INTRODUÇÃO
O presente trabalho traz o resgate histórico das principais discussões e ações realizadas por entidades nacionais - algumas delas já extintas - envolvidas com a questão educacional como MEC (Ministério da Educação e Cultura), CEAU (Comissão de Especialistas em Arquitetura e Urbanismo), ABEA (Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo), CREA (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura e Agronomia)4, CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo) e escolas inseridas em Instituições Públicas de Ensino Superior, com especial atenção às ações que de alguma forma impactaram na atual configuração da área da Tecnologia da Construção das escolas brasileiras.
Os dados foram obtidos por meio da análise qualitativa, com visitas técnicas a 21 escolas públicas de arquitetura do país e entrevistas direcionadas aos principais atores à frente da área estudada, somando ao todo 67 profissionais (docentes e técnicos) pertencentes a instituições de ensino e entidades de classe.
Ao analisar a atual estruturação da área da Tecnologia da Construção em diferentes escolas públicas brasileiras foi possível contextualizar os desafios enfrentados, que não se resumem ao arranjo físico laboratorial, mas a uma dimensão mais ampla, pois abrangem aspectos político-educacionais, estruturais e socioeconômicos. Uma simples abordagem quantitativa não possibilitaria compreender questões de fundo, no que diz respeito à natureza das relações interpessoais e burocráticas, difíceis de serem captadas por meio de instrumentos somente descritivos.
A partir do recorte temporal quanto à data de implantação dos cursos -acima de 10 anos em relação ao ano de início da pesquisa: 2013 a 2017 - foram selecionados 21 cursos de Arquitetura e Urbanismo inseridos em Instituições Públicas dentro do universo de 33 escolas com implantação até 2002. As categorias de análise consideradas na seleção foram:
Regional - procurando abranger escolas de diferentes regiões do país com representatividade regional;
Histórica - classificação das escolas baseando-se no momento político educacional em vigor no período de sua implantação:
Escolas implantadas antes da década de 1960 - Identificando o modelo de origem de cada escola: Belas-Artes ou Politécnico, e aquelas que surgiram de forma autônoma a estes modelos;
Escolas implantadas ao longo da década de 1960 - antes da adoção do Currículo Mínimo de 1969;
Escolas implantadas ao longo da década de 1970 -aplicação de regulamentações estabelecidas pelo Currículo Mínimo e realização da primeira avaliação do governo por meio da CEAU;
Escolas implantadas ao longo da década de 1980 - fim da ditadura;
Escolas implantadas ao longo da década de 1990 - realização do segundo levantamento pela CEAU.
A classificação em categorias Histórica e Regional de acordo com a sequência cronológica dos fatos históricos mais relevantes ao tema permitiu que durante as visitas e também ao longo do tratamento dos dados, fossem criados parâmetros para facilitar a compreensão de uma série de fenômenos (históricos/culturais/políticos/econômicos), que influenciaram a configuração dos espaços experimentais visitados e também a forma de condução das atividades na área da Tecnologia da Construção. Estas categorias de análise permitiram criar uma lógica para a realização das visitas, com a possibilidade de averiguar a influência que escolas mais antigas exerceram sobre outras, ao exportar quadros docentes, experiências e discussões já amadurecidas sobre o ensino.
AS PRIMEIRAS REFORMAS: O IMBRICAMENTO DAS PARTICULARIDADES HISTÓRICA, REGIONAL E ESTRUTURAL
De acordo com Motta (1977) em relação à educação institucionalizada, o ensino de Arquitetura e Urbanismo no Brasil teve duas principais vertentes em função da influência que exerceram: uma originária da Escola Nacional de Belas-Artes, no Rio de Janeiro; e outra da Escola Politécnica, em São Paulo. Enquanto no Rio de Janeiro o ensino Belas Artes estava integrado à área artística, em São Paulo, de acordo com Ficher (2005), a arquitetura veio a ser estudada inicialmente como uma das especialidades da engenharia.
