observar que uma grande fatia de seus conteúdos, estão relacionadas às modalidades esportivas. Por sua vez, essa imagem estereotipada das aulas práticas, também, trouxe à tona em algumas falas a avaliação de que a Educação Física como componente curricular ainda ocupa um lugar diferenciado, por vezes até desqualificado, em relação as demais disciplinas do currículo.

Sabe que na reunião agora de entrega de notas... Acabou que muita gente ficou [reprovado] comigo, na prática são muito bons, participativos, mas não entregam trabalhos. Então a vice-diretora antes da entrega de notas, foi justificar para os pais, o alto número de reprovações na disciplina (AD professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

Por fim, constata-se na figura do coach-teachera preocupação com o desempenho escolar dos alunos e não apenas o foco no âmbito esportivo. Exemplificando, a partir do filme “Coach Carter”,observa-se através de algumas ações e falas do treinador Carter, a preocupação com a formação acadêmica e com o potencial dos alunos de sua equipe de basquete da escola. A exemplo disso, destaca-se frases como: “Esses alunos são alunos-atletas. ‘Alunos’ vem antes” e “não é difícil obter uma média 5,75”, além de preocupações relacionadas à frequência, empenho e participação dos discentes pertencentes ao time no âmbito escolar. As atitudes citadas das figuras cinematográficas possuem aproximações com os professores participantes da pesquisa que trabalham com equipes escolares, onde geralmente a participação dos alunos é vinculada ao comportamento social do estudante em sua rotina escolar.

Outra coisa que eu acho interessante que ele [Treinador Carter] falou, é o aluno atleta. É o que a gente convive com nossos alunos. Às vezes, quando a gente pede um boletim, eles ficam todos ofendidos, até porque geralmente... geralmente não, em alguns casos, os melhores na Educação Física são os mais “pestinhas”. (HG professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

-Aí que tá, às vezes eu me pergunto: o rendimento está baixo, vamos tirar ele do esporte? (AD professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

- Não é que [o esporte] vai salvar, porque às vezes a gente diz que o esporte salva, mas pelo menos dá alguns momentos de alegria. Talvez alguns momentos de cumprir regras, de resolver problemas, de estar inserido. (HG professor (a) da rede municipal de Rio Grande).

Deste modo, verifica-se que a cenário criado ao redor do coach-teacher se aproxima do contexto de trabalho dos professores participantes do grupo focal. Posto que a figura cinematográfica e o professor, dividem aspectos sociais, práticas profissionais que se assemelham, fazendo com que exista diversos pontos de aproximação entre a prática profissional na vida real e nas obras cinematográficas.

Esporte na escola

Diversas construções cinematográficas se utilizam de instituições e conceitos sociais como objetos de seus enredos, sejam como temática principal ou como elemento coadjuvante. Aspectos ligados à Educação Física são comumente observados em produções norte-americanas, uma vez que é possível observar distintas obras onde segmentos da cultura corporal ganham destaques na cinematografia, entre eles está o esporte.

Quanto à relação entre esporte e cinema, verifica-se uma variedade de obras cinematográficas que se caracterizam por estarem ligadas a modalidades esportivas individuais e coletivas. Nelas são apresentadas situações que de modo frequente apresentam o esporte como uma ferramenta capaz de agregar e transmitir valores, mudar comportamentos, transformar modos de vida, chegando a naturalizar seus aspectos educativos e salvacionistas.

[...] Eu tenho alunos também que chegaram recém no sexto ano e estão com 16 anos, vai ser a primeira vez que eles vão ter a oportunidade de sair da escola. Um exemplo dos jogos escolares, ele [aluno] chegou no sexto ano agora, vai ter a oportunidade de jogar na equipe da escola. Eu sempre o incentivei a passar, pois eu sei que ele tem muitos problemas, e esse guri passou e agora está lá no grupo. Ele é uma referência sabe, ele está sempre lá na volta, sempre ajudando. E é uma das coisas que deslumbrou ele a passar de ano, de sair da tarde para ir para a manhã, para poder participar das equipes da escola. (RW professor (a) da rede municipal de Rio Grande)

No excerto, o professor RW narra o caso de alguns de seus alunos em que a naturalização do esporte como ferramenta educativa se torna evidente. Ainda que no momento inicial da discussão, tenha-se registrado pela fala de HG a compreensão de total distinção entre as figuras “Coach” e “Teacher”, observa-se por meio da descrição de algumas de suas vivências, uma atuação contrária. Se uma das primeiras reações causadas no grupo a partir da exibição do videoclipe, foi de estranhamento acerca da suposta fusão treinador-professor. Temos, no exemplo trazido por RW, a valorização de uma modo de apropriação do esporte em seu viés competitivo, como ferramenta educativa por si só.

