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Acta Scientiarum. Education

versão impressa ISSN 2178-5198versão On-line ISSN 2178-5201

Acta Educ. vol.43  Maringá  2021  Epub 01-Set-2021

https://doi.org/10.4025/actascieduc.v43i0.51436 

FORMAÇÃO DE PROFESSORES E POLÍTICAS PÚBLICAS

A profissão de professor em foco: alguns fatores que dificultam a adesão à carreira docente

La profesión de un profesor enfocado: algunos factores que dificen la adhesión a la carrera docente

Rafael Izidoro Martins Neto1  * 
http://orcid.org/0000-0002-6837-0994

Cláudio Alves Pereira1 
http://orcid.org/0000-0002-4829-6272

1Instituto Federal de Minas Gerais, Av. Juscelino Kubitscheck, 485, Distrito Industrial II, 35588-000, Arcos, Minas Gerais, Brasil.


RESUMO.

O presente trabalho, buscando identificar evidências da (des)valorização da carreira profissional docente, realizou uma pesquisa com estudantes do terceiro ano do ensino médio e coletou dados sobre o entendimento que esses jovens tinham a respeito da carreira docente e das suas escolhas para o processo seletivo que se aproximava. Justifica-se a realização dessa pesquisa pelo fato de os índices oficiais do Censo Escolar da Educação Superior apontarem uma queda progressiva no número de alunos recém-formados no ensino médio que optam por ingressar em cursos de licenciatura nas instituições de ensino, sejam públicas ou privadas. Foram entrevistados estudantes de duas escolas privadas e duas escolas públicas da cidade de Bambuí, interior do estado de Minas Gerais, com um total de 7 turmas e 128 estudantes entrevistados. Para que fosse possível realizar esse estudo, os pesquisadores aplicaram um questionário, sendo os dados analisados por uma abordagem qualitativa exploratória. Os resultados apontam que a maioria dos jovens entrevistados não consideram atrativa a profissão docente e que esta não deve ser a escolha para prosseguimento de estudos no ensino superior. Como indícios desse posicionamento, estão as ideias relacionadas à profissão docente: más condições de trabalho, baixa remuneração, falta de reconhecimento social, desrespeito por parte dos alunos, dentre outras, embora estes mesmos jovens reconheçam no professor o potencial de agente transformador social e político.

Palavras-chave: docência; carreira docente; valor social da carreira docente

RESUMEN.

El presente trabajo, buscando identificar evidencias de la (des)valorización de la carrera profesional docente, realizó una encuesta con estudiantes de tercer año de bachillerato y recogió datos sobre la comprensión que estos jóvenes tenían sobre la carrera docente y su desempeño. opciones para el proceso de aproximación selectiva. Esta investigación se justifica por el hecho de que los índices oficiales del Censo Escolar de Educación Superior apuntan a una caída progresiva en el número de estudiantes recién egresados del bachillerato que optan por ingresar a carreras de grado en instituciones educativas, sean públicas o privadas. Se entrevistó a estudiantes de dos colegios privados y dos públicos de la ciudad de Bambuí, en el interior del estado de Minas Gerais, con un total de 7 clases y 128 alumnos entrevistados. Para hacer posible este estudio, los investigadores aplicaron un cuestionario, cuyos datos se analizaron mediante un enfoque cualitativo exploratorio. Los resultados muestran que la mayoría de los jóvenes entrevistados no consideran atractiva la profesión docente y que esta no debería ser la opción para continuar sus estudios en la educación superior. Como evidencia de esta posición, están las ideas relacionadas con la profesión docente: malas condiciones laborales, baja remuneración, falta de reconocimiento social, falta de respeto por parte de los estudiantes, entre otras, aunque estos mismos jóvenes reconocen en el docente el potencial de agente transformador social y político.

Palabras-clave: docencia; carrera docente; valor social de la carrera docente

ABSTRACT.

The present paper, seeking to identify evidence of the (de)valuation of the teaching career, surveyed third year High School students and collected data about the understanding that these young people had about the teaching career and their choices for the upcoming selection process. This research is justified by the fact that the official indexes of the School Census of Higher Education point to a progressive decrease in the number of recent high school graduates who choose to enrol in teaching degree courses in educational institutions, whether public or private. We interviewed students from two private and two public schools in the city of Bambuí, in Minas Gerais state's interior, with a total of seven classes and 128 students. To make this study possible, the researchers applied a questionnaire, and the data were analyzed using an exploratory qualitative approach. The results show that most of the young people interviewed do not find the teaching profession attractive and that this should not be their choice for studies in higher education. As evidence of this position, there are ideas related to the teaching profession, such as: poor working conditions, low remuneration, lack of social recognition, disrespect from students, among others, although these same young people recognize in the teaching activity the potential for social and political change.

Keywords: teaching; teaching career; social value of the teaching career

Introdução

A sociedade brasileira tem experimentado mudanças econômicas, políticas, sociais e tecnológicas, especialmente a partir da década de 1990, provocando alterações nas formas de organização do trabalho nos mais diversos campos de atuação. Observa-se que os indivíduos mais jovens, especialmente, têm apresentado perspectivas diferentes e distintas em relação ao seu desenvolvimento profissional. Esses aspectos econômicos e sociais podem causar uma diminuição nas contratações e gerar instabilidade a quem ocupa algum cargo e almeja uma progressão na carreira.

No cenário atual, observa-se que os empregos formais, estáveis e remunerados, estão sendo substituídos por ofertas selecionáveis que não garantem, a longo prazo, uma sequência de atividade. O trabalho, independentemente se este é uma atividade formal ou não, sempre vai ser uma atribuição difícil, em muitos casos pouco valorizado e com oportunidades escassas. Nesse cenário, a profissão docente mescla fatores de ordem pessoal, social e econômica que, supõe-se, têm provocado a queda no número de ingressantes nos cursos de licenciatura e, consequentemente, no número de egressos.