Por volta da década de 1930 ocorreram determinados fatos históricos relacionados tanto às estruturações curriculares como também à regulamentação do exercício profissional que provocaram profundas transformações no ensino nos anos subsequentes. Um deles relaciona-se às reformas promovidas por Lúcio Costa em 1931, quando diretor da Enba (Escola Nacional de Belas Artes). Suas ideias visavam reestruturar o ensino tanto do ponto de vista de sua organização como também de sua orientação, seguindo a linha do movimento modernista. Para Segawa (1997), embora estas ações junto à escola não tenham se sustentado por muito tempo, foram suficientemente marcantes como forma de conscientizar uma nova geração de arquitetos sobre as transformações em curso na Arquitetura e Urbanismo mundial, principalmente, em uma estrutura conservadora como a que prevaleceu.
Neste mesmo período, foram promovidas as primeiras discussões sobre a regularização das atribuições profissionais do arquiteto, ocorridas a partir do Art. 30 do Decreto no 23.569 de 11 de dezembro de 1933, que relata como atribuições profissionais:
o estudo, projeto, direção, fiscalização e construção do edifício com todas as suas obras complementares;
o estudo, projeto, direção, fiscalização e construção das obras que tenham caráter essencialmente artístico ou monumental;
o projeto, direção e fiscalização dos serviços de urbanismo;
o projeto, direção e fiscalização das obras de grande decoração arquitetônica;
a arquitetura legal, nos assuntos mencionados nas alíneas a) e c) do mencionado;
perícias e arbitramento relativos à matérias de que tratam as alíneas anteriores.
Para Artigas (1977), a arquitetura e o ensino saíram deste processo muito prejudicados, pois não se compreendeu qual o papel do arquiteto neste momento histórico, prevalecendo o conceito de formação que a antiga Academia de Belas Artes havia criado para o arquiteto: uma espécie de técnico menor, um ignorante, alheio às exigências das leis da gravidade e do comportamento das estruturas, enfim, dos aspectos técnicos que envolvem o ambiente construído.
O Quadro 02 apresenta a organização de ações de maior visibilidade desenvolvidas em alguns estados da federação desde a criação dos primeiros cursos de arquitetura no país.
ESTADO | ANO | AÇÕES |
Rio de Janeiro | 1826 | Na forma de Academia Imperial inicia-se o ensino regular de Arquitetura, um dos cursos da Escola Real das Ciências, Artes e Ofícios |
1890 | Na República, as diretrizes do curso foram alteradas dissociando cada vez mais o ensino de Arquitetura do ensino Belas-Artes | |
1931 | A Reforma introduzida pelo então diretor arquiteto Lúcio Costa, passou a apresentar uma definida orientação Modernista | |
1945 | As inovações da Reforma acabaram por provocar a separação definitiva do Curso de Arquitetura da Escola de Belas Artes, sendo criada a Faculdade Nacional de Arquitetura (este acontecimento marcou simbolicamente o surgimento dos cursos autônomos na área) | |
1961 | A Faculdade passa a ocupar seu endereço atual, na Ilha do Fundão, chamando-se, posteriormente, de Faculdade de Arquitetura e Urbanismo | |
Bahia | 1877 | Fundação do curso de Arquitetura com a Academia de Belas Artes, mas sem reconhecimento nacional |
1949 | Com a federalização da Instituição, é realizada a incorporação da Escola de Belas Artes à universidade. | |
1959 | A Faculdade se separa da Escola de Belas Artes e o currículo do curso de Arquitetura passa por reformulação | |
Minas Gerais | 1930 | Fundada a Escola de Arquitetura para a formação de engenheiros-arquitetos. Trata-se da primeira instituição de ensino de Arquitetura e Urbanismo da América do Sul criada de forma não subordinada a Escolas Politécnicas ou Institutos de Belas Artes ou Filosofia. |
1944 | Por intermédio do então prefeito Juscelino Kubitschek de Oliveira a escola foi incorporada ao Instituto de Belas Artes. Neste mesmo ano o curso é reconhecido pelo Governo Federal | |
1946 | O curso passa a integrar a Universidade de Minas Gerais, passando a denominar-se Escola de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais | |
Pernambuco | 1932 | O ensino de Arquitetura e Urbanismo começa de forma oficial com a fundação da Escola de Belas Artes de Pernambuco (Ebap) |
1945 | Reconhecimento como Ensino Superior | |
1949 | Primeiros movimentos separatistas dentro da Escola de Belas Artes | |
1958 | Criação da Faculdade de Arquitetura do Recife | |
1969 | Com a reforma universitária a Faculdade de Arquitetura do Recife transforma-se no Departamento de Arquitetura e Urbanismo (DAU). | |
