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Roteiro

versión On-line ISSN 2177-6059

Roteiro vol.46  Joaçaba ene./dic 2021  Epub 01-Oct-2020

https://doi.org/10.18593/r.v46i.23753 

Seção temática: Desafios da formação de professores para o ensino de Matemática

Considerações da obra Professor: artesão ou operário?

Susimeire Vivien Rosotti de Andrade1I  , Professora assistente
http://orcid.org/0000-0001-9188-8620

I Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Colegiado de Matemática, Professora assistente.


A obra de Vitor Henrique Paro - Professor: artesão ou operário? de 2018, que é pesquisador e professor titular na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo foi dedicada aos professores e professoras que atuam na educação básica. Ela é o resultado de uma pesquisa realizada no período de março de 2014 a fevereiro de 2018 cujo “objetivo geral estudar a singularidade da ação educativa escolar como processo de trabalho e investigar suas implicações para as políticas educacionais e para a administração da educação fundamental.” (PARO, 2018, p. 19).

Nesta obra o autor se “propõe a examinar a singularidade do processo de produção pedagógica e os desafios que se apresentam para as políticas públicas educacionais e para a administração da escola fundamental.” (PARO, 2018, p. 31). Para tanto, parte de uma pesquisa que inter-relacionou uma investigação de natureza bibliográfica-documental e de campo sendo que esta foi desenvolvida no ano de 2016 na Escola Municipal de Ensino Fundamental do sistema público de ensino da cidade de São Paulo.

Segundo o autor o trabalho de campo “ensejou não apenas a coleta de opiniões e impressões, mas também a discussão, o questionamento e o levantamento de problemas e de propostas.” (PARO, 2018, p. 21).

Neste sentido, a obra foi organizada em uma introdução e quatro capítulos. Na introdução o autor apresenta quais são as grandes ameaças que rondam o direito à educação que são os seguintes: “1) a razão mercantil que orienta as políticas educacionais e 2) o amadorismo dos que cuidam dos assuntos da educação.” (PARO, 2018, p. 25). Diante disso, aponta que o modo de produção capitalista influencia as políticas sociais inclusive a educacional, portanto, que se espalha “por todo corpo social servindo de paradigma para as relações humanas e sociais sejam elas econômicas ou não” (PARO, 2018, p. 29) e o amadorismo pedagógico e a ignorância pedagógica são imprescindíveis para que essa lógica do sistema seja aceita.

Mediante o exposto, na introdução o autor afirma que o modo de produção capitalista impõe suas regras em todas instituições sociais e a escola não será poupada dos seus interesses que seguem a lógica do mercado, portanto, a orientação teórica da obra tem como base os estudos desenvolvidos por Marx e o levou a considerar que é essencial o desenvolvimento de pesquisas no tocante à natureza da ação educativa que por sua vez levou a escolha do objetivo da obra.

Desse modo, no primeiro capítulo intitulado “Educação enquanto atividade pedagógica” busca enforcar a educação como ação pedagógica, estabelecendo uma relação entre a educação e a ação pedagógica que favorece afirmar que a atividade educativa que se efetiva na educação básica torna imprescindível uma abordagem científica. Para tanto, organiza este capítulo partindo das seguintes discussões: A cultura como objeto da educação; Não há transmissão, mas apropriação; O professor como portador do senso comum; Educação escolar exige saber técnico-científico; A ideologia do “não”; “Limites”: um discurso muito limitado; Democracia como fundamento de humanidade; Democracia como fundamento pedagógico; A marca Professor: artesão ou operário? do autoritarismo desde a infância; “Construção do conhecimento”?; Quem trata de políticas educacionais precisa entender de educação.

Assim, no primeiro capítulo destaca a sua concepção de educação como apropriação da cultura, e à docência como um trabalho imprescindível à constituição do ser humano como ser histórico, social e político. Considera que sua trajetória de pesquisador lhe oportunizou um contato com responsáveis por tomadas de decisões nos sistemas municipais de ensino e que esta concepção de educação, “acompanhada de conteúdos teóricos atualizados e argumentos consistentes sobre área educacional” favorecem na luta pelas transformações na realidade escolar. Diante disso, as decisões competentes das políticas públicas educacionais “não podem ignorar a natureza do processo de ensino-aprendizagem, sua especificidade e os conhecimento técnicos e científicos que o envolvem.” (PARO, 2018, p. 60).

No segundo capítulo, que o autor denomina de “Educação enquanto processo de trabalho” procura enforcar a relação entre a ação educativa como processo de trabalho. Toma como base o conceito trabalho preconizado por Marx, isto é, uma atividade orientada a um fim fonte de vida e desenvolvimento humano. Organizou o capítulo partindo da seguinte discussão Produção material e produção não material; Trabalho manual e trabalho intelectual; Elementos do processo de trabalho; O produto da escola; Elementos do processo de trabalho pedagógico; Um objeto de trabalho singular; Trabalho concreto e trabalho abstrato; Trabalho forçado; A relevância do produto; Consciência do processo pedagógico; Em síntese.