Os participantes dessa pesquisa são estudantes das redes pública e privada de uma cidade do interior de Minas Gerais que estavam matriculados no último ano do Ensino Médio no mês de maio de 2019. Estando na etapa em que são comuns as pressões para a definição do futuro profissional que escolherão, se farão um curso de graduação ou quais outros rumos darão às suas vidas pessoal e profissional, esses jovens têm em mente, em diferentes níveis de percepção, quais são os sinais enviados pelo mercado de trabalho a respeito de profissões que estão ‘em alta’ e quais delas oferecem melhores salários. Essas informações criam nos jovens um cenário de profissões desejadas e outras pouco atrativas, cujos critérios perpassam o ideário juvenil de valorização social e remuneração futura.

A queda no interesse dos estudantes em investir na formação acadêmica na área das licenciaturas é um dado preocupante. A falta de professores qualificados e a ausência de pessoas capacitadas para áreas e conteúdos aplicados aos ensinos médio e fundamental é tema de pesquisa e discussão em livros, artigos e fóruns pelo Brasil. Acrescentam-se dois outros fatores muito importantes para a análise dessa questão: i) a queda no número de egressos licenciados (baixa entrada e baixa saída, conforme apontam os dados do Censo da Educação Superior); e ii) a mudança de perfil do docente que, devido à escassez de professores licenciados e ao aumento das instituições de ensino, profissionais bacharéis passaram a exercer a docência, seja como uma escolha definitiva ou como opção temporária de trabalho.

A pesquisa teve como sujeitos os estudantes do terceiro ano do Ensino Médio de quatro instituições de ensino, sendo duas privadas e duas públicas (destas, uma escola estadual e outra federal) na cidade de Bambuí, estado de Minas Gerais. Buscou-se coletar dados sobre os entendimentos que esses jovens tinham sobre a carreira docente. Como objetivos secundários, a pesquisa também buscou identificar se o professor, na visão deles, é tido como um agente de transformação social e política, bem como conhecer o percentual desses jovens que tinham um dos cursos de licenciatura como opção de ensino superior.

Justifica-se a realização dessa pesquisa, o fato de os índices oficiais apontarem uma queda progressiva no número de alunos recém-formados no Ensino Médio que optam por ingressar em cursos de licenciatura nas instituições de ensino, sejam elas públicas ou privadas. Como contribuição para o debate acadêmico-científico, destaca-se a potencialidade dos dados aqui apresentados para a formulação de políticas públicas que visem tornar a carreira docente mais atrativa e, com isso, colaborar com os estudos que objetivam a valorização da carreira do magistério e dos professores no Brasil.

Revisão de literatura

De maneira a tecer as discussões propostas por essa pesquisa, selecionou-se referenciais teóricos que nos apontam caminhos para com eles concordarmos ou apresentarmos novas visões, novas análises e que, inegavelmente, contribuem para o debate no campo da formação de professores.

Com o objetivo de facilitar a leitura e organização das ideias, essa seção foi organizada em dois eixos de discussão: a primeira tratará do Ensino Formal e o Ensino Médio, enquanto a segunda trará contribuições sobre a Licenciatura e a Carreira Docente.

O Ensino Formal e o Ensino Médio

Para o cenário da pesquisa, é importante evidenciarmos o locus do processo educacional: a instituição de ensino. Contudo, há o núcleo familiar que é parceiro fundamental nesse processo educacional. As diversas relações que acontecem na e entre instituição de ensino e família afetam diretamente a carreira docente.

O processo educativo formal é, sem dúvida, um dos fatores essenciais para o processo de construção da cidadania e deveria ser tido como uma prioridade, um dos alicerces da gestão pública, sendo destinada a ela maior atenção nos investimentos realizados por parte de quem administra os recursos da nação. Segundo Facci (2004), o sistema educacional brasileiro não pode ser tido como uma referência de investimentos, uma vez que este não tem uma distribuição e atendimento igualitário para suas necessidades, além de um investimento bem inferior ao necessário para suprir sua demanda, o que demonstra descaso e falhas por parte dos governantes.

Pereira (2004) também contribui para essa discussão ao trazer o papel da família como parceira do ensino formal. Segundo o autor, os fatores de ensino e aprendizagem não podem ser somente vinculados à instituição escolar, cabendo também ao núcleo familiar colocar-se operante e de maneira que ocorra uma contribuição simultânea de performances para que a criança, adolescente ou qualquer outro perfil tenha melhores condições de se desenvolver e aprender.

Ainda segundo Pereira (2004), antes mesmo das crianças chegarem à Escola, existem vários fatores que prejudicam o seu desenvolvimento intelectual, sendo esses fatores de cunho social, notadamente recursos financeiros escassos e o papel decisivo da família (especialmente dos pais/responsáveis) na formação humana desses indivíduos. É salutar apontar a importância da Escola e da Família como tecidos complementares na formação dos indivíduos.

Observou-se nas escolas pesquisadas que algumas áreas de ensino na Educação Básica já apresentam defasagem no número de professores e que, aliada ao resultado da falta de recursos financeiros na Educação, essa é uma questão social delicada: mesmo depois de concluída a formação acadêmica, há professores que não estão dispostos a lecionar. Excluindo-se os fatores de ordem pessoal, é possível que a desvalorização da carreira docente na Educação Básica, os baixos salários e as condições de trabalho estejam afastando esses profissionais das salas de aula. Contudo, essa hipótese não será detalhada nessa pesquisa, podendo se constituir noutro trabalho investigativo junto a esses sujeitos.

Conforme analisa Mizukami (1986, p. 11), “[...] no processo da educação, durante o período em que o aluno frequenta a escola, ele se confronta com modelos que lhe poderão ser úteis no decorrer de sua vida durante e pós-escola”. Como projeto de construção de cidadania, portanto, é preciso tomar a Educação como um projeto de Nação.

Apontando o foco para o Ensino Médio, os dados oficiais do Ministério da Educação (MEC) apontam que essa fase escolar traz enormes desafios para a sociedade brasileira. As mudanças no âmbito social e psicológico sofridas pelos jovens têm potencializado interferências no aproveitamento acadêmico, embora essas não possam ser tidas como únicas responsáveis pelo fracasso escolar. Os dados estatísticos produzidos pelo MEC apontam que cerca de 30% dos alunos que chegam ao Ensino Médio se atrasam para concluir essa etapa ou não se formam; dos ingressantes, 28% abandonam a Escola ainda no 1º ano dessa etapa. Se colocarmos em análise os dados dos últimos dez anos, o crescimento do ensino médio é de apenas 0,3%, ou seja, o valor é quase que nulo (Brasil, 2018).