Rio Grande do Sul | 1896 | Fundada a Escola de Engenharia de Porto Alegre, disponibilizando entre os 05 cursos o de Arquitetura, extinto em 1908. |
1936 | O Instituto de Belas Artes inaugura o curso técnico de Arquitetura | |
1945 | O curso de Arquitetura alcança a condição de curso superior. A escola de Engenharia, já incorporada à Universidade de Porto Alegre, instaura novo curso de Arquitetura. | |
1952 | Conclusão do processo de fusão dos cursos de Arquitetura da Escola de Belas Artes e da Escola de Engenharia de Porto Alegre, originando a futura Faculdade de Arquitetura da Universidade do Rio Grande do Sul. | |
São Paulo | 1943 | Instalação do Instituto de Arquitetos do Brasil |
1945 | É realizado o I Congresso Brasileiro de Arquitetos | |
1947 | O governo reconhece a Faculdade de Arquitetura Mackenzie | |
1948 | A FAUUSP é fundada, tendo se originado do antigo curso de engenheiro-arquiteto da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. |
Fonte: Laverde (2017)
Embora as discussões sobre os rumos do ensino dos cursos de Arquitetura e Urbanismo tenham sido promovidas em instituições localizadas em diferentes regiões do país, tiveram grande destaque as novas propostas da FAUUSP e UNB, devido ao caráter inovador. De acordo com Artigas (1977), o curso da FAUUSP foi organizado a partir da adaptação dos currículos da Escola Nacional de Belas Artes e da Escola Politécnica, em que a principal preocupação da comissão seria dar a devida importância à “Composição da Arquitetura”, colocando o Atelier em posição de destaque e as demais disciplinas do currículo convergindo para ele: Teoria e Crítica e Tecnologia. Para a comissão, esta estratégia concretizava a hipótese do estabelecimento de uma conexão direta entre a esfera do ensino e da atividade profissional. Este pensamento não se restringiu à FAUUSP, pois simultaneamente ao que acontecia nesta escola, os cursos de Arquitetura da UFMG e UFRGS também direcionaram suas reformas colocando o atelier de projeto em posição de destaque.
Os direcionamentos dos encontros então realizados sugeriam a implantação de um currículo comum em nível nacional, construído a partir de uma conceituação da Arquitetura e Urbanismo e do perfil profissional revelado pelo Movimento Moderno, com a possibilidade de estabelecer uma ruptura definitiva com o ensino tradicional herdado das escolas de Engenharia e Belas-Artes, quando analisados de forma isolada. Sobre isso, Graeff relata:
(...) Falo dos memoráveis e quase esquecidos Encontros Nacionais de Arquitetos, Estudantes e professores de Arquitetura, realizados em diversos estados da federação entre meados da década de 1950 e ano histórico de 1962. Este foi, sem nenhuma dúvida possível, o mais alto momento do pensamento brasileiro voltado para a questão da formação profissional do arquiteto. Dele germinou por um lado, a experiência radical que se tentou realizar na Universidade de Brasília, entre 1962 e 1966 e, por outro, resultou no primeiro currículo mínimo para formação de arquitetos. GRAEFF,(1983, p. 22).
Dentre as propostas curriculares, a que apresenta reformulações mais sensíveis na área tecnológica - em que o uso laboratorial e experimental está indissociado da proposta geral do ensino - foi desenvolvida na FAUUNB por volta de 1962, estruturada em três ‘troncos’: Teoria, Composição e Tecnologia, havendo uma total integração entre teoria e prática. Sobre sua participação na UNB, João Filgueiras Lima - Lelé comenta em uma de suas palestras:
(...) quando eu fui professor, convocado pelo arquiteto Oscar Niemeyer - que era coordenador do ensino e das obras e eu, secretário executivo da Secretaria de Planejamento - optamos naquela ocasião por iniciar com a industrialização da construção, do pré-fabricado. A nossa ideia era ter uma fábrica de produção dentro da própria universidade, um centro de planejamento, isso trabalhando junto com a Faculdade de Engenharia, e que ela fosse a base de todo o ensino de Arquitetura e Engenharia na construção civil. Esta foi uma ideia muito estimulada por Darcy Ribeiro, que na ocasião foi o fundador da Universidade de Brasília, nosso primeiro reitor [...]. LIMA (2011)
Estas discussões amadurecidas em importantes escolas do país foram interrompidas pelo regime militar, quando houve a prisão de professores e estudantes e a cassação de docentes. Para Graeff (1983), as reformas que revelavam maior vitalidade inovadora entre 1956 e 1962 foram profundamente feridas: UNB, UFRGS, USP e UFMG, exatamente onde o processo de mudança curricular e metodológico se encontrava mais desenvolvido.
