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Roteiro

versão On-line ISSN 2177-6059

Roteiro vol.45  Joaçaba jan./dez 2020  Epub 28-Abr-2020

https://doi.org/10.18593/r.v45i0.20066 

Artigos de Demanda Contínua

O Programa Horizonte 2020 da União Europeia e a perspectiva universidade de classe mundial: aproximações e tendências

The European Union Horizon 2020 program and the world class university perspective: approaches and trends

Le Programme Horizon 2020 de L’union Européenne et la perspective universitaire de classe mondiale: approches et tendances

Lara Carlette Thiengo1I  , Professora Adjunta
http://orcid.org/0000-0003-3593-4746

Lucídio Bianchetti2II  , Professor Aposentado
http://orcid.org/0000-0001-9748-5646

IUniversidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Professora Adjunta

II Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina, Professor Aposentado


Resumo:

Neste artigo analisamos o Programa-Quadro da União Europeia (UE) para a Investigação e a Inovação - Horizonte 2020, lançado pela Comissão Europeia em 2014, como parte da Estratégia Europa 2020. O objetivo é demonstrar como este Programa é estruturado/fundamentado a partir de elementos da concepção de World Class University, (Universidade de Classe Mundial) que vem sendo difundida pelos Organismos Internacionais, especialmente o Banco Mundial, Think-Thanks, especialistas e rankings acadêmicos. Para isso, em termos teóricos-metodológicos, utilizamos o levantamento bibliográfico e a análise documental, buscando compreender as totalidades das relações/fenômenos, bem como as contradições, influências, relações de força e projetos em disputa que os atravessam. Por ora, compreendemos que H2020 “coroa” o longo processo de relativização de determinada universidade europeia, instaurando/reforçando uma concepção de universidade que vai ao encontro de características do modelo de excelência ou de classe mundial.

Palavras-chaves: World Class University; Horizonte 2020; Educação Superior

Abstract:

In this article we analyze the Horizon 2020 Program - Framework Program for Research and Innovation - launched by the European Commission in 2014, as part of the Europe 2020 Strategy. The objective is to demonstrate how this Program is structured/fanned by elements of the conception of World Class University that is being disseminated by International Organizations, especially the World Bank, Think-Thanks, experts and academic rankings. For this, in theoretical-methodological terms, we use the bibliographical survey and the documentary analysis, seeking to understand the totality of the relations / phenomena, as well as the contradictions, influences, power relations and projects in dispute that cross them. For the time being, we understand that H2020 “crowns” the long process of relativization of a particular European university, establishing/reinforcing a university concept that meets the characteristics of the model of excellence or world class.

Key words: World Class University; Horizon 2020; European University.

Résumé:

Dans cet article, nous analysons le programme-cadre de recherche et d'innovation de l'UE - Horizon 2020, lancé par la Commission européenne en 2014, dans le cadre de la stratégie Europe 2020. L'objectif est de démontrer comment ce programme est structuré/ élaboré à partir d'éléments de conception World Class University, qui est diffusé par des organisations internationales, notamment la Banque mondiale, Think-Thanks, des spécialistes et des classements académiques. Em termes théorico-méthodologiques, nous utilisons l'enquête bibliographique et l'analyse documentaire, en cherchant à comprendre la totalité des relations / phénomènes, ainsi que les contradictions, les influences, les relations de pouvoir et les projets en litige qui les traversent. Pour le moment, nous comprenons qu'H2020 couronne le long processus de relativisation d'une université européenne donnée, en établissant / renforçant un concept universitaire qui répond aux caractéristiques du modèle d'excellence ou de classe mondiale.

Mots clés: Université de classe mondiale; Horizon 2020; Université Européenne.

1 INTRODUÇÃO

Neste artigo, que é parte de discussões elaboradas em tese de doutorado (THIENGO, 2018), analisamos o Programa-Quadro para a Investigação e a Inovação - Horizonte 2020 (H2020), lançado pela União Europeia (UE), em 2014. Nossa intenção é demonstrar como este Programa é estruturado/fundamentado a partir de elementos da concepção de World Class University, que também vem sendo denominada Universidade de Classe Mundial (UCM) ou Universidade de Excelência.

Partimos do entendimento que o modelo de UCM refere-se à constituição de universidades ou grupo de universidades que tenham um propósito específico, que seria o de representar globalmente o ensino superior nacional em sua capacidade de gerar desenvolvimento econômico e conhecimento na área científica, tecnológica e de inovação. (THIENGO, 2018a), tornando-se um slogan para o desenvolvimento da capacidade de competição em um mercado global de educação superior (ALTBACH et al., 2012).

Para Salmi (2009), a UCM é identificada a partir de um conjunto de características ou (pré)condições, tais como: uma alta concentração de talentos (professores e alunos); abundantes recursos para oferecer um ambiente de aprendizado rico e conduzir pesquisa avançada; e características favoráveis de governança que incentivem visão estratégica, inovação e flexibilidade, permitindo que as instituições tomem decisões e gerenciem recursos sem se sobrecarregarem com burocracia.3

A emergência/difusão deste modelo de universidade, contudo, faz parte de um processo mais amplo de reformas da educação superior que vêm ocorrendo nas últimas décadas e têm como características centrais: a expansão dos sistemas de educação superior; internacionalização a partir dos processos de mobilidade e cooperação (MOROSINI, 2011); e o aprofundamento da diversificação (diferenciação) e flexibilização das Instituições de Educação Superior (IES) e das modalidades de ensino e pesquisa considerando o caminhar para a estruturação de uma “universidade mundial” (SGUISSARDI, 2005).

Essas transformações estão articuladas à centralidade assumida pelos Organismos Internacionais (OIs) na proposição/indução de políticas e à reconfiguração do papel do Estado (LIMA, 2005), e às aceleradas transformações decorrentes do processo de mundialização do capital (CHESNAIS, 1996), considerando as novas finalidades requeridas à universidade no âmbito do regime de predominância financeira: a produção de conhecimento e matéria-prima (SILVA JÚNIOR, 2017).

Desse modo, no período que se inicia após a Segunda Guerra Mundial e adquire culminância a partir da década de 1980, essa nova dinâmica expressa a emergência, ainda que de modo informal, do modelo norte-americano de Universidade de Pesquisa (MOURA, 2012) ou, como afirma Silva Júnior (2017), a New American University, o que indica que as bases da concepção de UCM já estavam colocadas no referido período. Nesta direção, como indicam Mollis (2006), Moura (2012) a atividade de pesquisa de base pragmática e utilitarista no interior da universidade torna-se o elemento central de um modelo de exportação e adequação, recebido e transplantado para muitos países, servindo de “paradigma-fonte de investimento para instituições locais de ensino superior” (MOURA, 2012, p. 16).

