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Motrivivência

versão On-line ISSN 2175-8042

Rev. Motriviv. vol.33 no.64 Florianópolis  2021  Epub 02-Jul-2021

https://doi.org/10.5007/2175-8042.2021.e80210 

Porta Aberta

Formar para inovar em Educação Física: bases para a produção de inovação na educação básica

Training to innovate in Physical Education: basis for production of innovation in basic education

Formación para inovar en Educación Física: base para la producción de innovación en la educación básica

Marcio Antonio Raiol dos Santos1 
http://orcid.org/0000-0002-4723-1231

Carlos Afonso Ferreira dos Santos1 
http://orcid.org/0000-0003-4008-5478

1Universidade Federal do Pará, Núcleo de Estudos Transdisciplinares em Educação Básica, Belém, PA, Brasil.


RESUMO

Este ensaio reflete a inovação na formação inicial para a licenciatura e objetiva analisar bases teórico-normativas e vivenciais que impulsionam o trato com esse fenômeno no curso de ensino superior da Educação Física. Observamos que a emergência da inovação como elemento de reflexão na formação docente em Educação Física decorre de sua demarcação em diretrizes e sua exploração teórico-metodológica e epistemológica em projetos pedagógicos e no currículo. A vivência cotidiana formativa, além disso, precisa proporcionar em suas atividades de ensino, pesquisa e extensão o desenvolvimento profissional de docentes que entendam a inovação e suas características como uma das fontes para atuação com qualidade e compromisso político na escola básica. A modelação curricular, por exemplo, representa um dos conceitos que, trabalhado no ensino superior, viabiliza a experimentação da inovação no currículo, atribuindo a esse objeto um caráter ampliado, dinâmico e flexível, favorecendo a existência de práticas inovadoras na Educação Física.

PALAVRAS-CHAVE: Educação física; Formação inicial; Inovação; Escola

ABSTRACT

This essay brings reflections on innovation in the initial formation for the licentiate degree and aims to analyze theoretical, normative and experiential bases that impel the deal with this phenomenon in the Physical Education higher education course. We observed that the emergence of innovation as an element of reflection in Physical Education teacher training comes from its demarcation in curricular guidelines and from its theoretical and methodological exploration in pedagogical projects and in the curriculum. In addition, the daily life experienced needs to provide in its various teaching, research and extension activities the professional development of teachers who understand innovation and its characteristics as one of the sources for acting with quality in the basic school. Curriculum modeling, for example, represents one of the concepts that, worked in higher education, allow thinking and experiencing innovation in the curriculum, attributing to this object an expanded, dynamic and flexible character, favoring the existence of innovative practices in Physical Education.

KEYWORDS: Physical education; Initial formation; Innovation; School

RESUMEN

Este ensayo trae reflexiones sobre la innovación en la formación inicial para la licenciatura y tiene como objetivo analizar las bases teóricas, normativas y vivenciales que impulsan el abordaje de este fenómeno en la carrera de Educación Física superior. Observamos que la emergencia de la innovación como elemento de reflexión en la formación del profesorado de Educación Física proviene de su demarcación en los lineamientos curriculares y de su exploración teórica y metodológica en los proyectos pedagógicos y en el currículo. Además, la vida cotidiana vivida necesita proveer en sus diversas actividades de docencia, investigación y extensión el desarrollo profesional de docentes que entiendan la innovación y sus características como una de las fuentes para actuar con calidad en la escuela básica. La modelación curricular, por ejemplo, representa uno de los conceptos que, trabajados en la educación superior, permiten pensar y experimentar la innovación en el currículo, atribuyendo a este objeto un carácter expandido, dinámico y flexible, favoreciendo la existencia de prácticas innovadoras en Educación Física.

PALABRAS-CLAVE: Educación física; Formación inicial; Innovación; Colegio

INTRODUÇÃO

Inovar é uma autêntica aventura, afirma o sociólogo espanhol Jaume Carbonell (2002, p. 9). De acordo com o autor, compreende uma viagem “[...] marcada por dificuldades, paradoxos e contradições, mas também por possibilidades e satisfações”. Reverberada no campo educacional, a aventura proporcionada pela inovação se entrelaça às expectativas contemporâneas do fazer educativo, igualmente marcado por dificuldades, perigos, possibilidades, paradoxos, adicionado de interesses, construções, histórias, desejos...

Se inovar corresponde a uma autêntica aventura, pode sua ação navegar por espaços diversos, dentre os quais a educação de vertente escolarizada. Entretanto, para esta ação acontecer, não só a aventura no sentido positivo e satisfatório do termo basta, pois inovar também é um desafio, dado que não ocorre espontaneamente, mas através de sistematização e mobilização teórico-prática de seus elementos e características, além do reconhecimento social acerca das relações que mantém com a escola pública e suas complexas realidades.

Na Educação Física, Almeida (2017) ressalta que o fenômeno da inovação abrange uma vertente multifatorial, reunindo distintos aspectos de compreensão conceitual ao percorrer variados âmbitos formativos. Isso significa dizer que a inovação pode estar presente na escola, na formação profissional ao nível acadêmico e outros espaços sociais.

No que diz respeito à formação docente, é coerente destacar que configura ambiente propício à garantia de capacitação profissional de pessoal qualificado para atuação na sociedade em suas distintas áreas. No âmbito da formação inicial da licenciatura a lógica é a mesma. Porém, o que se observa, segundo Gatti (2016), é a insuficiência de políticas e práticas que efetivamente estejam alicerçados à inovação, a fim de se articular as necessidades das novas gerações e fazer com que a função social da escola seja cumprida, a qual, para a autora, reside na oferta às crianças e jovens dos conhecimentos acumulados pela civilização na história da humanidade.