De maneira a intervir nesse cenário, o MEC propôs e o governo federal sancionou, no final de 2018, a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o Ensino Médio. O intuito, segundo o documento, é reestruturar essa fase escolar, tornando-a mais profunda e estimulante em seu desenvolvimento regular. Seria trazer o incentivo ao adolescente, a fim do mesmo desenvolver seu protagonismo com convicção e autonomia para suas escolhas futuras (Brasil, 2018). Ao priorizar a oferta obrigatória apenas das disciplinas Matemática e Língua Portuguesa, o documento indica que essa seria a base comum curricular para o Ensino Médio, estando os Estados e Municípios livres para escolherem o itinerário de formação complementar que melhor se adequar às particularidades regionais. Contudo, é preciso cautela para se verificar os benefícios e retrocessos que a lei poderá provocar nos sistemas públicos de ensino.

Motta e Frigotto (2017), na defesa do direito à formação integral para todos e todas, chamam a todos os educadores para iniciarem uma contrarreforma.

Como conclusão mais geral, trata-se de uma contrarreforma que expressa e consolida o projeto da classe dominante brasileira em sua marca antinacional, antipovo, antieducação pública, em suas bases político-econômicas de capitalismo dependente, desenvolvimento desigual e combinado, que condena gerações ao trabalho simples e nega os fundamentos das ciências que permitem aos jovens entender e dominar como funciona o mundo das coisas e a sociedade humana. Uma violência cínica de interdição do futuro dos filhos da classe trabalhadora por meio da oficialização da dualidade intensificada do Ensino Médio e de uma escola esvaziada, na perspectiva de Antônio Gramsci. Pelo grau de violência e pelo que interdita, uma contrarreforma que tem que ser confrontada, sem tréguas, no todo e nos detalhes (Motta & Frigotto, 2017, p. 369).

Conforme aponta Ferraço (2004, p. 113), não existindo mais espaço para o já comprovado modelo de educação “[...] que se limita a ensinar saberes, que faz da memorização o seu pilar fundamental e que prolonga o divórcio com a vida [...]”, não faz sentido pensar em uma escola que foca o estudo nos livros, somente, e perde a riqueza das possibilidades da contextualização da realidade social da qual faz parte. É possível que aqui esteja a chave para que o jovem valorize o saber e, dessa forma, coloque dentro das suas possibilidades o desejo de cursar uma licenciatura, oportunidade em que poderia, para além de ensinar, contribuir para esse processo de construção de cidadania.

Contribuindo com esse debate, analisando o cotidiano da sala de aula na Educação básica, Penteado (1994, p. 55) afirma que:

O professor vem atestando o desinteresse, o enfado, a desatenção de crianças e adolescentes quando colocados diante das exigências do estudo calcado apenas no ensino livresco; as respostas decoradas que daí resultam para as provas e para agradar o professor encerrando na própria escola o ato de aprender. Pouco se leva da escola para a vida. E assim a vida vai se repetindo, se conservando. Perpetuando e multiplicando seus problemas.

Esse professor que atesta os índices trazidos pelos governos, afirma ou contesta-os, traz consigo um arcabouço de conhecimentos e sentidos produzidos no seu curso de formação. A próxima seção discutirá sobre os cursos de licenciatura, que embora não sejam a única maneira de ingresso na carreira docente, são eles que têm a especificidade de formar professores para a Educação Básica. Conforme aponta Oliveira (1998), de maneira genérica, o ensino passa por um processo profundo de crise que permanece e não parece mudar tão cedo. Talvez não somente a Educação, assim como tantos outros parâmetros relacionados ao convívio em sociedade, se encontram em crise de relacionamento.

Ao final do Ensino Médio, optar pela carreira docente é uma escolha que traz desafios sociais e profissionais para o jovem. Muhlstedt e Hagemayer (2015) realizaram uma pesquisa com grupo focal composto por professores que atuavam na rede estadual de Londrina no ano de 2013 com o objetivo de investigar como se dava o processo de inserção do sujeito à profissão docente, levando em consideração as circunstâncias, os contextos de vida e as primeiras aproximações com a atividade docente. Ao final, os pesquisadores concluem que aqueles sujeitos que escolhem a docência como profissão, o fazem embasados em uma vasta experiência e nas suas próprias opiniões enquanto alunos. Assim, o processo de escolha pela licenciatura feita por um jovem que está prestes a finalizar o Ensino Médio, segundo os autores, também passa pelo seu próprio julgamento enquanto sujeito-aluno que está deixando de sê-lo, ou seja, tanto a escolha quanto a sua atuação docente se constitui em um misto de experiências pessoais e profissionalidade.

O profissional que trabalha na área de Educação lida cotidianamente com a integração, a comunicação e interação com indivíduos diversos, com pensamentos diferentes, conhecimentos, sejam eles colegas de trabalho, alunos, pais ou membros da comunidade. Assim, o docente se encontra inserido em um espaço bastante complexo onde a interação social com as pessoas e o ambiente é ativa. Segundo Veiga (2004), talvez seja no Ensino Médio que o professor tenha um papel fundamental na orientação aos alunos, principalmente aqueles que estão próximos de se formar e terão de tomar algumas decisões, onde possivelmente irão definir qual curso e profissão desejam para o seu futuro.

A Licenciatura e o professor

Sem dúvidas, é dentro de uma sala de aula que o professor se torna o grande porta-voz e mediador do conhecimento, sendo que a partir daí seus alunos podem começar ou continuar o processo de construção do conhecimento. Muito daquilo que é realizado no ambiente escolar tem a ver com o perfil do docente e da sua ciência da pedagogia. Assim, esse espaço físico, criado para o encontro educacional formal e sistêmico, é um ambiente privilegiado para a transformação, local em que professores e alunos ficam frente a frente para gerir seus dilemas, trabalhar suas necessidades e contestações sobre a vida, sobre o ensino, sobre as pessoas e suas maneiras de pensar e agir (Veiga, 2004).