Assim, apesar de as universidades consideradas de excelência ou classe mundial limitarem-se a um grupo muito pequeno de instituições que procuram estar no topo dos sistemas nacionais e internacionais de educação, ganha destaque a constatação de que um número crescente de países e pessoas estão se juntando à corrida para construir UCMs por meio do estabelecimento de iniciativas especiais, tais como a concessão de fundos adicionais para universidades selecionadas. Dentre eles, para além de esforços individuais dos governos de alguns países europeus como Alemanha, França e Reino Unido, percebemos que a UE, em sua dimensão de bloco, também vem orientando o mais recente Programa-Quadro de financiamento a partir da perspectiva de excelência.

Considerando o exposto, ao longo deste texto, dedicamo-nos a pontuar especificamente o Programa Horizonte 2020 e suas aproximações com a concepção de UCM, bem como a relevância de pensar as transformações da educação superior em nível global, bem como suas relações em América Latina. Para isso, em termos teóricos-metodológicos, utilizamos o levantamento bibliográfico e a análise documental, à luz do materialismo histórico, buscando compreender as totalidade das relações/fenômenos, bem como as contradições, influências, relações de força e projetos em disputa que os atravessam. O corpus documental foi composto por documentos da Comissão Europeia, Parlamento Europeu e também publicações dos OIs e seus especialistas.

2 POR QUE OLHAMOS PARA A UNIÃO EUROPEIA?

Antes de atermos nossa análise ao Programa em questão, faz-se importante destacar por quais motivos precisamos voltar nossas atenções para os movimentos da UE no que se refere à Educação Superior. Duas questões devem ser especialmente frisadas. A primeira delas se refere ao fato de este Programa indicar uma aproximação mais explícita da UE ao modelo norte-americano de educação superior, a partir das bases conferidas pelo Processo de Bolonha (PB), a despeito da tradição europeia sobre este área (THIENGO, 2018). A segunda questão refere-se ao protagonismo que os blocos e entidades de caráter supranacional vêm adquirindo no âmbito da governança global da educação superior. Neste contexto, a UE representa uma das formas institucionais mais avançadas neste domínio, uma vez que este bloco tem assumido, progressivamente, um papel mais ativo na área das políticas sociais.4

Grek (2016) afirma que, apesar da regra da subsidiariedade, as inúmeras transformações ocorridas no âmbito da educação, notadamente no da educação superior, ao longo das últimas três décadas sugerem que a governança do bloco em relação ao ensino superior está, de fato, acontecendo.

Ainda de acordo com a referida autora, é preciso considerar duas fases da governança na UE: a fase inicial, quando desenvolveram uma forma persuasiva para governar a educação europeia a partir de dados e números (soft governance), e a fase desenvolvida, quando a aliança com a OCDE passou a permitir a vigilância mútua, exercida por meio do monitoramento de desempenho e comparação (GREK, 2016).

Entendemos, pois, que a UE desempenha um papel de relevo na rede de políticas educativas globais, na medida em que difunde visões de mundo, modelos e experiências que têm repercussões diretas nas formas de pensar e fazer educação.

Sobre esse aspecto, é importante perceber que a “eficácia” da influência europeia sobre os outros continentes, como, por exemplo, a América Latina, está relacionada, para além dos laços culturais e econômicos, à cooperação promovida no âmbito de vários programas europeus e também às estratégias de difusão dessa concepção cooperativa no âmbito acadêmico, por meio de palestras, seminários, grupos de apoio à participação dos demais países em projetos europeus e até mesmo, em alguns casos, da atuação de agências ou de representantes dos programas ou da Comissão Europeia de modo geral. Essas estratégias de cooperação e a abertura de convocatórias para mobilidade são, além de uma forma de atração e captação de talentos, um modo de difusão de uma concepção ou concepções de educação superior.

Tendo em vista o exposto, no item que segue passamos a apresentação do Programa em questão.

3 O PROGRAMA HORIZONTE 2020 (H2020)

A busca pela excelência acadêmica e científica na UE compõe uma estratégia de soerguimento do bloco, que tenta resgatar a sua hegemonia política e econômica em relação aos EUA e, particularmente, em relação ao poder de atração de estudantes e professores por parte das suas universidades. De acordo com Robertson (2009), outros elementos também compõem este contexto no qual a UE passa a dinamizar uma série de reformas educacionais. Alguns deles são: a competitividade cada vez mais acirrada entre países e blocos, com a ascensão de países asiáticos, sobretudo a China; a criação dos polos de educação superior na região árabe; a Área Alternativa das Américas; a emergência dos rankings acadêmicos internacionais5 e o aprofundamento do neoliberalismo.

Ante esta conjuntura, o processo de “modernização” das universidades europeias tem como direcionamento alcançar a “Europa do Conhecimento” e construir a “União da Inovação” para uma economia baseada em conhecimento. Este movimento iniciou com o PB, assinado em 1999, tendo continuidade com o alargamento desse processo - Bolonha 2020 -, os quais conferem bases para implantação de um novo Programa-Quadro europeu para investigação e inovação, o Programa H2020, que compõe a Estratégia Europa 2020.

O Programa H2020 foi lançado pela Comissão Europeia em 2014, como parte da Estratégia Europa 2020. Em novembro de 2011, a Comissão apresentou o pacote legislativo relativo ao H2020, um programa-quadro para o período 2014-2020. O Programa congrega fontes já existentes de financiamento à investigação e à inovação, a saber: o Programa-Quadro para a Competitividade e a Inovação (PCI) e Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia (EIT) - em um único programa. 6 Desse modo, entendemos que o H2020 expressa a forma mais avançada7 - no âmbito das políticas públicas - da promoção da excelência acadêmica e científica no âmbito do bloco europeu.

Efetivamente, o H2020 foi criado pelo Parlamento Europeu por meio do Regulamento n. 1291, em 2013 (PARLAMENTO EUROPEU; CONSELHO EUROPEU, 2013), como um instrumento financeiro para a implementação da União da Inovação, iniciativa emblemática destinada a assegurar a competitividade global da Europa. Visto como um meio para impulsionar o crescimento econômico e criar postos de trabalho, o H2020 tem o apoio político dos líderes europeus e dos membros do Parlamento Europeu, convergindo na compreensão de que a investigação é um investimento no futuro que deve estar no centro do plano da UE, a fim de promover o crescimento econômico e a geração de empregos.