- E o que o Reff vai fazer quando terminar o colégio?

- Eu não sei, ir para a faculdade eu acho.

- E você vai fazer faculdade?

- Ah, eu não técnico, eu não sou um crânio como o Reff.

- Acha que tem futuro no futebol?

- Claro que não! Já que eu estou no colégio, pelo menos eu bato em alguém enquanto eu estou aqui.

- Está legal, eu gostei disso. Um cara consciente. [...] Mas se você não for para afaculdade, não vai ser porque você não é qualificado. Então eu quero que você me traga suas notas no final de cada semana, e ai a gente vai dar uma olhada juntos. Tá bem?

- Tá bem.

(Trecho retirado do filme, Duelo de Titãs)

Portanto, independente da modalidade esportiva, seja nos filmes ou trazidas nas falas dos participantes da pesquisa, é possível identificar o que podemos chamar por ethus (atitude) esportivo como o elemento que centraliza e personifica a figura do coach-teacher, bem como do professor-treinador.

- Eu estou sabendo de tudo!

- Do que está falando?

- Ou você apita o jogo direito, ou eu vou para os jornais. E não me importo de prejudicar minha carreira, mas eu juro que não paro até todos vocês estarem na cadeia.

(Trecho retirado do filme Duelo de Titãs)

Desta forma, o cinema e o esporte se configuram como ferramentas educativas e de produção de conhecimentos que utilizadas de modo conjunto podem potencializar estudos acerca das duas temáticas. Uma vez que “o cinema tem a seu dispor infinitas possibilidades de produzir significados” (DUARTE, 2002 p. 33). Além disso, o esporte “[...] é um fato social capaz de influenciar os costumes e hábitos das pessoas” (PIMENTA; HONORATO, 2010, p.497), isto é, cinema e esporte são capazes de produzir inúmeros sentidos e significados, participando do processo de constituição coletiva e individual dos sujeitos. Assim como da formação de opinião a partir dos modos de endereçamentos de cada obra, das impressões deixadas por produções fílmicas e da carga cultural de cada sujeito.

Potencialidade do cinema na Educação Física escolar

As instituições relacionadas à produção de conhecimento, historicamente, utilizam ferramentas distintas para atingir seus objetivos. É preciso salientar que a academia, a escola e a família não são únicas detentoras do processo de educação do indivíduo. Instituições religiosas, bem como a própria mídia também contribuem na produção social e cultural de cada sujeito. Estes fatores fazem com que as mensagens emitidas em cada filme ajam de modos distintos e produzam diferentes significados de acordo com o local de recepção e de percepção social de quem o assiste. Para Duarte (2002, p.54), “existe um sujeito social dotado de valores, crenças, saberes e informações próprios de sua(s) cultura(s), que interage, de forma ativa, na produção dos significados das mensagens”.

Em relação a fatores pedagógicos, o cinema pode ser utilizado de modo a potencializar as relações sociais e de aprendizado. Uma vez que se constitui de uma gama de ferramentas capazes de produzir múltiplos significados e possui capacidade de atingir grandes parcelas da sociedade global. Entender o cinema como um lugar de produção de conhecimento, oportuniza sua apropriação enquanto experiência para o pensamento, muito mais do que mera contemplação. Na medida em que os filmes produzem significados a partir do olhar e do sistema social no qual o mesmo é reproduzido, uma mesma cena de um filme pode produzir diferentes sentidos quando apreendida por grupos sociais distintos.

E o que isso tem a ver com a educação? Porque o gosto ou a preferência por uma determinada forma de arte cultural deveria interessar professores e pesquisadores dessa área? Se pensarmos a educação como um processo de socialização esse tema torna-se bastante relevante para nós (DUARTE, 2002, p. 14).

O cinema, entendido como uma prática cultural da sociedade moderna pode ser utilizado como uma potente ferramenta no processo de produção de saberes acadêmicos, artísticos e sociais. Todavia, percebe-se, através da fala dos professores, que embora estejam habituados a utilizar de tecnologia durante a construção de suas aulas, o Cinema é pouco utilizado como uma ferramenta ou conteúdo na Educação Física escolar.