O CURRÍCULO MÍNIMO E A CRIAÇÃO DAS ENTIDADES GOVERNAMENTAIS E ASSOCIATIVAS
A proposta do Currículo Mínimo de 1962, desenvolvida em conjunto com entidades e instituições de ensino, foi substituída pela de 1969 que, segundo Santos (2001), embora mantivesse de maneira geral na Resolução que o instituiu a relação dos conteúdos constantes do Currículo Mínimo de 1962, a implantação do Currículo Mínimo de 1969 estava centrada em novos parâmetros, a partir do entendimento de sua formação como núcleo de matérias, considerado o mínimo indispensável para a adequada formação profissional. As normas propostas denotavam uma visão padronizadora, indiferente às dinâmicas de mudanças de procedimentos didático-pedagógicos em andamento nos cursos. O Quadro 03 equipara os dois Currículos Mínimos para melhor visualização das disciplinas equivalentes.
CONTEÚDOS MÍNIMOS A SEREM OBSERVADOS NA ORGANIZAÇÃO DOS CURSOS DE ARQUITETURA (1962) | CONTEÚDOS MÍNIMOS A SEREM OBSERVADOS NA ORGANIZAÇÃO DOS CURSOS DE ARQUITETURA (1969), RESOLUÇÃO CFE NO 3, DE 23 DE JUNHO DE 1969. |
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MATÉRIAS | MATÉRIAS BÁSICAS |
1. Cálculo | 1. Estética, Hist. das Artes e, especialmente da Arquitetura |
2. Física Aplicada | 2. Matemática |
3. Resistência dos Materiais e Estabilidade das Construções | 3. Física |
4. Desenho e Plástica | 4. Estudos Sociais |
5. Geometria Descritiva | 5. Desenho e outros meios de expressão |
6. Materiais de Construção | 6. Plástica |
7. Técnica de Construção | MATÉRIAS PROFISSIONAIS |
8. História da Arquitetura e da Arte | 1. Teoria da Arquitetura, Arquitetura Brasileira |
9. Teoria da Arquitetura | 2. Resistencia dos Materiais e Estabilidade das Construções |
10. Estudos Sociais e Econômicos | 3. Materiais de Construção, Detalhes e Técnicas da Construção |
11. Sistemas Estruturais | 4. Sistemas Estruturais |
12. Legislação, Prática Profissional e Deontologia | 5. Instalações e Equipamentos |
13. Evolução Urbana | 6. Higiene da Habitação |
14. Composição Arquitetura, de Interior e de Exteriores | 7. Planejamento Arquitetônico |
15. Planejamento |
Fonte: Adaptado pela autora a partir de Schlee et. al. (2010).
Tanto a proposta do Currículo Mínimo de 1969, como também a proposta de 1962, não contemplam discussões voltadas à infraestrutura técnica e laboratorial na área técnico-construtiva, sendo a experiência da FAU UNB considerada uma exceção ao tentar fazer uma conciliação entre atividades projetuais e técnicas por meio da experimentação construtiva, aproximando-a da proposta bauhausena, sendo a construção de Brasília o primeiro canteiro experimental utilizado para dar apoio às disciplinas na área da Tecnologia da Construção. Mas, por ter sido prematuramente abortada, não foi possível analisar os resultados provenientes desta proposta inovadora frente aos dados gerados pelo modelo centrado no Atelier de Projeto, que vigora até hoje na maior parte das escolas brasileiras.