As medidas específicas do H2020 (PARLAMENTO EUROPEU; CONSELHO EUROPEU, 2013) incluem:

Unir os esforços de instituições de investigação de excelência e congêneres de desempenho inferior para criar ou desenvolver centros de excelência (grifo nosso);

Germinar instituições, incluindo intercâmbio de pessoal, visitas de peritos e cursos de formação;

Estabelecer cátedras no Espaço Europeu de Investigação (EEI) para atrair acadêmicos de renome para instituições com elevado potencial;

Criar um mecanismo de apoio às políticas, para ajudar a melhorar a investigação e a inovação nacionais e regionais;

Oferecer melhor acesso às redes internacionais a investigadores e inovadores de nível excelente (grifo nosso);

Reforçar as redes transnacionais dos Pontos de Contato Nacionais para que possam prestar melhor apoio aos potenciais participantes.

O argumento apresentado pela Comissão Europeia está fundamentado no entendimento de que, ao associar investigação à inovação, o H2020 contribui com a excelência científica, a liderança industrial e a resolução de desafios sociais, sendo estes os três pilares do Programa.

O pilar “Excelência Científica” é orientado a partir de áreas programáticas, visando apoiar ideias novas e com risco elevado, de forma a acelerar o desenvolvimento em áreas emergentes da Ciência e da Tecnologia, bem como a construção de novas tecnologias futuras. Para tanto, além de impulsionar a competitividade, considera-se apoiar abordagens novas e não convencionais, investigação fundamental, pesquisas de longo prazo e de inovação tecnológica em temas selecionados e pesquisa voltada para objetivos, enfrentando-se assim os grandes desafios da área de Ciência e Tecnologia, com investimentos diretos em infraestruturas de investigação e financiamento para infraestruturas físicas e eletrônicas de classe mundial, acessíveis a todos os investigadores.

No pilar “Liderança Industrial” a ênfase recai sobre investigação nas áreas e temas tecnológicos considerados “essenciais” - nanotecnologias, materiais avançados, biotecnologias, entre outras - e também a facilitação do acesso a capitais de risco para financiamento da investigação e da inovação. De acordo com dados da própria Comissão, os programas de trabalhos publicados até a última chamada (COMISSÃO EUROPEIA, 2015a) cobrem um número limitado de áreas, de modo a permitir a concentração de esforços e de recursos, sob o argumento de maximizar o seu impacto.

Já o pilar “Desafios Societários” é apresentado como forma de oferecer respostas às grandes preocupações dos cidadãos europeus, a saber: saúde, crescimento demográfico e bem-estar; segurança alimentar, agricultura sustentável e proteção das florestas, investigação marinha e marítima e bioeconomia; energia segura, limpa e eficiente; transporte inteligente, verde e integrado; ação climática, recursos eficientes e matérias-primas; sociedades inclusivas e inovadoras; sociedades seguras.

Apesar do apelo humanitário atrelado a esses desafios - que em grande medida correspondem a preocupações reais e importantes -, essas áreas também podem ser compreendidas como estratégicas, tendo em conta as contradições do sistema de acumulação de capital. Ou seja, a UE pauta a sua agenda científica e tecnológica a partir dos “efeitos colaterais” do próprio sistema, buscando a liderança desses setores.

O objetivo apresentado pelo Programa, então, é assegurar que a Europa produza ciência de nível mundial, elimine as barreiras e facilite a colaboração entre os setores público e privado na promoção da inovação. Para isso, com o H2020, visa-se identificar potenciais centros de excelência em regiões com um baixo desempenho, a fim de proporcionar-lhes aconselhamento e apoio à consecução de políticas, permitindo assim que os Fundos Estruturais da UE sejam utilizados para melhorar a infraestrutura e os equipamentos.

Em termos financeiros, o orçamento destinado ao H2020 está projetado em aproximadamente 80 bilhões de euros, sendo o instrumento com maior financiamento da história da UE especificamente orientado para o apoio à investigação. Por meio do H2020 cofinancia-se projetos de investigação e inovação, os quais preveem investimentos ao longo de sete anos, distribuídos em três grandes áreas prioritárias elencadas no Programa. No Gráfico 1, é possível visualizar essa distribuição:

Fonte: Comissão Europeia (2014).

Gráfico 1 Divisão Orçamentária do H2020 (UE) 

O acesso dos países ao financiamento é feito com base em convites concorrenciais - chamadas abertas por áreas -, de modo que não há cotas ou orçamentos previamente definidos para cada país ou área. As decisões sobre o financiamento são tomadas depois que todas as propostas de projetos são avaliadas, de forma independente, pelo H2020 e suas agências.

Com efeito, determinados países ou organizações de investigação têm um desempenho melhor do que outros, o que indica a concentração de recursos em determinados centros, ainda que no plano propositivo (discursivo) o financiamento para promoção da ciência de excelência seja apresentado como uma possibilidade ao alcance de todos.

De acordo com os dados divulgados em 2017 pela Comissão Europeia sobre o montante de recursos angariados por cada país nas seleções dos projetos nos primeiros anos do Programa, do total de financiamentos (aproximadamente 20 bilhões de euros), a Alemanha conseguiu 17%, seguida respectivamente do Reino Unido, com 16,5%, da França, com 11,1%, e da Espanha, com 9,8%.

Do mesmo modo, de acordo com o documento Horizonte 2020: Primeiros resultados (COMISSÃO EROPEIA, 2015a), o número de candidaturas também foi maior nos seguintes Estados-membros: Itália, Espanha, Reino Unido, Alemanha e França.

Ainda é importante considerar o direcionamento do financiamento por temas de pesquisa. No seminário O Papel da Ciência na Diplomacia, realizado pela Comissão Europeia em 2015, foi enfatizada a necessidade de escolher áreas prioritárias para coordenação internacional, que, “apesar de complexa, seja exequível e traga benefícios concretos para todos” (COMISSÃO EUROPEIA, 2015b, p. 1). No Gráfico 2, tendo em vista os primeiros resultados do Programa, apresentados pela própria Comissão Europeia (2015a), identifica-se a distribuição do financiamento por temas:

Fonte: Comissão Europeia (2015).

Gráfico 2 Financiamento por áreas de pesquisa 

A partir do exposto no Gráfico 2 e nos documentos orientadores do Programa, percebemos a ênfase no financiamento em áreas estratégicas em detrimento de outras de menor apelo mercadológico, o que indica que a excelência almejada em termos científicos está intrinsecamente relacionada aos desígnios do capital.

Do mesmo modo, verificamos um forte incentivo para que as instituições formem alianças entre si, sobretudo em âmbito regional, o que torna as parcerias uma condição quase obrigatória para captar os fundos.