O Censo da Educação Superior registrou decréscimo no ingresso de alunos nos cursos de licenciatura. Em 2010, um quinto das matrículas totais da graduação, incluindo cursos presenciais e a distância, estava nos cursos de licenciatura, representando, à época, 21,1% do total das matrículas. Já no último levantamento (2017), esse número caiu para 7,14% (Brasil, 2018).

A escolha direta pelo magistério está ligada ao contexto referenciado acima. Valle (2006), explica que o interesse dos jovens no cenário atual pela carreira docente está diretamente relacionado a algumas lógicas de pensamento: sua representatividade em si mesmo, o espaço oferecido no mercado de trabalho e, em especial, da profissão, a sua função e atribuição como educador. Em meio à fórmula de descrever qual a lógica verdadeira de querer ser um professor, talvez a grande motivação esteja diretamente ligada aos valores altruístas e à própria realização profissional, fortemente relacionados à sua imagem como referência educadora, à experiência ofertada pelo cotidiano, o próprio saber, à capacidade do dom e muito em função pelo próprio amor à profissão, que pode despertar o desejo para ensinar, ajudar e acreditar em uma possibilidade de transformar as pessoas, mudar o meio social do país através do próprio esforço.

A sociedade tem acompanhado inúmeros debates levantados sobre a insuficiência de professores nas escolas, o desinteresse pela profissão e a gama de fatores que culminam na desvalorização da profissão docente. A falta de docentes para disciplinas da formação básica, profissionalizante e superior é sempre tema de discussões em veículos de mídia nacional e artigos de pesquisas de grandes centros universitários. O próprio Ministério da Educação (MEC), em dados expostos recentemente, afirma que, no Brasil, apenas cerca de 2% dos discentes que vão se formar no Ensino Médio têm como objetivo principal se tornarem professores (Brasil, 2018, 2017).

O índice apontado pelo MEC se mostra alarmante para o futuro da Educação no Brasil, já que a expectativa de melhoria em relação a estes dados não aparece com otimismo. Independente das reivindicações de cada professor atualmente, sobre o que precisa ser feito e trabalhado para melhorar esse cenário, ainda é necessário convencer e mostrar para o recém formado que a escolha para a profissão é positiva e deveria ser pensada. Mas, para isso falta um plano de carreira bem acentuado, salários compatíveis com a dificuldade da ação, uma valorização motivacional e condições de trabalho aceitáveis. Enquanto isso não ocorre gradativamente, ao contrário, acontece o processo reverso de desinteresse pela profissão afastando mais pessoas de dentro da sala de aula (Tartuce, Nunes, & Almeida, 2010).

Segundo Tardif & Lessard (2012, apud Muhlstedt e Hagemayer, 2015), a figura profissional do professor ocupa um lugar de destaque na sociedade contemporânea, visto que o seu elevado número de representantes a coloca como um dos mais importantes grupos ocupacionais e uma das principais ‘peças’ da economia. Contudo, Muhlstedt & Hagemayer (2015) apontam que a carreira docente vem sofrendo um histórico processo de desvalorização, desqualificação e desprestígio social. Nessa mesma pesquisa, os autores apontam que a escolha pela carreira docente tem algumas razões, sendo o resultado de fatores externos e de outros de cunho pessoal, combinando-se de diferentes formas, concluindo que,

[...] ao fazer a escolha do curso de licenciatura em instituição de ensino superior, o sujeito, tendo em vista suas circunstâncias de vida, é envolvido por aspectos situacionais e de sua formação, e, outros, como as perspectivas de empregabilidade, renda, taxa de retorno, status associado à carreira ou vocação, bem como identificação, autoconceito, interesses, habilidades, maturidade, valores, traços de personalidade e expectativas com relação ao futuro (Muhlstedt & Hagemayer, 2015, p. 37).

Os cursos de licenciatura são cada vez menos escolhidos como primeira opção de curso entre os jovens recém-formados que desejam entrar na faculdade. Segundo Tartuce, Nunes & Almeida (2010), existe um importante ponto de análise a ser verificado entre aqueles candidatos que optam por cursar uma licenciatura e por aqueles que optam por um bacharelado. Segundo os autores, a maioria dos jovens dos anos finais da educação básica tem escolhido cursos de formação em que, ao final, não terão que trabalhar com o ensino; assim, tornar-se um professor tem se mostrado um plano secundário na escolha final desses jovens.

Ao falarmos das licenciaturas, mantenhamos o foco de que esses cursos têm a função de formar professores para a educação básica, capacitar os licenciandos para serem mediadores do conhecimento acumulado historicamente em determinada área de ensino, além de contribuir no processo de construção cidadã dos seus alunos.

Ser docente exige dedicação, preparação e responsabilidade. O professor tem que cativar a atenção do aluno e organizar o processo de apresentação dos conhecimentos, trazendo sentido a estes. Ensinar é um processo dialógico em que professor e aluno, aluno e aluno, todos juntos trazem sentido ao processo de ensino-aprendizagem. Esse processo faz parte das funções e maneiras que o educador tem como alternativa para tentar conseguir atuar dentro de sala de aula, ensinar os seus discentes e, quem sabe, conseguir motivar para que novos alunos tenham interesse pela profissão no futuro. A licenciatura é a área para formar profissionais que irão se apresentar e atuar no magistério (Moraes, 2009).

Moraes (2009) ainda aponta que os cursos de bacharelado estão mais direcionados a áreas de atuação diferentes, como a tecnologia, pesquisa e o próprio mercado de trabalho. Isso não quer dizer que a área acadêmica como atuação na docência seja descartada, tampouco inutilizada. Ainda conforme o autor, o bacharelado faz parte de uma ligação mais tecnocrática dos acadêmicos, fazendo ressalvas de importância ampliadas ao trabalho de cunho mais técnico, valorizando o conhecimento de origem prática de outros tipos de conhecimento e recursos.