Essa noção encontra eco na formação inicial da licenciatura em Educação Física, na medida em que as políticas e práticas de ensino na graduação se deparam com o desafio constante de inserir o conhecimento na centralidade das novas linguagens, lógicas e mudanças do mundo contemporâneo (GATTI, 2018). Nesse contexto, a busca pela inovação na formação inicial, por ser um desafio, colaboraria com processos alinhados a escolarização de cidadãos na perspectiva da problematização do conhecimento no interior de um projeto de formação escolar de vertentes transgressora e política.

Assim refletido, este estudo é caracterizado como um ensaio que tem por objetivo refletir os desafios deparados pela formação inicial em licenciatura da Educação Física no que se refere ao fenômeno da inovação. O mesmo se divide em dois momentos. O primeiro, reunido em duas seções, discute, segundo literatura especializada, movimentos históricos da formação profissional em Educação Física no Brasil, e a inovação como fenômeno educacional na escola e na Educação Física. O segundo momento, também com duas seções, reflete bases (de caráter teórico-normativo e vivencial) que orientam ou impulsionam a formação de professores inovadores nessa área de intervenção.

UMA SÍNTESE HISTÓRICA DA FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL: movimentos de reprodução e de revisão

Uma síntese histórica da formação profissional em Educação Física no Brasil se confunde com a própria história dessa disciplina nas escolas do país nas décadas iniciais do século XX e seu percurso durante os anos e século seguinte.

Ao revisarem a literatura, Cruz et al. (2019) indicam quatro momentos de destaque em relação ao estabelecimento de um campo formativo da Educação Física no cenário nacional brasileiro. Conforme sistematizam, seu percurso histórico se baseou, em um primeiro momento, nas influências das instituições médicas e militares. Mais tarde, orientou-se pelos desdobramentos do paradigma esportivista. Em seguida, no paradigma do Movimento Renovador e, por fim, nas diretrizes curriculares de 2002 e 2004.

Ressaltam Cruz et al. (2019) que a constituição da formação docente em Educação Física no Brasil em seus distintos momentos fez surgir, em cada um deles, bases teórico-metodológicas que orientaram e orientam até hoje o currículo, o ensino e, de modo geral, o processo de formação de professores de Educação Física para atuação nas escolas, ocasionando a emergência e construção de distintas concepções e práticas em relação a esse campo do conhecimento.

Na perspectiva dos momentos apresentados por Cruz et al. (2019), faz-se importante demarcar dois movimentos ordenadores. O primeiro deles se refere ao modelo reprodutor de formação profissional visado pelas instituições médicas e militares - com foco no fenômeno ginástico - e pelo esportivismo. De base biológica e técnica, respectivamente, esse modelo seguiu a tendência educacional das escolas de seus períodos no século XX.

Prática privilegiada do pensamento liberal das elites brasileiras e pautada nos métodos europeus, a ginástica na escola visava a aquisição de hábitos de higiene e saúde, a valorização do desenvolvimento físico e moral (NUNES; RÚBIO, 2008) e a formação do homem moderno (SOUZA, 2012). O mesmo aconteceu no Estado Novo, momento no qual, sob a influência da instituição militar, foi conferido a essa prática objetivos de rendimento físico, com vista ao adestramento de sujeitos e seus corpos para a capacitação ao trabalho e, consequentemente, o desenvolvimento econômico do Estado brasileiro (BETTI, 2009).

Com o paradigma esportivo não foi diferente. Figurou como prática e tendência que propagou interesses voltados ao desenvolvimento brasileiro do ponto de vista da competência técnica. O esporte como instituição legitimou na escola, igualmente a ginástica, certas finalidades educacionais. Dentre essas, destaca-se um modelo de escolarização que, em consonância ao currículo tecnicista, objetivou formar sujeitos com iniciativas voltadas à construção de um ideal de nação pautado na eficácia e no controle social (NEIRA; NUNES, 2009).

Conteúdo na Educação Física brasileira, o esporte no contexto da ditadura militar obteve exclusividade e reinou como instrumento dedicado a fins políticos e sociais. Como política educacional, o Desporto Estudantil ganhou evidência junto a Política Nacional de Educação Física e Desportos (PNED) e, consequentemente, a preocupação com a performance, o rendimento esportivo e o aspecto nacionalista esteve no centro das atribuições do universo escolar (NASCIMENTO, 2016).

Um olhar atento aos objetivos pretendidos com a ginástica e o esporte no apogeu de seus discursos educacionais na Educação Física brasileira, além de atribuir a essa disciplina, na escola, distintas finalidades e identidades (NUNES; RÚBIO, 2008), estimulou a formação de profissionais em acordo com as intencionalidades visadas pela Educação Física, a partir da adoção de programas formativos com bases teóricas, metodológicas e políticas articuladas ao contexto que se apresentava a sociedade e suas demandas imediatas (CRUZ et al., 2019).

Essa linha de entendimento considera que a compreensão da Educação Física baseada numa noção restrita de corpo e ser humano, sobretudo mediante as influências da ciência positivista nesse campo, estabeleceu-se hegemonicamente no cotidiano escolar e transferiu aos cursos de formação superior um caráter de atraso, como analisam Borges e Furtado (2019), pois desconsideram valores e aspectos que permitiriam atribuir outro sentido à Educação Física e seus saberes no campo formativo docente.