4 “HORIZONTE” EUROPEU PARA 2020: UNIVERSIDADES DE CLASSE MUNDIAL?

As características centrais para o alcance de excelência ou de status de classe mundial propalada pelos OIs também podem ser percebidas no processo de modernização das universidades europeias, no âmbito do PB e, especialmente, nas proposições do H2020, ainda que este não esteja relacionado apenas às universidades ou ao conjunto específico delas. Desse modo, neste item, discutimos a forma como cada uma dessas características remetidas às UCMs são apresentadas nos documentos da UE no que concerne à promoção de determinada concepção de excelência e de diferenciação da educação superior.

O objetivo de “promover a excelência” tem ganhado maior expressividade na última década, no âmbito do lançamento da Estratégia Europa 2020 e do H2020, visto que uma das medidas específicas deste último é “unir os esforços de instituições de investigação de excelência e congêneres de desempenho inferior para criar ou desenvolver centros de excelência” (COMISSÃO EUROPEIA, 2014, p. 16).

Neste sentido, a proeminência dada a esta questão no cenário europeu tem enfatizado a preocupação com a visibilidade internacional de algumas instituições, em muito associada à proliferação dos rankings e também à ampliação do número de fusões, com o objetivo de criar instituições ou redes de excelência8 ou de classe mundial.

De acordo com Pacheco (2003, p. 25), o estatuto europeu como centro de excelência depende do reconhecimento de uma identidade europeia que ainda não existe. Assim, o modelo europeu segue o modelo norte-americano com um objetivo explícito: “criar na Europa um centro de excelência no nível da educação, formação e investigação científica e tecnológica por meio do desenvolvimento de recursos humanos de elevada qualidade”.

No H2020, a noção de excelência é associada à construção de alguns centros de investigação de elite orientados para áreas estratégicas, capazes de atrair pesquisadores de renome internacional. Para alcançar esta concepção de excelência, estes centros teriam como objetivo promover a competitividade, reforçar a posição da UE enquanto líder mundial na produção de ciência e desenvolver as soluções dos desafios societais propostos. Isto é, o financiamento de projetos pelo H2020 tem como único critério “a excelência científica em qualquer área de investigação, levada a cabo por equipes de investigação individuais, quer nacionais quer multinacionais, lideradas por um investigador principal” (COMISSÃO EUROPEIA, 2014, p. 23).

Isso significa que a excelência, além de um objetivo a ser alcançado ou reforçado, também é considerada pelo Programa um critério para financiamento, ainda que uma definição precisa do que confere excelência às IES ou aos projetos não apareça de forma explícita nos documentos. A noção de excelência como sinônimo de qualidade, assentada em um viés pragmático da ciência, que faz parte do imaginário social neoliberal compartilhado nas últimas décadas, parece ser reforçada e induzida pelos documentos, direcionando a reprodução de padrões e normas estabelecidas sobre qualidade, ciência e universidade.

A noção de excelência também é utilizada pelo Programa para identificar certos níveis de pesquisadores - os “pesquisadores de nível excelente”, que também são descritos como jovens investigadores em nível de excelência, talentos ou talentos em nível de excelência, cérebros e cientistas inovadores, que, como mencionamos anteriormente, devem ser a todo custo atraídos para a UE (COMISSÃO EUROPEIA, 2014). Outra característica interessante é que esta categoria de pesquisadores deve estar apta a trabalhar em parceria com empresas inovadoras, garantindo assim “a promoção da excelência requerida pelo bloco”.

Entretanto, outra vez fica implícito o significado do que, efetivamente, seria um pesquisador de excelência, o que nos leva a inferir que este tipo de profissional deve responder às mesmas características do que configura, nestes documentos, a excelência científica, a saber: oriundo de áreas consideradas estratégicas; comprometido com o desenvolvimento de inovação; disponível e preparado para a mobilidade geográfica e institucional e que esteja em consonância com a dinâmica do setor privado. Se considerarmos ainda que o H2020 é um desdobramento do interesse da UE em recuperar a liderança das suas universidades galgando posições nos rankings mundiais, os critérios de seleção destes pesquisadores também estarão associados ao número de medalhas, patentes e publicações, o que reforça a lógica meritocrática, quantitativa e exclusivista da ciência.

Este processo de criação de polos de excelência no cenário europeu faz parte de um movimento mais amplo de massificação e de diferenciação das modalidades de oferta da educação superior, em que as finalidades e a estrutura das IES passam a ser formatadas em função de prioridades estratégicas.

Outra questão relevante refere-se aos processos de internacionalização e mobilidade acadêmica, os quais, para a Comissão Europeia, são aspectos centrais para a conquista da excelência acadêmica e científica, motivo pelo qual são considerados elementos da competição mundial pelo talento.

Por intermédio dos documentos, a Comissão afirma que a atuação se concentra no desenvolvimento de uma estratégia global de internacionalização que signifique, acima de tudo, posicionar as IES, os seus alunos, investigadores e pessoal, os sistemas nacionais ligados às várias atividades relevantes relacionadas à investigação, à inovação e ao ensino superior, em um plano mundial, de acordo com o seu perfil individual, as necessidades do mercado de trabalho e a estratégia econômica do país.

De um modo geral, os documentos apresentam a necessidade de promover a atratividade europeia. Assim, um dos objetivos do H2020 é promover a UE como destino de estudo e investigação para os melhores talentos de todo o mundo, e, para esse fim, apoiar a criação e o desenvolvimento de estratégias de internacionalização por parte das instituições europeias de educação superior, como podemos perceber no seguinte excerto: “O Horizonte 2020 reforçará a posição da UE enquanto líder mundial na área de ciência, atraindo os cérebros mais brilhantes e ajudando os cientistas a trabalharem em estreita colaboração e a partilhar ideias em toda a Europa.” (COMISSÃO EUROPEIA, 2014, p. 7).

Neste mesmo sentido, o Programa prevê o favorecimento de relações internacionais, até mesmo com instituições de outros países, com o intuito de ampliar o reconhecimento acadêmico, reter talentos e promover o mercado da mobilidade acadêmica, que se apresenta como uma dinâmica em franca expansão. Percebe-se que a Comissão trata com bastante destaque as condições de promoção da internacionalização, considerando também promover facilidades e direitos para os cidadãos que migrarem para a UE.