Embora muitos autores aleguem que o Currículo Mínimo de 1969 enrijeceu o ensino brasileiro em relação ao de1962 - que permitia maior flexibilidade para que os cursos se ajustassem as particularidades regionais de cada local - em alguns momentos foi questionado se seria correto afirmar com tanta veemência de que o Currículo Mínimo de 1969 seja o grande responsável pela inércia vivenciada durante muitos anos no ensino, até porque, seria cômodo para muitos cursos se apoiarem em regras e normas ao invés de promoverem discussões que alimentassem experiências diferenciadas. Este questionamento vai ao encontro de algumas considerações de Santos (2001), ao relatar que durante as reuniões que redigiram a Carta de Ouro Preto em 1977, já haviam identificado que a reforma do Currículo Mínimo, por si só, não garantiria a melhoria do ensino, mas como indutor de mudanças. Reiterava-se, que somente a mobilização de professores, estudantes e funcionários, articulados por um projeto-pedagógico, poderia implantar e sustentar de forma permanente o desenvolvimento de novas experimentações no ensino, isso quer dizer, iniciativas intra e inter-departamentais.
Diante de uma flagrante diminuição da qualidade do ensino, Gutierrez (2013) coloca que o Ministério da Educação e Cultura, nesta época, foi motivado a instalar as comissões de especialistas e, particularmente para o curso da Arquitetura e Urbanismo, o CEAU - Comissão de Especialistas em Arquitetura e Urbanismo. Em paralelo, as escolas resolveram juntar forças para fazer frente à problemática que se apresentava no ensino, resultando na fundação da ABEA - Associação Brasileira de Escolas de Arquitetura -criada em 23 de novembro de 1973. Assim, o IAB - Instituto de Arquitetos do Brasil - passava a atuar especificamente na área profissional e a ABEA e a CEAU na área do ensino, pois a substituição do Currículo Mínimo de 1962, amplamente discutido por estudantes, professores e profissionais, por outro 1969, gerou muita insatisfação, assim como o aumento acelerado das matrículas nas instituições privadas.
Quando analisadas as discussões promovidas pela ABEA no período compreendido entre 1973 e 1985, divulgadas por meio dos Cadernos da Associação, é observado que as preocupações direcionadas à área da tecnologia se restringiam ao Ensino de Estruturas, pouco ou nada é relatado sobre as demais áreas como a Tecnologia da Construção. Os principais assuntos discutidos pela Associação eram: Currículo Mínimo, Carga horária5, Atelier de Projeto, Atribuições Profissionais e a inserção de novas disciplinas como: Paisagismo, Conforto Ambiental e Informática, com exceção de algumas reinvindicações realizadas pela Associação, para que o ensino de tecnologia fosse mais direcionado às particularidades do curso de Arquitetura em relação à Engenharia. Sobre isso, os textos encontrados possuem mais caráter reinvindicatório, do que propriamente, um reconhecimento sobre a co-responsabilidade que teriam os cursosna promoção das melhorias necessárias à área tecnológica.
Segundo Schlee et al (2010), dentre as iniciativas promovidas neste período destaca-se a proposta de trabalho conjunto entre CEAU e ABEA visando a discussão ampla e abrangente sobre o ensino. Com os resultados do extenso levantamento das condições vivenciadas nos cursos de Arquitetura e Urbanismo em funcionamento, o CEAU passa a colaborar com a Secretaria de Educação Superior do MEC na elaboração do Programa Integrado de Melhoria do Ensino de Graduação em Arquitetura (Pimeg-ARQ), que se desenvolveu ao longo dos anos 80 (BRASIL, 1981).
O período de 1990 foi marcado pela expansão do ensino superior no Brasil e pela retomada do processo regulatório pelo Estado. A recomposição das Comissões de Especialistas no âmbito da Secretaria de Ensino Superior (SESU/MEC) possibilitou uma interlocução direta do MEC com as entidades de ensino, este segundo levantamento foi realizado entre fevereiro de 1993 e setembro de 1994. Segundo Monteiro (2013), o resultado da conjugação de tais esforços culminou na Portaria MEC nº 1770/94, que estabelecia as Diretrizes Curriculares nacionais para os cursos de Arquitetura e Urbanismo em substituição ao currículo mínimo de 1969. Essa legislação pode ser considerada como um marco referencial no tocante a profundas mudanças do ensino de Arquitetura e Urbanismo e também por estabelecer padrões de qualidade relativos à infraestrutura necessária aos cursos: laboratórios, acervo bibliográfico mínimo, maquetaria, salas de projeto, etc. O diagnóstico da nova equipe do CEAU realizada na década de 1990 destaca pela primeira vez e de forma incisiva a ausência de infraestrutura encontrada nas escolas, reconhecendo que os laboratórios, maquetaria e acervo bibliográfico eram elementos fundamentais para o bom funcionamento dos cursos.
