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Acta Scientiarum. Education

versão impressa ISSN 2178-5198versão On-line ISSN 2178-5201

Acta Educ. vol.42  Maringá  2020  Epub 01-Set-2020

https://doi.org/10.4025/actascieduc.v42i1.52938 

HISTÓRIA E FILOSOFÍA DA EDUCAÇÃO

Memes sobre ciência e a reconfiguração da linguagem da divulgação científica na cibercultura

Memes about science and the reconfiguration of the language of scientific divulgation in cyberculture

Memes sobre ciencia y la reconfiguración de la lengua de la divulgación científica en la ciberultura

Kaio Eduardo de Jesus Oliveira1  * 
http://orcid.org/0000-0002-5390-0593

Cristiane Porto2 
http://orcid.org/0000-0001-5622-030X

Leonardo Fraga Cardoso Junior 2 
http://orcid.org/0000-0001-8926-0121

1Faculdades Integradas de Sergipe, Rua Manoel Oliveira César, 450, 49300-000, Tobias Barreto, Sergipe, Brasil.

2Curso de Comunicação Social, Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade Tiradentes, Aracaju, Sergipe, Brasil.


RESUMO.

Os memes na contemporaneidade tem assumido um papel importante como mais um dispositivo que ganha novas aplicabilidades e redimensionamentos na Cultura Digital. No que se refere à divulgação científica, estabelece uma produção de cenários distintos e novas maneiras de manifestação dessa forma de produção em rede. O texto analisa a produção e a reprodução de memes acerca da ciência sob a ótica de sua linguagem digital. Isso se dá a partir da construção de um modelo de comunicação que articula diferentes elementos morfológicos, sintáticos e semânticos em rede, como intertextualidade, humor e representação estética. Trata-se de uma pesquisa qualitativa com abordagem exploratória em páginas do Facebook, buscando entender como a partir da produção dos memes cria-se, paralelamente, uma forma de comunicação científica, deslocando e propondo um lugar-outro de circulação de informação, de ideias e fatos científicos. Observa-se que o meme na ótica deste trabalho, articula a produção de uma divulgação científica, que não parte obrigatoriamente de um ‘lugar institucionalizado’, mas que se manifesta em meio a uma miríade de novas formas de popularização de conhecimentos científicos. Assim, fundamenta-se na ideia de uma maneira diferente de fazer divulgação sobre ciências que tem como panorama o uso de tecnologias digitais e capacidade de autoria dos usuários das redes na cultura digital.

Palavras-chave: educação; divulgação científica; memes; cultura digital

ABSTRACT.

Memes in contemporaneity have been playing an important role as one more digital device that acquires new applicabilities and is redimensioned in Digital Culture. When it comes to scientific dissemination, they establish a production of distinct scenarios and new ways of manifesting this web production. The article intends to analyze the production and the reproduction of memes about science. This is possible through the construction of a kind of language that articulates different morphological, syntactic and semantic web elements, such as intertextuality, humor and aesthetic representation. To achieve it, a qualitative research with an explorative approach was conducted in Facebook pages, searching for, among other elements, how a form of scientific communication is created, in a parallel way, through the production of memes, relocating and proposing a new place for the circulation of information, ideas and scientific facts. It is observed that the meme means, through the optics of this work, the production of scientific dissemination that does not necessarily come from an ‘institutionalized place’, but that manifests in the midst of a myriad of new forms of popularizing scientific knowledge. Therefore, it is funded by the idea of a different way of disseminating science, having as outlook the use of digital technologies and the ability of authorship of web users in digital culture.

Keywords: education; scientific divulgation; memes; digital culture

RESUMEN.

Los memes en los tiempos contemporáneos han asumido un papel importante como otro dispositivo digital que gana nueva aplicabilidad y cambia de tamaño en la cultura digital. Con respecto a la difusión científica, establece la producción de diferentes escenarios y nuevas formas de manifestar este tipo de producción en red. El texto pretende analizar la producción y reproducción de memes sobre ciencia desde la perspectiva de su lenguaje digital. Esto ocurre a partir de la construcción de un tipo de comunicación que articula diferentes elementos en red, sintácticos y semánticos, como la intertextualidad, el humor y la representación estética. Es una investigación cualitativa con un enfoque exploratorio en las páginas de Facebook, que busca, entre otros elementos, cómo, a través de la producción de memes, se crea una forma de comunicación científica en paralelo, desplazando y proponiendo un lugar, otro para la circulación de información, ideas y hechos científicos. Se observa que el meme significa, en la perspectiva de este trabajo, la producción de una difusión científica, que no necesariamente parte de un ‘lugar institucionalizado’, sino que se manifiesta en la miríada de nuevas formas de popularizar el conocimiento científico. Porque se basa en la idea de una forma diferente de diseminar la ciencia que tiene como panorama el uso de tecnologías digitales y la autoría de los usuarios de la red en la cultura digital.

Palabras-clave: educación; diseminación científica; memes; cultura digital

Introdução

Quando analisamos o processo de popularização da ciência nos últimos anos, percebemos como em pouco tempo a internet tem possibilitado a construção de variados cenários para a expansão de diferentes concepções de Ciência. Em ambientes digitais e, especialmente, por meio das redes sociais, é possível fazer apontamentos quanto à construção dos sentidos e de aprendizagens, em relação ao discurso textualizado ou em correlação a outros meios.

