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Acta Scientiarum. Education

Print version ISSN 2178-5198On-line version ISSN 2178-5201

Acta Educ. vol.45  Maringá  2023  Epub Aug 01, 2023

https://doi.org/10.4025/actascieduc.v45i1.65751 

FORMAÇÃO DE PROFESSORES E POLÍTICAS PÚBLICAS

Ferramentas pós-críticas educacionais e curriculares para pesquisar e analisar vídeos

Herramientas educativas y curriculares poscríticas para investigar y analizar videos

Danilo Araujo de Oliveira1  * 
http://orcid.org/0000-0003-3222-3172

Shirlei Sales2 
http://orcid.org/0000-0003-4446-9508

1Universidade Federal do Maranhão, Avenida José Anselmo, 2008, 65400-000, Codó, Maranhão, Brasil.

2Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.


RESUMO.

Neste artigo, partimos dos percursos de uma tese de Doutorado que explorou o funcionamento de um currículo no ciberespaço mobilizando ferramentas metodológicas com elementos da netnografia e análise do discurso de inspiração foucaultiana, desde uma perspectiva pós-crítica. Aqui o nosso foco será descrever como, ao mobilizar essas ferramentas, analisamos um conjunto de vídeos divulgados no currículo investigado. Essa ação compõe o esforço metodológico para consolidação de um campo epistemológico de como operar ao analisar o funcionamento de um currículo cultural não-escolar. O que sistematizamos aqui não se constitui prescrição para repetição de uma fórmula, mas busca funcionar como inspiração e contribuição na construção de metodologias de experimentação e invenção curriculares.

Palavras-chave: vídeos; netnografia; discurso; currículo

RESUMEN.

En este artículo, partimos de los caminos de una tesis doctoral que exploró el funcionamiento de un currículo en el ciberespacio, movilizando herramientas metodológicas con elementos de netnografía y análisis del discurso de inspiración foucaultiana, desde una perspectiva poscrítica. Aquí, nuestro enfoque será describir cómo, al movilizar estas herramientas, analizamos un conjunto de videos publicados en el currículo investigado. Esta acción compone el esfuerzo metodológico por consolidar un campo epistemológico de cómo operar al analizar el funcionamiento de un currículo cultural no escolar. Lo que aquí sistematizamos no es una receta para la repetición de una fórmula, sino que busca funcionar como inspiración y aporte en la construcción de metodologías de experimentación e invención curricular.

Palabras-clave: vídeos; netnografía; discurso; reanudar

ABSTRACT

ABSTRACT. In this article, we begin from the paths of a doctoral dissertation that explored the functioning of a curriculum in cyberspace, mobilizing methodological tools with elements of Foucault-inspired netnography and discourse analysis from a post-critical perspective. Our focus will be to describe how we analyze videos released in the investigated curriculum when mobilizing these tools. This action composes the methodological effort to consolidate an epistemological field of how to operate when analyzing the functioning of a non-school cultural curriculum. What we systematize does not constitute a prescription for replicating a formula but seeks to function as an inspiration and contribution to the construction of curricular experimentation and invention methodologies.

Keywords: videos; netnography; discourse; curriculum

Introdução1

As teorias pós-críticas trouxeram, para os campos da educação e do currículo, mudanças significativas proporcionadas, sobretudo, pela problematização e ampliação dos conceitos que constituem esses campos. O conceito de educação deixou de ser entendido como restritamente vinculado aos processos que se desencadeiam na e pela escola ou em espaços educativos formais ou institucionalizados. Currículo, por sua vez, não é compreendido somente como um conjunto de disciplinas acadêmicas ou escolares ou mesmo como um programa instituído com um objetivo a seguir para formar um grupo de alunos/as.

Com inspiração em Michel Foucault, o conceito de educação passa a contemplar práticas variadas “[...] nas quais se produzem ou se transformam as experiências que as pessoas têm de si mesmas” (Larrossa, 1994, p. 35). Assim, ao observar essas práticas, “[...] o importante não é que se aprenda algo ‘exterior’, um corpo de conhecimentos, mas que se elabore ou reelabore alguma forma de relação reflexiva do[a] ‘educando’[a] consigo mesmo[a]” (Larrossa, 1994, p. 34, grifo do autor). Em outras palavras, o conceito de educação passa a ser imbricado com a perspectiva foucaultiana dos processos de subjetivação, isto é, com as diversas formas através das quais os indivíduos se transformam em sujeitos. Educação é, portanto, uma prática discursiva com o objetivo de “[...] produzir e mediar certas ‘formas de subjetivação’” (Larrossa, 1994, p. 51, grifo autor).

De modo similar, considerando esses aspectos, o conceito de currículo “[...] passa a ser visto em sua relação com a cultura” (Paraíso, 2010, p. 33). O currículo é, assim, entendido como uma “[...] prática cultural que divulga e produz significados sobre o mundo e as coisas do mundo” (Paraíso, 2010, p. 33). Esses significados se constituem em conhecimentos a serem ensinados que incidem na fabricação de sujeitos. O currículo, pois, não é visto apenas na escola e nas salas de aula, mas materializando-se nas “[...] bibliotecas, nos museus, nas propostas político pedagógicas, nas diferentes formações, na pesquisa educacional, na internet, nos jogos, nas brincadeiras, na mídia, no cinema, na música, na cultura, no cotidiano” (Paraíso, 2010, p. 37).

O alargamento dos conceitos de educação e currículo ampliou também as possibilidades de pesquisas no campo curricular, criando diferentes tessituras. Diversas pesquisas têm sido feitas a partir das compreensões então empreendidas2. É nesse sentido que buscamos analisar na pesquisa à qual esse artigo se vincula o funcionamento do currículo bareback. Entendendo, pois, que a divulgação de ditos relacionados à prática sexual bareback no ciberespaço, ao corporificar narrativas particulares, produzir sentidos e significados, constitui-se em um discurso que luta para produzir verdades e saberes, assim como busca ensinar e demandar sujeitos de determinados tipos. Dessa forma, consideramos como currículo, ditos, discursividades, relações de poder-saber e regimes de verdade localizados no ciberespaço, especificamente no blog blogbarebackbr.blogspot.com e três perfis do Twitter: @bare_putaria, @baredeprep e @bareback33, no que se refere aos jogos de incitação às práticas sexuais sem preservativo, que nomeamos de ‘currículo bareback’. Entendemos que a forma como ele funciona no ciberespaço remete aos modos de atuação de um currículo que, conforme ressaltado por Paraíso (2007, p. 24), produz “[...] sentidos, práticas e sujeitos de determinados tipos”.

O conjunto desses ditos torna-se, na perspectiva pós-crítica, “[...] uma prática discursiva produtora de saberes, significados e de culturas” (Paraíso, 2010, p. 42). Essas práticas discursivas podem ser lidas como um currículo que divulga modos de vida e que participam do jogo da produção de verdades sobre práticas sexuais sem preservativo entre homens. Esses aspectos mostram sua “importância fundamental nas políticas e nas lutas culturais contemporâneas” (Paraíso, 2010, p. 43). O ‘currículo bareback’, assim como outros currículos culturais, pode “[...] somar ou disputar espaço com outros sistemas, outras práticas e outros discursos” (Paraíso, 2010, p. 43).