Neste capítulo o autor afirma que no modo de produção capitalista o trabalho não vislumbra “uma atividade orientada a um fim”, isto é, o trabalho humano que preconizou ao ser humano transcender e modificar a sua própria natureza, diferenciando-se dos outros animais, tornando-se histórico e, consequentemente, social, em suas palavras o ser humano trabalha “quando produz direta e indiretamente sua existência, mas também quando usufrui desta produção.” (PARO, 2018, p. 64).

Desse modo, no modo de produção capitalista para atender a sua produção econômica o trabalho será abstrato que não é sinônimo de trabalho humano, portanto, os capitalistas pagam pela força de trabalho (a energia humana, física e espiritual aplicada no processo), assim, “não paga todo o trabalho do trabalhador.” (PARO, 2018, p. 65).

A educação como processo de trabalho implica considerar que “a atividade é de ensino e de aprendizado”, afirma que os professores e os alunos desenvolvem um trabalho que “despendem sua energia humana (força de trabalho) na realização do produto” (PARO, 2018, p. 69), e o produto do processo educativo consiste no ser humano educado, assim, a escola é compreendida como boa caso consiga formar bons cidadãos.

Paro afirma ser essencial que a educação escolar esteja a encargo do Estado, que deve representar o interesse do cidadão e não ao modo de produção capitalista. Ademais, a compreensão de que o trabalho que é uma atividade orientada a um fim que designa o conceito de trabalho humano não é o sinônimo de “trabalho abstrato (historicamente determinado sob capitalismo)” (PARO, 2018, p. 76) oportuniza aos professores entender a responsabilidade de seu trabalho para com a transformação na sociedade, consequentemente, “com vista à qualificação de sua atividade junto a seus educandos.” (PARO, 2018, p. 86).

Diante dessa reflexão teórica o autor apresenta no terceiro capítulo “Quem ‘trabalha’ no processo pedagógico” os papéis que desempenham tanto educando quanto educador. Para esta reflexão organiza o capítulo a partir das seguintes discussões: “‘Educar’ é com a família. Escola só ‘ensina’”; O engodo das novas tecnologias; Avaliação; Avaliação no processo; A “cultura” do exame; “Avaliação” externa: um álibi para nada fazer; A singularidade do trabalho educativo; Condições de trabalho; Formação docente; As críticas à “proletarização” do trabalho docente; O professor não educa sozinho; Qualidade de vida do professor; Identidade profissional; Dignidade; Indignação.

No capítulo três o autor afirma que no processo educativo o professor e o aluno desenvolverão sua atividade de maneira indissociável sendo ambos ativos neste processo, assim, o aluno deve operar como um sujeito, o professor além disso deve ser o sujeito que dialoga com o sujeito, em suas palavras “a ação do educador não se dá de uma forma exterior, como quem transforma o objeto de trabalho e este se deixa transformar no produto”, pois o ser humano “nas relações sociais, que estabelece, está suposta a condição de sujeitos dos envolvidos.” (PARO, 2018, p. 103).

Para o autor a formação de professores relaciona com sua formação humana, e ainda, suas pesquisas empíricas nas escolas levou a concluir que uma posição autoritária não é aprendida na formação inicial dos professores, mas em sua trajetória humana. Compreende que a formação “em serviço” deve ser “objeto de uma política pública que vise de fato a transformação da própria escola.” (PARO, 2018, p. 110). Ademais, no modo de produção capitalista deve ser desvelado “as condições de trabalho inteiramente inadequadas para professores e alunos, e a correspondente prática de uma didática antediluviana, incapaz de prover a cultura que propicie a formação humano-histórica do educando.” (PARO, 2018, p. 121).

O autor finaliza a obra afirmando que a educação como apropriação da cultura torna o educador um sujeito responsável em propiciar metodologia, procedimentos de ensino e assumir seu trabalho com compromisso para a construção de seres democráticos para uma sociedade democrática. Assim, no modo de produção capitalista ao desenvolver sua atividade que é de ensino, consequentemente, preconizando um trabalhador torna essencial “envolver sua vontade numa relação político-democrático.” (PARO, 2018, p. 128).

Além disso, a concepção da educação visando apropriação da cultura ressalta a importância do trabalho do professor no processo educativo, pois o produto deste processo será a formação de cidadão. Desse modo, é evidenciado a responsabilidade do Estado para a efetivação não devendo seguir os interesses do modo de produção capitalista e sim atender a sociedade.

Diante dessas considerações a escola é uma instituição social que deve oportunizar a produção de convivência efetiva a partir da persuasão concebida como dialogo onde o homem é concebido como sujeito, e a dominação que o leve à condição de objeto não pode ser aceita com naturalidade. Para tanto, o amadorismo pedagógico não pode permear neste ambiente social, pois “despreza a natureza político-democrático da relação pedagógica.” (PARO, 2018, p. 130).

REFERÊNCIAS

PARO, V. H. Professor: artesão ou operário? 1. ed. São Paulo: Cortez, 2018. [ Links ]

1 Doutora em Educação Matemática pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; Mestre em Educação para a Ciência e a Matemática pela Universidade Estadual de Maringá.

Recebido: 31 de Janeiro de 2020; Aceito: 05 de Agosto de 2020

Endereço para correspondência: Avenida Tarquínio Joslin dos Santos, 1300, Polo Universitário II, Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil; susivivien@hotmail.com

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