Discutindo o movimento de profissionais bacharéis assumirem a docência como prática profissional, Gomes (2009) aponta que essa é uma condição que nem sempre garante um exercício profissional com ‘postura crítica, criativa e científica’ exigidas de homens e mulheres que se dediquem à profissão docente. Para o autor, ter uma postura crítica no ensino está na capacidade do professor de problematizar a realidade na qual vivemos, apontar e não compactuar com a falta de compromisso com a educação e despertar interesse nos estudantes para que estes consigam identificar e discutir os problemas, prática que abre espaço para que haja crítica e autocrítica. Sobre o termo Espírito Criativo indicado pelo autor, aqui se aloja a capacidade para reorganizar todas as observações, vivências e aprendizados armazenados em nossa mente e na identificação do momento oportuno para recorrer a estes para subsidiar uma nova resposta a situações antigas ou uma resposta ajustada a uma situação nova. Por fim, quanto à postura Científica, o autor ensina que o professor deve ter apurado conhecimento científico sobre a sua área e saber selecionar o que vai ser ensinado num dado momento e local.

Outro ponto de análise que se faz necessário é trazido por Souza Neto et al. (2007): a escolha do curso de licenciatura por influência de terceiros e sem ter conhecimento das particularidades da futura profissão. Na pesquisa dos autores, realizada no ano de 2005 na cidade de Limeira, estado de São Paulo, um dos objetivos foi identificar como os professores de uma escola de educação infantil compreendiam a sua escolha profissional e o magistério como profissão.

Souza Neto et al. (2007) observaram que, dos sujeitos aprovados, uma parcela de 25,8% tinha, já na iminência do vestibular, a certeza de que concorreriam a uma vaga no curso de licenciatura, não havendo outra opção para o curso superior. Para estes sujeitos, segundo os autores, o fator determinante para a escolha teria sido a dimensão afetiva ou afetivo-social ligada a uma “[...] obrigação moral da profissionalidade docente, a preocupação, o respeito e o interesse pelos escolares o que implicaria numa afetividade e moralidade” (Souza Neto et al., 2007, p. 581).

A seguir será apresentado o tópico da metodologia escolhida para a pesquisa, onde será apontado o percurso adotado pelos pesquisadores para o desenvolvimento desse estudo. Serão detalhados os instrumentos de coleta de dados e como foi planejada a abordagem aos sujeitos da pesquisa.

Metodologia

O presente estudo possui uma abordagem qualitativa exploratória, tendo se utilizado como instrumento para coleta de dados um questionário semiestruturado apresentado a alunos da série final do Ensino Médio.1

O locus da pesquisa é constituído por um conjunto de quatro escolas da cidade de Bambuí, estado de Minas Gerais, que ofertam o terceiro ano do Ensino Médio. Os primeiros contatos com os diretores das instituições de ensino aconteceram no período de 01 a 03 de maio de 2019, com aprovação de todos os gestores.

Uma das instituições está instaurada no âmbito federal, sendo duas turmas do ensino técnico integrado pesquisadas, num total de 38 alunos, sendo essas turmas identificadas como FED A e FED B. Outra instituição de ensino está inserida no âmbito de jurisprudência estadual e teve três turmas pesquisadas, sendo duas delas do turno matutino e a terceira, do turno noturno, num total de 70 alunos (de maneira a organizar o tratamento dos dados, essas turmas foram identificadas aleatoriamente como EST A, EST B e EST C). As outras duas instituições estão no setor privado de ensino e tiveram uma turma pesquisada em cada uma delas, com 13 e 07 alunos, e sendo identificadas nessa pesquisa como PART A e PART B, respectivamente. A diferença de públicos atendidos, ao se levar em conta os estratos sociais, foi planejada de maneira a alcançar representatividade e, com isso, buscar legitimidade para os apontamentos feitos ao final dessa pesquisa.

O critério de inclusão dos sujeitos dessa pesquisa foi a obrigatoriedade de serem alunos regularmente matriculados no terceiro ano do Ensino Médio em alguma das quatro escolas selecionadas. Foi-lhes explicado que a participação na pesquisa teria caráter voluntário e que não haveria nenhum benefício aos seus participantes nem tampouco prejuízo àqueles que não quisessem de ela participar.

A aplicação do questionário aconteceu entre os dias 14 e 24 de maio de 2019. Conforme postula Mattar (1996), os dados coletados por meio de questionários são de origem primária, ou seja, são informações não encontradas ou direcionadas de outros estudos e pesquisas, sendo obtidos pelos pesquisadores para a solução dos problemas propostos. Finalizada a etapa de coleta dos dados, foram organizados os 128 questionários.

Para análise dos dados e transcrição dos questionários e informações coletadas, os pesquisadores utilizaram um computador com a ferramenta Office versão 2019. Os dados foram tratados qualitativamente à luz do referencial teórico escolhido e os resultados serão apresentados a seguir.

Resultados e discussão

Na definição do perfil dos alunos que responderam aos questionários, foi constatado que 40,62% são homens e 59,38% são mulheres. A faixa etária dos participantes é variada, embora a maioria deles esteja dentro do indicador idade-série correto: 22,64% tinha entre 16 e 17 anos; 65,63% tinha entre 17 e 18 anos; e 11,73% tem mais de 18 anos. Seria possível inserir outras questões que identificassem o perfil socioeconômico dos sujeitos da pesquisa, mas os pesquisadores optaram por inserir apenas essas duas questões para se criar um perfil mínimo de sexo e idade, deixando o foco da pesquisa para as percepções deles sobre a profissão docente.

Para analisar a percepção em relação ao foco da profissão docente e obtermos o maior detalhamento possível, foram inseridas questões objetivas e subjetivas no questionário entregue aos alunos. Uma das questões objetivas perguntava ‘Quando você finalizar o Ensino Médio, você pretende ingressar em um curso superior?’ e apresentava como opções as respostas Sim (com variações ‘Sim, curso de licenciatura’ e ‘Sim, curso superior diferente de licenciaturas’), Não (com variações ‘Não, pretendo fazer curso técnico profissionalizante’ e ‘Não, pretendo parar os estudos e apenas trabalhar’) e a oportunidade de apresentar Outra opção (havia espaço para o aluno identificá-la). Os dados podem ser analisados pela Figura 1.

Fonte: Os autores.