Em contexto posterior, o segundo movimento ordenador da formação docente em Educação Física se refere a um modelo revisor de suas tendências anteriores. Com base em Cruz et al., (2019), esse modelo foi representado pelo Movimento Renovador da Educação Física e as diretrizes curriculares do início do presente século.

O movimento de revisão aqui discutido, em primeiro lugar foi marcado pelo repensar teórico do campo da Educação Física, o qual possibilitou o discurso de crítica direcionado a esse campo e seus currículos hegemônicos no Brasil, sejam eles escolares ou dos processos de formação a nível superior. Como podemos apreender da discussão de Machado e Bracht (2016), o Movimento Renovador da Educação Física iniciou na área um inédito repensar de seus pressupostos teóricos, denunciando os paradigmas hegemônicos da área, os quais de efeito também hegemônicos até hoje nas práticas pedagógicas escolares, como os da aptidão física e esportivo.

Ao mesmo tempo, surgiu com o Movimento Renovador uma crise que permeou a Educação Física, deparando-se a área, segundo Machado e Bracht (2016), com a revisão de práticas e questões de ordem pedagógica, antes naturalizada no cotidiano das escolas. No campo formativo, os conflitos se deram, por sua vez, na construção de uma proposta de formação de base humanística e não somente tecnicista, em um primeiro plano descolada dos pressupostos teóricos da formação docente pretendida pelas instituições médicas, militares e mais a frente pelo esportivismo; e, de modo secundário, coerente com o perfil de professor exigido pelo novo cenário político e social da década de 80 (CRUZ et al., 2019).

Embaladas pelo movimento de repensar teórico da Educação Física, diretrizes normativas para a formação docente ganharam centralidade no início do século XXI, com vista a uma nova configuração formativa e perfil de professor, segundo Cruz et al. (2019). Continuam os autores:

A formação docente, em Educação Física, é apresentada a partir das novas diretrizes em 2002 - Resolução CNE/CP 01/2002 e Resolução CNE/CP 02/2002 - e 2004 - Resolução 07/2004. Estas novas diretrizes apresentam mudanças significativas no que diz respeito à definição de critérios para a formação docente. Uma vez que propôs uma nova concepção de profissional de Educação Física aos cursos de formação que reflete sobre um conjunto de conhecimentos, capacidades e habilidades, abrindo o leque de possibilidades para a formação humana (CRUZ et al., 2019, p. 232).

As diretrizes curriculares para a formação apresentadas nos anos iniciais do século corrente surgiram como movimentos normativos de revisão, orientação e oferta de autonomia para a construção, pelas instituições de ensino superior, de seus currículos e projetos (CRUZ et al., 2019), distintos das propostas de formação antes dominantes no Brasil, as quais indubitavelmente conectadas ao contexto social vigente. Contemporaneamente, outros documentos seguiram a tendência de normatização do campo de formação. No campo macro da educação, a Resolução nº 2, de 1º de julho de 2015, que definiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior e para a formação continuada, e na Educação Física, as novas Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Educação Física, Resolução nº 6, de 18 de dezembro de 2018.

No interior dessa análise, um objeto particular de discussão entra em cena: a inovação. Ao navegar nos extremos da prescrição (diretrizes, projetos curriculares) e do próprio cotidiano educativo, a inovação instaura um novo campo de debate na perspectiva da formação docente, de efeitos reais na atuação realizada por professores na escola básica. Nessa lógica, pretendemos responder com esse artigo: a formação em Educação Física na história, e mais recentemente com as diretrizes que a orienta, favoreceu (ou favorece) processos de inovação na escola?

A ESCOLA E EDUCAÇÃO FÍSICA COMO ESPAÇO DE INOVAÇÃO E A FORMAÇÃO DOCENTE NA LICENCIATURA

Há muito a educação básica brasileira discursa a favor da garantia e oportunidade adequadas de escolarização ao conjunto da população do país (GOLDEMBERG, 1993). Ainda que sua configuração tenha sofrido processos mutacionais atrelados ao surgimento de uma nova forma hegemônica e histórica de socialização, que é a escolar, a necessidade da escola em sistematizar finalidades voltadas à produção do saber e estímulo ao ato intelectual da aprendizagem (CANÁRIO, 2005) é iminente e histórica.

Com referência a caracterização da escola como instituição histórica e social e, especialmente da educação básica como nível de educação nacional do Brasil, observa-se que a construção das ações ocorridas nesse espaço se ampara em processos pedagógicos inseparáveis de projetos de formação para os cidadãos e cidadãs brasileiros.

Nessa vertente, refletir processos pedagógicos implica direcionar o olhar aos componentes curriculares da escolarização básica manifestados em saberes de campos específicos de conhecimento que, organizados no currículo escolar, precisam ser sistematizados e socializados por meio de práticas pedagógicas. Dentro desse panorama de significação temos a Educação Física, entendida como prática pedagógica especialmente a partir dos anos finais do século passado, quando ocorreu a regulamentação da educação escolarizada no Brasil com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (BRASIL, 1996).

Todavia, importa ressaltar que a simples compreensão da Educação Física como prática pedagógica e componente curricular na escola não nos isenta de refletir sobre marcantes discussões centradas na sua especificidade, desafios e limites nesse ambiente e no currículo.