Sendo assim, compreende-se a centralidade da internacionalização e a atratividade de estudantes internacionais em dois campos: concentração de talentos e movimentação de recursos. De acordo com o documento (COMISSÃO EUROPEIA, 2013, p. 9, grifo nosso):

O peso econômico do ensino superior internacional está aumentando rapidamente. Alguns países, incluindo destinos populares como o Reino Unido, o Canadá, os EUA e a Austrália, atribuem grande importância ao ensino superior enquanto serviço gerador de uma importante fonte de rendimentos (8,25 mil milhões de libras esterlinas no Reino Unido e 15,5 mil milhões de dólares australianos na Austrália em 2010) [...].

Neste contexto, a Comissão Europeia (2013, p. 10) destaca que, se desejam continuar a ser o principal destino em um contexto de concorrência crescente por parte da Ásia, do Médio Oriente e da América Latina, as IES europeias terão de agir de forma estratégica para explorar todos os benefícios do prestígio da Europa em termos de excelência do ensino superior. Isso significa que

as instituições de educação superior] terão de tornar-se ainda mais atrativas, promover ativamente a mobilidade internacional dos alunos e do pessoal, propor currículos inovadores de qualidade mundial e um excelente nível de ensino e oportunidades de investigação, e participar na cooperação e em parcerias estratégicas com outras IES, as entidades governamentais, o setor privado e a sociedade civil de todo o mundo. Além disso, terão de contribuir de forma mais significativa para o crescimento econômico, encorajando a inovação e garantindo que o ensino superior responda às necessidades do mercado de trabalho. (COMISSÃO EUROPEIA, 2013, p. 10, grifo nosso).

É importante salientar também que um dos argumentos apresentados pela Comissão Europeia para a promoção da mobilidade fundamenta-se na estimativa de que um aumento líquido de até um milhão de pesquisadores venha a se tornar necessário ao longo desta década, em virtude das demandas econômicas e sociais e do envelhecimento da população.

Percebemos também o uso recorrente de dados e números que promovem a constante “sensação de temor”, estabelecida pela competitividade com outros países não membros (além dos EUA). A China, por exemplo, é apontada como uma grande ameaça à “soberania europeia” em termos de instituições de ponta e atratividade de talentos.

Ademais, a proficiência em inglês é um elemento imprescindível para qualquer estratégia de internacionalização dos alunos, dos professores e das instituições.

Levando em consideração este contexto, é evidente que a competição global está aumentando e que a mobilidade dos estudantes é cada vez mais considerada como parte dessa agenda de concorrência. Para Van der Wende (2015), o fluxo de capital humano e financeiro na Europa, no que se refere à Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), poderia resultar no aumento da concentração das mentes em um número limitado de regiões, bem como na concentração de áreas disciplinares, privilegiando as engenharias, as ciências naturais e da vida e as ciências médicas, que já são mais internacionalizadas. Consequentemente, a investigação nestes domínios provavelmente tornar-se-á ainda mais concentrada em um número limitado de instituições.

É preciso considerar também que o crescimento da oferta de alta qualificação para uma parcela da força de trabalho nos países da UE traz consigo uma incompatibilidade de estágios, que pode emergir mais em certos países do que em outros. O fato cria o risco de um êxodo de trabalhadores altamente qualificados de países onde o desemprego é elevado para os países em que os empregos estejam disponíveis. Essa migração representa uma possível “fuga de cérebros” dos países em que os investimentos em P&D são baixos e a consequente concentração da força de trabalho mais qualificada em países com infraestrutura de pesquisa desenvolvida e altos níveis de investimento em P&D.

Desse modo, apesar dos aspectos positivos da mobilidade científica, como as potenciais oportunidades para uma maior integração e intercâmbio cultural entre os diversos países, devemos reconhecer que esta concentração coloca o modelo clássico de universidade europeia global sob pressão. Compreendemos, pois, que a internacionalização pode ser considerada uma estratégia crucial para a UE, especialmente no que está relacionado à atração de talentos. De acordo com a Unesco (2015, p. 25):

A Europa continua a ser um polo de excelência e cooperação internacional em pesquisa básica. O primeiro órgão de financiamento pan-europeu para a pesquisa de ponta foi criado em 2008: o Conselho Europeu de Pesquisa (ERC). Entre 2008 e 2013, um terço de todos os bolsistas do ERC foram coautores de artigos classificados entre 1% das publicações mais citadas em todo o mundo. Espera-se que o programa Horizonte 2020 para a pesquisa e a inovação, dotado com o maior orçamento de qualquer programa-quadro da UE (€ 80 bilhões), impulsione ainda mais a produção científica da UE.

Outro eixo importante ao qual está alinhado o Programa Europeu é a inovação. Assim como já aparece no próprio subtítulo do Programa H2020 - “programa-quadro de investigação e inovação da UE” - está explícita a articulação entre investigação e inovação como elemento fundamental para alcançar os níveis de desenvolvimento econômico desejados. Na documentação do Programa destaca-se que

[...] explorar o potencial da reserva de talentos da Europa e maximizar e disseminar os benefícios da inovação por toda a União é, por conseguinte, a melhor maneira de reforçar a competitividade da Europa e a sua capacidade para enfrentar os desafios societais no futuro. (COMISSÃO EUROPEIA, 2014, p. 16).

Neste âmbito, as alianças estratégicas em termos de processos e produtos e o investimento em inovação tecnológica permanente são considerados cada vez mais fundamentais, demandando maior aporte financeiro em pesquisa e tecnologia, assim como parcerias entre governo, universidades e institutos de pesquisa. Desse modo, o “Horizonte 2020 presta um enorme apoio à inovação para o desenvolvimento de protótipos, testes, demonstrações, atividades-piloto, validação de produção em larga escala e replicação no mercado” (COMISSÃO EUROPEIA, 2014, p. 17), sendo igualmente abrangidas novas modalidades de inovação no setor público e privado.

Sendo a Liderança Industrial um dos pilares do H2020, o Programa “apoia tecnologias revolucionárias necessárias para consolidar a inovação em todos os setores” (COMISSÃO EUROPEIA, 2014, p. 9), oferecendo acesso à capital de risco e financiamento para pequenas e médias empresas “altamente inovadoras”, uma vez que, de acordo com a Comissão Europeia (2014, 15), é preciso “levar boas ideias ao mercado”.

De acordo com dados da própria Comissão Europeia (2017a, p. 21), o H2020 parece estar respondendo a estas expectativas, uma vez que:

A adicionalidade do Horizonte 2020 é muito forte [...] 83% dos projetos Horizonte 2020 não teriam ido à frente sem o financiamento Horizonte 2020; [o Programa] ajudou a alcançar resultados mais rapidamente em 45% dos projetos, em comparação com o que poderia ter sido alcançado em âmbito nacional. (COMISSÃO EUROPEIA, 2017a, p. 20, tradução nossa).