A compreensão de currículo que subsidiou esta pesquisa implicou também um esforço metodológico para consolidação de um campo epistemológico de como operar ao analisar o funcionamento de um currículo cultural não-escolar. Ou seja, como criar, localizar, mostrar, organizar e analisar um currículo cultural não-escolar. Nesse esforço, compartilhamos o que aprendemos com Meyer de que “[...] teoria e método são indissociáveis e de que nossas opções metodológicas precisam fazer sentido dentro do referencial teórico no qual as inscrevemos” (Meyer, 2012, p. 48). Portanto, ao falar de um esforço metodológico ou de metodologia, estamos falando também das teorias nas quais essa metodologia está inscrita. No âmbito dessas teorias, consideremos metodologia, nessa pesquisa, como “[...] um certo modo de perguntar, de interrogar, de formular questões e de construir problemas de pesquisa que é articulado a um conjunto de procedimentos de coleta de informações” (Meyer & Paraíso, 2012, p. 16). A metodologia é, pois, “[...] construída no processo de investigação” (Meyer & Paraíso, 2012, p. 15).

Por isso mesmo, consideramos ainda, o lugar de funcionamento do ‘currículo bareback’. Seu funcionamento, assim como outros currículos culturais não-escolares, se dá “[...] no emaranhado da rede” (Pelúcio, Pait, & Sabatine, 2015, p. 6). A rede é o ciberespaço, onde se produz “[...] conteúdo que pode ser replicado por teias de links, constituindo essa imensa rede na qual tecnologia e afetos se tramam nos desafiando metodologicamente” (Pelúcio et al, 2015, p. 7).

Nesse emaranhado da rede, está, portanto em funcionamento o ‘currículo bareback’. Assim, um primeiro entendimento que consideramos importante explicitar é o de que os vídeos, em uma pesquisa, não estão isolados de um determinado contexto, pelo contrário, eles estão localizados para atender um determinado objetivo e diz do funcionamento de algo em específico, relacionando-se com aquilo que está ao seu redor. Ao tomar esses vídeos como objeto de pesquisa, olhamos suas disposições, como se dava sua composição com os outros elementos, como por exemplo, os títulos e legendas que os agrupavam de uma certa forma. Os modos de ver e analisar esses vídeos estão atrelados a uma questão de pesquisa, que por sua vez, está inscrita numa perspectiva teórica e metodológica que direciona as problematizações que podemos fazer a respeito deles. Até chegar no momento da descrição do trabalho efetivo com os vídeos, iremos detalhando os caminhos que fomos trilhando pelo emaranhado da rede até chegarmos neles. A seguir, apresentamos os passos teórico-metodológicos: como ‘combinamos elementos da netnografia e análise do discurso de inspiração foucaultiana’ para produção das informações e análise dos vídeos que compõem o ‘currículo bareback’.

Metodologia: definições iniciais, procedimentos para produção de informações e análise do ‘currículo bareback

Para a pesquisa, metodologicamente, articulamos elementos e procedimentos da netnografia - metodologia derivada da etnografia para investigar o ciberespaço - (Sales, 2010) e análise do discurso de inspiração foucaultiana - metodologia para produção de informações e análise das práticas discursivas. A netnografia foi utilizada para análise da cibercultura, para pesquisar como se dá o imbricamento da cultura bareback4 com a cultura do ciberespaço. Articulada à análise do discurso de inspiração foucaultiana, foi possível selecionar o blog e os perfis que fizeram parte da pesquisa, para, em seguida, produzir as informações e análises na perspectiva curricular.

A netnografia se constitui a partir dos pressupostos da etnografia, mas atribuindo-lhes novos sentidos e significação, “[...] aplicados ao universo ciberespacial [...]” e para efeitos de “[...] análise da cibercultura” (Sales, 2010, p. 43). Dito de outro modo, a netnografia é utilizada para estudar os “[...] grupos e culturas online” (Noveli, 2010, p. 115). Nas pesquisas com netnografia, há, pois, um entendimento “[...] da internet como cultura e artefato cultural [...]”, atentando-se para “[...] a inserção da tecnologia no cotidiano e seus significados culturais em diferentes contextos” (Prado, 2015, p. 181). Isso equivale a verificar que “[...] as tecnologias digitais são artefatos culturais de intensa fusão com a produção de modos de vida, desejos, anseios e prazeres” (Silva, 2018, p. 39).

Como culturas, estão envolvidas na produção de significados específicos que incidem na forma de experiências variadas, instituindo até mesmo uma ‘nova economia do desejo’ (Miskolci, 2017). Miskolci (2017, p. 281) defende que essa nova economia de desejo corresponde aos desejos digitais, os quais envolvem “[...] regulações de gênero que entrelaçam fantasias culturais espalhadas midiaticamente/comercialmente e o desejo de literalizá-las5, corporificá-las”. Entendemos, portanto, que a prática bareback, como cultura organizada, difundida em articulação com a cibercultura, compõe essa nova economia de desejo. Pesquisamos o currículo bareback a partir da cibercultura, porque “[...] grande parte do discurso bareback ocorre on-line, onde as comunidades virtuais se fundem em torno da troca de palavras, imagens e fantasias” (Dean, 2008, p. 84). Combinado a elementos da netnografia, fizemos uma análise do discurso de inspiração foucaultiana.

Essa última surge na pesquisa como um modo de analisar “[...] como se instaura certo discurso, quais suas condições de emergência ou suas condições de produção” (Fischer, 2001, p. 216). Consideremos, portanto, que o ‘currículo bareback’, ao funcionar como discurso, é uma invenção deste mundo e emerge como efeito de relações de poder específicas, uma vez que é o poder que “[...] produz as coisas, ele induz ao prazer, ele forma o saber, ele produz o discurso” (Foucault, 2014b, p. 22).

O discurso foi tomado como “[...] práticas que formam sistematicamente os objetos de que falam” (Foucault, 2008, p. 55). O discurso é mais do que signos usados para designar coisas. Nas análises aqui empreendidas, investigou-se esse ‘mais’, fazendo-o aparecer, descrevendo seu funcionamento, quais são suas condições de emergência, táticas e técnicas para formar, constituir aquilo de que se fala. Isso exigiu ainda uma descrição minuciosa e detalhista das práticas constituintes, pois o discurso é uma “[...] prática produtiva que fabrica verdades, saberes, sentidos, subjetividades” (Sales, 2010, p. 123). Ao empreender a análise do discurso tomando como referência Foucault, buscamos entender também como “[...] se produzem efeitos de verdade no interior de discursos que não são, por eles mesmos, nem verdadeiros nem falsos” (Foucault, 2014b, p. 21). Por isso, atuar com análise do discurso, nessa perspectiva, não tem sentido se apenas se descrevem as grandes verdades científicas e suas formações. Nesse sentido, o objetivo é mapear, localizar e detalhar as práticas cada vez mais locais que também constituem os sujeitos. Dessa forma, a análise do discurso foi útil para investigar o funcionamento do ‘currículo bareback’.