Neste cenário, de mediação de diferentes linguagens que viabilizam este tipo de comunicação, evidenciamos que há em muitas situações a necessidade de um referencial mínimo para a produção, mesmo que cômica, de conteúdos on-line, em especial nas mídias sociais. Os memes, por exemplo, efetivam situações de aprendizagem, que possibilitam que os sujeitos articulem uma produção de sentidos do que foi então publicado e oferecido à sua leitura singular.

Por meio de um meme relacionado à ciência, por exemplo, a informação pode se transformar em conhecimento, baseando-se nas condições de produção, ligados ao contexto sócio-histórico e à memória ou ao debate público que, pode, também, ser agregado ao conteúdo, embora isso não seja uma regra. Com base nas condições de produção, a informação neste tipo de artefato digital é significada de maneiras distintas, já que sua replicação não é uniforme. Nem igual para todos, no que diz respeito ao sentido que lhe é atribuído, ou seja, cada sujeito o interpreta, implicando sua visão de mundo.

A maneira como nos apropriamos de determinada informação sobre uma ciência, um personagem dela, um fato científico em formato de meme ou uma piada situacional sobre questões políticas ligadas ao meio científico, repercute nossa concepção de ciência e afeta nossa maneira de problematizar determinados temas. A forma como os memes projetam a intencionalidade de um ‘texto’ ao leitor (Orlandi, 2010) pode ser diferente da forma como um jornal impresso ou revista sobre ciências e até um programa de televisão o faz. Ou ainda, como um programa de rádio e os museus de ciência estabelecem sua relação comunicacional, porém a relação entre esses interlocutores constitui um processo de produção da leitura ou da tradução do sentido ligado à mensagem, ao contexto cultural e a possibilidade de construção de sentidos viabilizados pelos elementos constitutivos da mensagem do meme.

Enquanto a Divulgação Científica em programas de televisão e museus teria uma via mais estreita, com um nível de intensidade menos frenético do que o obtido no digital, especialmente, pela interação quase inexistente. Na internet, a resposta e replicação instantânea faz com que a produção e compartilhamento de um meme sobre um fato científico, mesmo, problematizando com deboche e de forma satírica, trabalhe de maneira quase ininterrupta em sua produção. O que consiste, algumas vezes, numa mera repetição, ou variações desse, de forma fragmentada e multidirecional, mas em colaboração a partir da capacidade de autoria de cada sujeito implicado nesta ação.

A produção de um meme em páginas no Facebook, ou outra rede social, parte da utilização de elementos com diferentes formatos e recursos multimídia para construir um diálogo que se diferencia em muitos aspectos da comunicação científica institucionalizada. Essa produção cria paralelamente uma forma de comunicação científica, deslocando e propondo um lugar-outro de circulação de informação, de ideias e fatos científicos. Com seu segmento de público, um meme propõe e expõe determinado argumento, interpretado, por cada sujeito ativo no compartilhamento, ou que apenas recebe, interpreta e atribui sentido a linguagem digital, por meio de sua leitura singular.

Essa ação de deslocamento da linguagem científica construída pelos memes significa na ótica deste trabalho a produção de um tipo de divulgação científica, que não parte obrigatoriamente de um ‘lugar institucionalizado’, mas que redimensiona a popularização de conhecimentos científicos, pois estrutura-se na ideia de uma comunicação sobre ciências que tem como cenário o uso de tecnologias digitais e as potencialidades culturais que elas atribuem ao sujeito em mediação com suas funções e com a capacidade individual de autoria, criatividade e interpretação.

Se a divulgação científica, conceitualmente, é pensada como um modo de possibilitar a apropriação social da ciência, pela mudança ou pela recodificação de linguagens, essa articulação é inerente à possibilidade de construção de processos de aprendizagens nos atos de tradução e interpretação. A construção destes exercícios de divulgação científica com os memes, mesmo que não intencionais, exigem uma aceitação não só do tema por parte do sujeito, mas das condições de produção em que o seu discurso está implicado e onde foi produzido.

Assim sendo, por meio de uma pesquisa qualitativa com abordagem exploratória em páginas do Facebook, este texto tem como objetivo geral analisar a produção e a replicação de memes sobre ciência sob a ótica da linguagem digital. A partir da construção de um tipo de linguagem que articula diferentes elementos morfológicos, sintáticos e semânticos em rede, como intertextualidade, humor e representação estética, estes artefatos produzem sentidos, subjetividades e experiências de aprendizagem coletivas, pela bricolagem e pela autoria de cada sujeito implicado em rede.

Deste modo, nas páginas a seguir o trabalho reflete, em um primeiro momento, a produção de memes sobre ciência no contexto on-line a partir de estratégia comunicativas. Em seguida, o texto discute como memes podem produzir sentidos e subjetividades em rede, a partir das experiências coletivas dos usuários na replicação de memes sobre personagens e fatos da ciência no Facebook.

Produção de memes sobre ciência na cultura digital

As condições de produção dos memes, enquanto divulgadores de ciência, são outras em relação as dos diferentes meios de divulgação científica, inclusive nas próprias redes sociais. Os memes neste caso, enquanto produtos culturais e expressões de nossas experiências, carregam, similarmente, em si a linguagem cultural da Cibercultura e com ela a implicação com o cotidiano do público, que não se define como um público-alvo da divulgação científica especificamente, mas como um público em potencial, que pode se identificar ou não com a mensagem, compreender totalmente ou parcialmente o enunciado do meme e que, é capaz de se apropriar do conteúdo pela piada, pelo tipo de humor ali contido, ou pela brincadeira implícita e atribuir sentido a eles. Bakhtin (2010) explica que este tipo de público, que é atingido indiretamente por um eventual discurso, pode ser pensado como um público ‘superpudestinátario’.