Em Meira (1994), é visto que o cenário encontrado neste segundo processo de avaliação dos cursos é tratado como o “fenômeno do barateamento” e de descaracterização do ensino da arquitetura ‐ que, aparentemente, não precisa de mais do que uma sala com pranchetas, alunos, professor e “boas ideias” - levando ao entendimento, por parte das burocracias do Ensino Superior, de que ele é barato. Para a autora (consultora) do CEAU:
(...) a experimentação passa a ser gráfica, e não construtiva. Suprimem‐se os laboratórios, desconsidera‐se a biblioteca, extingue‐se o acervo bibliográfico e iconográfico. A abertura de novos cursos é extremamente facilitada, porque sua implantação se torna “barata” - ainda que a essência da natureza de sua oferta esteja prejudicada. MEIRA (1994, p. 91).
Ainda sobre este assunto, Leite (2005) relata que, nesta segunda avaliação do CEAU, em pelo menos metade dos cursos analisados, não havia menção explícita da existência de práticas experimentais como recurso didático. E nos casos onde constava esta referência ‘aulas de laboratório’, não se verificava a pormenorização da natureza dos espaços pedagógicos, nem tampouco o tipo de atividade desenvolvida. Os programas das disciplinas de Tecnologia, em geral com uma listagem de aulas teóricas intercaladas com aulas denominadas ‘práticas’, eram destinadas à resolução de exercícios de dedução matemática, levando a entender que o conceito de atividade experimental, quando existia, era bastante restrito, voltado à demonstração e comprovação das teorias científicas transmitidas e não à experimentação e à prospecção, revelando um ensino pouco voltado à problematização como método de aprendizagem.
Seguindo a linha cronológica dos fatos que diretamente impactaram nas reformulações curriculares atuais, as Diretrizes Curriculares de 1994, se transformaram em um instrumento regulador das condições infraestruturais dos cursos, passando então a ser exigido o oferecimento de espaços e equipamentos especializados para as matérias profissionais. É importante registrar que a Portaria nº 1.770/94 do Ministro da Educação e Cultura explicita como origem das novas Diretrizes Curriculares as recomendações dos Seminários Regionais e Nacional dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo e da Comissão de Especialistas de Ensino de Arquitetura e Urbanismo da Secretaria de Ensino Superior do MEC.
De acordo com Monteiro (2013), diante de tal diagnóstico, a CEAU e a ABEA se uniram novamente para elaboração do documento intitulado Perfis da Área & Padrões de qualidade - expansão, reconhecimento e verificação periódica dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo, que foi apresentado ao CNE (Conselho Nacional de Educação) em 1996, complementando e aprofundando a Portaria 1770/94 que estabelecia as Diretrizes Curriculares. Em 1999,no IX Congresso da Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo (Conabea) / XVI Encontro Nacional sobre Ensino de Arquitetura e Urbanismo (Ensea),são discutidas novas configurações laboratoriais por uma comissão de especialistas, resultando em “parâmetros consistentes de referência” para o processo de avaliação dos cursos. De acordo com Monteiro (2013), após um período de rediscussão das Diretrizes Curriculares as contribuições foram então encaminhadas e resultaram na proposta de Resolução das Diretrizes Curriculares para os cursos de Arquitetura e Urbanismo, documento protocolado no MEC ainda no ano de 1998. Essa proposta tramitou no CNE durante oito anos e, reafirmando o documento de 1994 foi finalmente aprovada por meio da Resolução CNE/CES n o 6/2006. BRASIL (2006). Nesta proposta, não é mencionada qualquer atualização no que diz respeito aos laboratórios e espaços experimentais dos cursos de Arquitetura e Urbanismo, permanecendo em vigor o conteúdo do documento de 1994 até o presente momento.