A análise do discurso, inspirada em Foucault, remete à “[...] relação, coexistência, dispersão, recorte, acumulação, seleção de elementos materiais” (Foucault, 1996, p. 57). Para isso, em articulação com a netnografia, produzimos as informações necessárias por meio de materiais disponibilizados nos perfis do Twitter @ bare_putaria, @baredeprep e @bareback3 e do blog blogbarebackbr.blogspot.com. Procuramos reunir conjuntos de ditos heterogêneos sobre a prática bareback, sem, contudo, pretender ser exaustivos, afastando-nos, portanto, do objetivo de alcançar a totalidade dos ditos. Os critérios de seleção procuraram, então, abranger a variedade de modos de divulgação da prática e das disputas que a compõem, entre eles os vídeos pornôs. Os ditos se constituem, em seu conjunto, no discurso bareback entendido aqui como um currículo. Considerou-se, desse modo, ao longo do trabalho analítico, que o discurso bareback é disperso, sendo necessário o processo de “[...] constituir unidades a partir dessa dispersão [...]”, mostrando como determinados discursos “[...] aparecem e [...] se distribuem no interior de um certo conjunto” (Fischer, 2001, p. 206).

Nesse processo, procuramos focar as análises nas “[...] coisas ditas [...]” (Foucault, 1996, p. 22), naquilo que os próprios perfis do Twitter e blog ofereciam como material de e para análise. Exploramos, assim, “[...] as lutas em torno das imposições de sentido” (Fischer, 2007, p. 56). Isso foi feito procurando “[...] admitir um jogo complexo e instável em que o discurso pode ser, ao mesmo tempo, instrumento e efeito de poder, e também obstáculo, escora, ponto de resistência e ponto de partida de uma estratégia oposta” (Foucault, 2014a, p. 110). Além de considerar o discurso bareback em sua materialidade, isto é, em seus ditos, procurou-se também estabelecer “[...] relações entre as coisas ditas no discurso investigado com outras coisas ditas em outros momentos e espaços [...]” (Paraíso, 2007, p. 62), visto que tal articulação permite “[...] identificar de que modo as coisas ditas existem, quais suas relações com outras coisas que são ditas e o que significa o fato delas terem se manifestado” (Paraíso, 2007, p. 64). Desse modo, exploramos ao máximo o que estava sendo disponibilizado pelo campo de pesquisa, partindo do entendimento de que isso se dá como construção histórica, cultural, pois analisar discursos, nessa perspectiva, significa “[...] dar conta de relações históricas, de práticas muito concretas, que estão ‘vivas’ nos discursos” (Fischer, 2013, p. 151, grifo da autora).

Foucault (2003, p. 11) entende discurso também como “[...] um conjunto de estratégias que fazem parte das práticas sociais”. Assim, ao dizer desse tempo da contemporaneidade, ressaltamos que essas práticas se dão em estreita relação com a cibercultura (Sales, 2010; Pelúcio et. al., 2015; Miskolci, 2017). Isso implica investigar as práticas discursivas da cibercultura. As postagens, compartilhamentos, curtidas, comentários, expressos na cibercultura sobre modos de realizar práticas sexuais e narrativas de experiências específicas não se configuram apenas como uma composição de textos, imagens e vídeos em uma rede social, mas são entendidos, neste artigo, como “[...] jogos estratégicos, de ação e de reação, de pergunta e de resposta, de dominação e de esquiva, como também de luta” (Foucault, 2003, p. 9). Jogos, por sua vez, que incidem na constituição de sujeitos específicos, sobre as relações deles com os mais variados temas da sociedade e sobre os modos com que nos relacionamos neste tempo. Considerando esse tipo de análise, voltamos nossa atenção ao ciberespaço para analisar como determinados discursos vão se “[...] configurando em meio a relações de poder [...]” (Maknamara & Paraíso, 2013, p. 47), o que significa, também, “[...] questionar sobre as condições de possibilidade e as regularidades a partir das quais determinados discursos concorrem para o exercício do poder e a produção de posições de sujeito” (Maknamara & Paraíso, 2013, p. 47).

Através do mapeamento do funcionamento do ‘currículo bareback’ e dos materiais produzidos para a apreciação a partir da netnografia em articulação com a análise do discurso aqui proposta, analisamos como determinado saber foi se constituindo a partir das práticas discursivas, como elas engendraram os saberes e como cada formação discursiva construía os objetos de que falava.

Nesse sentido, dada a abundante disponibilização de vídeos pornográficos constitutivos do ‘currículo bareback’, voltamos nosso olhar especificamente para eles. Esse olhar foi feito, pois, com as lentes da análise do discurso foucaultiana em articulação com elementos da netnografia para empreender a observação dos vídeos, pois entendemos que esse material se constituía em uma linguagem própria desse currículo para instruir, ensinar, autorizar e demandar conduções da conduta específicas. Compondo o funcionamento do currículo aqui em análise.

Notas sobre posicionamentos éticos da pesquisa

No que se refere ao posicionamento ético da pesquisa, reforçamos a compreensão de que as pesquisas com internet estão diante de muitos desafios decorrentes das complexidades e dos dilemas éticos e estéticos que parecem emaranhar ainda mais essa composição complexa e sem ordem própria da cibercultura. Um dos desafios encontrados nesta pesquisa foi a identificação ou não do blog e perfis pesquisados, mesmo se tratando de material disponibilizado publicamente. Optamos, assim, em seguir as orientações das Diretrizes Éticas da Associação de Pesquisadores da Internet (Franzke, Bechmann, Zimmer, Ess, & Association of Internet Researchers, 2020). Trata-se de um documento colaborativo escrito, em âmbito internacional, por pesquisadoras/es, estudantes e desenvolvedoras/es técnicas/os que enfrentam questões éticas em suas pesquisas.

Considerando que as “[...] as questões levantadas pela pesquisa na internet são problemas éticos precisamente porque evocam mais de uma resposta eticamente defensável para um dilema específico [...]” (Franzke et al., 2020, p. 6 - tradução nossa6), optamos por dar importância a algumas reflexões que pareciam se aplicar ao contexto desta pesquisa. Esse documento ressalta que um “[...] cuidado especial deve ser tomado ao coletar dados da mídia social, a fim de garantir a privacidade e dignidade dos sujeitos” (Franzke et al., 2020, p. 12- tradução nossa7). Considerações adicionais foram sugeridas, “[...] incluindo atenção específica às minorias, indivíduos e/ou comunidades LGBT [...]” (Franzke et al., 2020, p. 17- tradução nossa8), de maneira que se recomenda: “[...] quanto maior a vulnerabilidade de nossos sujeitos, maior nossa responsabilidade e obrigação de protegê-los de possíveis danos” (Franzke et al., 2020, p. 18, tradução nossa9).

Dessa forma, a versão preliminar da tese, apresentada no exame de qualificação, informava a identificação das páginas analisadas. Mas, a partir de discussão com pesquisadoras/es da banca de qualificação e análises junto ao grupo de pesquisa, optamos por retirá-la. Isso demonstra que, assim como somos forçadas/os, ao longo do projeto de pesquisa, a revisá-lo, “[...] somos da mesma forma confrontados[as] com a necessidade de revisitar nossa ética inicial, suposições e designs” (Franzke et al., 2020, p. 4- tradução nossa10). Encontramos, nesse documento, respaldo à decisão então tomada.

Mesmo que as questões éticas tenham sido tomadas, prioritariamente, na pesquisa, como algo que se refere à metodologia, é necessário ressaltar aqui elas também orientam todas as escolhas feitas, o modo de perguntar, a forma de produzir, registrar e divulgar os dados e também como analisá-los, respeitosamente. Para isso, sugerimos a leitura dos textos analíticos e como os posicionamentos éticos e políticos constituem as análises.