Correia (2016) oferece subsídios para essa análise ao questionar se os conteúdos de ensino da Educação Física se orientam pela especificidade da cultura escolar. Em linhas gerais, questiona, antevendo a função que a escola exerce na sociedade, se esses mesmos conteúdos são submetidos a processos de sistematização, problematização ou transformação didática.

Em diálogo com Correia (2016), pode-se considerar que a discussão em tela é influenciada pelo modo como se manifestou a Educação Física na história da educação brasileira. No entendimento crítico do pensamento renovador da Educação Física, uma mera atividade (BRACHT; GONZÁLEZ, 2005; MACHADO; BRACHT, 2016). Em função disso, na visão de Silva (2008) é necessário impulsionar a transição no interior da tradição da Educação Física na escola, a qual implique o abandono a práticas sem finalidades educativas e provoque a aproximação a ações pedagógicas condizentes com seu “status” de componente curricular (proporcionar o conhecer).

A premissa presente nas interlocuções de Correia (2016) e Silva (2008) estimula a apreciação crítica da Educação Física brasileira na escola e sua associação a propostas tradicionais de ensino, formação e, principalmente, trato ao conhecimento escolar. Essa mesma apreciação imprescinde a adentrada em um cenário fundamental de reversão das práticas pedagógicas e curriculares da Educação Física na escola, as quais perpassam ações inovadoras. Um cenário de inovações para a Educação Física revisa os discursos históricos de seu campo, como os que perspectivam certa desvalorização dos conhecimentos frente a seu valor educativo na sociedade contemporânea.

Nessa lógica, inovar frente aos desafios da escola básica exerce papel de destaque diante das concepções de aprendizagem marcadas historicamente dentro desse lócus educativo. Ademais, inovar na Educação Física escolar demonstra a preocupação do campo em rever suas práticas pedagógicas de modo que, corroborando Soares (1996, p. 6), o papel da escola, das metodologias de ensino, bem como do planejamento escolar objetive “[...] organizar o conhecimento a ser tratado no tempo [...]” ao “[...] produzir desafios com este desconhecido [...]”.

Falando-nos do final do século XX sobre a Educação Física na escola como matéria de ensino, período no qual fora regularizada e organizada a educação brasileira com a LDB, Soares (1996) já delineava importantes reflexões relativas a necessidade de essa disciplina aprofundar sua especificidade no referido ambiente, tal como alertam Bracht et al. (2014, p. 59) ao entenderem que “[...] pensar e repensar a inserção da Educação Física no currículo escolar coloca-se como tarefa permanente para a área”.

O princípio acima nos desloca para outro campo de análise, no qual a inovação exerce centralidade. No que se refere a esse fenômeno educacional, julgamos importante destacar que ao mesmo tempo em que permite à escola assumir uma postura contestadora de paradigmas tradicionais de ensino, possibilita visualizar a Educação Física como um tempo-espaço de ressignificação de suas práticas pedagógicas e curriculares, estando a serviço de um processo contínuo de aumento das aprendizagens, voltado ao desenvolvimento humano de educandos, com base em padrões de equidade e justiça social (JESUS; AZEVEDO, 2020; JESUS; ALVES, 2019).

Conceitualmente, Carbonell (2002, p. 19) define a inovação como um “[...] conjunto de intervenções, decisões e processos, com certo grau de intencionalidade e sistematização, que tratam de modificar atitudes, ideias, culturas, conteúdos, modelos e práticas pedagógicas”. Pacheco (2019), com base em uma noção mais paradigmática, a entende como um processo transformador, o qual permite refundar a escola, rompendo com práticas da escola moderna e transitando para um paradigma de educação interessado nas necessidades da escola dos tempos contemporâneos. Em associação ao conceito proposto por Jesus e Azevedo (2020), a existência de inovação, nesse sentido, está condicionada a capacidade interna das escolas em gerir aprendizagens positivas.

O reconhecimento de uma escola contemporânea, baseado nas reflexões de Thurler (2001), demanda o próprio reconhecimento desse lócus de educação como um espaço no qual se vislumbre práticas profissionalmente transformadas. Se a inovação pode ser entendida como um processo sistemático de ações que introduz “em uma linha renovadora, novos projetos e programas, materiais curriculares, estratégias de ensino e aprendizagem, modelos didáticos e outra forma de organizar e gerir o currículo, a escola e a dinâmica de classe” (CARBONELL, 2002, p. 19), o papel profissional do professor ganha destaque imediato.

Para isso, cabe, antes, ao campo formativo da licenciatura no ensino superior delinear estratégias e processos, assim como mobilizar bases teóricas e concepções de formação nas quais a educação seja entendida como ato político e a inovação responsável por inspirar práticas pedagógicas emancipatórias, equitativas e transformadoras. Na Educação Física, como vimos na seção anterior, o delineamento e mobilização em questão buscariam no movimento de revisão uma das fontes para a construção de projetos formativos com características crítica, dinâmica e ampliada, de modo superar aos poucos as tendências históricas da formação docente do campo (CRUZ et al., 2019). Ao encontro da análise realizada por Almeida (2017), a inovação na escola é favorecida se o campo formativo da licenciatura possibilitar

[...] uma relação diversificada com a cultura, de maneira que quanto mais ampla for a formação do professor, mas [sic] recursos ele pode acessar para conduzir o ensino; o caráter problematizador e intencional da prática, que é favorecido na medida em que o docente tem uma relação diferenciada com a teoria, atuando como intelectual/ intérprete/ tradutor; a atribuição de um sentido crítico ao conhecimento, acompanhado do reconhecimento da dimensão ético-política da profissão [...] (ALMEIDA, 2017, p. 12).