AS AÇÕES PROMOVIDAS POR INSTITUIÇÕES DE ENSINO E ENTIDADES GOVERNAMENTAIS E ASSOCIATIVAS E O IMPACTO NA ÁREA DA TECNOLOGIA DA CONSTRUÇÃO
O Quadro 04 apresenta uma síntese dos principais fatos históricos que impactaram de alguma forma em reformas na área da Tecnologia da Construção dos cursos de Arquitetura e Urbanismo nacionais. Os dados obtidos compreendem o período entre 1930 e 2016, com a identificação das principais ações realizadas por entidades nacionais que demonstraram preocupação pela área e consciência sobre a importância das atividades experimentais estarem incorporadas nas atividades de formação. Estes dados correlacionam as ações com o momento histórico/político em que foram desenvolvidas, evidenciando a relação direta ou indireta entre as ações promovidas por Instituições de Ensino; Entidades Governamentais e Associativas.
AS INSTITUIÇÕES PÚBLICAS CUJOS CURSOS DE ARQUITETURAFORAM IMPLANTADOS EM DATA ANTERIOR A 1956 FORAM: UFRJ, UFRGS, USP, UFBA E UFPE. | |
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Data/ Governo | Principais ações promovidas pelas Instituições de Ensino; Entidades Governamentais e Associativas |
1930-1954 Getúlio Vargas e Eurico Gaspar Dutra |
Ensino: A Reforma introduzida pelo Arquiteto Lúcio Costa, apresenta uma definida orientação Modernista, influenciando reestruturações no ensino em diferentes regiões do país. |
Governo: A partir do Art. 30 do Decreto no 23.569 de 11 de dezembro de 1933, foram delimitadas as atribuições profissionais direcionadas à regularização das atribuições do arquiteto. Os cursos inseridos em instituições públicas cujo início de implantação ocorre anteriormente a 1945 são: UFRJ; UFMG; UFRGS; USP; UFBA e FAU UFPE. Fundadas as agências do CNPq, em 1950 e da CAPES, em 1951. | |
1956-1961 Juscelino Kubitscheck |
Ensino: - Impacto da arquitetura modernista brasileira no ensino: influência da construção de Brasília; - Em 57 a FAUUSP promove uma reestruturação das linhas mestras do curso, na qual o ‘ateliê’ passou a ser chamado de ‘espinha dorsal’, sendo proposta uma estrutura didático-pedagógica com 03 departamentos: Projeto, Tecnologia e História da Arquitetura; - Em outras regiões do país também são promovidas discussões sobre reestruturações nos cursos de arquitetura como UFMG e UFRGS, defendendo conceitos próximos ao da FAUUSP sobre a representatividade dos ateliers de projeto nos cursos. |
Governo: - sem identificação | |
1961-1964 João Goulart |
Ensino: - A FAUUNB, criada em 1962, teve sua proposta de ensino estruturada em três ‘troncos’: teoria, composição e tecnologia (havia uma total integração entre teoria e prática, com foco na arquitetura como processo). - Discussões nacionais sobre a reforma universitária e formulação de Diretrizes para o Currículo Mínimo de 1962. |
Governo: - Cursos de arquitetura criados neste governo e inseridos em instituições públicas: UNB (1962); UFPR (1962/63); UFC (1964); UFPA (1964). | |
REGIME MILITAR - 1964-1985 | |
1964-1967 Humberto Castelo Branco |
Ensino: sem identificação |
Governo: Perseguição e cassação de professores e estudantes universitários. Desestruturação dos modelos de ensino até então implantado. | |
1967-1969 Artur da Costa e Silva |
Ensino: - sem identificação |
Governo: - Reforma Universitária e implantação do Currículo Mínimo de 1969. De acordo com Leite (2005), este documento promove a ampliação da atividade projetual e início do desprestígio dado à área técnica na formação do arquiteto. | |
10/1969- 03/1974 Emílio Médici |
Ensino: - sem identificação |
Governo: - Pela Portaria Ministerial nº 699 de 1973, foi criada a Comissão de Especialistas no Ensino de Arquitetura e Urbanismo (CEAU), no Departamento de Assuntos Universitários do Ministério da Educação e Cultura. Os cursos de arquitetura criados neste governo e inseridos em instituições públicas foram: UFF (1970); UFPel (1971); UFRN (1973); UFAL (1973); | |