Utilizar o cinema como uma ferramenta pedagógica, eu nunca tinha pensado, porque a gente põe vídeos do youtube, imagens, mas um vídeo, até porque a gente fala: vamos ver um vídeo e começa, “ih aula teórica”. Então, até para a gente ampliar nosso horizonte e quando vê, começar a trabalhar.

(HG professor (a) da rede municipal de Rio Grande)

Nesse sentido, quando abordado o tema da potencialidade do cinema na instituição escolar, sobretudo nas aulas de Educação Física, percebe-se uma avaliação positiva dos participantes da pesquisa. Entretanto, os professores e professoras revelaram não lançarem mão dessa ferramenta, com tanta frequência, em suas aulas. Logo, o Cinema acaba aparecendo como mais um recurso alternativo para aulas em dias de chuva. Por vezes, sua aplicação é feita sem articular um diálogo ajustado ao conteúdo desenvolvido pela disciplina.

Professor/a de Educação Física e seu papel social

Quando se trata da figura do coach-teacher, certifica-se que a personagem possui um grande apelo às questões sociais e carrega em sua personalidade, valores sociais, comumente considerados um modelo a ser seguido. A figura cinematográfica apresenta características que são vistas como benéficas pela sociedade ocidental. Questões como disciplina, pertencer a uma família tradicional, participar do processo educacional dos filhos, são exemplos disso.

O papel social pode ser considerado um ponto de aproximação entre os docentes e as personagens. É perceptível que tanto nas obras cinematográficas, como nas aulas de Educação Física, a relação dos alunos com os professores e professoras, acontecem de maneira diferente do relacionamento com outros docentes das instituições. Os docentes acreditam que esse vínculo mais intenso, estabelecido com os alunos, se justifica pela proximidade e pelo sentimento de confiança creditado a eles, devido às características de uma disciplina que se desenvolve através de práticas corporais muito mais atrativas do que as da sala de aula.

Mas a gente vê principalmente nos filmes e na nossa realidade que a parte educacional de notas é só uma parte né, olha o que o professor é, é muito mais o social do que propriamente o treino, a gente... eu mesmo costumo dizer, eu não consigo sentar. Na aula de Educação Física tu não senta. Só na hora da chamada e depois tu estás sempre muito próximo do aluno. Muitas vezes tu estás mais próximo que qualquer outro professor e tu te envolve ainda, né!?

(HG professor (a) da rede municipal de Rio Grande)

Na fala de HG, é possível observar que a disciplina Educação Física estabelece um parêntese no funcionamento regular da instituição escolar. A proximidade e a confiança como consequência de aulas que dependem da interação e expressão corporal continuamente, abre canais de comunicação que, por vezes, não encontram vazão na instituição nem na própria relação familiar dos discentes. Assim, manifesta HP:

Eu tive até um aluno em um dia de chuva e tinha só um aluno, e aquele aluno me falou que um mês atrás tentou se suicidar e ele nunca tinha falado pra ninguém na escola. E eles têm essa ligação muito forte com o professor de Educação Física.

(HP professor (a) da rede municipal de Rio Grande)

Deste modo, verifica-se que tanto o grupo de professores, quanto a figura do coach-teacher consistem em uma referência para os sujeitos que transitam no mesmo meio social. Uma vez que são vistos como modelos a serem seguidos, os estudantes acabam por exercer maior liberdade em dialogar com seus professores. Ainda, sobre as características que, supostamente, distinguem os professores e professoras de educação Física, dos colegas das demais disciplinas no contexto escolar, RW destaca:

É um dos únicos professores que escutam eles, que eles não têm medo, a gente é uma parceria para eles na escola. Eles têm a gente assim.

(RW professor (a) de Rio Grande)

- Mas qual o problema filho?

- Eu estou disponível.

- É bom ouvir isso, mas eu já sou casado.

- Eu tirei média cinco treinador, eu vou fazer faculdade.

- Coisa boa!