Considerando os apontamentos de Almeida (2017), a oferta de formação ampliada ao futuro professor de Educação Física atuante na escola básica, de modo particular, pode viabilizar a construção de uma cultura pessoal e profissional de natureza inovadora, favorecendo a produção de práticas pedagógicas naturalmente transformadas, por efeito do sentido atribuído aos fenômenos de ensino da Educação Física na escola básica.

O favorecimento a práticas e experiências inovadoras na escola perpassaria, na formação docente, em diálogo com Pimenta (1999), a criação de condições para o reconhecimento da docência como prática social voltada ao ensino, na qual se inclui a problematização e o enfrentamento as situações complexas que da escola emergem. Para a autora, entender a prática social “como o ponto de partida e como ponto de chegada possibilitará uma ressignificação dos saberes na formação de professores” (PIMENTA, 1999, p. 25).

Na perspectiva da inovação, em nosso olhar, a ressignificação dos saberes na formação docente pode ser reflexo, em menor grau, mas não menos importante, tanto das diretrizes ou princípios que orientam os projetos e programas de formação da licenciatura, quanto, de maneira mais efetiva, das experiências e possibilidades teórico-metodológicas e epistemológicas mobilizadas no cotidiano do processo formativo.

A seção seguinte analisa bases possíveis, apresentadas em diretriz, para a emergência da inovação como princípio na licenciatura em Educação Física. Posteriormente, finalizamos com alguns indicativos referentes ao cotidiano de formação docente e o que nele pode ser refletido e viabilizado para a atuação inovadora na Educação Física, no cenário escolar.

BASES CONTEMPORÂNEAS PARA INOVAÇÃO NA EDUCAÇÃO FÍSICA NO BRASIL: diretrizes para formação de professores

Damos início à análise das bases teórico-normativas para a inovação na formação docente em Educação Física ressaltando que, por si só, essas podem exercer impacto relativamente menor quando comparado ao delineamento institucional dos cursos de ensino superior com relação a suas atividades acadêmicas.

Ainda assim, consideramos relevante apresentá-las, dado o fato de constituírem diretrizes que orientam os cursos na construção de seus projetos, currículos e práticas, embora, em se tratando especificamente das Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de graduação em Educação Física (DCNEF), objeto de análise desta seção, a mesma possa constituir um documento passível a críticas com relação a seu contexto de elaboração, como a que a entende ser uma diretriz que reforça a divisão na formação em Educação Física, em favor dos interesses de seus produtores, desejosos à privatização do ensino e a formação à distância, características intimamente associadas ao projeto neoliberalista de educação (FREITAS; OLIVEIRA; COELHO, 2019).

Apesar disso, empreendemos análise a formação específica da licenciatura em Educação Física, capítulo III das DCNEF (BRASIL, 2018), considerando que, a despeito de reforçar a fragmentação do curso, é ela quem orienta o itinerário formativo da licenciatura e cabe a nós, no interior da discussão apresentada neste artigo, refletir e estimular a reflexão acerca da inovação na formação de professores para a educação básica.

Com isso, é importante inicialmente salientar que, de acordo com as DCNEF, a etapa específica da formação em licenciatura em Educação Física deverá considerar aspectos inerentes a atuação do futuro egresso no campo escolar, dentre os quais alguns princípios norteadores da formação inicial, como: a sólida formação teórica e interdisciplinar, e a unidade teoria-prática.

A relevância dos princípios citados para o campo de análise da inovação revela, na formação inicial da licenciatura em Educação Física, três sentidos. O primeiro reflete o quanto uma forte base teórica, proporcionada na formação, estimula o conhecimento amplo dos diversos saberes e fenômenos que constituem a Educação Física, propiciando ao graduando mais possibilidades de trato a esses no ambiente escolar e, consequentemente, de relação entre eles e outros campos do conhecimento na perspectiva da interdisciplinaridade (segundo sentido em evidência).

Isso favorece práticas inovadoras na Educação Física na medida em que os trabalhos pedagógicos e curriculares na escola estarão amparados em bases teóricas ampliadas, as quais permitirão ao futuro professor mobilizar conceitos, fenômenos e saberes que questionem e superem a tradição da disciplina (SILVA, 2008; ALMEIDA, 2017), tematizar diferentes e diversos conteúdos (MALDONADO, 2018) e, especialmente, problematizar teoricamente os saberes da Educação Física nas aulas, no cenário escolar (FARIA et al., 2010).

A problematização supracitada, em função do caráter inovador do conhecimento, perpassa a reflexão crítica das práticas corporais na sociedade, sobretudo em função dos marcadores que as atravessam; o estímulo ao pensamento e a alteração de sentido dado às práticas, por ocasião da finalidade formativa da Educação Física constante no currículo e no projeto pedagógico da escola (CHAVES JUNIOR; MEURER; OLIVEIRA, 2014; CHAVES JUNIOR; BERTHIER, 2012; SILVA; BRACHT, 2012), entre outros aspectos que se relacionam ao reconhecimento da escola como espaço democrático e de formação de sujeitos inovadores, pensantes, comunicantes e transformadores (FREIRE, 2008), além de contestadores da realidade social contraditória.

