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Conjectura: Filosofia e Educação

versión impresa ISSN 0103-1457versión On-line ISSN 2178-4612

Conjectura: filos. e Educ. vol.25  Caxias do Sul  2020

https://doi.org/10.18226/21784612.v25.e020029 

ARTIGOS

Consequências de modelos formativos: entre o moderno e o pós-moderno

Consequences of formative models: between modern and post-modern

Leoni Maria Padilha Henning* 
http://orcid.org/0000-0001-8004-2371

Genipo Soares de Oliveira Neto** 
http://orcid.org/0000-0002-0519-943X

*Doutorado em Educação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Pós-Doutorado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Atualmente é professora-associada na Universidade Estadual de Londrina. E-mail: leoni.henning@yahoo.com

**Mestre em Educação e Graduado em Filosofia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Professor de Filosofia na Rede Estadual do Paraná desde 2008. E-mail: genipooliveira@gmail.com


Resumo

O presente artigo pode ser justificado como um breve panorama do debate entre modernidade e pós-modernidade em suas implicações ao campo da educação e formação humana, diante da emergência de nova humanidade, fruto do capitalismo tardio, com suas promessas não cumpridas, diante da colonização de todas as esferas, inclusive da própria educação. Assim, este trabalho visa a traçar alguns contornos do complexo liame entre modernidade e pós-modernidade, bem como a concepção de homem decadente, por um lado, e de homem emergente, de outro, ante essa nova condição geracional. Para tal, o trabalho se constitui de uma pesquisa de metodologia teórico-conceitual, propondo-se como uma contribuição ao recorrente questionamento sobre a relevância das metanarrativas na formação humana, tomando como autores “estelares” Kant e Nietzsche, justificando, inclusive, uma espécie de pré-história do debate entre os metarrelatos. Daí, portanto, as escolhas conceituais deste artigo, que se deu por agenciamentos que possibilitassem a defesa de uma concepção vitalista, inerentemente criativa, como uma disciplina do pensamento indispensável a uma humanidade que se queira para além da mera reprodução erudita, do cinismo mercadológico ou, ainda, dos desígnios tecnocientíficos e rudeza materialista-determinista que rondam o tempo presente. Portanto, o artigo sugere que o novo paradigma em construção, ao se pautar por uma nova lógica, nos possibilita, considerando as críticas à modernidade, dar vazão a novo horizonte ético, que considere o homem em sua integridade. Ou seja, compreendido como “sujeito peninsular” (que habita entre o biológico e o cultural), e não, como sonhava a modernidade, como homem “insular”, tido como sobrenatural, desenraizado do corpo e da natureza.

Palavras-chave Formação humana; Educação; Modernidade; Pós-modernidade

Abstract

This article can be justified as a brief overview of the debate between modernity and postmodernity in its implications for the field of human education, in the face of the emergence of a new humanity, as the result of late capitalism with its unfulfilled promises, before the colonization of all spheres, including education itself. Thus, the work seeks to trace some contours of the complex link between modernity and postmodernity, as well as the conception of a decadent man, on the one hand, and an emergent man, on the other, in face of this new generational condition. For this, the work consists of a research of conceptual theoretical methodology proposing as a contribution to the recurrent questioning about the relevance of the metanarratives in human formation, taking as “stellar” authors Kant and Nietzsche, justifying even a kind of prehistory of the debate between metanarratives. Hence, therefore, the conceptual choices of this article, which was based on assemblages that enabled the defense of an inherently creative, vitalist conception as a discipline of thought indispensable to humanity that wants beyond mere erudite reproduction, marketing cynicism or, still, of the techno-scientific designs and materialistic-deterministic rudeness that surround the present time. Therefore, the article suggests that the new paradigm under construction, when based on a new logic, allows us, considering the criticisms of modernity, to open possibilities to a new ethical horizon that considers man in its integrity. That is, a “peninsular subject” (which lives between the biological and the cultural areas) and not as modernity dreamed as an “insular” man, considered as a supernatural being, uprooted from the body and nature.

Keywords Human formation; Education; Modernity; Postmodernity

Introdução

No turbilhão do cotidiano, paradoxalmente, nos sentimos imersos no imediato ao mesmo tempo que, inconscientemente, abdicamos da consciência do presente, ou seja, sucumbimos à fugacidade do presenteísmo em prejuízo do agora. Curiosamente, notamos certa incoerência, algo de errado, uma espécie de farpa no cérebro, daí a emergência do thauma (espanto, admiração e/ou perplexidade), um estranhamento sobre o mundo que, talvez em troca da sobrevivência, geralmente negamos e nos calamos com a “boca cheia de feijão”. Eventualmente, alguns desses agenciamentos não calam enquanto não atendemos ao seu chamado, tal como uma criança mimada que nos atormenta até que tenha nossa atenção – e, geralmente, a vida se justifica nesses momentos em que deixamos as “coisas importantes de lado”.

Este trabalho surge de um agenciamento, de uma “farpa no cérebro”, de um thauma, se preferir. Como professor de Filosofia para adolescentes, o que incomoda principalmente um dos autores, mesmo antes como ser humano, é saber: O que ele faz? Ir além da resposta automática e banal, sobre o porquê da Filosofia e, mais especificamente, o porquê de seu ensino em nosso tempo e espaço; afinal: Qual é a importância ou relevância do que faz como professor de Filosofia? Este trabalho, portanto, parte de uma ponderação existencial de um professor de Filosofia preocupado com os princípios e limites de sua tarefa social, sem a vulgar certeza do significado daquilo que consumiu pelo menos um terço de sua vida e energia vital: ser professor de Filosofia. Nesse sentido, podemos esclarecer que nossa pesquisa se localiza no nó górdio entre educação e filosofia, que é eloquentemente traduzido na fala do professor Giacóia Júnior:

Vale aqui, penso poder afirmar, a máxima evangélica: lá onde está depositado teu maior tesouro, ali está também teu coração. E é precisamente nesse ponto que se cruzam, para não mais se separar, filosofia, ensino, educação e formação – pois filosofia é o mais sublime objeto de veneração; como amor da sabedoria, ela é a figura suprema do amor

(GIACÓIA JÚNIOR, 2005, p. 83, grifo nosso).

Para explorarmos esse tema, nossa opção é traçar um panorama singular do debate entre moderno e pós-moderno, no campo da educação, diante da emergência de nova humanidade, fruto do capitalismo tardio, com suas promessas não cumpridas, diante da colonização de todas as esferas, inclusive a da educação. Assim, o trabalho visa a delinear alguns contornos do complexo liame entre modernidade e pós-modernidade, bem como a concepção de homem emergente dessa nova condição.

Contudo, a despeito das dificuldades inerentes a tal proposta, de antemão, fica a certeza da urgência desse tema e de que, mais do que nunca, é necessário integrar o que foi relegado à marginalidade. Se, no limiar da modernidade, optou-se pelo separar para conhecer, hoje, na exaustão desse modelo, é preciso buscar o caminho da junção que torne o conhecimento fidedigno.