Procedimentos de pesquisa e análise dos vídeos

Somente no blog analisado havia, no período de pesquisa, 96 vídeos disponíveis. Os vídeos tinham tamanhos variados, sendo o menor de seis segundos e o maior de 98 minutos e 26 segundos de duração. Consideramos, para análise, os vídeos postados até março de 2020 no currículo investigado (trata-se do período inicialmente designado para fazer a netnografia, ou seja, entre os meses de agosto de 2019 e março/2020). Como se trata de um campo muito dinâmico e que se atualiza constantemente, foi necessário definir uma etapa para isso sob pena de nos envolver em um trabalho interminável.

O primeiro trabalho com os vídeos consistiu em assistir a todos eles. Trata-se de um trabalho exaustivo, pois são muitas horas de material, com imagens que se repetem. Como é um material pornográfico, o trabalho mexe com nossas emoções e imaginações e, em diversos momentos nos envolve, de alguma forma. Então, além de demorar dias para fazer isso, foram realizadas algumas pausas. No entanto, com o passar do tempo a relação com os vídeos muda, pois o modo como você os olha acaba sendo, predominantemente, marcado pelo interesse de pesquisa. As sensações e emoções sexuais parecem dar lugar a esse interesse.

O modo como olhamos, percebemos e analisamos nossos objetos, no momento inicial da pesquisa, diz da forma como eles estão para nós constituídos de maneiras específicas. Assim, esse modo, ainda é, por vezes, restrito e nos impede de ampliar as possibilidades de análise. O que pode ir alargando nossas perspectivas é o próprio processo constitutivo da pesquisa que vai exigindo de nós o estudo sistemático de diversos textos teóricos e também de outras pesquisas já produzidas. No caso da investigação que subsidia este artigo , soma-se a isso um procedimento que constitui nosso grupo de pesquisa: as orientações coletivas. Além disso, submetemos os primeiros resultados à análise crítica de outro importante grupo de pesquisa, ensino e extensão. A seguir detalhamos cada uma dessas etapas metodológicas e como elas foram decisivas para a construção das análises dos vídeos.

Quando relatamos acima como o material pornográfico mexe com nossas emoções e imaginações, referimo-nos à questão de como vamos, de certo modo, para o campo de pesquisa vinculados/as a algumas verdades sobre o nosso objeto. Nesse primeiro contato com os vídeos pornôs, a verdade proeminente que tomamos era de que os vídeos pornôs se constituem como algo excitante e/ou masturbatório. Como problematizar esse regime de verdade que circunscreve, forja o uso dos vídeos para essa finalidade? Seria possível escapar dela e multiplicar as verdades sobre os vídeos pornôs?

As relações de poder estão também em funcionamento no processo de pesquisa, porque há uma série de disputas em torno da produção de sentidos acerca do nosso objeto e que dizem também da constituição da subjetividade-pesquisador/a. Então, é preciso problematizar, desconfiar, estar à espreita, ver, rever, dar um passo atrás em todo o processo de pesquisa para poder ver de um outro modo, multiplicar as perspectivas de análise, tornar problemático algo que nos parece comum (Meyer & Paraíso, 2012). Como no caso específico aqui: era preciso tornar um problema a verdade que nos parecia comum acerca dos vídeos como apenas algo excitante e/ou masturbatório. Para isso, o nosso próprio prazer e excitação em ver os vídeos precisaram passar por uma certa tensão ao nos perguntarmos: o que é possível além disso?

Surgia, assim, um primeiro desafio. Procuramos encontrar textos teóricos/conceituais sobre vídeos pornôs e/ou pornografia e que dialogassem, de algum modo, com a perspectiva pós-crítica. Entre os textos nacionais encontramos o artigo Hardcore para um sonho: poética e política das performances pós-pornôs (Oliveira, 2013). O autor trazia questões importantes que nos ajudavam a pensar o nosso objeto, como: “Pode a pornografia dizer outra coisa sobre os corpos sexuados e sobre si mesma?” (Oliveira, 2013, p. 235). Ou seja, para além de um material com cenas de corpos nus, sexo e gozo, o que mais poderíamos dizer sobre ele? No próprio artigo, Oliveira (2013) já nos dava uma pista importante: falava que estávamos num regime sexopolítico e que “[...] a pornografia evidentemente não pode deixar de soar como uma regulação heteronormativa de práticas sexuais, sentimentos, amores, corpos, processos identitários [...]” constituindo-se como “[...] parte significativa de todo um processo de normalização da sexualidade na cama da vida” (Oliveira, 2013, p. 236). A pornografia produz e disputa sentidos sobre o sexo, a sexualidade e a subjetividade.

Nos inspiramos também em um outro texto nacional que, analisando a pornografia, mostra que “[...] as pedagogias da sexualidade presentes na pornocultura, que constituem diferentes corpos, práticas, prazeres e sujeitos desejantes” (Zago & Atolini, 2020, p. 93). O autor e a autora chegam a mostrar que, na pornocultura, “[...] não há barreiras para se discutir, aprender e ensinar sobre os desejos e prazeres que o corpo pode desfrutar” (Zago & Atolini, 2020, p. 93).

Ampliando nossas buscas por textos teóricos, percebemos a necessidade de recorrer a textos internacionais, dada a escassez de análise sobre o tema no Brasil. Encontramos, então, o texto de Mowlabocus, Harbottle e Witzel (2013, p. 530, tradução nossa11), os quais ressaltam que “[...] a pornografia é mais do que apenas material para masturbação”. Os autores chegam a essa conclusão a partir de uma longa pesquisa com grupo focal composto por homens gays, no qual, em relação à pornografia, “[...] o entendimento mais comum era dimensão educacional [da pornografia], oferecendo instruções e experiências sobre práticas sexuais masculinas gays” (Mowlabocus et al., 2013, p. 527, tradução nossa12). A partir de leituras como essas, passamos a observar na divulgação dos vídeos pornôs no ‘currículo bareback’ uma notória pretensão pedagógica. Em uma das legendas para uma sequência de vídeos, era possível ler a seguinte instrução: “É assim que se faz: Bareback de verdade ama GOZAR DENTRO!”13. Mas reiterava-se ainda a verdade acerca do prazer, como descrevemos acima. Assim, os vídeos divulgados são utilizados também para provocar o desejo: “Aí estão alguns vídeos para deixar vocês com vontade”. Além disso, localizamos em um outro texto (Mikos, 2017) que essa combinação do ensinamento de como fazer e com a produção da vontade mobilizada por meio dos vídeos pornôs não é uma novidade instaurada no currículo investigado na tese que subsidia este artigo. Isso nos leva a concluir sobre a importância de conhecermos a fundo as condições históricas de produção das verdades sobre o material que pesquisamos. Aprendemos, assim, que os primeiros filmes pornôs do começo do século XX, nomeados como stag films ou dirty movies, eram transmitidos em bordéis e casas de prostituição não somente para excitar os homens, mas para oferecer instruções sobre os corpos e as práticas sexuais.