Isso pode ser exemplificado, ao passo que todo meme, mesmo que não apresente autor em tempo e espaço correlatos, designa sua produção a um destinatário, que pode, por sua vez, ser mais ou menos concreto e concebido com um variado grau de consciência em rede e se materializa em distintos modos de ler. E, de igual modo, este conteúdo pode atingir um terceiro elemento constitutivo do enunciado “[...] cuja compreensão responsiva, absolutamente exata é pressuposta seja num espaço metafísico, seja num tempo histórico afastado” Bakhtin (2010, p. 357) esclarece que o superdestinatário não é o segundo elemento do diálogo, outro sujeito ou discurso, mas, sim um terceiro elemento que se mostra sempre superior e imanente ao ato comunicativo.

Um enunciado em um meme sobre ciência se dirige não somente a um destinatário imediato, cuja presença é percebida, mais ou menos, conscientemente, mas, igualmente a um ‘superdestinátário’. Ou melhor, um público afetado sem estar diretamente ligado ao diálogo (Fiorin, 2018). Assim como a divulgação científica em meios mais tradicionais, todo meme contém um enunciado, um discurso inerente a sua construção, que se mostra na releitura, ou em múltiplas leituras em relação à produção original.

Este fato pode ser compreendido apenas pela piada empregada e articulada diretamente a um interlocutor, todavia, ao mesmo tempo, pode afetar diferentes sujeitos e públicos de modos diferentes. Mesmo que não estejam atrelados, diretamente, ao seu significado, uma vez que o meme carrega consigo subjetividades e construções discursivas que articulam relações de poder, afetos, mobilizações, engajamentos, indignações, sentimentos e aprendizagens.

A construção da linguagem digital do meme, quando produzido sobre um fato científico, por exemplo, faz com que o sujeito seja inserido em um ecossistema além do tradicional, uma ambiência justaposta, onde o potencial imagético e semiótico pode ser aguçado e tornar-se fundamental na construção dos sentidos que se articulam a diferentes atores mobilizados por aquele exemplo particular.

Essa situação ocorre, com um importante fator adicional, que é a comunicação informal via mensagens compartilhadas, reproduzidas e ressignificadas de maneira instantânea, por diferentes mídias. Tudo isso, a partir da autoria de cada usuário de uma rede, vinculada diretamente ao conteúdo ou relacionada a ela, que acontece devido às características do ambiente digital (legendas em redes sociais, links para conteúdo complementar). É por isso que entendemos que a produção de sentidos com os memes sobre Ciência é diferente de outros formatos de divulgação científica, posto que constroem deslocamentos deste gênero de linguagem.

Na produção e replicação de memes sobre Ciência, os enunciados, a intertextualidade, as relações dialógicas, o próprio discurso que o meme carrega na construção da mensagem efetivam a ação comunicacional. Mesmo pela interlocução da paródia, da sátira, da ironia, estes elementos tornam os memes peculiares na comunicação sobre uma ciência, um personagem da história da Ciência, um fato científico, ou sobre questões políticas que interferem diretamente a produção científica.

Além dos temas e questões que pode carregar, a produção e replicação de um meme pode acontecer por meio da composição da piada, do deboche inerente a mensagem implícita, pela comicidade aplicada em seu contexto, na composição do seu enunciado, ou apenas pela popularidade de determinado tema. Este, pode representar os modos como os sujeitos se representam e se posicionam em ambientes on-line.

A construção desta linguagem não ‘formalizada’ e desvinculada de um ambiente institucional caracteriza um tipo divulgação científica independente, uma vez que nem todo meme sobre Ciência tem como propósito divulgar conteúdo científico e promover aprendizagem. Entretanto, isso pode ocorrer, já que é construído a partir da apropriação de elementos do meio científico e que exigem interpretações. Além disso, não se articula a uma instituição, a um laboratório, ou a uma linha editorial da imprensa, mas a autopublicação, originada pela autoria visual de cada produtor de meme com a intenção de problematizar, debochar ou apenas repercutir uma situação.

Do ponto de vista discursivo, a comunicação sobre ciências materializada por memes na internet ocorre mediante experiências culturais dos sujeitos, fazendo com que, a partir desse ‘contato’ com o discurso científico pelo humor memético, seja desencadeado um percurso de produção de sentidos diferente. Isso por meio da unidade de informação contida nele. E, de igual modo, do possível interesse despertado pelo meme, podendo ampliar a curiosidade sobre as temáticas inerentes às piadas, às paródias, às ironias, nos variados tipos e formatos de memes e em distintos níveis de alcance. Vejamos o exemplo na Figura 1.

Fonte: Artes da Depressão (2019).

Figura 1 Einstein rindo. 