A discussão entre modernidade e pós-modernidade: uma escolha entre vida e razão

Entendemos que a modernidade é fruto de escolhas que fizemos como humanidade, e tais escolhas têm um nome: Ocidente. Irmanamos, igualmente, na certeza de que esse caminho, para o bem e para mal, nos trouxe até este ponto. E, que, se quisermos mais do que simplesmente seguir em frente, fluindo para uma perspectiva vital e criadora para além da estrada que nos conduziu até aqui, é preciso reavaliar nossa jornada com um horizonte mais aberto do que a simples perspectiva apologética ao novo ou da mera crítica apaixonada dos vícios do velho caminho. É nesse espírito de afirmação da multiplicidade e não dualismo, de crítica criativa e não de passional defesa, que este texto se dispõe a examinar esse terreno que nos nutriu, mesmo que à custa de uma monocultura devastadora.

A modernidade é, em geral, estabelecida como um momento icônico, a partir do século XVII, de ênfase nos ideais de razão, ciência, técnica, progresso, emancipação, sujeito, localizada ante a Revolução Francesa como elemento de retroalimentação com os conceitos de igualdade, liberdade e fraternidade. Elementos que, para os defensores da modernidade, se estabelecem de modo positivo e, ao contrário, àqueles que se colocam de fora, como um valor negativo. Nesse sentido, há aqueles que apostam na exaustão da modernidade e, portanto, consideram que o projeto iluminista é obsoleto, daí a alcunha de pós-moderno.3 Por outro lado, há um grupo que defende que as forças produtivas dos conceitos modernos ainda não se exauriram4 havendo, desse modo, a necessidade de aprofundar o quadro teórico moderno.

Nesse cenário, mais do que nos entrincheirarmos em um dos lados, buscamos, aqui, vislumbrar os elementos que podem contribuir para a compreensão desse momento de crise, já que partimos do postulado de que independentemente das chaves de leitura das quais possamos nos tornar partidários, seja o neomodernismo, seja o pós-moderno,5 não podemos nos cegar à necessidade de investigar o moderno, em seus aspectos epistemológicos, políticos e éticos, no intuito de pensar sobre os caminhos e possibilidades que se apresentam neste debate para além do mero desejo de vitória, fruto, muitas vezes, de uma atmosfera tóxica, oriunda da, infelizmente, comum confusão entre as várias formas de debate e guerra.

Sem medo de denunciar nossos agenciamentos ou de ofender a sensibilidade do leitor, tomaremos como ponto exemplar, na apresentação deste tópico, a oposição entre um dos grandes legisladores da modernidade, Kant, e seu apaixonado opositor, Nietzsche, no qual a crítica à Kant e à modernidade se confunde, muitas vezes, em hilariantes e sagazes aforismos. A escolha dos autores antitéticos se justifica pelo protagonismo que cada um representou em sua escolha ética, estética e epistêmica.6 Na carne e letra desses autores, encontramos o ápice da cultura crítica, como iluminação progressiva, e, por outro, a “[...] negação de estruturas estáveis do ser, a que o pensamento deveria recorrer para ‘fundar-se’ em certezas não-precárias” (VATTIMO, 1996, p. 7).

Tomemos, portanto, algumas considerações sobre a filosofia kantiana. Tendo em vista o fervor científico de sua época, diante da emergência das ciências exatas, Kant buscou, em sua Crítica da razão pura, dar à filosofia um estatuto de ciência que lhe viabilizasse um rigor capaz de desviá-la da multiplicidade de opiniões. Para “Kant, como sabemos, a filosofia, tomada em seu pleno conceito, é apenas um ideal para figurar a totalidade do conhecimento filosófico, a saber, o sistema completo da ciência possível” (apudGIACÓIA JÚNIOR, 2005, p. 90). Dessa maneira, para o filósofo alemão é necessário compreender os filósofos assim como os físicos.7 Para ele, a filosofia é a ciência da associação de todos os conhecimentos e os fins essenciais da razão humana, no interior da qual a razão, como órgão do conhecimento, deve conhecer a si mesma, constituindo o tribunal que garantirá as legítimas pretensões se baseando em leis eternas e imutáveis. O projeto kantiano, como uma expressão do modelo moderno, se estabelece na busca da construção de um sistema filosófico erigido sobre um esquema hierárquico e orgânico dos saberes.

Destarte, antes de uma doutrina filosófica, se pressupõe a crítica na qual se deve discernir os modos de saber, as diferentes faculdades e os conseguintes fins e aplicações de cada instrumento. A filosofia kantiana, portanto, tem como lastro a ideia de que o fim da razão é ela própria, cabendo-lhe estabelecer a própria determinação e o próprio ajuste dos meios para se atingir os fins dados. Em suma, a razão para Kant é ré e juíza ao mesmo tempo.8

A razão, como solo do projeto crítico kantiano, se estabelece, ao mesmo tempo, de modo destrutivo, como empreitada contra a multiplicidade de opiniões oriundas do pseudossaber da metafísica dogmática e, de modo criativo, ao tomar a legislação a priori como fonte do sistema filosófico. Em outras palavras, a razão expõe, ao mesmo tempo, a finitude e a dignidade do homem, como legislador da ciência e da moral.

Já Nietzsche, com suas especificidades filosóficas e preocupações sobre o ser filósofo, como atesta o próprio autor, está a mil léguas de um conceito que inclui até mesmo um Kant (NIETZSCHE, 2008, p. 61-62). Isso porque Nietzsche toma o filósofo como um terrível explosivo diante do qual tudo estaria em perigo (p. 61-62), sendo de sua competência levantar as insígnias da experimentação e da perspectiva, como pode ser exemplificado em sua crítica quando o autor não toma como modelo de sua filosofia a ciência, mas a arte. Se Kant se utiliza da ciência como inspiração para sua filosofia, do outro lado, Nietzsche encontra, na arte, o conceito central de sua filosofia, vida, prenunciando, desse modo, um dos elementos basilares da disputa entre moderno e pós-moderno.

No pensamento nietzschiano, a filosofia, bem como a psicologia, a história, a ciência e a arte recebem nova conceituação, tornando-se fidedignas depositárias da incumbência de afirmar a vida, tendo-a como meta. Podemos dizer, desse modo, que será sempre sob a ótica da vida que os estudos de Nietzsche encontrarão seu fio condutor. Daí a questão que, necessariamente, se coloca, a saber: Qual é o sentido que o conceito de vida toma dentro da obra de Nietzsche? Explicitada a referente recorrência do conceito de vida na obra do autor, como ponto de convergência e condicionamento dessa filosofia, o termo se mostra paradigmático na compreensão da crítica nietzscheana, bem como na compreensão da ideia de uma filosofia que se coloca a serviço da vida.

No Crepúsculo dos ídolos, Nietzsche aponta àquilo que pode ser o caráter fundamental do termo vida: “[...] vida não é a necessidade, a fome, mas antes a riqueza, a exuberância, até mesmo o absurdo esbanjamento – quando se luta, luta-se pelo poder...” (NIETZSCHE, 2006, p. 71). Assim, o conceito de vida remete a uma expressão de embriaguez ou opulência, na qual a riqueza de figuras e a plenitude da invenção compõem “[...] um oceano de possibilidades, tão imprevisível e aventuresco que não precisamos mais de um Além, no Aqui há o suficiente de tudo isso” (SAFRANSKI, 2001, p. 293).