Os argumentos utilizados pela Comissão ao longo dos documentos definem a situação dos empresários europeus como adversa e cheia de obstáculos para transpor suas ideias para uma dimensão comercial. Também são utilizados números e dados com o objetivo de comparar os EUA e a UE, demonstrando que esta investe 15 bilhões de euros a menos por ano em capitais de risco se comparada aos EUA, sendo necessário um acréscimo anual de mais de 100 bilhões de euros em investimento em Inovação e Desenvolvimento (I&D) de cariz empresarial para alcançar o objetivo dos 3% do PIB.

Os projetos financiados pelo H2020 devem ser orientados para os resultados suscitados pelo mercado, desenvolvendo centros de construção de tecnologias-chave articulados ao setor produtivo. Desse modo, no processo de seleção desses projetos, os proponentes precisam demonstrar como a exploração dos resultados gerará o impacto esperado e contribuirá para a economia europeia.

Assim como explicitamos anteriormente, entendemos que a ênfase na inovação tecnológica, de forma geral e também no âmbito da UE, são consequências da necessidade de redução dos custos e do tempo, no contexto de crise do capital, para a retomada dos níveis de acumulação e reversão da taxa decrescente de lucros. Por isso, a universidade é requisitada a atrelar-se mais estreitamente às necessidades de áreas estratégicas do setor produtivo.

É importante assinalar que parte do orçamento do H2020 é direcionado ao financiamento do Instituto EIT, às atividades de investigação realizadas no âmbito da pesquisa Tratado Euratom (Comunidade Europeia da Energia Atômica) e também ao Centro Comum de Investigação (Joint Research Centre - JRC).9

Destacamos o EIT, pois este reúne instituições de ensino superior, centros de investigação e empresas de nível excelente com vistas a criar os empresários do futuro e a garantir que o “triângulo do conhecimento” europeu possa ser comparado com o que há de melhor no mundo. A Comissão Europeia decidiu intensificar significativamente o seu apoio ao EIT, propondo um orçamento de 2,8 bilhões de euros (COMISSÃO EUROPEIA, 2011) para o período de 2014 a 2020, o que representa aumento substancial, tendo em vista os 309 milhões de euros estabelecidos desde o seu lançamento, em 2008.

O Instituto assenta-se em um conceito de plataformas de parcerias público-privadas transfronteiriças, designadas de Comunidades do Conhecimento e Inovação (Knowledge and Innovation Community - KIC). 10 As KICs podem candidatar-se ao financiamento no âmbito do H2020 e desenvolver um conjunto alargado de atividades, que cobrem o que a UE denomina de cadeia da inovação, a saber: programas de ensino e formação, desenvolvimento de projetos inovadores e de incubadoras de empresas e ainda reforço da ligação entre a pesquisa e os mercados.

Também faz parte do H2020 o Conselho Europeu de Investigação (Europe Research Concil - ERC), cuja atividade principal é disponibilizar financiamento atrativo e de longo prazo a investigadores notáveis e suas equipes que empreendem investigações de alto risco e grande impacto. A investigação no âmbito do ERC está orientada pelas seguintes diretrizes: excelência científica como principal critério para distribuição de fundos para investigação, contemplando propostas em qualquer domínio da investigação e pesquisadores em qualquer fase da carreira; gestão direta da investigação e de fundos atribuídos; supervisão direta da equipe e acesso à estrutura apropriada para investigação.

Segundo o relatório encomendado pelo think-thank europeu Bruegel (AGUION et al., 2008, p. 25), o ERC é o programa europeu com maior potencial para promoção da competitividade europeia, sendo considerado modelo base de excelência, ainda que seu financiamento não possa ser equiparado aos orçamentos de programas norte-americanos.

Busca-se, primordialmente, incorporar novas economias ao comércio mundial, uma vez que o avanço da ciência e do conhecimento permitiu uma conexão ainda maior entre países que compõe ou não o eixo dinâmico do capital, com o objetivo de ampliar a mais-valia relativa e a autonomia da esfera financeira. Percebemos que esse movimento ocorre na UE, sobretudo, a partir da estratégia de cooperação, a despeito dos seus aspectos positivos para os países, IES e seus quadros científicos. Compreende-se ainda que a ênfase na cooperação está articulada ao discurso de responsabilidade social e até mesmo a um tom humanitário, resguardando elementos que a associam à tradição socialdemocrata europeia.

Neste contexto, em face da integração econômica e da competitividade mundial, os mercados têm contribuído para a maior flexibilização dos processos de trabalho, para a mobilidade geográfica e para rápidas mudanças nas práticas de consumo, pouco importando que sejam profundamente alteradas as relações sociais e a vida organizacional destas sociedades. Sendo assim, a regulação dos sistemas de educação superior, como na UE, abrangendo todos os níveis e modalidades, está sendo subsumida a esta racionalidade ao buscar maior rendimento e maior produtividade definidos a partir de matrizes e parâmetros únicos.

Os doutorados industriais também fazem parte das Ações Marie Skłodowska-Curie. São iniciativas que conciliam a pesquisa acadêmica com o trabalho exercido em empresas, bem como outros tipos de formação inovadora que promovem a empregabilidade dos pesquisadores e o desenvolvimento das suas carreiras.

De forma mais ampla, podemos afirmar que o próprio nível de doutorado assume especial relevância nos objetivos da UE. De acordo com Haug (2012), é possível notar que os estudos de doutoramento estão se europeizando de forma rápida, em um contexto de crescente cooperação e concorrência entre universidades e países, o que favorece o mercado da mobilidade acadêmica e também a criação de centros de excelência formados por universidades, empresas e institutos de diferentes Estados-membros do bloco.

A educação e a qualificação para o trabalho tornaram-se, então, a base do discurso proferido pela UE, legitimando percursos formativos flexíveis, nos quais a ênfase recai sobre o desenvolvimento de saberes e competências múltiplas, continuamente atualizadas, em resposta às exigências pragmáticas da suposta sociedade do conhecimento e da inovação.

Tendo em vista o exposto, compreendemos que as universidades europeias vêm sendo transformadas em componente basilar de um sistema de inovação adequado às estratégias de desenvolvimento europeu, a partir da pesquisa e da exploração dos seus resultados, da cooperação industrial e da formação e atração de pesquisadores altamente qualificados (MOROSINI, 2011). As estratégias e programas desenvolvidos nas últimas três décadas vêm operando tais transformações, que são deflagradas com o H2020

Por fim, o terceiro eixo/característica do H2020 refere-se aos trâmites no âmbito da gestão, que, nesse Programa, é orientada pela simplificação de regras, gestão financeira e execução. Para tornar possível essa simplificação, o Programa reúne toda a gama de apoio à investigação e inovação em um quadro estratégico comum, incluindo uma série de regimes de financiamento simplificados, designadamente um conjunto racionalizado de formas de apoio, utilizando regras de participação com princípios aplicáveis a todas as ações.