O ato de ler e interpretar este meme compartilhado no Facebook exige que o leitor associe as características que fazem, implicitamente, o meme ter sentido engraçado, aos elementos da Tabela Periódica da Química, que se tornam lúdicos ao serem relacionados às expressões de riso das práticas comunicativas em redes sociais e expressarem, igualmente, uma nova maneira de representação da Química, ganhando sentido. Ao usuário desatento, talvez este post não estabeleça nenhuma relevância, não obstante que, para entendê-lo é preciso articular os signos da linguagem digital e da composição estética do meme às características da Química, enquanto ciência, representada pelos elementos da Tabela Periódica e, assim, produzir um significado.

O meme em formato de imagem, da Figura 1, problematiza questões ligadas a Tabela Periódica dos elementos químicos, associados à composição de expressões típicas de troca de mensagens em redes sociais que representam a sonoridade de uma gargalhada (kkk) e um sorriso sem graça (hehehe), articuladas à expressão do físico Albert Einstein em correlação com as legendas. Esta composição estética e semântica por sua vez representa o símbolo de dois elementos químicos, o Potássio (K) e o Hélio (HE), e um enunciado que exige um exercício de tradução de quem lê o meme e se propõe a entender seu significado. Por sua vez, igualmente, se estabelece a uma coleção, ao passo que permite a replicação de outras versões por parte dos usuários inseridos neste discurso, como mostra os comentários da imagem.

É por isso que enfatizamos que a maioria dos memes não são produzidos para a divulgação científica, mas como piadas e brincadeiras situacionais no digital em rede. Entretanto, a implicação de sentidos relacionada com a ciência e com a divulgação científica propõe aspectos de uma releitura que é feita em sua construção, uma vez que o cerne da produção de sentidos está no modo de relação (leitura) entre o dito e o compreendido (Orlandi, 2008), por um sujeito historicamente determinado.

A compreensão da leitura, neste caso específico, é saber que o sentido do meme poderia ser outro, mas a compreensão, no entanto, supõe uma relação com a cultura, com a história, com a linguagem, com as experiências individuais e coletivas, que podem ser atravessadas pela reflexão e pela crítica construída por cada indivíduo. “O sujeito que produz uma leitura a partir de sua posição, interpreta. O sujeito-leitor que se relaciona criticamente com sua posição, que a problematiza, explicitando as condições de produção da sua leitura compreende” (Orlandi, 2008, p. 117).

Os memes enquanto componentes discursivos de divulgação científica e da linguagem digital produzem efeito de sentido, com alterações e replicações do singular, e do diferente, da paráfrase e da polissemia. Dois eixos que constituem o movimento da significação entre repetição e a diferença, que podem romper com a comunicação institucionalizada sobre Ciência, o que resulta em interpretações e significações diferentes, deslocamentos de linguagem e de sentido, autorias individuais e coletivas e reconfiguração de contextos.

A polissemia neste contexto é um elemento importante e pode ser entendida pelas multiplicidades de sentidos que este tipo de linguagem permite. Já a paráfrase, erigida nos memes, se relaciona à construção de um sentido auxiliar, ou paralelo que funciona como um recurso de interpretação, trocando elementos básicos da constituição do sentido, mas mantendo a ideia central. Esta característica se relaciona diretamente a noção de intertextualidade, ou seja, a articulação entre diferentes textos e contextos, como é comum em muitos memes, que misturam personagens e fatos em situações e expressões diferentes aos reais.

Em detrimento disso, apropriar-se da narrativa de um meme na Cibercultura exige tradução de seus códigos, de suas legendas, compreensão de seus personagens, seus contextos e suas correlações. A interpretação está presente em toda e qualquer manifestação da linguagem e o meme, enquanto linguagem digital, também exige uma leitura particular, pois não há sentido sem interpretação. Com isso, os diferentes gestos de interpretação, uma vez que memes usam diferentes formas da linguagem, com suas diferentes materialidades, podem significar de modos distintos, (Orlandi, 2010) e promover formas diferentes de aprender.

O modo como os memes produzem discursos discurso desestabiliza a posição ‘divulgador de ciência’, inclusive, do jornalismo científico, por muito já consolidado, que trabalha com um conjunto de recursos que se modificam e são modificados constantemente. Diferentes materialidades, profissionais especializados, estratégias de planejamento e comunicação que, no discurso de um meme ou coleção deles, dispensa essa materialidade e pode ser construído por um sujeito implicado com as práticas culturais da cultura digital, deixando a produção da divulgação científica, neste caso, de ter uma centralidade articulada às intencionalidades formais para a construção de uma linguagem alternativa mediada pela comicidade e pela ludicidade.

A linguagem dos memes desestabiliza, ao mesmo tempo, a posição do leitor, apesar da clássica leitura linear ocidental da esquerda para a direita e de cima para baixo. Um meme em sua composição exige uma nova forma de leitura, que convida o leitor a romper com essa forma de leitura já posta, uma vez que é produzido por estratégias de linguagens variadas, com diferentes recursos estéticos e audiovisuais, como imagens, sons, vídeos e hipertexto que permitem ao leitor um modo singular de aguçar sua leitura.

Desse modo, podemos ‘ler’ primeiro suas cores, seu formato, seus sons, os personagens ali inseridos, a presença ou ausência de frase escrita, seus recortes e suas colagens, suas paráfrases e polissemias e suas correlações, para compreender também sua mensagem. Visto que, o rompimento na forma de uma leitura já posta, faz com que os sentidos possam partir para qualquer direção, assim como a não linearidade da leitura, quando comparada ao que se requer de um texto escrito de divulgação científica em uma revista, por exemplo. Deste modo, é possível estabelecer formulações diversas no mesmo contexto de significação (Orlandi, 2008). Com isso, a contrução dos sentidos não se diliu, não desaparece, nem se institue e permanece, mas está sempre em movimento.