O pensamento de Nietzsche se apresenta como uma leitura da realidade a partir de uma reflexão sobre a vida, que representa o próprio caráter irrevogavelmente perspectivo da realidade. Ou seja, em Nietzsche, não há uma filosofia sobre a vida, mas há uma vida que filosofa, porquanto o filósofo não se indaga pela utilidade de uma ideia à proporção que somente se preocupa com a potência criativa: “Com o pensamento de Nietzsche não chegamos a parte alguma, não há resultante, não há resultado. Nele existe apenas a vontade da interminável aventura do pensar” (SAFRANSKI, 2001, p. 320).

Vida, enfim, se estabelece como novo som, misterioso e sedutor, no qual Nietzsche fixou sua filosofia. Ainda podemos dizer, nos remetendo especificamente ao O nascimento da tragédia, que Apolo e Dionísio apontam, em sua eterna dança, a opulência do termo vida: enquanto Apolo, através da “bela aparência” torna a experiência valorosa e digna de ser vivida, nos empurrando à vigência do próximo momento, salvando o homem de uma imediata unificação com a infinitude e de uma consequente náusea diante do retorno ao cotidiano deficitário, Dionísio, por sua vez, fornece o ânimo indispensável à criação.

Porquanto, a filosofia nietzscheana buscou preencher uma lacuna até então presente nos tratados sobre a moral, que, por mais “[...] estranho que possa soar, em toda ‘ciência da moral’ sempre faltou o problema da própria moral: faltou a suspeita de que ali havia algo problemático” (NIETZSCHE, 1992, p. 86). Logo, Nietzsche visou, com sua crítica, a pôr em dúvida a crença moral, para, em seu ínterim, desmitificá-la.

Ao contrário, para Kant, posto que o papel da filosofia, como uma arquitetônica dos saberes, é dar unidade aos conhecimentos múltiplos, sob uma ideia, a moral não é passível de uma desmistificação, no sentido niestzscheano, na proporção que a moral advém da razão comum dos homens. Nesse sentido, Kant cumpriu a tarefa de sua filosofia ao criar uma fórmula de moralidade, na qual os conhecimentos múltiplos ganham unidade. Portanto, o autor encontrou uma fórmula para a moral comum, e não um novo princípio, alertando para um dos maiores perigos para a moral: os eruditos, que pretendem fundar a moral em princípios assistêmicos e impuros.

Logo, para Kant, a função da filosofia, no campo ético, se resume a devolver a pureza da moral, dado que essa é um fato indiscutivelmente racional, universal e necessário, enquanto para a perspectiva nietzscheana a moral deve ser tomada como um problema ou, mais precisamente, como um grande problema que, como tal, exige um “[...] grande amor, e deste são capazes somente os espíritos fortes, redondos, seguros, que se apoiam firmemente em si mesmos” (NIETZSCHE, 2001, p. 237).

A partir dessas considerações, fruto de suas inspirações (segundo um dos autores, a razão se apresenta como órgão capaz de dar à moral nova forma, para o outro, as morais devem ser avaliadas a partir da vida como princípio), é que podemos considerar que Kant construiu uma sólida doutrina moral, e Nietzsche a negou em bloco apontando, em última instância, à nova moral.

Tomando a moral como um dado, Kant buscou deduzi-la, cuja busca visou a justificar a necessidade de vontade expressa pelo imperativo categórico, ou seja, o autor almejou demonstrar o liame racional existente entre a incondicionalidade do dever moral e a vontade racional sensível do homem. Nessa ocasião, como pedra angular de sua doutrina, Kant evocou providencialmente o conceito de liberdade. Assim, a doutrina moral kantiana se compõe, basicamente, de três aspectos inseparáveis: 1) Autonomia: o princípio da moralidade assentado na autonomia da vontade; 2) Rigorismo: a incondicionalidade da exigência moral; e 3) Formalismo: o julgamento moral da máxima baseado na racionalidade da universalidade da lei.

Diferentemente de Kant, que buscou deduzir e, consequentemente, universalizá-la, Nietzsche, talvez, prenunciando um princípio sociológico, buscou fundamentar a ideia de que a moral varia de acordo com as escolhas culturais que optam por exaltar ou reprimir determinadas pulsões, conforme a necessidade e/ou utilidade. Todavia, a conclusão nietzscheana não será sociológica, mas ética: o homem é criador de valores.

Na empreitada contra uma moral de inspiração platônico-cristã, Nietzsche recorreu à genealogia como um instrumento capaz de desmistificar essa construção, na medida em que, ao remontar aos sistemas de valores segundo tipos de homem, esse aparato propicia a descoberta de uma variedade de homens e, mais que isso, de “[...] uma hierarquia entre homem e homem, e, em consequência, entre moral e moral” (NIETZSCHE, 1992, p. 134). Assim, em sua obra, Nietzsche se propõe expor a gênese da moral. Para ele, a moral europeia nasce como moral escrava, da qual surge o par axiológico bem/mal, como realização de uma vontade, talvez inconsciente, de vingança em relação aos senhores. Visto que, nessa moral, a qualidade de bom é agregada ao oprimido, fraco ou escravo, enquanto o homem forte é pensado sob a insígnia de mal. Já a moral do senhor é pensada noutra perspectiva, suas características se estabelecem à sombra do par axiológico bom/ruim. Dessa sutileza se depreende uma autoglorificação do senhor: o bom como aquele que afirma a si próprio, independentemente do outro; e o ruim como diferença ou distância do bom.

Consequentemente, é a partir dessas duas esferas iniciais de valores, uma como afirmação de si (diante do pathos da distância) e a outra como força reativa ou negação do outro (diante do ressentimento pelo forte), que Nietzsche terá condições de indicar o mérito da primeira moral, moral do senhor, e o caráter danoso da segunda, moral do escravo. Porquanto, toda moral depositária dessa perspectiva escrava visou, até o momento (a buscar a superação do senhor, não pela afirmação de si, mas pela negação do outro) a excomunhão do indivíduo forte. Deu-se, assim, uma anatematização no decorrer da história, por via da exaltação do amor à pátria, do cuidado com a comunidade e da preocupação com o outro, tendo sido o indivíduo forte, distante de toda suposta generosidade, caracterizado como tirano. Nesse sentido, a moral como cuidado ético do outro se apresenta como a expressão de “instintos inconscientes de adestramento”, sendo utilizada como instrumento cultural na imposição de determinado tipo ideal de homem em detrimento da pluralidade de tipos possíveis, suprimindo a vida como aparência e experiência. Dado esse aspecto, “a moral” se apresenta como a mais alta antítese da vida, pois aliena o homem do devir, quando reduz a interpretação da realidade a uma “única fonte de sentido”, em que a vida é julgada e suprimida pelo Uno, seja em nome de um “mundo das ideias”, com sua “escolha pré-natal”, seja em prol duma “dependência interior” com sua razão prática.