[Estudante abraça a figura do coach-teacher]

(trecho retirado do filme Duelo de Titãs)

Portanto, identifica-se no professor de Educação Física e no coach-teacher um elo de aproximação referente ao papel social que exercem. Ambos possuem características em comum. É possível mencionar uma rede de sentidos e significados ativados por suas figuras e que se relacionam com designações do tipo: amigos, conselheiros, modelos a serem seguidos, etc. A fala dos participantes evidenciam o papel do professor na instituição escolar como um agregado de significados, tornando-se uma referência para aqueles que com ele convive.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experiência proporcionada pela realização do grupo focal, tendo nos fragmentos dos filmes o disparador da discussão temática com os participantes da pesquisa, revelou no primeiro momento uma reação adversa do grupo acerca da fusão professor-treinador, implicada na figura do coach-teacher. No entanto, o decorrer da conversa fez aparecer uma série de narrativas sobre suas vivências profissionais individuais, trazendo à tona uma apropriação naturalizada do esporte como conteúdo predominante das suas aulas. Como efeito, observamos que as fronteiras elencadas para a distinção entre os supostos papéis do professor e do treinador, acabam por se desfazer quando problematizados a partir da identificação dos cenários e contextos dos filmes frente suas próprias atuações e posturas assumidas quando participam de competições escolares, por exemplo. Portanto, é possível indicar a consolidação da compreensão do coach-teacher enquanto um agregado de características e atitudes pedagógicas e sociais exercidas no cotidiano dos participantes da pesquisa em sua atuação docente.

Observou-se que tanto o professor de Educação Física riograndino, como a figura do coach-teacher possuem características semelhantes na relação com os alunos (ou alunos-atletas). Conforme relatado pelos participantes da pesquisa, em diversos momentos é necessário assumir um papel de conselheiro ou de amigo confidente. Tanto no ambiente escolar como nas produções cinematográficas analisadas, são os docentes de Educação Física que estabelecem uma relação de maior proximidade e confiança com os discentes. Desta forma, os professores e professoras de Educação Física, bem como a figura emblemática do coach-teacher, são vistos como referências por aqueles alunos que transitam pelos seus locais de atuação.

Portanto, observa-se diversos pontos de aproximação entre o coach-teacher e o contexto de atuação dos professores e professoras participantes do grupo. Entre eles, destaca-se: a área de atuação que ambos exercem, na qual são vinculadas atuações com contextos e práticas esportivos; a proximidade e a relação afetiva com os discentes, dado que assumem papeis que docentes de outras disciplinas não exercem; e que, embora exista espaço para outras áreas da cultura corporal, o esporte ainda é hegemônico nas práticas relacionadas às aulas e atividades extracurriculares promovidos pela Educação Física. Por fim, é notável entre o grupo, o reconhecimento acerca das potencialidades do cinema como ferramenta de produção de conhecimento, ainda que ele não seja muito explorado durante as aulas de Educação Física na escola.

REFERÊNCIAS

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1 Nesta pesquisa, nomeamos coach-teacher aquelas personagens caracterizadas pela atuação como professor-treinador de equipes esportivas das high schools norte-americanas e que, por efeito, se aproximam do contexto de atuação do professor de Educação Física escolar brasileiro.

2Cabe enfatizar que são restritas a produções cinematográficas que possuem como cenário o esporte em contexto escolar, e que também exploram a figura do coach-teacher.

3A escolha dos professores que atuam nos anos finais do ensino fundamental, se justificou pelo entendimento de que este é um contexto favorável para o desenvolvimento do esporte como conteúdo das aulas de Educação Física no ensino fundamental.

AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Secretaria de Município da Educação (SMEd) da cidade do Rio Grande - RS por possibilitar e incentivar a participação de seus professores nessa pesquisa

FINANCIAMENTO Não se aplica

APROVAÇÃO DE COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA Este artigo faz parte da pesquisa Educação Física e Cinema: a figura do "coach teacher" e suas implicações no processo de formação de professores da rede pública em Rio Grande -RS, aprovada conforme parecer consubstanciado da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, número 3.694.731

LICENÇA DE USO Os autores cedem à Motrivivência- ISSN 2175-8042 os direitos exclusivos de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution Non-Comercial ShareAlike (CC BY-NC SA) 4.0 International. Esta licença permite que terceiros remixem, adaptem e criem a partir do trabalho publicado, desde que para fins não comerciais, atribuindo o devido crédito de autoria e publicação inicial neste periódico desde que adotem a mesma licença, compartilhar igual. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico, desde que para fins não comerciais e compartilhar com a mesma licença

PUBLISHER Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Educação Física. LaboMídia - Laboratório e Observatório da Mídia Esportiva. Publicado no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade

EDITORES Mauricio Roberto da Silva, Giovani De Lorenzi Pires, Rogério Santos Pereira

EDITOR DE SEÇÃO Bianca Poffo

REVISÃO DO MANUSCRITO E METADADOS João Caetano Prates Rocha; Keli Barreto Santos

Recebido: 06 de Julho de 2021; Aceito: 05 de Setembro de 2021

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CONFLITO DE INTERESSES

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