O discurso de divulgação científica em formato de meme é implicado de sentidos diferentes, assim como o texto, já que ele parte em múltiplos planos significantes. Diferentes versões de um meme resultam em novos produtos significantes, ou seja, uma meme sempre surge de outro meme. Um meme sempre remete a outros memes, a outros discursos dispersos no espaço-tempo, simulando um passado, reinterpretando-o (Chagas, 2020).

Os memes não exigem ‘paternidade’ ou reconhecimento autoral para surtirem efeitos e instigarem versões e variações. Essa é uma das características mais notórias: não necessitar reconhecimento de quem o produz em sua totalidade faz com que o meme trace conceitos próprios de criação dentro do cenário conectado dos ambientes digitais e não exijam vínculo ao meio científico para ‘falar de Ciência’.

Quando associado ao elemento anterior, na concepção estética a possível ‘ausência de autoria’ faz com que o meme produza, nos sujeitos, um sentido marcante, cujo efeito é o ‘de todos para todos’. Isto é, um sentido característico e próprio da cultura digital, que soa como algo de todos os sujeitos, simultaneamente, quase como um patrimônio público daqueles que transitam por esta ambiência, onde todos podem criar e compartilhar um meme e replicar sua visão de mundo acerca do conteúdo. O que não é muito comum em um texto de um pesquisador ou um texto de divulgação científica.

Nesse sentido, se algum usuário da rede deseja criar um meme, ele já está exposto a todos os discursos que o precederam em um ambiente digital e as outras experiências on-line. Afinal, ao fazer circular uma imagem em discurso memético, as derivações se constroem a partir da formação discursiva que ele possui, materializada pela replicação. A replicação não, necessariamente, significa imitação, dado que cada meme expressa seu sentido pessoal, mas autoria, visto que, de forma colaborativa ele pode continuar o debate ou dar um desfecho a uma narrativa, com um novo meme, independentemente de seu formato.

A apropriação de um meme sobre Ciência, portanto, permite experiências de aprendizagem, pois ao curtir uma página que replica memes em redes sociais, compartilhá-los ou comentar publicações, o sujeito, em relação, inscreve-se num determinado campo de saber e de interesses. Isso faz com que esse sujeito consuma aquela página, seus discursos, filiando-se à sua ideologia no compartilhar realizado pela página, no compartilhar de memes que abordam a ciência e a tecnologia, entre outras questões.

O ator de ‘curtir’, comentar ou compartilhar um meme em nossas experiências on-line se configuram como práticas sócio-históricas de nosso tempo, sendo uma forma de se dizer algo, executar uma ação ou de formular um procedimento que passa a ter representação e sentido para o interlocutor no ato comunicativo. Portanto, produzir e replicar um meme não é uma simples tarefa de compartilhar conteúdo em um ambiente digital. Trata-se de uma maneira de produzir posicionamentos, construir experiências, autorias e, especialmente, aprendizagens que estão diretamente afetadas pelas condições de humor e de aprendizagens ligadas a determinado conteúdo, como discutiremos nas páginas a seguir.

Memes, produção de sentidos e subjetividades sobre ciência

Para entender um meme sobre Ciência é importante observar as relações dialógicas que se estabelecem na construção dos sentidos de sua linguagem, em razão que ele agrega diferentes formas de expressão em um único artefato. Segundo Fiorin (2018), o dialogismo no pensamento bakhtiniano se remete às relações de sentido que se estabelecem entre enunciados, uma vez que não são as unidades da língua que são dialógicas, mas os enunciados. Por conseguinte, os memes por si só, não são dialógicos, mas seus sentidos e significados sim, pois produzem relações dialógicas a partir das leituras, das traduções, dos comentários atribuídos, dos compartilhamentos e das experiências compartilhadas em redes sociais.

Limor Shifman (2014) em um estudo pioneiro sobre memes na cultura digital reconhece que as traduções, a partir das leituras dos memes, são fundamentais para a construção de pontes interculturais. Ou melhor, as ‘piadas internas’ contidas nos memes precisam ter sentido compreensível em diferentes culturas para terem efeito. Posto que, nem sempre um meme usado fora de contexto tem sentido coerente para quem o lê. Isso exige um conjunto prévio de conhecimentos para traduzir as referências que são articuladas pela bricolagem de um meme.

Deste modo, o dialogismo observado na replicação de memes pode ser apontado como o modo de funcionamento real de uma linguagem, sendo o princípio constitutivo do enunciado, posto que todo enunciado se constitui a partir de outros (Fiorin, 2018). Nos memes, os enunciados podem ser compostos pela polissemia e pela paráfrase, visto que são sempre melhor compreendidos quando lidos em conjunto ou em coletividade. O que possibilita o entendimento, sua origem, seu contexto, suas derivações, suas referências, quais os elementos que compõem seu discurso, qual a intencionalidade.

O meme na Figura 2, por exemplo, evidencia essa característica bem peculiar nos memes sobre Ciência ao problematizar as questões ideológicas que permeiam o pensamento do educador brasileiro Paulo Freire na estruturação do seu método de alfabetização. Estas questões ideológicas fazem a correlação com a sobreposição das imagens com legendas que questionam um movimento político contemporâneo. Com expressões e gírias, linguagem coloquial, que permeiam o comportamento e a linguagem em redes sociais, durante a sobreposição estética em formato cômico produzem sentidos que podem ser derivados por uma coleção com a mesma moldura.