A genealogia ilumina o debate contra Kant, pois rechaça a ideia de uma moral universal. Independentemente de se basear numa etimologia, com frequência, fantasiosa, a genealogia nietzscheana tem a virtude de demonstrar a coexistência, mesmo no cérebro, de várias morais incompatíveis, que rivalizam com a pretensão universalista de uma moral comum: “O interesse da genealogia está no que mostra e não com que argumentos mostra” (REBOUL, 1993, p. 70). Destarte, Nietzsche ataca Kant com um ideal aristocrático, espécie de cavaleiro-poeta provincial:

Os nobres e bravos que assim pensam estão muito longe da moral que vê o sinal distintivo do que é moral na compaixão, na ação altruísta ou no desinteresse, a fé em si mesmo, o orgulho de si mesmo, uma radical hostilidade e ironia face à “abnegação” pertencem tão claramente à moral nobre quanto um leve desprezo e cuidado ante as simpatias e o “coração quente”

(NIETZSCHE, 1992, p. 173).

Nietzsche exemplifica, em detrimento da moral gregária de pretensões universalistas, uma antiga nobreza que encontrou, na responsabilidade, na crueldade, no orgulho, na audácia, no egoísmo, enfim na distância diante do débil, a sua superioridade. Porquanto, o genealogista, também como médico e legislador, afirma a saúde, ou melhor, a “grande saúde” dos magníficos animais de presa, como César Bórgia e Napoleão, que usaram toda força dos seus instintos. Em suma, esses “[...] eram os homens mais inteiros (que, em qualquer nível, significa também ‘as bestas mais inteiras’)” (NIETZSCHE, 1992, p. 170).

Utilizando-se da paradoxalidade desses personagens, Nietzsche parece sugerir que o único pensamento que sobrevive é aquele que vive na temperatura de sua própria destruição, ou seja, a saída enunciada por tais homens anuncia, ante os diagnósticos críticos da modernidade, a implantação de um paradigma que considere uma realidade viva, menos mutilada ou sinestésica. Nietzsche aventa novo horizonte ético, que considere o homem em sua integridade, em toda sua potência, como “sujeito peninsular” (que habita entre o biológico e o cultural), e não, como sonhava a modernidade, como homem “insular”, tido como sobrenatural, desenraizado do corpo e da natureza.

A aristocracia do passado, ao mostrar que a humanidade pode reencontrar sua saúde, tem um valor simbólico análogo ao valor da Revolução Francesa para Kant. Logo, os nobres do passado são para Nietzsche “[...] uma visão, de algo perfeito, inteiramente logrado, feliz potente, triunfante, no qual ainda haja o que temer! De um homem que justifique o homem” (NIETZSCHE, 1998, p. 35). Em contraposição à visão de homem do século XIX que é motivo de enjoo para Nietzsche, “[...] a visão do homem agora cansa – o que é hoje o niilismo, se não isto? Estamos cansados do homem” (p. 35).

A moral débil, por conseguinte, nessa perspectiva, se identifica à figura de um eunuco, visto seu caráter dualista que exclui o contrário ou tudo que se identifica com a vitalidade, como a força, a crueldade e a cólera. O mal para essa moral se identifica com tudo que sobrepassa e aumenta, em outras palavras, tudo que é grande. Nietzsche, ao exaltar o homem que soube utilizar seus afetos, condena Kant por não ter compreendido o papel do “mal”.

Contudo, esse reproche é contestável, visto que, em sua filosofia da história, Kant reconhece a força do egoísmo como elemento indispensável à sociedade, bem como ao seu aprimoramento, ao motivar a comunidade na direção da elaboração de planos políticos e culturais. Todavia, na esfera ética, Kant toma o mal como injustificável, e o afeto, impossibilitado de se erigir, como princípio para a moral, por ser essencialmente subjetivo, condicionado por um eudaimonismo.9 Contrariamente, Nietzsche reivindica a paixão, perguntando: “[...] eliminar a vontade inteiramente, suspender os afetos tudo sem exceção, supondo que o conseguíssemos: como? – não seria castrar o intelecto?” (NIETZSCHE, 1998, p. 109).

Contudo, para Nietzsche, sempre é lícito perguntar, ainda, o que se pode, a partir de tal afirmação, deduzir da pessoa que afirma? Em suma, “[..] também as morais não passam de uma semiótica dos afetos” (NIETZSCHE, 1978, p. 87). Esse método leva Nietzsche a tomar Kant como um filósofo que, com “razões rebuscadas”, buscou fundamentar seus “desejos mais íntimos”.

Um dos pontos de sustentação dessa crítica diz respeito à ideia de que Kant, atraído pelo ideal cosmopolita, diante do fim “[...] da crença de que um deus dirige os destinos do mundo e não obstante as aparentes sinuosidades no caminho da humanidade” (NIETZSCHE, 2000, p. 33), teria introduzido preconceitos morais em sua filosofia, a fim de preservar os princípios autorreferentes positivos da sociedade. Nietzsche afirma que a crítica kantiana não tem validade ao passo que a Crítica da razão pura cria as condições para se tornar a moral invulnerável.

Segundo Nietzsche, a filosofia de Kant se constituiu como uma “filosofia de escapatórias” (NIETZSCHE, 2006, p. 72), uma vez que, nessa filosofia, se alojam a metafísica e a moral, logo após a Crítica da razão pura tê-las expulsado do campo do conhecimento. Kant, de acordo com Nietzsche, atestou, com essa obra, a impossibilidade de um conhecimento teórico acerca da metafísica e da moral. Todavia numa manobra, que Nietzsche intitulou de “dividir para reinar”, Kant teria criado as condições necessárias para a criação da crença racional ou da razão divinizada na Crítica da razão prática. É necessário salientar, aqui, que a crítica de Nietzsche diz respeito, evidentemente, à divisão entre conhecimento e fé racional, no limiar da qual Kant teve que suprimir o saber para obter um lugar para a fé. Partindo da concepção de que o homem é um ser racional sensível e que, portanto, se estabelece num estado de liberdade (como coisa em si que se relaciona com os fenômenos) e numa condição de necessidade (como fenômeno que se relaciona com outros fenômenos), Kant fundamentou a concepção de que o agir moral é a melhor expressão da autonomia, ao passo que a razão (fundamento do agir moral) tem plena identificação com o reino da liberdade, algo que para Nietzsche não passa de um embuste de um filósofo zeloso pelo bem-estar social.

Porquanto, tomando a ideia de autonomia como ponto fulcral de sua doutrina moral, Kant estabeleceu que a entrega à lei moral é a maior manifestação de autonomia, já que a lei foi formulada através do imperativo categórico. Ou seja, essa doutrina opera a ideia de que a lei manifesta a liberdade, ao invés de destruí-la. Essa formulação levou Nietzsche a valorar Kant como um moralista que, como um “operário da filosofia”, nada criou e somente buscou fundamentar seus preconceitos através de um ardiloso sistema hierárquico e orgânico de conceitos.