Um direcionamento analítico nesse sentido considera a necessidade de atenção teórica especial aos conhecimentos no currículo de formação docente em Educação Física, sejam eles obrigatórios ou optativos, de modo que sua organização nesse documento possa provocar, na prática acadêmica cotidiana, a experimentação contextualizada, multidimensional, prática e teórica de saberes pedagógicos, sociais, humanos, biológicos e outros diversos; revendo a instrumentalização discente unicamente segundo uma lógica mecanicista e enfatizando a construção de uma identidade plural do professor formado (GORDO; MOREIRA, 2011).

O terceiro sentido em destaque, em diálogo com as análises de Gordo e Moreira (2011), refere-se ao entrelaçamento entre teoria e prática nos cursos de Educação Física, orientação expressa nas DCNEF. Conforme analisam os autores, essa relação precisa ser revista, e, sobretudo articulada, durante todo o processo de formação docente e não unicamente no estágio curricular, fato que pode gerar profunda insegurança aos discentes com relação à atuação qualificada em seu futuro campo de trabalho, e não apenas. Uma deficitária base acadêmica de caráter teórico-prática no percurso formativo pode também impedir que práticas inovadoras possam ser experimentadas e trabalhadas, seja no ensino superior e consequentemente na escola básica.

Os princípios discutidos e expressos pelas DCNEF são complementados por seu entendimento acerca do conceito de docência como ação educativa e como processo pedagógico, o qual, dentre outros elementos, acentua a “[...] socialização e construção de conhecimentos e sua inovação, em diálogo constante entre diferentes visões de mundo” (BRASIL, 2018, p. 3).

Reside na passagem citada o elemento mais característico da análise a respeito da inovação no campo formativo do ensino superior da Educação Física, cujo significado retoma importante discussão acerca de como o trato ao conhecimento nesse processo de formação veio ocorrendo em seu percurso histórico no Brasil.

Ao considerarmos que o modelo reprodutor de formação resultou numa lógica acrítica de Educação Física e de trato aos seus conhecimentos, convém reconhecer que o mesmo é incoerente com o sentido de construção pelo qual o conhecimento é concebido nas DCNEF e, particularmente, no campo teórico da Educação Física. Nessa perspectiva, reprodução de formas e práticas seria sinônimo de estabilidade, no sentido freiriano de cristalização da criação (FREIRE, 2016), enquanto que construção se aproximaria do sentido de inovação, isto é, a inovação da própria prática e das formas de lidar com e entender o conhecimento (PACHECO, 2019).

Com base nesse entendimento, a característica central da inovação se encontra articulada ao vislumbre, pelos projetos, currículos e campo de vivência da licenciatura em Educação Física, das formas, estratégias e atitudes que permitam aos graduandos dominar, entender o conhecimento e, com isso, pensar, construir e experimentar práticas de natureza inovadora para efetivação na atuação futura. Nesse movimento, a abordagem das bases epistemológicas derivadas das teorias curriculares se mostra relevante, pois reflete sobre os sujeitos que estas pretendem formar e, de modo mais específico, a crítica permanente as ideologias existentes na sociedade e os efeitos que essas produzem sobre os corpos, as culturas e as práticas corporais (FENSTERSEIFER; GONZÁLEZ; SILVA, 2019), com evidente repercussão na intervenção pedagógica da Educação Física.

Acreditando na necessidade de revisão de seus projetos pedagógicos, assim como pensam Gordo e Moreira (2011) ao analisar a realidade de universidades da região Norte do Brasil, é imperativo que alguns pontos sejam demarcados e explicitados.

O primeiro ponto é a delimitação do perfil profissional almejado, o qual, de acordo com as DCNEF, precisará ser aquele com capacidades de produzir inovação a partir dos conhecimentos que entende e domina. Esse perfil demanda não somente a instrumentalização didático-pedagógica de professores, mas também a capacidade de construir práticas político-pedagógicas contrárias aos desígnios do programa de qualidade total na educação, de vertente neoliberal. Neste, a educação se encontra subserviente a economia do mercado do século XXI e se apresenta como requisito para formação de pessoas competentes pela escola, conforme visão de futuro de organismos internacionais, como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) (JESUZ; AZEVEDO, 2020).

Cabe, portanto, as instituições formativas reconhecer que o professor inovador poderá ser um sujeito transgressor de práticas educativas neoliberais e fomentador de práticas socialmente justas do ponto de vista do currículo (MACEDO; MACÊDO, 2018), bem como produtor, em parceria com demais atores escolares, especialmente docentes de outros componentes curriculares e gestão pedagógica, de atividades reinventadas e críticas, ressignificando o processo histórico da Educação Física na escola.

O segundo ponto deverá entender o currículo de formação como espaço no qual necessitarão, em perspectiva prescritiva e refletida, estar justificadas determinadas intenções básicas de escolarização e, portanto, dispostos discursos (significados) que irão definir papéis, sejam eles dos professores, alunos e conhecimentos socializados (GOODSON, 2013). Com isto, a formação de professores inovadores (ou indicativos para isso) precisará ser justificada na organização curricular dos cursos de licenciatura em Educação Física, em espaços como ementa, objetivos das disciplinas e perfil do professor ambicionado.

O terceiro e último ponto finaliza a discussão deste artigo, mas não encerra o debate teórico acerca da inovação na formação de professores de Educação Física. O ponto em questão será analisado na seção seguinte e revela que o cotidiano formativo, naquilo que Sacristán (2017) chama de currículo em ação, oferece (ou precisa oferecer) vivências teórico-práticas que possibilitem aos graduandos da licenciatura em Educação Física entender a docência como ação dinâmica, na qual a reflexão sobre a prática é constante, atitude capaz de favorecer processos de inovação.