Figura 1 Intenção de ingresso em um curso superior 

Fazendo um parâmetro de comparação, as respostas de todas as escolas foram bem próximas, mostrando um alto índice de rejeição ou não interesse dos alunos em cursar alguma licenciatura como opção de formação superior e, consequentemente, como sendo suas escolhas para o futuro mercado de trabalho.

Outra questão objetiva do questionário teve o objetivo de identificar como era a figura social tida pelos estudantes e construída pelos anos vivenciados na Escola e em sociedade. Assim, a questão perguntava “Você considera que ser PROFESSOR é uma profissão valorizada no mercado de trabalho?” e apresentava como opções apenas “Sim” ou “Não”. Os dados podem ser observados na leitura da Figura 2.

Fonte: Os autores.

Figura 2 (Des)valorização da profissão docente 

O que se pode notar é um índice baixíssimo de convicção dos alunos sobre a valorização profissional do professor. Pode-se notar que os alunos das turmas FED A e FED B, que na teoria têm professores mais valorizados em comparação aos demais docentes, levando-se em consideração a remuneração, o plano de carreira e os benefícios da carreira pública federal, ainda assim consideram que a carreira docente é pouco valorizada no mercado de trabalho. Como possível análise para esse cenário, os dados mostram que a visão da valorização ou desvalorização da profissão docente não sofre maior influência do contato direto com esse profissional, mas é construída sobremaneira por uma percepção global da profissão docente ao nível de país. Assim, pelas respostas obtidas, observa-se que a profissão docente não é valorizada em nosso país e essa percepção tem forte influência nas respostas obtidas para a questão anterior, afinal, a valorização pelo mercado é um dos balizadores nessa fase de escolha do futuro profissional desses estudantes.

Buscando refinar o posicionamento dos estudantes nas questões anteriores do questionário, a próxima pergunta foi ‘Assinale abaixo os termos que você vincula à PROFISSÃO DE PROFESSOR’. De maneira a obtermos um resultado fidedigno, deixou-se clara a mensagem ao aluno de que era permitido assinalar mais de uma opção, pois a percepção da valorização ou desvalorização da carreira docente é tida como multifatorial, envolvendo fatores pessoais, familiares, sociais, financeiros, dentre outros. Os pesquisadores elencaram as opções: a) Baixa remuneração; b) Dedicação aos alunos; c) Más condições de trabalho; d) Sobrecarga de trabalho; e) Falta de incentivo pelo governo; f) Reconhecimento positivo pela sociedade; g) Desvalorização profissional; h) Falta de oportunidade de crescimento dentro da profissão; i) Desrespeito por parte dos alunos; e Outros (com espaço suficiente para que se pudessem ser listados; outros termos, no entanto, não foram apontados pelos estudantes).

Pela Figura 3, chamam-nos a atenção alguns índices de termos vinculados ao professor e, para esses, faremos uma análise mais detida.

Devido à limitação de número de páginas para expormos os resultados completos da pesquisa, orientamos para que seja utilizado um leitor de QR Code para acessar outros gráficos da pesquisa. Os gráficos 4 a 12 estão disponíveis no QR Code abaixo.

Fonte: Os autores.

Fonte: Os autores.

Figura 3 Termos e características vinculados ao professor e à profissão docente. 

O Gráfico 4 discutirá o termo ‘baixa remuneração’. Este é associado à profissão docente por 100% dos alunos da PART A, por 86% dos entrevistados na escola PART B, por 85% da turma EST A, por 96% da turma EST B, por 81% da turma EST C. Os dados colhidos na escola federal apresentaram-se mais uma vez controversos: a baixa remuneração foi associada à carreira docente por 81% dos alunos da turma FED A, mas somente 45% da turma FED B assim entenderam.

Outro termo envolvido seria quanto à ‘dedicação aos alunos’ e as respostas foram bem diversificadas, dividindo opiniões nas turmas pesquisadas (Gráfico 5). Para 50% dos sujeitos da PART A esse termo estaria vinculado à figura do professor, enquanto para os estudantes da PART B o índice de vinculação ficou em 71%. Na instituição federal, as duas turmas apresentaram resultados bem parecidos, com 81% para a FED A e 82% para a FED B. Na escola estadual, a variação foi maior, com vinculação do termo à figura docente por 65% (EST A), 32% (EST B) e 44% (EST C). Esse quesito se mostra importante por identificar o quanto o aluno, ao longo da sua trajetória escolar, se sentiu acolhido, valorizado pelo professor. Assim, quanto maior o sentimento de acolhimento por parte do professor, maior seria (em hipótese, nesse momento) o sentimento de gratidão para com o indivíduo professor e a percepção da valorização da profissão docente.

O termo ‘más condições de trabalho’ (exposto no Gráfico 6) também obteve diferentes posicionamentos por parte dos estudantes. Enquanto observa-se um extremo mínimo na turma FED A, apontando que apenas 3% dos estudantes relacionou o termo à profissão docente, passando pela turma PART A com 8%, observamos que a turma EST C apontou 23% e EST B com 29%, temos um resultado extremo máximo na turma PART B, com identificação de 86%. As demais turmas ficam espalhadas nesse espectro (EST C com 44% e FED B com 45% dos entrevistados). Rapidamente percebemos um distanciamento significativo, embora se note um certo equilíbrio entre as três turmas da instituição estadual, com destaque para a turma EST C em considerar o professor como não tendo boas condições de trabalho (importante salientar que essa turma é do turno noturno). Cabe ressaltar também a diferença de entendimentos das turmas da instituição federal, sendo que a turma A, com índice de 3% e da turma B com 45%. Para um próximo estudo, fazer um grupo focal com esses alunos poderia ser uma oportunidade para aprofundamento nessa análise.

O Gráfico 7 expõe detalhadamente os resultados quanto ao termo ‘sobrecarga de trabalho’. Ele também obteve grandes variações de índices entre as escolas e entre as turmas, embora a maioria concorde com a vinculação do termo à profissão docente. Os alunos da turma PART A consideraram esse aspecto em 92% das respostas, enquanto a PART B ficou com um índice de 72%. Entre as duas turmas da instituição federal, temos um distanciamento também considerável: FED A com 59% e FED B com 82%. A instituição estadual de ensino apontou diferentes entendimentos para essa vinculação: para as turmas do turno matutino, 73% (turma EST A) e 50% (turma EST B); já para a turma EST C (turno noturno), apenas para 38% dos alunos o professor tem sobrecarga de trabalho.