Vale destacar que, embora não seja notabilizado apenas pelo viés científico, Paulo Freire obtém um notório destaque no campo das ciências em Educação. Deste modo, o meme não se remete apenas ao Paulo Freire alfabetizador, mas ao Paulo Freire pensador e pesquisador de suas práticas pedagógicas e que é referência e base para outras pesquisas em ciências humanas, mas também de polêmicas no contexto político e ideológico.

Fonte: Nãopodemosescreverisso (2019).

Figura 2 Paulo Freire e a construção do saber. 

A imagem recorre à construção de sentido pela intertextualidade, por meio de frases que não se relacionam, contextualmente, mas que na paródia articulada pelo meme produzem uma significação em conjunto para a ‘tradução’, interpretação da expressão publicada pelo educador no livro Pedagogia do oprimido (Freire, 1987). Deste modo, um meme pode despertar um interesse do usuário que não está atento de imediato ao seu significado, mas que pode se apropriar da piada e da brincadeira construída pela linguagem digital e possivelmente entendê-la, atribuindo sua própria interpretação.

A intertextualidade apontada neste caso é uma concepção de análise complexa, a partir da qual todo texto articula outras vozes, de quem pronuncia o enunciado com distintas vozes articuladas. A intertextualidade cobre uma diversidade de possibilidades, como verificação de quais vozes são incluídas e quais são excluídas. Isto é, que ausências significativas podem ser observadas, assim como que presenças podem ser notadas. Esta característica é implícita a um meme sobre Ciência, na medida em que converge em uma única situação elementos e características, contextualmente, distintas para a composição de um sentido específico pela composição estética, pela referência a um fato científico, ou pela piada situacional.

Com isso, a produção de sentidos pode ocorrer em um meme sobre Ciências a partir da associação de referências estéticas, semióticas à semântica da linguagem atribuídas ao contexto empregado ou em correlação a outros contextos. Produzir sentidos e subjetividades não significa entendê-la como origem, mas como um processo, de acordo com a configuração socio-histórica em que o meme pode se situar e causar inquietação a quem se apropria. A subjetividade não é um dado prévio, nem um ponto de partida, mas um ponto de chegada de um processo complexo e em muitos casos contraditório.

É a partir dessa perspectiva que há múltiplas maneiras de se subjetivar, na medida em que o sujeito pode fixar, manter ou transformar sua identidade (Foucault, 1997). As subjetividades, portanto, são construídas na relação com os outros e na construção de situações de aprendizagem que podem ocorrer pela experiência individual e coletiva.

A Figura 3, por sua vez, representa como estes artefatos podem ser produzidos em correlação e em derivação, e que é comum a replicação de memes em formato de imagens com padrões específicos. Ou seja, como uma espécie de moldura, representando uma expressão ou comportamento que se diferenciam nas legendas, em cada implicação do sentido da frase, mas que se articulam pelas referências imagéticas, produzindo uma coleção que pode se referir ao mesmo contexto, ao mesmo personagem, com versões diferentes.

O meme em correlação ainda com a Figura de Paulo Freire problematiza o ‘Movimento Escola sem Partido’. Trata-se de um movimento político contemporâneo no Brasil que crítica um suposto posicionamento ideológico na Educação Brasileira, atribuindo culpa à obra do educador e ao seu método de alfabetização. Em contraposição a este fato, no enunciado do meme é apresentado uma frase atribuída, popularmente, ao educador e ‘ideologicamente’ em discordância do movimento político. Entretanto, vale destacar que tanto o Movimento Escola sem Partido, quanto a frase de Paulo Freire pertencem a tempos e contextos diferentes, mas na produção de significados articulada pela linguagem do meme (com expressões e gírias populares), passam a promover um debate intertextual conjunto.

Fonte: Nãopodemosescreverisso (2019).

Figura 3 Paulo Freire e Escola sem Partido. 

Assim, memes em formato de imagens, conhecidas como ‘image macro’, evidenciam questões até aqui problematizadas sobre autoria visual e produção compartilhada de sentidos, que por meio de signos e símbolos exigem interpretações individuais de cada sujeito. Deste modo, não basta saber o que significa cada uma das unidades da linguagem presentes em um destes artefatos que compõem o enunciado de um meme. Para apreender seu sentido é preciso identificar as relações dialógicas que ele mantém com outros enunciados no discurso (Fiorin, 2018).

O tom expresso nos enunciados dos memes tende para a ironia, para a ‘carnavalização’ de um discurso oficial e não retira deles o lado crítico, pelo contrário, fortifica a criticidade: são como avaliações sociais que retratam acontecimentos sob um determinado ângulo (Bakhtin, 2006). As condições sociais, políticas, econômicas e culturais intervêm em nós, sujeitos enunciadores, influenciando nossas práticas discursivas. Não há como separar o sujeito enunciador do seu local de enunciação. Ao escolher replicar ou não um meme, o sujeito assume sua atitude ativamente responsiva e indicia sua posição social, histórica e ideológica.