Todo esse processo de tensionar as verdades então construídas sobre os vídeos pornôs, exigiu de nós diversificadas ações metodológicas, como buscar outros elementos que nos ajudassem a conceber os vídeos com essa característica educativa. Encontramos uma pesquisa que mostrava como a dimensão pedagógica dos filmes pornôs pode ser conferida na atualidade pelas respostas dos/as seus/suas próprios/as consumidores/as. Em pesquisa realizada entre janeiro de 2016 e julho de 2017 pelo ‘Quantas Pesquisas e Estudos de Mercado’, a pedido do canal a cabo Sexy Hot, foi perguntado “[...] por que o público consome pornô” (Muraro, 2018). Entre os principais motivadores listados pela pesquisa está “[...] ver e aprender situações e posições” (Muraro 2018).

Esses achados nos ajudaram a concordar com o argumento de que “[...] a pornografia gay serve a uma diversidade de funções (entretenimento, educação, validação, identificação)” (Mowlabocus, 2015, p. 55). Foi assim que passamos a perceber que essa diversidade de funções era encontrada também nos vídeos pornôs do ‘currículo bareback’. Compreendemos, pois, que a divulgação do comportamento sexual através da pornografia bareback não somente gera provas documentais de como as práticas sexuais são feitas. Ela cria laços comunitários, diz de modos de vida com rituais e iconografias distintos, como defende Dean (2009). Além disso, recorre a práticas curriculares para divulgar, ensinar, incitar sobre essa forma de ter relações sexuais. Trata-se de uma prática discursiva que incide na condução da conduta dos indivíduos.

Considerando, pois, que o público assiste aos filmes pornôs também com a finalidade educativa, é necessário destacar quais tipos deles têm mais audiência, pois suas pedagogias podem incidir de forma mais ampla na condução das condutas de muitos indivíduos. Ao buscar por essas informações, chegamos a uma revisão anual do site Pornhub, um dos sites pornôs que aparecem no ‘currículo bareback’. Nessa revisão, apresentam-se tendências, termos e pesquisas mais recentes. A última revisão divulgada é do ano de 2019, até o momento de escrita da tese. Entre os dados apresentados, encontramos o item “Categoria gay mais vista [...]” no qual a prática bareback figura como terceira colocada no ranking, tendo subido um lugar em relação ao ano anterior (Pornhub, 2019, tradução nossa14).

De todo modo, a relação entre espectador e filme não é estabelecida de modo linear. Os efeitos pretendidos não são garantidos, pelo contrário, são constituídos de tensões e imprevisibilidades. Dessa forma, não consideramos que todos os indivíduos que assistirem aos vídeos pornôs disponibilizados no currículo bareback terão desejo de praticar o sexo bareback. Não se pode garantir que os espectadores adotarão para si os procedimentos de condução da conduta tal qual esses vídeos divulgam e prescrevem. Isso nos aproxima da discussão feita por Elizabeth Ellsworth (2001). Segundo a autora, apesar de os filmes e a pedagogia operarem partindo da tentativa de responder às questões: quem são os indivíduos? Quem eu quero que eles sejam?, produzindo modos de endereçamento, “[...] todos os modos de endereçamento ‘erram’ seus públicos de uma forma ou de outra [...]”, de maneira que “[...] não há como garantir respostas a um determinado modo de endereçamento” (Ellsworth, 2001, p. 42, grifo da autora). Assim, ao dizer como um currículo funciona, quais são os investimentos, ensinamentos e incitamentos expressos nele, não estamos tomando por garantido que as aprendizagens serão efetivadas, ou mesmo que o sujeito desejado nesse currículo será finalmente produzido.

Em suas análises sobre pornografia bareback, Dean (2009, p. 118, tradução nossa15) chega a afirmar que “[...] a suposição de que a pornografia condiciona o comportamento de seus telespectadores, para o bem ou para o mal, falha em explicar o surgimento da subcultura bareback, pois se os homens gays tivessem sido condicionados pela pornografia gay durante os anos 90, nunca teriam inventado o bareback”. Nesse sentido, “[...] a relação entre a pornografia e as atividades sexuais de seu público, portanto, deve ser consideravelmente mais complexa do que um modelo mimético ou comportamentalista permite” (Dean, 2009, p. 117-118, tradução nossa16).

Quando vídeos pornôs são mobilizados no ‘currículo bareback’, é possível perceber que eles compõem uma narrativa que está em disputa por produzir a verdade acerca do prazer, do corpo, do sexo, das sexualidades e de gênero. E aqui é preciso afirmar que essa é uma perspectiva utilizada na pesquisa, forjada a partir do referencial teórico que mobilizamos. Ou seja, o modo como o/a pesquisador/a irá analisar os vídeos, sua metodologia, depende, está articulada, com as teorias que ele/a faz uso.

Essas proposições guiaram também nossa metodologia, pois partimos do pressuposto de que “[...] teoria e método são indissociáveis e de que nossas opções metodológicas precisam fazer sentido dentro do referencial teórico no qual [nos] inscrevemos” (Meyer, 2012, p. 48). Considerando também o pensamento de Foucault de que nenhum método “[...] se aplicaria, do mesmo modo, a domínios diferentes [...]” (Foucault, 2003, p.229), podemos afirmar que um método de pesquisa vai sendo forjado de acordo com a questão formulada sobre um problema. E o nosso problema de pesquisa partia de um campo de pesquisa específico: o campo curricular, buscava entender os modos de funcionamento do currículo investigado. Nesse sentido, nos aproximamos da pergunta central no campo curricular - O que deve ser ensinado? (Corazza & Tadeu, 2003) - para analisar esse funcionamento.

A partir dessas compreensões, entendemos ser possível pensar que a pornografia é acionada como um meio de “[...] aprender novas técnicas sexuais, validar um senso de si mesmo, encontrar uma alternativa às práticas sexuais convencionais ou a um método, para apoiar as relações sociais e sexuais existentes” (Mowlabocus et al., 2013, p. 530, tradução nossa17). Ela pode ensinar e instigar a produção de uma relação de um prazer outro, diferente da norma prevalente, constituído por relações de poder. Considerando que esse currículo só pode ser compreendido se olhado numa perspectiva histórica do presente, entende-se, do mesmo modo, que a pornografia como outras expressões da sexualidade, deve ser posta em seu contexto, vista através de filtros culturais, sociais, políticos e econômicos.

Se, ao analisar uma produção pornográfica, Dean afirmou que esta funciona como “[...] testemunho sexológico sobre os desejos, fantasias e prazeres de um barebacker” (Dean, 2009, p. 126, tradução nossa18), mais do que isso, no currículo analisado, pensamos que as produções mobilizadas funcionam como pedagogias que ensinam quais desejos, fantasias e prazeres constituem o bareback, instruindo sobre o que se pode e deve ser feito como barebacker. Elas ajudam a tornar visíveis quais verdades constituem a prática sexual objeto desta pesquisa.

Nesse sentido, reiteramos que ao longo do processo de análise é necessário ir lançando mão de estratégias metodológicas e analíticas que nos ajudem a ir produzindo nossa argumentação de forma coesa e coerente. Essas ações são fundamentadas, criadas, elaboradas a partir de nossos referenciais teóricos. Mas os referenciais não falam por si só. O processo analítico exige criatividade, como, por exemplo, ao nomear as pedagogias, ao escolher formas de elaborar tópicos no texto para as análises. Como se tratava de vídeos, escolhemos nomear os tópicos nessa parte da tese de take. Utilizamos a placa de cinema - clapboard - para formular as introduções. Mas tudo isso ainda não é suficiente para a construção de análises consistentes, densas e de qualidade teórica. As parcerias acadêmicas são fundamentais para um processo de pesquisa que nos fortaleça, nos anime e nos inspire para a realização de um trabalho de excelência, mas que também multiplique os sentidos que produzimos com e sobre o nosso objeto de pesquisa.