Sobre a ‘falta de incentivo por parte do governo’ foi construído o Gráfico 8. Nota-se que a maior parte das turmas pesquisadas consideram insuficientes as políticas governamentais em relação à profissão docente. Chamam a atenção os dados muito próximos das duas turmas A e B da escola federal: 89 e 91%, respectivamente. Entre as turmas das duas instituições particulares, PART A e PART B, observou-se também uma homogeneidade nos posicionamentos: 69 e 57%, respectivamente. Na escola estadual, tivemos um distanciamento entre os índices: a turma EST A teve índice de 96%, a turma EST B com 61% e a turma EST C com 44%. Considerando os percentuais, grande parte da classe estudantil acredita que faltam incentivos por parte do governo para com a educação. É importante salientar que o período de aplicação do questionário coincidiu com a divulgação, pelo governo federal, da política de contingenciamento de despesas com a Educação e os consequentes movimentos de reverberação pelos veículos da imprensa e da mobilização dos sindicatos, embora não possamos relacionar os posicionamentos dos sujeitos da pesquisa com o fato, pois não temos como medir o quanto o tema foi discutido em sala de aula e nos outros ambientes sociais os quais os estudantes frequentam.

É possível que o tópico que mais evidencie a visão da profissão docente por parte dos estudantes esteja nas respostas condensadas no Gráfico 9. Para o tópico ‘reconhecimento positivo da sociedade’ em relação à profissão docente. Em geral, todas as turmas não vincularam o termo à profissão, retrato social da importância social dada ao professor. Para as instituições privadas, apenas 15% (PART A) e 29% (PART B). Na instituição federal, os índices apontam 19 e 27%, respectivamente, para FED A e FED B. Para os estudantes da escola estadual, a figura do professor não tem, definitivamente, o reconhecimento social: 11% (EST B), 12% (EST A) e 31% (EST C). Novamente, vale ressaltar que o arcabouço cultural dos alunos é um importante fator que influencia na escolha do seu futuro profissional. Assim, ao identificar que a profissão docente não é reconhecida socialmente, a tendência é que tenhamos cada vez menos professores formados, embora esse seja um de muitos outros ângulos de análise dessa questão.

O próximo termo se apresenta como um contraponto ao anterior (reconhecimento) e é dada ao entrevistado a possibilidade de apontar se a profissão docente pode ser relacionada à ‘desvalorização profissional’ (Gráfico 10). Assim, se o termo analisado anteriormente já apontava para o não reconhecimento positivo para a profissão docente, agora os índices de todas as turmas apontaram para valores superiores a 50% para a sua desvalorização: 57% (PART B), 63% (EST C), 73% (FED B), 77% (PART A), 79% (EST B), 89% (FED A) e 92% (EST A). Assim, podemos concluir que, para os entrevistados, a profissão docente é desvalorizada.

A ‘falta de oportunidade de se desenvolver dentro da profissão’ foi tema de debate no questionário e apresentou índices com grandes variações, conforme aponta o Gráfico 11. Enquanto 77% dos entrevistados da turma PART A consideram que o termo esteja vinculado à profissão docente, no outro extremo temos a turma EST B em que apenas 7% tem esse mesmo entendimento. Também para essa questão seria interessante, para um trabalho futuro, investigar junto a um grupo focal os motivos desse distanciamento. As demais turmas ocupam lugares entre o espectro desses extremos.

O último termo que se destaca é a questão da relação de respeito entre aluno e professor. Assim, o termo ‘desrespeito por parte dos alunos’ é bastante interessante de se analisar, uma vez que a obtenção de um resultado positivo alinharia ou confrontaria com os comportamentos individuais e coletivos dos alunos no ambiente escolar. Os dados do Gráfico 12 mostram que para 69% dos alunos da turma PART A o professor sofre com ações de desrespeito por parte dos alunos e isso se torna um termo associado à profissão docente. Na outra turma da instituição particular (PART B), o resultado é ainda mais alto: 86%. Altos também foram os índices observados nas turmas A e B da escola federal, com 81 e 82%, respectivamente. Os respondentes da instituição estadual tiveram índices de 88, 57 e 63%, respectivamente, para as turmas A, B e C. Assim, pelo entendimento dos alunos entrevistados, independentemente de serem de escolas públicas ou privadas, o professor não tem sido respeitado pelos alunos.

A última questão que será analisada buscava conseguir, resumidamente, qual era o entendimento do aluno, amparado em sua vivência no ambiente escolar e no ambiente social, sobre o papel social do professor (Figura 4). Assim, a questão ‘Tome por base a profissão de PROFESSOR. Se eu lhe disser O professor é um importante agente de transformação social e política’, você concorda com essa afirmativa?’ se apresentava como fechada e com as seguintes opções de resposta: ‘Sim’, ‘Não’ ou ‘Parcialmente’.

Fonte: Os autores.

Figura 4 A importância do professor como agente (ou não) de transformação social e política. 

Todas as turmas consultadas registraram índices acima de 75% para a opção Sim, entendendo ser o professor um importante agente de transformação social e política. A exceção ficou por parte da turma PART B em que apenas 44% dos respondentes consideraram o docente exemplo de agente transformador.

Considerações finais

Mediante o levantamento e tratamento dos dados apresentados, da observação realizada nos locais de aplicação dos questionários, pode-se considerar que a profissão docente não é valorizada, tampouco interessante no atual cenário social e político, sendo que estes cenários se entrelaçam e interferem nas condições de ofertas de todas as atividades educacionais.

Pelas respostas coletadas, percebeu-se que os alunos entrevistados no terceiro ano do Ensino Médio carregam uma ideia de profissão docente como sendo pouco ou nada valorizada profissional e socialmente, sem boas condições de trabalho, com sobrecarga de tarefas e com casos de desrespeito por parte daqueles a quem ele ensina: os seus alunos. Esse cenário se mostra decisivo em deixar para segundo plano ou mesmo bloquear as possibilidades desses sujeitos em escolher serem professores.