Em síntese, Nietzsche rejeita, na doutrina moral kantiana, as ideias de autonomia, rigorismo e formalismo por consistirem numa artimanha de um espírito que chegou à “beira do abismo”, visualizou o oceano tempestuoso e indeterminado do Ser e sentiu, posto a covardia, a necessidade de se refugiar novamente numa “jaula”. Assim, Nietzsche forja de sua crítica uma espécie de estilística da moral de si, na qual clama pela criação e não pelo bom e certo, em prejuízo do mal e do errado. No ensaio dessa nova moral, Nietzsche aponta a um porvir, a um além, no qual a moral kantiana, como um momento avançado da decadência, estará extirpada, tal como um veneno ou doença que afligia o homem e a humanidade. Essa nova moral visa, portanto, a uma transvaloração dos valores. Valores, que, de acordo com Nietzsche, têm sua crueldade, debilidade e ressentimento expressos na doutrina moral de Kant, na proporção em que “Kant lhes mostrou o caminho secreto através do qual podem, por iniciativa própria e com o maior decoro científico, perseguir doravante os ‘desejos do seu coração’” (NIETZSCHE, 1998, p. 143), ou seja, os desejos morais débeis do homem medíocre.

Diante da principal crítica à escolha moderna, fonte de sua potência e, ironicamente, sua decadência, podemos observar o caráter unilateral e totalitário de mutilação da vida em suas dimensões criativo-passionais em prol do controle racional de toda a dimensão humana. Soma-se a esse argumento a tese de Vattimo, que posiciona Heidegger e Nietzsche lado a lado, como precursores da crítica pós-moderna, ao apontarem a uma diferenciação da metafísica, e não, sua destruição ou negação:

Eles se acham, assim, por um lado, na condição de terem de distanciar-se criticamente do pensamento ocidental enquanto pensamento do fundamento; e de outro, porém, não podem criticar esse pensamento em nome de uma outra fundação, mais verdadeira. É nisso que, a justo título, podem ser considerados os filósofos da pós-modernidade

(1996, p. 7).

Assim, Vattimo apresenta Nietzsche e Heidegger como filósofos que vislumbraram os limites do projeto moderno, independentemente do otimismo diante do aumento exponencial do progresso. Tal como a monocultura se apresenta hoje, como fonte da degradação do solo, a modernidade, diante dos olhos nietzscheanos, sugere a exploração até os limites da exaustão dos potenciais humanos até alcançar sua inevitável esterilidade: o niilismo.

O campo maçado da era moderna, portanto, a despeito de seus formosos frutos dentre os quais, além da maximização do conforto, podemos citar “[...] o duplo voo da terra para o universo e do mundo para dentro do homem” (ARENDT, 1993, p. 14), culminou no estéril campo do niilismo, no qual o homem se encontra alienado de sua natureza integral, mas somente como sujeito capaz de prever.

Do mesmo modo, o homem assistiu, no decorrer da era moderna, ao alijamento de suas condições básicas de existência, reduzindo-o a mero trabalhador, como fabricador de artifícios. Ou ainda, dentro da perspectiva da indústria cultural, como empregado/consumidor, no qual o homem, tal como o personagem chapliniano de Tempos modernos em face da sociedade administrada, é tomado simplesmente como objeto/engrenagem de um sistema que não compreende e que se encontra absorvido. Além da sujeição do homem a uma condição de reificação, o século XX foi palco de um processo de deslegitimação da racionalidade moderna em vista das novas linguagens e eventos científicos que aceleraram o processo de corrosão dos dispositivos modernos de especulação e emancipação:

Da segunda lei da termodinâmica à teoria da catástrofe, de René Thom do simbolismo químico às lógicas não denotativas, da teoria dos quanta à física pós-quântica; do uso do paradigma cibernético-informático no estudo do código genético ao ressurgimento da cosmologia de observação; da crise da Weltanschawng newtoniana à recuperação da noção de “acontecimento”, “acaso” na física, na biologia, na história, o que temos é a crise de uma noção central nos dispositivos de legitimação e no imaginário moderno: a noção de ordem e com ela assistimos à rediscussão da noção de “desordem”, o que, por sua vez, torna impossível submeter todos os discursos (ou jogos de linguagens) à autoridade de um metadiscurso que se pretende a síntese do significante, do significado e da própria significação, isto é, o universal e consistente

(BARBOSA, 2000, p. 10-11).

Barbosa evidencia os pontos de viragem da linguagem no crepúsculo da modernidade: a contestação da verdade, em sua ampla designação como verdades religiosas, científicas e jurídicas. O homem do século passado, desse modo, se deparou com a dificuldade, já prenunciada por Nietzsche em Verdade e mentira no sentido extramoral, de permanecermos no interior de conceitos claros e distintos, pois, diferentemente do que a racionalidade moderna enunciou de posse do conceito-chave de previsibilidade, a natureza guardou uma última surpresa: a ideia de que o equilíbrio a priori, o conceito de previsibilidade e a busca de solução moderna não bastam e não dão conta dos conceitos de ciência, mundo e homem, bem como da relação entre eles.

Eis a cisma que anuncia e sugere novo paradigma, nova racionalidade ou, por que não, nova razoabilidade. Diante dessa conjuntura de esvaziamento da racionalidade moderna e do consequente conceito de homem neste contexto, devemos aceitar que “[...] existe um entrosamento entre o gênero de linguagem que se chama ciência e o que se denomina ética e política [...]: um e outro procedem de uma mesma opção, e essa chama-se Ocidente” (LYOTARD, 2000, p. 13). Opção pela disjunção que não mais traduz a eloquência de nossa realidade. Daí a crítica da modernidade como esquema de caráter totalitário que buscou isolar, por via de “cordões sanitários”, tudo aquilo que sugerisse o efêmero, o sombrio, o equívoco, o subjetivo, a anomalia, em uma palavra, o erro. Da exclusão do incerto, do imprevisível, do desordenado, do subjetivo, em suma, do não racional, temos o ideal moderno de endogamia, que conspira para o silêncio, alheio às novas tendências.

Posto isso, podemos dizer que o pós-moderno é a condição cultural atual de incredulidade “[...] perante o metadiscurso filosófico-metafísico, com suas pretensões atemporais e universalizantes” (BARBOSA, 2000, p. 8). Condição que sugere nova legitimação, novo dispositivo que não vise, ao contrário da lógica moderna, à verdade, como no método cartesiano, nem a emancipação, como o visado na filosofia de Kant.

Nesse sentido, dissertando a favor de outro paradigma que não opere a disjunção como forma de conhecimento, Morin e Maffesoli orientam um elogio ao que pode ser enunciado como condição inerentemente trágica do homem, que, por ora, exige seu lugar de direito.

O Bárbaro não está mais às nossas portas, ultrapassou nossos muros, está em cada um de nós. Portanto, de nada serve julgá-lo, ou mesmo negá-lo. Sua força é tamanha que ele seria capaz de tudo submergir. Assim, como foi o caso em outras épocas, é melhor compreendê-lo, quando mais não seja para poder integrar ainda que homeopaticamente, o inegável dinamismo de que é portador

(MAFFESOLI, 1998, p. 11).

Morin se utiliza da mesma metáfora ao enunciar a necessidade de integração na confecção de novo paradigma:

Estamos ainda numa época de barbárie das ideias, de barbárie do espírito. É por isso que eu digo que estamos na pré-história do espírito humano. Sofremos de assustadoras doenças do espírito [...]. A grande doença da razão é a racionalização que encera o real num sistema lógico coerente, coerente ao preço de terríveis mutilações

(MORIN, s/d, p. 32).