A simplificação das regras de financiamento do Programa tem como objetivo reduzir custos administrativos de participação, contribuir para a prevenção e redução dos erros financeiros e acelerar o processo. Neste contexto, o financiamento de montante fixo visa deslocar o foco da verificação dos insumos (isto é, dos custos envolvidos) para a monitorização do desempenho e dos resultados, abrangendo todo o ciclo de vida do projeto, incluindo novas formas de auditoria.

Em 2017, o Programa foi revisado e introduziu uma nova definição de remuneração adicional para os investigadores, bem como simplificou a cobrança de outros custos das subvenções. Isto permitirá uma aceitação mais ampla das práticas contabilísticas e de gestão por parte dos beneficiários.11

A partir desta revisão está prevista também a racionalização do programa de trabalho H2020 para o período 2018 a 2020, que deverá ser ainda mais centrado em prioridades-chave. Desse modo, haverá menos tópicos e menos chamadas, com o objetivo de maximizar o impacto.

Outra questão importante refere-se à autonomia orçamental conferida aos projetos do H2020, que prevê a possibilidade de alocar recursos em pessoal, infraestrutura, entre outros, do modo como os proponentes considerarem adequado.

O H2020 incorpora essa lógica, ao selecionar projetos com base na excelência, estabelecer contratos, gerenciar resultados, além de funcionar como um incentivo financeiro para encorajar fusões institucionais e a concentração em áreas de pesquisa, associando de modo explícito a relação desempenho-financiamento.

Sobre os modelos flexíveis de gestão e a autonomia das universidades, destaca-se a gestão de pessoal, sobretudo na mudança do regime de contratação dos docentes, que, cada vez mais, deixam de ser contratados como funcionários públicos e passam a trabalhar sob regime de contratação temporária. Esta questão está diretamente articulada à ênfase na mobilidade e à atração de talentos no contexto europeu. Ou seja, para que a atração e a retenção desses cérebros ocorra com sucesso, deve existir a prerrogativa para a criação de salários competitivos e a possibilidade de atualização constante do quadro de profissionais.

De acordo com Aguion et al. (2008), esta é uma prática que já ocorre em vários países europeus e tende a ganhar cada vez mais expressividade.

Os desdobramentos dessas mudanças já podem ser observados no âmbito acadêmico a partir da imposição de uma hierarquia interna aos docentes de cada departamento e também pelo acirramento da competitividade entre pares no que se refere a salários, projetos, prêmios, entre outros. Sob essa lógica, o docente excelente precisa estar cada vez mais atento às demandas produtivas, estabelecendo relações com o setor privado e tendo como objetivo precípuo a produção da inovação em áreas estrategicamente induzidas.

Com tantas tarefas de ordem competitiva, inferimos que a atividade de ensino fique em segundo plano, bem como as demais atividades de vivência e reflexão sobre a universidade. Compreendemos, assim, que a racionalidade neoliberal se instaura de modo progressivo nas universidades europeias, mediante a elaboração de uma cultura acadêmica orientada pelos valores do mercado e pela busca por excelência, apesar dos movimentos de resistência em várias instituições ou países.

Também é preciso considerar que os processos de gestão das IES europeias estão cada vez mais profissionalizados, ou seja, há uma tendência que defende que os cargos administrativos das universidades devem ser ocupados por profissionais especializados (em administração ou áreas correlatas), podendo ou não ser membros do corpo docente. Em vista disso, os órgãos colegiados têm cada vez menos “peso” nas decisões universitárias, uma vez que são considerados exemplos de burocracia acadêmica. Desse modo, compreendemos que o financiamento diferenciado, posto em prática por meio de projetos direcionados a determinados grupos, e não às IES, bem como a arquitetura simplificada do H2020, também podem ser considerados elementos que enfraquecem as relações institucionais mais amplas, criando movimentos de competitividade entre e intra-instituições, entre e intra-docentes.

Em linhas gerais compreendemos que o H2020, considerando sua dimensão estrutural e financeira, é expressão do exercício da governança supranacional praticada pela UE, na medida em que normatiza objetivos e estratégias comuns, promove fusões e fere a autonomia das instituições e dos Estados-nação. Ademais, o Programa induz à adoção de mecanismos de gestão institucional calcados na flexibilidade, com base nos preceitos da concepção de UCM, somados ao movimento de promoção da excelência a partir da investigação e da inovação propostas pela UE.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para concluir este texto é importante, de saída, expor os limites da análise ora empreendida pois se trata de um Programa em andamento e também uma tendência que vem se delineamento ao longo desta última década. Soma-se às limitações a escassa literatura sobre o Programa e também sobre as UCM.

Considerando o exposto, até o momento, avançamos em nossas análises no sentido de compreender que o H2020 coroa o longo processo de relativização de determinada universidade europeia, instaurando/reforçando uma concepção de universidade altamente diferenciada, elitista, essencialmente articulada ao setor privado e às demandas produtivas, de modo a endossar um consenso sobre a excelência acadêmica e científica.

É importante considerar que a introdução de programas promotores de excelência baseados em diferenciação financeira, prêmios, fusões e seleções tende a criar um cenário com poucos vencedores e muitos perdedores, o que pode desencadear um efeito desmobilizador para a maioria dessas instituições. Outro possível desdobramento estreitamente relacionado às questões da investigação científica é o privilégio concedido a algumas das dimensões de atividade das IES, neste caso, à pesquisa induzida. Assim, a promoção de certos tipos de excelência pode vir a ser feita em detrimento da qualidade observada em outras dimensões, porventura menos valorizadas em termos de prioridades políticas e institucionais.

Os documentos relacionados diretamente ao H2020 abordam exclusivamente a promoção da excelência em investigação e inovação, sendo estas direcionadas aos principais grupos de pesquisa, de investigadores e de instituições do bloco, os quais devem associar-se a empresas inovadoras do setor privado.

Compreendemos que a Comissão preconiza a concentração das capacidades e competências de formação avançada, bem como a produção científica, em um número restrito de universidades ou de redes integradas, a serviço das grandes corporações de base europeia, deixando na retaguarda um grande número de estabelecimentos de ensino superior para atender a outras atribuições sociais e econômicas diferenciadas. Como afirma Barrera (2015), trata-se de estabelecer uma diferença explícita entre a educação para as massas (graduação) e uma educação de qualidade reservada ao sistema de PG de algumas instituições, espaço em que a pesquisa está concentrada.