Já que com nossas investigações entramos na luta pela produção de verdades acerca do nosso objeto, é importante reconhecer que elas não são verdades absolutas, a única verdade. Por isso, é fundamental multiplicar os sentidos possíveis, ampliar as perspectivas analíticas. Todo o trabalho de construção da pesquisa foi desenvolvido, portanto, conjuntamente, com a colaboração de outras/os pesquisadoras/es em processo de formação, por meio de reuniões quinzenais de orientação coletiva. Participam delas estudantes de graduação e pós-graduação que desenvolvem pesquisas sob a orientação da professora responsável, a qual se incumbe da coordenação das reuniões. Todas as produções do grupo, desde os projetos até os relatórios de pesquisa (monografias, dissertações e teses) são analisados e dicutidos conjuntamente. Os resultados das pesquisas são permanentemente avaliados, em um processo incansável de inúmeras revisões. A escrita dos materiais é permanentemente refletida e aprimorada. Essa metodologia se configura como um intenso trabalho de reflexão, elaboração e relaboração das análises. Essas reuniões funcionam de modo a complexificar nossas compreensões e multiplicar os sentidos construídos, além de verificar a assertividade das decisões, das escolhas teóricas-metodológicas, bem como da argumentação analítica desenvolvida.

A metodologia que desenvolvemos para realizar isso em nosso grupo é a leitura regular das produções e a discussão aprofundada entre todos/as componentes. Assim, todos os membros leem criticamente os textos umas/uns das/os outras/os. Analisam, elaboram pareceres, sugerem reformulações, apresentam outras formas de ver as elaborações, apontam lacunas e também possibilidades de maior desenvolvimento. Todo o processo é desenvolvido em uma dinâmica de comprometimento coletivo com a produção do grupo, de forma responsável, solidária, afetiva e extremamente respeitosa. Assim, vamos fazendo composições entre o modo como vemos nosso objeto, com o modo que a/o outra/o o vê. Construindo, desconstruindo , reconstruindo e multiplicando percepções.

É preciso registrar como essa metodologia contribui para a construção de parcerias acadêmicas e laços afetivos entre os membros do grupo de pesquisa. Há um processo de engajamento com o trabalho da/o colega, rompendo com a solidão, por vezes, característica do processo de formação de pesquisadoras/es. Isso produz mais confiança na assertividade do trabalho desenvolvido, além de preparar o grupo sobre como questionar as produções científicas, como também para elaborar respostas às mais diversas interrogações. Outro efeito importante é a consistente aprendizagem sobre os procedimentos necessários para analisar um projeto ou relatório de pesquisa e sobre como elaborar um parecer analítico. Por fim, essa metodologia ensina sobre como orientar estudantes em processo de formação em pesquisa. Essa é uma aprendizagem crucial, especialmente para as/os estudantes da pós-graduação, futuras/os coordenadoras/es e orientadoras/es de pesquisas.

Retomando a discussão específica acerca dos vídeos pornôs do ‘currículo bareback’, percebemos ao longo de produção das elaborações analíticas, permanentemente discutidas e refletidas nas reuniões de orientação coletiva, que era possível estabelecer ao menos três grandes agrupamentos para os vídeos. Isso foi feito levando em consideração que, no ‘currículo bareback’, já havia uma seleção prévia e um certo agrupamento dos vídeos a partir dos títulos e legendas que, mobilizados por esse currículo, designavam temáticas e qualificavam os filmes de modos bem específicos. Dessa forma, talvez pudessem ser nomeadas muitas outras pedagogias, além daquelas que discutimos na versão final da tese, da qual esse artigo se origina. A partir da perspectiva teórica que adotamos, considerando ainda que essas eram as pedagogias mais proeminentes, por meio das cenas que se repetiam em diversos vídeos, entendemos ser importante analisar inicialmente três pedagogias mais detalhadamente: a pedagogia da ‘masculinização’, do ‘fetiche’ e da ‘abjeção’). A seleção dos vídeos para comporem a argumentação analítica se pautou no critério de que houvesse mais elementos explícitos que evidenciam as pedagogias analisadas.

Assim, foi necessário assistir várias vezes a todos os vídeos, anotando detalhes, considerando as cenas com mais cuidado, observando atentamente todos os elementos que apareciam nessas cenas, os sons que lhes eram peculiares, os cortes e os ângulos específicos. Passamos a compreender que, dessa forma, poderíamos descrever determinadas técnicas curriculares mobilizadas para ensinar e autorizar condutas particulares. Por isso, fizemos uma descrição extremamente minuciosa de 14 vídeos selecionados por nós, de acordo com os elementos que mais associavam os vídeos com a prática bareback, a fim de produzir um consistente material para análise. Essa descrição gerou um apêndice com 21 páginas.

Ressaltamos que a escrita com a descrição minuciosa das cenas não foi fácil, passou por diversas versões até chegar à formulação final. Inicialmente, sabíamos que era necessário fazer isso, mas não conhecíamos a forma exata de como fazê-lo. Para enfrentar adequadamente esse desafio, pedimos ajuda a amigos/as e pesquisadoras/es do grupo para que assistissem a algumas das cenas e a descrevessem com maior número de detalhes que conseguissem. Assim, fomos analisando informações de um/a e de outro/a, observando o que cada um/a julgava importante na descrição. Esse processo foi realizado de modo atento, altamente reflexivo e oportunizou produzir fecundas composições. Cada pessoa, ao assistir os vídeos, observa a partir da sua perspectiva, gostos, desenvoltura, destreza e experiências. Somar esforços nesse momento foi importante para produzir com mais detalhes a descrição das cenas. Então, foi dessa forma que construímos um modo de registrar as cenas observadas.

Para classificar e agrupar os vídeos, primeiramente, escolhemos aqueles posts do ‘currículo bareback’ com legendas que mais atendiam ao objetivo da pesquisa. Nessa fase, escolhemos quatro postagens que foram organizadas em quatro grupos: ‘Socar, socar até gozar! Gozada dentro sempre é mais gostoso (pelo menos eu acho) E você, como curte a gozada?’ (Grupo 1); Vamos leitar os putos? Só na pele em fodas gangbang! Muito leite dentro!’ (Grupo 2); ‘Cafuçus fodem com força’ (Grupo 3); ‘Surubas bareback’ (Grupo 4). Estabelecemos esse agrupamento, a fim de reunir os vídeos por temáticas porque cada postagem trazia um conjunto de vídeos, à exceção da postagem estabelecida como Grupo 1, que continha somente um vídeo.

Além da categorização por grupos, etiquetamos cada vídeo com as seguintes informações: referência, data da postagem, título, tempo total e identificação do vídeo. Essa identificação foi feita tomando como referência a ordem de divulgação dos vídeos em cada postagem. Como, no Grupo 1, havia apenas um vídeo, ele foi identificado como Vídeo Único (VU). Os vídeos do Grupo 2 foram nomeados de acordo com a seguinte descrição A1, B1, C1, D1. Isso significa que A1 é o primeiro vídeo do Grupo 2, B1 o segundo, C1 o terceiro e D1 o quarto. Essa mesma organização foi feita para os demais, alterando os números em cada grupo. Feito isso, ainda estabelecemos uma forma de dividir os momentos dos vídeos, em minutos e segundos, descrevendo as cenas de acordo com o tempo em que elas iam acontecendo. Dessa forma, seria possível levar para as análises o tempo específico que a cena descrita ocorria. Essa se constituiu, portanto, em uma outra estratégia metodológica. Ao construir as análises do material, utilizamos trechos das descrições devidamente nomeados - esses trechos são mobilizados a depender do interesse de análise e entre parênteses o tempo exato que podem ser encontradas as cenas em questão.