Dessa maneira, os dois autores sugerem a necessidade de novas balizas que encaminhem o homem à pós-modernidade. “Isso implica que se saiba lavrar os campos já tão maçados do pensamento moderno” (MAFFESOLI, 1998, p. 13), a fim de se dissolverem as disjunções operadas pela modernidade, ocasionando um jogo complexo de complementariedade entre o claro e distinto e o obscuro e vago.

Os dois autores parecem sugerir, do mesmo modo, um paradigma em eterna reconstrução, à medida que o trágico é a configuração do inconciliável, posto que, tão logo aparece ou se torna possível uma acomodação, desaparece. Assim, como sentencia Morin, o único pensamento que sobrevive é aquele que vive na temperatura de sua própria destruição, ou seja, a saída enunciada por esses pensadores anuncia, ante os diagnósticos de fracasso da modernidade, a implantação de um paradigma que considere uma realidade viva, menos mutilada ou sinestésica.

Consequências de modelos formativos: “Minha Escola”

Depois desse sobrevoo sobre metarrelatos, em que foi possível vislumbrar a força desses modelos explicativos, cabe-nos, neste momento, pontuar as consequências formativas. Para tal, nos permitiremos ilustrar essa substanciação a partir do relato, em primeira pessoa, elaborado por um dos autores sobre seu primeiro dia como professor. Vejamos:

“Aproximo-me de um muro alto e um portão digno de uma fortaleza. Apresento-me por uma pequena janela, como aquelas que identificamos em filmes de clubes secretos. Uma senhora meio sisuda abre o portão com um molho de chaves próprio de um carcereiro “batedor de cadeados”, então, vejo um grande pátio coberto por telhas de zinco, que dão um aspecto sombrio ao ambiente mesmo sob o sol das quatorze horas, o que também contribui para o calor. Sigo a senhora até o próximo portão, que dá para o refeitório, no qual ouço ruídos cavernosos de conversas e alguns gritos de ordem, que me eram curiosamente familiares do tempo em que eu mesmo era um aluno do Ensino Médio.

Este breve relato do meu primeiro dia no colégio10 em que leciono, sugere, ao menos em parte, um dos porquês dos altos índices de desistência profissional de professores. Creio que minha teimosia, no mínimo, me impediu de seguir outro caminho e me levou a ter uma segunda impressão sobre o ambiente, segunda impressão que se maturou no tempo e na abertura para o ambiente humano, a despeito da estética de controle presente no quadro escolar,11 em contraste com a dimensão humana da educação que explode em vivacidade e possibilidades. A escola vista de fora provoca calafrios, principalmente diante do barulho oriundo do intervalo dos alunos da tarde, um verdadeiro pandemônio, contudo, frente a um segundo olhar se abre a oportunidade de se aproximar e fechar o foco, pois, a beleza explode à proporção que seu olhar se encontra com o outro. O melhor da escola é o aluno; é por eles que a escola existe e é por eles que a escola se justifica.

Assim, se o melhor da escola é o aluno, por outro lado, o pior é sua estrutura física, fruto de um modelo formativo que cerca corpos e aprisiona individualidades, tolhendo a possibilidade de multiplicidade. Um exemplo disto são as típicas salas de aula, nas quais encontramos situações notoriamente corriqueiras e, ao mesmo tempo inusitadas, na dinâmica professor-aluno. O jovem aluno, nativo digital, nasceu em um mundo permeado de telas ou janelas, que lhe dão acesso a todo tipo de informação, mas que, geralmente, não sabe muito bem como lidar com ela. Do outro lado da sala, o professor, arauto de uma antiga tradição escolar que exige o emprego da memória12 orgânica, em contraponto à contemporânea memória dos artefatos digitais.

Professor e alunos são contemporâneos, mas, muitas vezes, não são “conterrâneos”; coabitam o mesmo espaço e tempo, mas isso não significa que estão no mesmo “mundo”. Uma recente lembrança, que corrobora esta sensação, são os imprevisíveis (com as técnicas tradicionais) resultados eleitorais nos Estados Unidos da América e no Brasil. Parece-nos sintomas de uma dissociação entre o real e o virtual, diante da extrema fragmentação de visões de mundo, frente aos incalculáveis itinerários de agenciamentos pedagógicos possíveis.13 Difícil não citar a fala de desabafo de Umberto Eco sobre o poder das mídias sociais: “Redes sociais deram voz à legião de imbecis”14 e, acrescento sem trocadilho, deram voz e eco.

Vivemos na era das telas, onde a informação, seja oriunda da imprensa escrita (jornais, revistas, etc.), falada (rádio, televisão...), virtual (internet), se tornou abundante e acessível. Ao acessar o smartphone, ficamos sabendo que o ministro da Casa Civil comparou uma arma há um liquidificador, e que o acesso a armas de fogo foi flexibilizado pelo governo com o intuito de diminuir a violência; descobrimos que a gordura animal voltou a ser indicada, diante de um novo resultado de pesquisas sobre nutrição, e que podemos entender, clicando no banner reluzente, qual é o segredo da “barriguinha” de determinada atriz; recebemos notícias de um professor agredido em sala de aula e assistimos a um vídeo de Olavo de Carvalho que “denuncia” o uso de fetos humanos como adoçante nas fábricas da Pepsi.

Se a internet é feita para navegar, é fato que a maior parte da população está se afogando. Os cotidianos exemplos citados acima podem nos dar um fragmento do sentimento de confusão ou náusea, posto o excesso de informações caldeadas diariamente, nas quais, tal como no fenômeno da pororoca, fica difícil saber o que é o Solimões e o que é o Rio Negro. O sentimento de desterro nos assombra ao pensarmos, enquanto humanos e professores, que toda essa informação aleatória, ou fruto do algoritmo das grandes transnacionais da informação automática, se configura em memórias que agenciam comunidades em movimento de retroalimentação criando uma mônada, um mundo virtual, que, ora ou outra, reconstrói nossa realidade, nossa visão de mundo. A internet, com esse banco de dados colossal, essa caixa de pandora moderna, dá ao professor e ao aluno oportunidade e status de um verdadeiro demiurgo, com total liberdade de restauração da memória individual e, também, científica.

Nossos alunos, como nativos digitais, e boa parte da população mundial, em geral, na maioria imigrantes digitais, cada dia mais, vivenciam a experiência de forma fragmentada. Vídeos são lançados às enxurradas nos canais de stream, enquanto telespectadores saltam freneticamente de canal em canal. Contraditoriamente, nunca se leu tanto, mesmo que, na maioria dos casos, tais textos tenham a relativa densidade de um twitter ou meme. Na navegação pelo mar da internet, a legitimidade dos grandes piratas angariadores de likes, se dá, cada vez menos, pela razoabilidade ou coerência do que se professa e, cada vez mais, pelo carisma ou qualquer outro poder obscuro de rebanhar seguidores. Aos políticos que entenderam, sentiram ou embarcaram nesse novo mundo, o presente os regala com o poder. De Trump a Bolsonaro, em conúbio com as “estratégias” da pós-verdade, tal qual tipo como Bannon, assistimos com likes e dislikes à barbárie da dissolução do poder que antes era signatário de grandes conglomerados midiáticos.15 E, com todo esse panorama, ainda escutamos aqueles que se refugiam em uma estéril nostalgia, que se apegam a um passado que nunca existiu ao lembrarem de alunos muito diferentes e de professores respeitados e reconhecidos, presos em suas memórias.