O COTIDIANO FORMATIVO DE ENSINO COMO FONTE PARA O “SER INOVADOR”

Perrenoud (2010) e Arroyo (2013) são claros quando ressaltam que a condição para a existência de práticas inovadoras depende da existência de sujeitos que as produzam. Na escola básica, esse perfil de sujeitos inovadores encarna em atores escolares diretamente ligados às práticas educativas: os professores. Nesse sentido, as atividades acadêmicas cotidianas do processo de formação docente representam fonte fecunda para a instrumentalização profissional de professores que buscam em suas intervenções educativas na escola um sentido contemporâneo de vertente inovadora, e não somente reprodutora de práticas de outrora.

Para isso, em primeiro lugar, faz-se importante entender que um primeiro aspecto relacionado a apreensão sistemática e reconhecimento da relevância educacional da inovação, na formação, baseia-se na atitude epistemológica de graduandos, especialmente, frente ao campo de conhecimento da Educação Física. O conceito de curiosidade epistemológica de Freire (1996) é chave para essa compreensão.

Freire (1996) reflete que uma prática educativo-crítica é aquela que incorpora a curiosidade epistemológica como um de seus fundamentos. Para o educador, “a construção ou produção do conhecimento do objeto implica o exercício da curiosidade” (p. 95), o que sugere o distanciamento em relação a dado objeto ou fenômeno aprendido, tornando o sujeito que aprende capacitado criticamente, oportunizando a ele observá-lo atentamente, delimitá-lo, e, com isso, vislumbrar possibilidades. Superando a ingenuidade frente ao conhecimento, segundo Freire (1996), a curiosidade epistemológica tem na rigorosidade metódica a base de sua existência.

Desse modo, compete à formação da licenciatura em Educação Física tomar como princípio a curiosidade epistemológica, no sentido freiriano, com vista a tratar a inovação como tema para aprendizagem com rigor, experimentação e reflexão. A inovação, segundo essa acepção, representa um dos conceitos que questiona a tradição da Educação Física, reconhece a função social contemporânea da escola, “qual seja, formar o cidadão para atuar criticamente na vida pública, visando à construção de uma sociedade mais democrática” (NEIRA; NUNES, 2009, p. 92) e, em diálogo com Freire (2016), possibilita ao trabalhador social a ruptura com a estabilidade ao agir com inquietude em favor da mudança.

A curiosidade epistemológica pode ser exercida, no processo formativo, nas atividades de pesquisa. Tomadas como princípio formativo da docência, quanto mais a atitude de investigação das atividades docentes e da realidade escolar (PIMENTA, 1999) é desenvolvida em estudantes em formação, mais processos de inovação podem ser realizados em seu campo de trabalho futuro. Segundo Fino (2011), a aliança entre a investigação (da prática) com o intuito de inovar é fundamental para a geração de práticas transformadoras. André (2016) contribui com a discussão ao conceber a formação inicial como espaço de desenvolvimento profissional do professor crítico-reflexivo, autônomo em seu agir, e que busca na pesquisa possibilidades para atuação na escola.

Na dimensão extensiva, de experimentação, o cotidiano vivido da formação docente em Educação Física, articulado as atividades de ensino e pesquisa, precisa assumir e se mostrar favorável ao estímulo a uma cultura de inovação por parte de graduandos. Mais do que orientações normativas, o próprio cotidiano precisa se mostrar dinâmico no sentido de inspirar e propor o desenvolvimento de atividades que incentivem os discentes a reconhecer uma inovação e como ela pode ser sistematizada nos saberes que compõem o campo da Educação Física na escola, ainda que isso não seja tarefa primária dos cursos de licenciatura da área.

Uma formação para a inovação demanda, como tarefa central, a aprendizagem dos conhecimentos da Educação Física em suas múltiplas dimensões; pedagógicas, humanas, biológicas, sociais, técnicas e outras; para, a partir disso, desenvolver em discentes a capacidade de inovar com eles na escola. Essa capacidade pode ser desenvolvida em distintos âmbitos: nas ditas “aulas práticas”; no estágio supervisionado; bem como na construção de uma rede de discussão, problematização, estímulo e produção de práticas inovadoras entre docentes e discentes, alicerçada em princípios estratégicos a elas inerentes, como, por exemplo, o ato coletivo que embasa a construção de inovações na escola (CANÁRIO, 1996; JESUS; AZEVEDO, 2020). As possibilidades são vastas e depende de cada contexto de formação mobilizar estratégias para colocá-las em ação.

Nesse contexto, é importante também entender que desenvolver capacidade para produzir inovação não é sinônimo de ensinar como ser inovador. Aquela se refere à concepção de inovação como criação de condições para a mudança e invenção de novas práticas (ARROYO, 2013), enquanto esta a reduz, a coloca numa posição acrítica, pois desconsidera a autonomia dos estudantes em formação. Essa concepção se assemelha ao movimento de reprodução do campo formativo do ensino superior da Educação Física. Nesse caso, a inovação seria reproduzida mecanicamente.

A inovação como princípio de criação se refere às inovações classificadas como voluntárias, nas quais futuros professores subentendem-se como sujeitos plenos e autônomos no modo como agem, fazem e pensam suas práticas (MESSINA, 2001, p. 231). Segundo conclui a autora, três ações centrais são delegadas a esses sujeitos, “a) que expressem e escutem sua voz interior; b) que realizem a reflexão na ação (na, sobre e para a ação) e c) que desenvolvam uma mentalidade para assumir riscos”.