Como dissemos, a maioria dos vídeos não tinha diálogos, o que exigiu um esforço analítico para localizar e descrever as técnicas discursivas neles localizadas. E essas ações foram possíveis, pois, estávamos olhando os vídeos pelas lentes analíticas de inspiração foucaultiana. Mesmo quase não havendo falas, os modos como as imagens eram mobilizadas divulgavam demandas por um certo tipo de subjetividade vinculada às normas de gênero e fabricavam a prática sexual bareback de modo específico - como uma prática transgressiva à norma prevalente do uso compulsório do preservativo.

Nesse sentido, foi necessário fazer um trabalho muito específico de escrita com as imagens e os sons dos vídeos. 1) Descrever com detalhes o que apareciam nessas imagens; 2) Como elas apareciam; 3) Como essas imagens eram produzidas; 4) Como eram os corpos que apareciam nessas imagens. Esses foram os procedimentos metodológicos utilizados ao longo das observações e dos processos de análise. A partir de agora mostraremos alguns trechos do que localizamos nos vídeos. Não iremos nos deter na análise desses trechos de forma minuciosa, pois o objetivo do presente artigo é detalhar como trabalhamos metodologicamente com os vídeos.

Passamos a observar, portanto, como os corpos apareciam nos vídeos. Descrevemos os corpos musculosos, os movimentos e gestos das mãos, dos braços e do andar e como esse modo de exibição servia para conformar aquilo que é prescrito para um corpo masculino. Percebemos que há um certo investimento para se adaptar e se ajustar ao discurso normativo de gênero, buscando estabilizar os corpos no território masculino, ampliando as possibilidades para que isso seja mostrado. O discurso de masculinidade é acionado expulsando qualquer referência a traços afeminados ou delicados, evidenciando, através dos corpos em cena, os atributos físicos de macho viril. A regularidade com que essas características são divulgadas em diversos vídeos pornôs no ‘currículo bareback’ evidencia uma série de requisitos que precisa ser atendida para ser considerado um homem barebacker. A ‘pedagogia da masculinização’ adota o que Miskolci (2017, p. 69) chamou de “[...] tecnologias generificadas, ou, mais claramente, masculinizantes [...]”, disponibilizando, por meio da pornografia, “[...] modelos regulatórios sobre como ser, a quem desejar e o que fazer”. Trata-se, assim, de uma prática discursiva dos vídeos pornôs que engendra um tipo específico de jovem homem barebacker.

No que se refere aos sons dos vídeos, consideramos a proposição de Galvão (2017), a qual argumenta que o plano sonoro é algo importante nos vídeos pornôs. Esses vídeos se apresentam como “[...] iconotextos [...]” que “[...] associam intimamente imagens, vídeos, sons e textos” (Galvão, 2017, p. 39). Assim como nos filmes pornôs observados por Galvão (2017), os sons dos filmes disponibilizados no ‘currículo bareback’ se constituem, predominantemente, de gemidos, interjeições e palavras de incentivo. Vinculados aos estudos de gênero, passamos a observar que os sons são também mobilizados para realçar a ativação de uma ‘pedagogia da masculinização’ nos vídeos pornôs do currículo investigado. Dessa forma, as vozes e os gemidos ouvidos nesses filmes são vozes graves e grossas, como é possível ver nos trechos de vídeos pornôs destacados abaixo:

Ouvem-se muitos gemidos, como ‘ah!’, prolongados e com voz masculina bem grave (Vídeo A1). O homem que está de pé pede para que o parceiro faça sexo oral nele (em inglês ‘suck that, come on, suck it!’), o homem que recebe as ordens geme de modo grave, demonstrando prazer através dos gemidos (algo como ‘hum’) longos e bem sonoros e do modo como chupa insaciavelmente o pau do parceiro, que está sem preservativo (A3, 00 A 29 segundos). São vários gemidos agora (‘ah!’ combinado com ‘yeah!’, repetidamente). Um dos componentes anuncia que vai gozar dentro do parceiro sem preservativo e começa a gemer de forma forte e grave (A3, 6 minutos e 12 segundos).

Além da sonoridade ser algo que marca a produção dos vídeos, e, portanto, precisa ser observada em um trabalho analítico, adicionamos a essa compreensão o entendimento de que a voz é um demarcador de gênero. Com características distintivas, atribuem-se a uma voz valores masculinos ou femininos. Inscritas nas normas de gênero, uma voz mais suave e fina é entendida como uma voz feminina, já uma voz mais grave e grossa, uma voz masculina. Em outras palavras, é possível afirmar que “[...] as vozes são organizadas a partir das matrizes gendradas [...]”, utilizadas, assim, para caracterizar “[...] o que seria a voz de mulher e a voz de homem” (Camozzato, 2020, p. 253). Dessa forma, além de observar os usos das roupas, acessórios, exibição de corpos musculosos, mobilizados pelas técnicas da caracterização dos homens em cena e da exibição de corpos magros e ‘sarados’, consideramos que o tom de voz é algo que também constitui a masculinidade (Daniel & Filipe, 2010; Ribeiro, 2018; Silva & Tilio, 2018). Concebemos, assim, as vozes e os gemidos graves e grossos como elementos discursivos sonoros19 em operação nos vídeos pornôs que colaboram na atuação da ‘pedagogia da masculização’ no ‘currículo bareback’.

Referenciados/as pelos aportes das teorias pós-críticas e análises sobre currículos culturais não-escolares, buscamos problematizar as práticas curriculares, e ao analisar os vídeos, mostramos como diálogos estabelecidos, lugares onde as cenas são filmadas, os objetos dispostos nessas cenas, roupas utilizadas, corpos e vozes dos personagens, assim como a ausência proeminente de carinho e sentimento, recursos utilizados e modo de exibição das cenas, constituíam-se como técnicas20 que ensinam como os indivíduos devem se conduzir nas relações sexuais. Todos os procedimentos metodológicos aqui registrados foram, portanto, construídos em função do problema de pesquisa e fundamentados no referencial teórico.

Considerações finais

Descrevemos, aqui, como realizamos uma pesquisa, na qual parte do trabalho analítico consistiu na investigação de vídeos divulgados em um currículo cultural não-escolar, que nomeamos ‘currículo bareback’. Trata-se de uma temática ainda em emergência no campo educacional e curricular. A forma como fazemos nossas pesquisas está vinculada a modos particulares e inventivos, o que exige abandonar prescrições e maneiras determinadas e decididas a priori de como iremos trabalhar do início ao fim do percurso metodológico. Esse percurso é um caminho sinuoso, cheio de armadilhas, bifurcações, o que exige de nós muita atenção, estar à espreita de novos achados e questionar nossas escolhas permanentemente. Assim, a descrição de como operamos com os vídeos pode ser uma inspiração, para que se multipliquem as ideias, maneiras e modos de fazer pesquisa com e partir de vídeos.