Nesse “mar” de informações, experienciamos o conhecimento aos moldes de um consumidor afoito em uma loja de conveniências, mais preocupado com o sabor do que com a nutrição. Em uma relação narcisista, encontramos mais do mesmo em cada rede social, e, então, entendemos que, se unido a um grupo específico de idiotas, o ignorante se torna um guru. E, nesse joguete de retroalimentação, causado pelo ápice de uma conjuntura orientada pela indústria cultural,16 nos afogamos em um mar lodoso de saberes, sem distinguir, frequentemente, o que é uma confiável memória científica, filosófica ou artística posta no imbricamento de competição, ódio e ignorância. Na escola, esse contexto emerge da dificuldade de comunicação entre aluno e professor, habitantes de universos distintos, o que se configura como fator complicador para uma coexistência benéfica e produtiva que poderia culminar no exercício da construção de uma memória coletiva. A grande fragmentação e fluidez dos universos culturais dificulta o desejo ocidental de uniformidade. Em alguns momentos, podemos até ansiar pelo mundo pré-digital, uniformizado pelos poucos canais de informação tradicionais e, por outro lado, é possível ceder aos impérios de um relativismo tosco e preguiçoso. Então, encurralamo-nos entre uma perspectiva monoculturalista e uma barbárie completa nas relações.

Diante do exposto, pensamos que nossos alunos vivenciam a condição pós-moderna e têm acesso a uma memória através de informações nem sempre confiáveis. Contudo, a educação formal se encontra na modernidade. Ademais, os professores foram talhados nos moldes da modernidade herdeira do método cartesiano que inviabiliza, por exemplo, a reflexão voltada ao acontecimento da hibridação cultural. Logo, nossas universidades estão fundadas na modernidade, e nossa memória científica? Bem, a memória científica está diretamente ligada à pesquisa de uma comunidade ou de um grupo de pesquisa. Nas universidades, podemos falar sobre o volume de informações que nos chega e os critérios para selecioná-las. A excelência acadêmica é alcançada quando a produção científica atinge padrões estabelecidos por órgãos que a respaldam.

A estrutura educacional é igualmente herdeira da modernidade, porém a situação apresentada em sala de aula, conforme vislumbramos cotidianamente, é a de um aluno que vive a condição pós-moderna. Temos um problema: não há ensamblamento entre escola, professor e aluno. Forçar um aluno a se comportar nos moldes do século XVII, XIX ou mesmo XX, soa tão improdutivo ou violento como inserir um quadrado no espaço de um triângulo, só podendo resultar em fracasso, mutilação, indisciplina ou indiferença.

Tal contraste é sentido também no universo acadêmico. Uma disciplina especializada que se fecha no olímpico isolamento de sua técnica, separando-se de suas origens e de seus fins, um mal próprio da filosofia de gabinete já denunciado por Nietzsche e Schopenhauer. O que, originalmente, se colocava como arauto da emancipação por sua incapacidade de se situar na totalidade do saber, na realidade humana, perde qualquer valor de cultura e se converte em alienação. Tal dialética do esclarecimento é atestada e sentida de modo evidente na crise de nossa civilização.

Uma conclusão

Em virtude dos fatos aqui expostos, podemos irmanar a concepção de que o paradigma ainda em construção, ao se pautar por uma nova lógica, nos possibilita, considerando as críticas à modernidade, dar vazão a um novo horizonte ético que considere o homem em sua integridade,17 como sujeito peninsular (que habita entre o biológico e o cultural), e não, como sonhava a modernidade, como homem insular, tido tal como um ente sobrenatural, desenraizado do corpo e da natureza. Esse debate nos pede coragem e seriedade, coragem para admitir a corrosão da escolha moderna e seriedade para não sucumbirmos a uma mera apologia do pós-moderno.

Sobre isso, Odisseu tem muito a nos falar, como uma configuração dos ideais gregos. O personagem não nega a existência do “canto das sereias” e decide escutá-lo, mesmo que preso à segurança do mastro do navio – o mito não cala. É preciso reconhecer a verdade de Homero; e, pior que o sucumbir ao canto das sereias, é o seu silêncio. Portanto, um postulado que levantamos, aqui, é a necessidade de integrarmos o que foi relegado à marginalidade. E isso inclui a admissão do homem como ser determinado, exprimido e expresso entre o determinismo cultural e o determinismo genético, pois, somente desse modo, como sujeito radicalmente crítico, cônscio de seu caráter, o homem poderá resgatar sua autonomia, mesmo que relativa, como elemento que retroage sobre sua própria natureza para além da escolha iluminista. Reconheçamos, tal como Odisseu fez no final de sua odisseia, que somos homens, nem mais nem menos, apenas homens.

Portanto, se quisermos encontrar novas configurações que tragam ensamblamentos mais econômicos nas relações de ensino e aprendizagem, é necessário reavaliar nossos papéis para além da lógica arbórea do modelo moderno, centrado em uma epistemologia hierárquica, estabilizada na centralidade e centralização do conhecimento. É urgente e sintomático que as engrenagens do modelo escolar moderno patinam em nosso cotidiano fluido. Devemos afiar nosso olhar filosófico no intuito de vislumbrar novos rizomas capazes de planificar, mesmo que subterraneamente, novos caminhos. Tal procedimento traz consigo uma suspeita sobre a concepção escolástica de ensino, como mera doutrinação, que visa a aproximar o homem de um saber imutável. Assim, fica a suspeita, até certo ponto óbvia, para alunos e professores atentos, de que a escola, da maneira como a concebemos atualmente, ao menos no Brasil, tem se tornado obsoleta, promovendo o mau uso do capital, principalmente humano, em sua manutenção. Indica-se, portanto, a necessidade de ressignificar o papel da escola e, com ela, todos os conceitos que a gravitacionam.

3No primeiro parágrafo de A condição pós-moderna, Lyotard já define, “em termos diretos, seu conceito estelar e o papel gravitacional do mesmo em sua filosofia: “pós-moderna” [...]. Designa o estado da cultura após transformações que afetaram as regras dos jogos da ciência, da literatura e das artes a partir do final do século XIX. Aqui, essas transformações serão situadas em relação à crise dos relatos” (2000, p. 15).

4Dentre os que defendem a retomada da modernidade, podemos encontrar Husserl que demonstra a necessidade de se renovar o conceito de razão para além de uma concepção que oriente uma matematização da vida, manifesta na crise da cultura europeia, na qual o modelo das ciências da natureza se estabelece como única possibilidade de conhecimento científico. Daí a necessidade, segundo Husserl, de combater o objetivismo do sistema das proposições da ciência objetiva, já que esse equívoco promoveu a matematização do mundo da vida (Lebenswelt), gerando um distanciamento da ciência dos problemas humanos.