É importante evidenciar que, apesar de estarmos discutindo a questão da excelência em termos institucionais ou de formação de redes, o Programa H2020 trabalha a partir da dimensão de financiamento de projetos em temas e áreas específicas, concentrando-se no âmbito da PG, o que, por sua vez - reafirmamos - está claramente relacionado à concentração de determinadas pesquisas em algumas universidades.

De acordo com Nóvoa (2015), poder-se-ia argumentar que o processo de europeização da educação superior é estranho e irônico, ao passo que os cidadãos dos países menos desenvolvidos, sobretudo a partir do H2020, passam a pagar a ciência que se faz nos países mais desenvolvidos. Sobre esse ponto, o autor elucida:

O trabalho é realizado sob os auspícios da European Science Foundation, com a cumplicidade de alguns dos nossos colegas. É desnecessário dizer que tudo é feito de acordo com os melhores “padrões internacionais”, legitimados com linguagens e métricas de excelência, inovação e competitividade, empreendedorismo, transferência de conhecimento e mérito tecnológico, outputs, produtividade e impacto. Mas o problema está precisamente aqui. Em nome da europeização, reproduzem-se as mesmas fraturas de sempre. (NÓVOA, 2015, p. 269)

O próprio conceito de excelência acadêmica e científica abordado nos documentos analisados expressam uma compreensão equivocada do termo, que tende a “separar os melhores dos outros, esquecendo que, nas sociedades do século XXI, é central que todos tenham acesso ao conhecimento e que haja uma valorização não apenas da ciência mas também da cultura científica” (NÓVOA, 2015, p. 269).

Essa divisão de classes do ensino universitário expressa uma forma de “desmontagem da universidade pública” (BARRERA, 2015, p. 45) a partir do modelo estadunidense de UCM, que passa a ser o grande referencial para as universidades europeias na atualidade.

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3Em Thiengo (2018), aprofundamos a análise dessas características a partir dos principais documentos dos Organismos Internacionais.

4.Sobre esse aspecto, é importante destacar que o panorama da educação superior, da pesquisa e da inovação do bloco europeu é moldado pela forma com que as competências nessas questões estão distribuídas entre a UE e os Estados-membros. Pesquisa e inovação são áreas em que a UE e os Estados-membros partilham competências, o que significa que ambos podem produzir legislação juridicamente vinculativa sobre essas matérias. A UE atua, geralmente, de acordo com o princípio da subsidiariedade, isto é, existem leis cuja aplicação alcança todo o território europeu, nos casos em que sejam mais eficazes do que as de vigência em âmbito nacional. Na área da educação, a UE detém competências apenas para apoiar ou complementar os atos dos Estados-membros, sem que com isso interfira na harmonização de leis ou regulamentações nacionais. Outras instituições europeias, como o Conselho Europeu (representante direto dos Estados-membros) e o Parlamento Europeu (composto por representantes eleitos no âmbito de cada Estado-membro), também desempenham um papel importante nas áreas do ensino superior, da pesquisa e da inovação, como órgãos legislativos da UE, negociando e aprovando programas políticos e orçamentários.

5.De acordo com Hazelkorn (2009), poucos meses depois de publicado o AWRU - em que somente dez universidades europeias apareceram entre as 50 melhores, contra 35 dos EUA - foi realizada uma grande reunião entre os Estados-membros da UE, a fim de constatar por que a Europa estava em desvantagem em relação aos EUA e também em relação às demais economias. Ainda de acordo com a autora, “em anos subsequentes ao ranking seguiram-se pronunciamentos e promessas governamentais e institucionais; e lamúrias e exortações ocasionais” (HAZELKORN, 2009, p. 44), resultando na criação de um ranking (U-Multirank) e na adoção de uma postura ainda mais alinhada ao modelo de universidade americano, como pode ser percebido nos comunicados, documentos, estratégias e programas do bloco europeu.

6.Em linhas gerais, as principais diferenças em relação ao programa de financiamento anterior são: a) atenção aos “desafios societais” e à competitividade; b) integração da investigação e da inovação, a partir de financiamento regular - desde a ideia até o mercado -, bem como a ênfase nas atividades próximas do mercado; c) estrutura mais simples, com um único conjunto de regras e menor burocracia, um modelo mais simples de reembolso de custos, menos controle e auditorias; d) a implementação de uma linha independente de atuação com um orçamento dedicado à “Ciência com e para a Sociedade”; e) e principalmente a centralidade, no que se refere ao impacto da pesquisa, à natureza pragmática dos projetos e à participação das pequenas e médias empresas.

7.A busca pela excelência e a promoção das características basilares das UCM podem ser percebidas a partir da assinatura do PB e nos demais programas e políticas desenvolvidas no mesmo contexto.

8A relevância adquirida por esta concepção, inclusive, foi tema de um estudo organizado pela Associação Europeia para a Garantia da Qualidade no Ensino Superior (Enqua). O estudo The concept of excellence in higher education, publicado em 2014, indica que é preciso o estabelecimento de um objetivo alcançável para todas as instituições, bem como a possibilidade de elas virem a adotar critérios específicos, de acordo com suas particularidades.

9.Serviço científico interno da Comissão Europeia que presta apoio científico e técnico independente à elaboração de políticas da UE com base em dados comprovados.

10.As KICs são definidas pela UE como parcerias criativas altamente integradas, que envolvem pelo menos três organizações independentes de pelo menos três Estados-membros diferentes, bem como a interação com o setor privado.

11A revisão introduz uma série de medidas detalhadas, incluindo: a aceitação da prática contábil dos próprios participantes, ao cobrar os custos de produtos ou serviços prestados internamente em uma organização; maior abertura ao mundo, proporcionando uma opção mais simples para os parceiros internacionais de países do Terceiro Mundo não elegíveis para financiamento da UE; a ampliação da gestão da subvenção, exclusivamente eletrônica, para período posterior ao pagamento final.

1Doutora em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina; Mestra em Educação pela Universidade Federal de Viçosa; laracarlette@gmail.com

2Doutor em Educação: História, Política, Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro; lucidio.bianchetti@pq.cnpq.br

Recebido: 25 de Dezembro de 2018; Aceito: 29 de Setembro de 2019

Endereço para correspondência: Universidade dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, 39100-000, Bloco V, Sala 14, Campus JK, Rodovia MGT 367 - Km 583, n. 5000, Bairro Alto da Jacuba Diamantina, Minas Gerais, Brasil.

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