Mesmo recriando cenários diversos, os alunos ao serem perguntados sobre a profissão docente e relacionando-a como uma possível escolha para o seu futuro profissional, eles reconhecem o professor como um agente social importante e que exerce influência nos meios social e político e que faz jus, pelas suas visões, ao título de agente transformador, obviamente atravessando o ambiente escolar. Contudo, apesar do reconhecimento da importância social e política da figura do professor, mesmo acreditando nesse potencial transformador da profissão docente, o número de alunos que manifestaram o interesse em cursar uma licenciatura reflete os números oficiais: a busca por esses cursos está cada vez menor, ou seja, o número decrescente na formação de professores passou a ser um ponto de preocupação social e política. Socialmente, nota-se, pelo posicionamento dos estudantes questionados, que o professor continua sendo tido como uma potência para transformar a sociedade. Contudo, esses mesmos jovens identificam que o professor é um profissional marginalizado, social e politicamente.

Se a Escola é uma extensão da sociedade, os posicionamentos dos respondentes dessa pesquisa representam a cada um de nós, sujeitos sociais, pois trazem consigo vozes de muitos outros indivíduos que com eles convivem. Assim, para superarmos esse quadro de desvalorização da carreira docente, é preciso que as lideranças sociais e políticas brasileiras trabalhem para que o professor tenha condições dignas de trabalho, justa remuneração e possibilidades de progredir na carreira. Se assim agirmos, daremos importantes passos para que ‘ser professor/a’ se torne uma opção profissional atrativa para os jovens que finalizam o Ensino Médio. E, nessa etapa de evolução social, o professor poderá exercitar, em toda a sua plenitude, o seu papel de agente de transformação social e política, sensibilizando outros jovens e mantendo um ciclo virtuoso de formação de novos professores.

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1Parecer do Comitê de Ética n. 4.884.995.

12Nota: Os autores foram responsáveis pela concepção, análise e interpretação dos dados; redação e revisão crítica do conteúdo do manuscrito e ainda, aprovação da versão final a ser publicada.

2Translated from the original: “[...] no processo da educação, durante o período em que o aluno frequenta a escola, ele se confronta com modelos que lhe poderão ser úteis no decorrer de sua vida durante e pós-escola”.

3Translated from the original: “Como conclusão mais geral, trata-se de uma contrarreforma que expressa e consolida o projeto da classe dominante brasileira em sua marca antinacional, antipovo, antieducação pública, em suas bases político-econômicas de capitalismo dependente, desenvolvimento desigual e combinado, que condena gerações ao trabalho simples e nega os fundamentos das ciências que permitem aos jovens entender e dominar como funciona o mundo das coisas e a sociedade humana. Uma violência cínica de interdição do futuro dos filhos da classe trabalhadora por meio da oficialização da dualidade intensificada do Ensino Médio e de uma escola esvaziada, na perspectiva de Antônio Gramsci. Pelo grau de violência e pelo que interdita, uma contrarreforma que tem que ser confrontada, sem tréguas, no todo e nos detalhes”.

4Translated from the original: “[...] que se limita a ensinar saberes, que faz da memorização o seu pilar fundamental e que prolonga o divórcio com a vida [...]”.

5Translated from the original: “O professor vem atestando o desinteresse, o enfado, a desatenção de crianças e adolescentes quando colocados diante das exigências do estudo calcado apenas no ensino livresco; as respostas decoradas que daí resultam para as provas e para agradar o professor encerrando na própria escola o ato de aprender. Pouco se leva da escola para a vida. E assim a vida vai se repetindo, se conservando. Perpetuando e multiplicando seus problemas”.

6Translated from the original: “[...] ao fazer a escolha do curso de licenciatura em instituição de ensino superior, o sujeito, tendo em vista suas circunstâncias de vida, é envolvido por aspectos situacionais e de sua formação, e, outros, como as perspectivas de empregabilidade, renda, taxa de retorno, status associado à carreira ou vocação, bem como identificação, autoconceito, interesses, habilidades, maturidade, valores, traços de personalidade e expectativas com relação ao futuro”.

7The vestibular is an entrance exam for higher education institutes in Brazil.

8Translated from the original: “[...] obrigação moral da profissionalidade docente, a preocupação, o respeito e o interesse pelos escolares o que implicaria numa afetividade e moralidade”.

9Ethics Committee Opinion No. 4.884.995

Recebido: 13 de Dezembro de 2019; Aceito: 03 de Novembro de 2020

*Autor para correspondência: E-mail: rafael.izidoro18@hotmail.com

Rafael Izidoro Martins Neto: Mestrando em Administração pelo IFMG campus Formiga. Especialista em Docência para Educação pelo Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia de Minas Gerais - IFMG campus avançado Arcos (2020). Possui Graduação em Administração pelo IFMG - campus Bambuí (2018). Atuou como Professor Substituto na Cooperativa de Ensino de Bambuí - Coopen-Bí, ministrando disciplinas de Filosofia e Sociologia para Ensino Fundamental e Ensino Médio. Participou como membro e Coordenador de Marketing do Grupo de Estudos e Pesquisas em Administração - GEPAD (2017). Ministra minicursos sobre formação de textos, normas ABNT, Criação e Edição de Slides e Oratória para apresentação de trabalhos acadêmicos. Atualmente possui interesse pelos seguintes temas de pesquisa: Finanças, Tomada de decisão, Investimento, Docência, Educação e Metodologia Científica. ResearchID: AAV-6739-2020, E-mail: Rafaelizidoromartins@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6837-0994 E-mail: rafael.izidoro18@hotmail.com

Educação pela Universidade Federal de Lavras (UFLA), licenciado em Física pela Universidade Nova Iguaçu (UNIG), atualmente desempenha a função de professor no curso de Pós-Graduação em Docência ofertado pelo IFMG Campus Avançado Arcos. Desenvolve pesquisas na área de Currículo da Educação Básica, Educação Profissional e Tecnológica e Formação de Professores. ORCID: https://orcid.org/0000.0002.4829.6272 E-mail: claudioapessoal@gmail.com

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