5Segundo Abbagnano (2007, p. 792), é possível identificar, basicamente, três posturas em face da crise da modernidade: 1) o neomodernismo, próprio daqueles que defendem a necessidade de levar a cabo o projeto iluminista; 2) o antimodernismo, que sugere, obviamente, uma rejeição à modernidade em prol, nesse caso, de uma volta aos ideais medievais ou aos clássicos e arcaicos; 3) o pós-moderno ou, segundo sugere, como uma representação mais neutra, o tardo-moderno, atitude que indica a exaustão da escolha moderna e aposta em nova condição.

6Aproveitamos aqui para ressaltar que a opção por dois teóricos com divergências incontornáveis não buscou o diletantismo, almejou-se, pelo contrário, expor os perigos que nos assediam ainda hoje, tal como atesta o professor Giacoia em seu artigo “Sobre o filósofo como educador em Kant e Nietzsche”: “Refiro-me, primeiramente, ao risco envolvido na especialização extrema e atomizante, a que pode conduzir uma erudição meramente histórico-filológica, desacompanhada de motivação e interesse vital; um risco, aliás, firmemente fomentado pela racionalização utilitarista e pela moderna divisão mercantil da produção intelectual. Refiro-me, em associação com isso, ao perigo de submeter o ideal de formação a injunções e interesses que lhe são estranhos e que podem conduzir ao barateamento irreversível do talento filosófico. É por isso que devemos estar atentos ao que nos apregoam como ‘flexibilização’, adaptação às necessidades regionais ou mercadológicas” (GIACÓIA JÚNIOR, 2005, p. 94).

7Distante do otimismo racionalista que influenciou Kant, Husserl aponta, em sua obra, justamente a matematização das ciências, através da ruptura surgida entre o objetivismo fisicalista e o subjetivismo transcendental, como o elemento fulcral da eclosão da crise europeia, não somente na dimensão epistemológica, mas, também, nos planos éticos e civilizacionais. Desse modo, a crise, no pensamento husserliano, denota a falta de racionalidade que possibilite abordar os assuntos concernentes à existência humana. Soma-se a esse apontamento, a crítica de Lyotard que, além de destacar, do mesmo modo, a importância do vínculo social na legitimação das metanarrativas, sugere que a modernidade, em Kant, se dá de modo imperfeito, já que a metanarrativa é cindida em dois grandes ramos: a especulação (conhecer) e a emancipação (querer), diferentemente da aglutinadora filosofia hegeliana.

8Como é definido no prefácio da primeira edição da Crítica da razão pura: “[...] é um convite à razão para de novo empreender a mais difícil das suas tarefas, a do conhecimento de si mesma e da constituição de um tribunal que lhe assegure as pretensões legítimas e, em contrapartida, possa condenar-lhe todas as presunções infundadas; e tudo isto, não por decisão arbitrária, mas em nome das suas leis eternas e imutáveis. Esse tribunal outra coisa não é que a própria Crítica da razão pura” (KANT, 2001, p. 31).

9No parágrafo 11 da 1ª seção da Fundamentação da metafísica dos costumes, ao analisar a relação entre ações conforme o dever e a moralidade, Kant estabelece que o valor autenticamente moral da ação se caracteriza nas ações em que há coincidência entre a ausência de inclinações e a conformidade com o dever, ou seja, a moralidade se encontra em ações que são simplesmente por dever. Tal como frisa Schopenhauer, para Kant uma ação “[...] só tem valor moral genuíno quando acontece simplesmente por dever, sem qualquer tendência relacionada a ela. O valor do caráter só se institui quando alguém, sem simpatia no coração, frio e indiferente ao sofrimento de outrem, realiza boas ações não nascidas, na verdade, da solidariedade humana, mas apenas por conta, do enfadonho dever (SCHOPENHAUER, 1995, p. 40).

10Não impunemente, diante do aspecto prisional, o colégio em que leciono tinha, ou tem, como alcunha o nome de “Cadeião”, o que levou e leva alguns pais a matricularem seus filhos em colégios mais distantes. Curiosamente, o colégio em que estudei dois terços de meu Ensino Médio, não tinha uma fama muito diferente, mesmo sendo de outra região da cidade, sendo conhecido como “Lurdão”, designação que sugeria uma singela rima, “entra burro e sai ladrão”. Rima, muitas vezes, entoada com um estranho orgulho pelos próprios alunos, assim como o “carinhoso” apelido de meu colégio atual.

11“É natural, imagino, para qualquer professor do Ensino Médio atestar, na prática, a atmosfera prisional das escolas, com seus muros, grades, câmeras e, mais recentemente, a presença de policiais militares.”

12Entendemos memória como evocação do passado, um exercício de reconstrução de lembranças individuais, coletivas e científicas.

13Uma das marcas de nosso mundo pós-moderno ou da crise da modernidade se apresenta na multiplicidade de agenciamentos possíveis, e isso pode ser explicado pela imensa fragmentação do conhecimento que, com o advento do mundo digital, deixou de ser monopólio de uma casta priveligiada, seja na figura de um filósofo, seja na de cientista ou professor, como arautos da razão. Pelo contrário, a trágica marca de nosso tempo parece se substanciar muito mais em mecanismos e estratos passionais, que, se bem-administrados, podem engajar grandes massas em caminhos obscuros aos desígnos da razoabilidade.

14Cómico é o fato de que, na mesma página em que encontrei a citação de Eco, havia um vídeo com a seguinte legenda “Garota quebra cama ao ganhar like de pretendente”, fato que corrobora a posição do autor sobre o ombreamento entre o conhecimento científica e historicamente construído, e a opinião, presa ao senso comum: “Normalmente, eles [os imbecis] eram imediatamente calados, mas agora eles têm o mesmo direito à palavra de um Prêmio Nobel.” Disponível em: (https://www.terra.com.br/noticias/educacao/redes-sociais-deram-voz-a-legiao-de-imbecis-diz-umberto-eco,6fc187c948a383255d784b70cab16129m6t0RCRD.html. Acesso em: 17 dez. 2018.

15Se, no ápice do mundo moderno, o indivíduo se encontrava em uma situação de submissão diante da administração da cultura e informação, como apontam as análises da indústria cultural, hoje, ironicamente, talvez como revés do “pêndulo da história”, o que vivenciamos é a total fragmentação do poder de comunicação que, nas mãos de aproveitadores e/ou megalomaníacos, se substanciam em ataques às bases do pensamento administrado pela grande imprensa.

16O conceito não se refere aos veículos (televisão, jornal, rádio...), mas à utilização dessas tecnologias por parte da classe dominante. A produção cultural e intelectual passa a ser guiada pela possibilidade de consumo mercadológico. É um termo cunhado por Theodor Adorno (1903-1969) e Max Horkheimer (1895-1973), membros da Escola de Frankfurt. Os autores criaram o conceito de “indústria cultural” para definir a conversão da cultura em mercadoria.

17A integridade que nos é sugerida, na visão pós-moderna, aponta para um ideal nietzschiano de homem, como indivíduo capaz de aceitar a vitalidade em sua totalidade contraditória, como em uma dança entre Apolo e Dionísio.

Referências

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Recebido: 29 de Junho de 2020; Aceito: 06 de Julho de 2020

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