Assim, Bakhtin (2010) aponta que as relações dialógicas tanto podem ser contratuais, ou polêmicas, de divergência ou de convergência, de aceitação ou de recusa, de acordo ou de desacordo, de entendimento ou de desinteligência, de avença ou desavença, de conciliação ou de luta, de concerto ou de desconcerto. Os memes, enquanto gênero midiático e como linguagem digital, apresentam essas características, implicitamente, em suas relações dialógicas e nos mais variados exemplos em que são replicados, como forma de evidenciar e expressar nosso comportamento via redes sociais.

A construção de uma relação dialógica mediada por memes em ambientes digitais atuam pelos múltiplos enunciados em circulação sobre muitos temas, isto é, os enunciados ligados pela tradição de que a atualidade é depositária, os enunciados que falam dos objetivos e das utopias dessa contemporaneidade e dos desafios do futuro (Fiorin, 2018). Os memes sobre História, por exemplo, podem desempenhar analogamente esse papel, posto que, a partir de anacronismos, que não é uma característica comum para a historiografia, constroem sentidos em rede, misturando elementos de fatos e acontecimentos distintos, com personagens espaço-temporalmente dispersos. Isso com a intenção de produzir um discurso específico e apresentar um enunciado que só produz efeito com a interpretação destas ações significantes.

Vejamos no exemplo coletivo a seguir um conjunto de memes que a partir da convergência de imagens e legendas, do mesmo personagem, com expressões diferentes, problematiza algumas das teorias científicas mais populares da Física e do ensino de Física: As leis de Newton. A replicação destes memes de Isaac Newton - físico, astrônomo, matemático - inglês, considerado um dos personagens mais influentes da História da Ciência, flerta com um suposto significado, a partir de hábitos representados por expressões coloquiais com alguma correlação de sentido ao contexto original, mas com o objetivo de nos dizer algo.

Fonte: Minhacaraquando (2019).

Figura 4 As três leis de Newton. 

Esta bricolagem de elementos, representados no padrão estético do meme, que carrega em seu enunciado a representação de um dos mais importantes personagens da História da Ciência pode não seguir fielmente os fatos científicos que o envolvem, nem traduzir, literalmente, a importância das descobertas de Newton para a Física, mas problematiza questões que envolvem teorias e atores ligados a elas.

Entretanto, funciona como unidade de representação e de informação sobre um fato científico, ou de questões relacionadas a teorias da ciência. E este pode, potencialmente, despertar o interesse do ‘público leitor’ e articular um lugar-outro para o debate sobre ciência, ou simplesmente pela brincadeira, por meio de pedagogias dos memes que se dão, neste caso, por meio da ludicidade e do humor, e pela convergência de sentidos (Oliveira, 2020).

Buscamos demonstrar com estes exemplos que ler um meme sobre Ciência e produzir sentidos e subjetividades sobre eles não significa aprender mais ou menos sobre um determinado tema, independentemente do formato que são replicados. Os memes sobre Ciência são carregados de valores ideológicos e intencionalidades, bem como representações da intenção de quem os produz. Desse modo, as práticas de letramento inerentes à interpretação deles podem levar ou não o sujeito a uma postura de discernimento, de questionamento, de consciência crítica frente às imagens lidas.

Além de conhecer o funcionamento desse exercício de divulgação científica, essa prática discursiva pode tornar o indivíduo que não está ligado à produção cientifica mais familiarizado e mais inquieto quanto sua relevância no nosso contexto social, embora nem sempre essa seja a intencionalidade da produção e replicação de um meme. Especialmente, pela apropriação resultante do humor e da ludicidade inerentes a eles, que se constituem como um forte fator de atração e de apropriação da linguagem memética.

Logo, os memes sobre ciência são exemplos destas experimentações e da representação de um lugar-outro da divulgação científica na cultura digital favorecido pela popularização da internet e do acesso a ambientes digitais. Assim, mediante a pesquisa exploratória centrada na linguagem de memes replicados no Facebook, pudemos identificar alguns subtipos diferentes de memes com este propósito: memes sobre cientistas, que caricaturam personagens da ciência; memes sobre fatos científicos, que problematizam ou brincam com situações, teorias ou conhecimento científico; memes sobre pesquisas científicas, que constroem seu sentido com informações sobre pesquisas ou questões da produção científica; e memes anticientíficos, que produzem sentido mediante a desconstrução de argumentos científicos.

Considerações finais

Com esta pesquisa, foi possível observar que os memes, enquanto unidades de informação sobre ciência, ou os memes enquanto divulgadores de ciência, podem se tornar objetos de aprendizagem que carregam em si enunciados, sentimentos e expressões culturais do nosso tempo. Deste modo, para um fenômeno cultural em rede ser reconhecido como meme ele não precisa ser entendido pela sociedade como tal, uma vez que não tem uma etiqueta a partir do qual ele é considerado meme ou não. O que faz um conteúdo em formato digital ser entendido como meme é o fato de estar se multiplicando, se replicando, se transformando, sendo reapropriado, ressignificado e seguindo um fluxo comunicacional que não é homogêneo e tampouco unidirecional.