Especificamente, nessa pesquisa, o maior desafio foi mesmo operar com vídeos pornôs, em sua maioria, com ausência de diálogos. Isso nos levou a buscar estratégias novas para não simplesmente abandonar a ideia de incluir os vídeos. Como dissemos, eles eram abundantes em nosso corpus analítico e não poderiam ser desconsiderados. A descrição das imagens, do que aparecia no plano sonoro, dos elementos presentes nos vídeos, daquilo que se repetia, dos ângulos, das sequências priorizadas foi decisiva para a construção da compreensão do currículo analisado. O trabalho coletivo, respaldado em um grupo de pesquisa, comprometido com a análise criteriosa dos trabalhos desenvolvidos é uma estratégia metodológica que amplia, densifica e aprimora a investigação científica. No entanto, essas não são as únicas formas possíveis para um trabalho analítico com vídeos, pois essas ideias podem ser pluralizadas, a depender também da questão de pesquisa e do referencial teórico no qual a pesquisa se subsidia. Essa conjunção de fatores demanda, sempre, do/a pesquisor/pesquisadora um esforço metodológico, criativo, inventivo e teoricamente fundamentado para expandir as possibilidades de como fazemos e podemos fazer pesquisa sobre currículos e sobre educação.

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1Protocolo do Comitê de Ética: 22337319.5.0000.5149 (UFMG).

2Para mais detalhes sobre os assuntos específicos, ver: Currículo da nudez (Silva, 2018); Currículo dos Blogs (Meireles, 2017; Currículo do facebook (Evangelista, 2016); Currículo dos livros de literatura infantil (Freitas, 2008); Currículo do forró eletrônico (Cunha, 2011); Currículo do Orkut (Sales, 2010).

3Esses nomes são fictícios para preservar o animato dos sites pesquisados. Na tópico 2, discorremos mais sobre esse posicionamento a partir de uma perspectiva ética.

4Isso porque a prática bareback é considerada como um tipo de cultura por Dean (2009). Com suas condições de emergências, proeminentemente, localizadas em São Francisco ela se propagou “[...] rapidamente no espaço virtual” (Dean, 2009, p. 44). Desse modo, sites bareback tornam a prática “[...] mais visível e mais acessível” (Dean, 2009, p. 44). Segundo Dean (2009, p. X), “como qualquer cultura, esta tem sua própria linguagem, rituais, etiqueta, instituições, iconografia e assim por diante”.

5Aqui o autor parece fazer referência ao desejo de colocar em prática essas fantasias às quais ele se refere.

6No original: “[...] the issues raised by Internet research are ethical problems precisely because they evoke more than one ethically defensible response to a specific dilemma or problem”.

7No original: “Special care should be taken when collecting data from social media sites in order to ensure the privacy and dignity of the subjects.”

8No original: “[…] including specific attention to minorities, LGBT individuals and/or communities.”

9No original: “[...] the greater the vulnerability of our subjects, the greater our responsibility and obligation to protect them from possible harm.”

10No original: “[…] we are likewise confronted with the need to revisit our initial ethical assumptions and designs.”

11No original: “Pornography is more than ‘just’ material for masturbation. Mowlabocus, Harbottle e Witze.”

12No original: “The most popular understanding was its perceived educational dimension, offering instruction on, and experiences of, gay male sexual practices.”

13Legenda do blog investigado. Dado o posicionamento ético explicado no texto não iremos referenciar a fonte original. Assim, essa é a mesma explicação para essa e outras partes do corpus analítico citado ao longo do texto.

14“Most viewed gay category [...]” in which the bareback practice appears in third place in the ranking, having risen one place compared to the previous year.

15No original: The assumption that pornography conditions the behavior of its viewers, whether for better or for worse, fails to explain the emergence of bareback subculture, since if gay men had been conditioned by gay porn during the ’90s, then they never would have invented barebacking”.

16No original: “The relationship between pornography and its audience’s sexual activities therefore must be considerably more complex than a mimetic or behaviorist model allows.”

17No original: “Learning new sexual techniques, validating a sense of self, finding an alternative to conventional sexual practices or a method for supporting existing social and sexual relationships”.

18No original: “Function as sexological testimony about one barebacker’s desires, fantasies, and pleasures.”

19Sobre sons no pornô, ler Mitarca (2015) e Zeischegg (2015).

20Para conceito de técnicas ver Foucault (2014b).

32NOTA: No que se refere às contribuições ao texto, o primeiro autor desenvolveu a pesquisa de doutorado, da qual esse artigo se origina, orientado pela segunda autora. O texto foi adaptado, ampliado em algumas discussões para esse modelo de publicação e revisado pelo autor e pela autora em conjunto.

21Protocol of the Ethics Committee: 22337319.5.0000.5149 (UFMG).

22For more details on the specific subjects, see: Currículo da nudez (Silva, 2018); Currículo dos Blogs (Meireles, 2017; Currículo do facebook (Evangelista, 2016); Currículo dos livros de literatura infantil (Freitas, 2008); Currículo do forró eletrônico (Cunha, 2011); Currículo do Orkut (Sales, 2010).

23These names are fictitious to preserve the anonymity of the sites searched. In Topic 2, we discuss more about this position from an ethical perspective.

24This is because Dean (2009) considers the bareback practice a type of culture. With its emergency conditions prominently located in San Francisco, it spread “[...] quickly in virtual space” (Dean, 2009, p. 44). Thus, bareback sites make the practice "[...] more visible and more accessible” (Dean, 2009, p. 44). According to Dean (2009, p. X), “like any culture, this one has its own language, rituals, etiquette, institutions, iconography, and so on”.

25Here the author seems to make reference to the desire to put into practice those fantasies to which he refers.

26Caption of the blog investigated. We will not reference the original source, given the ethical position explained in the text. Thus, this is the same explanation for this and other parts of the analytical corpus cited throughout the text.

27“Most viewed gay category [...]” in which the bareback practice appears in third place in the ranking, having risen one place compared to the previous year.

28On sounds in porn, read Mitarch (2015) and Zeischegg (2015).

29For concept techniques see Foucault (2014B).

Recebido: 08 de Novembro de 2022; Aceito: 23 de Março de 2023

*Autor para correspondência. E-mail: oliveira.danilo@ufma.br

INFORMAÇÕES SOBRE OS AUTORES Danilo Araujo de Oliveira: Professor Adjunto da Universidade Federal do Maranhão. Doutor em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação: Conhecimento e Inclusão Social da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais. Possui graduação em Pedagogia (UNINTER, 2020) e Letras Português/Inglês pela UNIRB Faculdade Atlântico (2013). Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas em Currículos e Culturas (GECC) e do Observatório da Juventude. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3222-3172 E-mail: oliveira.danilo@ufma.br

Shirlei Sales: Professora do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da UFMG. Professora Associada do Departamento de Administração Escolar. Pós doutora pela University of Illinois at Urbana-Champaign, USA. Doutora em educação pela UFMG e membro dos seguintes grupos de pesquisa: Observatório da Juventude da UFMG; Ensino Médio em Pesquisa (EMPesquisa); Educação, Redes Sociotécnicas e Culturas e Digitais e do GECC (Grupo de Estudos e Pesquisas em Currículos e Culturas da FaE/UFMG). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4446-9508 E-mail: shirlei.sales@gmail.com

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