Exemplo da inovação como princípio criativo está em sua relação com o currículo escolar. Tendo em conta que a inovação parte de concepções previamente articuladas na subjetividade de quem a produz, a concepção epistemológica, entendida como concepções globais sobre conhecimento que incidem numa ideologia de educação com repercussão na prática, permite a professores significá-lo social e educativamente, principalmente no currículo (SACRISTÁN, 2017).

O inovar no currículo revelaria o modo como ocorre a interpretação e modelação que professores fazem dele na escola, a partir de concepções epistemológicas e da mobilização de princípios e teorias curriculares. A modelação curricular, conforme discute Sacristán (2017), representa o primeiro nível de decisão que parte exclusivamente do docente com base em seus constructos pessoais e em sua mediação curricular subjetiva. Acima de tudo, significa uma prática que atribui aos professores um caráter ativo no processo de interpretação do currículo que antes lhe fora apresentado. A atitude de modelação, portanto, reflete o modo como professores desenvolvem e realizam suas atividades pedagógicas.

Assim, caso a atitude docente esteja na modelação curricular, a inovação representa uma de suas fontes, uma vez que, com ela, as práticas pedagógicas ocorrerão com sentido ampliado relativamente ao conteúdo prescrito no currículo, favorecendo a existência de práticas transformadas, novas. Logo, na formação docente, o desenvolvimento da capacidade para entender o currículo, concebê-lo epistemologicamente e modelá-lo figura como ação que favorece a capacidade de inovar de graduandos. Neste ensejo, a experimentação discente de construção e desenvolvimento de currículos (PACHECO, 2007) de Educação Física, baseada nas concepções política e epistemológica do sujeito em formação, assume notória importância.

Dentre outras atividades acadêmicas no ensino superior capazes de estimular a inovação e seu desenvolvimento na escola, importa evidenciar que o ímpeto por práticas revistas, de natureza transformada, é condição para, no campo acadêmico, possibilitar a formação do perfil profissional inovador com o conhecimento na Educação Física (BRASIL, 2018) e, no campo escolar, o trato com qualidade dos saberes e fenômenos do componente curricular, visando a formação educativa integral de estudantes da educação básica (MALDONADO; SILVA, 2017), em perspectiva emancipatória, democrática e política.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As reflexões apresentadas neste estudo revelam que a inovação historicamente esteve a margem dos processos formativos da Educação Física no Brasil, sejam eles escolares ou a nível superior. Mais do que isso, um modelo de formação pautado na reprodução da lógica social em vigência no século XX atribuiu, até hoje, ao campo da formação docente da Educação Física uma marca identitária condizente com os objetivos visados por essa disciplina na escola moderna, contrários às intenções que possui na escola contemporânea.

Com esse cenário, a formação inicial da licenciatura em Educação Física se depara com um desafio: pensar a inovação como fenômeno pertencente a suas ações, de modo a visar o desenvolvimento profissional de professores que a reconheça, a experimente e a considere em suas atividades de ensino na escola básica.

Em relação a essa intenção, vimos que as DCNEF vislumbram, ainda que minimamente, elementos que favorecem a aprendizagem refletida dos processos de inovação na licenciatura em Educação Física, cabendo aos projetos e currículos dos cursos preverem momentos e concepções articulados a esse fenômeno educacional.

Paralelamente, julgamos pertinente ressaltar que o cotidiano formativo do ensino superior representa lugar onde as experiências com a inovação do conhecimento e das práticas ocorrem com mais efetividade, dado o fato de caracterizar, por excelência, espaço aberto às possibilidades, experimentações, reflexões e construção de práticas por vezes silenciadas nos projetos ou currículos de cursos de graduação para formação de professores da licenciatura. Como aludimos, a modelação curricular representa, nesse sentido, um dos conceitos que, no ensino superior, viabilizam a inovação no currículo, atribuindo a esse objeto educacional um caráter ampliado, dinâmico e flexível, favorecendo, consequentemente, a existência de práticas inovadoras na Educação Física, na educação básica.

Assim, as bases teórico-normativas e vivenciais que impulsionam o trato com a inovação no ensino superior da licenciatura em Educação Física se apresentam como norte para uma intenção maior, a qual reside na preocupação com a qualidade da educação ofertada no interior da escola. Os desafios para isso são enormes. A imersão em uma aventura dessa natureza nunca foi tão urgente. Ao mesmo tempo, nunca a Educação Física esteve tão preocupada, como hoje, com a demarcação de suas intenções educativas. Cabe a formação docente para a licenciatura, bem como a produção teórica da Educação Física, mobilizar esforços nesse sentido

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PUBLISHER Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Educação Física. LaboMídia - Laboratório e Observatório da Mídia Esportiva. Publicado no Portal de Periódicos UFSC. As ideias expressadas neste artigo são de responsabilidade de seus autores, não representando, necessariamente, a opinião dos editores ou da universidade

EDITORES Mauricio Roberto da Silva, Giovani De Lorenzi Pires, Rogério Santos Pereira

EDITOR DE SEÇÃO Rogério Santos Pereira

REVISÃO DO MANUSCRITO E METADADOS João Caetano Prates Rocha; Keli Barreto

Recebido: 24 de Março de 2021; Aceito: 28 de Junho de 2021

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