A partir dos memes analisados nesta pesquisa, bem como de muitos outros que não cabem neste texto, concluímos que produzir informação e conhecimento em ambientes digitais passa a ser uma condição para transformar ordem social vigente no contexto da cultura digital. Devido a este fator, a divulgação científica pode se efetivar de forma descentralizada e de maneira não formatada ou preconcebida, com a finalidade de ocupar os espaços, através das redes, com abordagens inesperadas sobre o conhecimento científico. Com isso, o entendimento da cultura digital passa a ser fundamental na lógica dos memes e do discurso científico mediante a replicação deles. Em razão que, ela, a replicação, já indica, intrinsecamente, um processo crescente de reorganização das relações sociais mediadas pelas tecnologias digitais, que podem afetar em maior ou menor escala, todos os aspectos entre cidades e ciberespaços a partir da capacidade de autoria em rede de cada sujeito.

Dentre outras conclusões obtidas com este trabalho vale destacar que, o aspecto autoral dos memes na divulgação científica que se materializa mediante um princípio fundamental da Cibercultura, a capacidade de gerar autoria é um elemento constitutivo da divulgação científica em formato de meme. Esta característica materializa o processo ‘cocriativo’ e colaborativo dos usuários na produção de legendas e edição ou reedição de imagens e replicação de sentidos por variados formatos da linguagem digital.

Sem a exigência de alta qualidade estética e artística, o caráter ‘amador’ e informal das experimentações possibilitadas pelos recursos tecnológicos envolvidos em sua produção fazem com que os memes viabilizem a produção dos usuários da internet. Estes podem por experimentação e experiência individual, criar e compartilhar sua versão de um meme, atribuindo seu modo de dizer e de estar na rede.

Cruzar referências e sintetizar conteúdos se torna um recurso indispensável e, talvez, o mais acessível para acompanharmos o fluxo de acontecimentos e nos posicionarmos diante da relevância da Ciência em sociedade. É possível usar um meme pra dizer que não é capaz de opinar e, ainda assim, transmitir uma ideia na voz de outra pessoa, em relação a um determinado fato.

Contudo, a leitura de um meme nunca é passiva, os ambientes digitais como o Facebook, por exemplo, conectados em rede na perspectiva discursiva do digital oferecem dispositivos para o possível debate sobre a Ciência, sobre personagens da ciência, ou sobre fatos científicos. Isso pode colaborar para uma nova percepção da Ciência e dos espaços de produção de ciência, mediante as diversas possibilidades de produzir a própria versão a respeito de determinado fato científico, que não exigem formação, espaço institucional, ou hierarquia.

Portanto, a partir da linguagem efetivada pelos memes no Facebook, foi possível concluir que eles articulam uma nova ambiência de divulgação científica ao passo que configuram as seguintes características: Podem informar a população sobre temas de ciência; Possibilitam a promoção do debate sobre os diversos aspectos (políticos, econômicos, sociais etc.) que influenciam a Ciência; Fazem com que o público não especializado tenha uma visão crítica da Ciência (de acordo com seus modos de ler e interpretar); Podem combater as pseudociências, problematizando grandes questões em debate; Podem mostrar os processos, os personagens e as controvérsias envolvidos na atividade científica e nos fatos científicos; Promovem uma aproximação entre ciência e sociedade, especialmente, pela mediação cômica.

Referências

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4NOTA: Os autores foram responsáveis pela concepção, delineamento, análise e interpretação dos dados, redação do manuscrito, revisão do conteúdo e aprovação da versão final.

Recebido: 02 de Abril de 2020; Aceito: 10 de Agosto de 2020

* Autor para correspondência. E-mail: kaioeduardojo@gmail.com

Kaio Eduardo de Jesus Oliveira: Doutor em Educação, PPED/Universidade Tiradentes. Mestre em Educação (PPED/ Unit). Especialista em Tecnologias Educacionais (Unit). Pesquisador e vice-líder do Grupo de pesquisas em Tecnologias da Informação e Cibercultura- GETIC. Professor das Faculdades Integradas de Sergipe. E-mail: kaioeduardojo@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5390-0593 E-mail: kaioeduardojo@gmail.com

Cristiane de Magalhães Porto: Doutora Multidisciplinar em Cultura e Sociedade - UFBA. Mestrado em Letras e Linguística - UFBA. Pesquisadora do Instituto de Tecnologia e Pesquisa - ITP. Bolsista em Produtividade em Pesquisa do CNPq - Nível 2 e faz parte do Comitê Assessor de Divulgação Científica do CNPq (2018-2021), onde assumiu em 2020-2021 e coordenação deste Comitê. Pós-doutorado em Educação - UERJ. Coordenadora do Programa de Estímulo a Mobilidade e ao Aumento da Cooperação Acadêmica da Pós-Graduação (PROMOB-FAPITEC/CAPES - UNIT/UERJ/UFSC-2018-2020). É professora do Curso de Comunicação Social e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Tiradentes - Unit. Líder do Grupo de Pesquisa Educação, Tecnologia da Informação e Cibercultura (GETIC/UNIT/CNPq). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Educação, Redes Sociotécnicas e Culturas digitais (UFBA/CNPq). Dedica-se ao estudo de Cibercultura, disseminação e divulgação da ciência em suporte on-line e impresso. ORCID: http://orcid.org/0000-0001-5622-030X E-mail:crismporto@gmail.com

Leonardo Fraga Cardoso Junior: Mestrando em Educação pela Universidade Tiradentes. Graduado em Jornalismo (Unit) e Pesquisador no Grupo de Pesquisa Educação, Tecnologia da Informação e Cibercultura (GETIC/UNIT/CNPq). Bolsista CAPES/PROSUP pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8926-0121 E-mail: leonardofragajr@gmail.com

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