Entidades Associativas:-ABEA:- Criação da Associação Brasileira de Escolas de Arquitetura (ABEA) em 1973; - Apoio à CEAU para a realização do levantamento sobre a situação do ensino nas escolas nacionais; | |
1974-1979 Ernesto Geisel |
Ensino: - Em 1974 as deliberações do I Encontro de Professores de Estruturas para Escolas de Arquitetura consideraram as peculiaridades intrínsecas do tipo de profissional a ser formado. Entre outras recomendações estavam: a implantação de laboratórios; abertura da possibilidade de estudo do comportamento estrutural e a viabilidade técnica de outras estruturas e materiais; |
Governo: - Em 1974, visita realizada pelo CEAU às escolas do Brasil, com elaboração do documento: ‘Diagnóstico das condições de ensino e pesquisa em arquitetura e urbanismo no Brasil’. Este documento traz poucas discussões sobre a área da tecnologia e infraestrutura utilizada pelos cursos, sendo apenas destacada a ausência de padrões de referência e a situação de improviso encontrada nas escolas visitadas. Os cursos de arquitetura criados neste governo e inseridos em instituições públicas: UFPB (1974); UFSC (1977); UEL (1978); UFES (1978); | |
Entidades Associativas: - sem identificação | |
1979-1985 João Figueiredo |
Ensino: - sem identificação |
Governo: Os cursos de arquitetura criados neste governo e inseridos em instituições públicas: UNESP-Bauru (1984), EESC-USP (1985); | |
Entidades Associativas:- Segundo Gutierrez (2013), entre 1982 e 1985 a ABEA deixou de funcionar. - Em 1985 a associação passa por uma reformulação, transformando-se em uma entidade de ensino: Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo. | |
NOVA REPÚBLICA | |
1985-1990 José Sarney |
Ensino:- sem identificação |
Governo: - sem identificação | |
Entidades Associativas:- sem identificação | |
03/1990 12/1992 Fernando Collor |
Ensino:- sem identificação |
Governo: Os cursos de arquitetura criados neste governo e inseridos em instituições públicas: UFV (1992); UFJF (1992) | |
Entidades Associativas:- Em 1990, foi iniciado o reconhecimento (estado da arte) da área a partir do Inventário dos cursos de Arquitetura e Urbanismo conduzido pela ABEA | |
12/1992 01/1995 Itamar Franco |
Ensino: - sem identificação |
Governo: - O Currículo Mínimo é substituído pelas Diretrizes Curriculares, vigente por 25 anos. - O último relatório desenvolvido pela CEAU foi publicado, e os dados divulgados revelam maior reconhecimento sobre a importância dos laboratórios voltados à experimentação construtiva que o anterior, de 1973, mas revela um cenário lamentável visto na maioria das escolas brasileiras: a inexistência destes espaços ou quando existentes, considerados como ‘retóricos’; -As Diretrizes Curriculares de 1994 identifica como exigência a dotação por parte dos cursos, das condições de infraestrutura e de oferecimento de espaços e equipamentos especializados para as matérias profissionais, com ênfase no caráter experimental. Os cursos de arquitetura criados neste governo e inseridos em instituições públicas foram: UFSM (1993); UFPI (1993); UEMA (1993); | |
Entidades Associativas:- sem identificação | |
1995-2003 Fernando Henrique Cardoso |
Ensino: - sem identificação |
Governo: Em 2002 é extinto o CEAU - O mandato dos conselheiros expirou em julho de 2002 e novas comissões não foram nomeadas, visto que a legislação federal havia mudado e previa a implantação de um grande comitê assessor no âmbito da SESu/MEC. Nos dez primeiros anos do século XXI houve várias mudanças no ensino superior brasileiro, a começar pelo seu sistema de avaliação, cujo processo deixou de ser da alçada do SESu/MEC e passou para as mãos do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Os cursos de arquitetura em instituições públicas criados neste governo foram: UFMT (1995); UFU (1996); UNICAMP (1999); UEM (2000); UFRRJ (2000); UFMS (1999/2000); UFT (2000); UFCG (2002); | |
Entidades Associativas:- Segundo Schlee et al (2010) entre 1995 e 1996 a Abea contribui para a reavaliação dos projetos pedagógicos dos cursos e das práticas acadêmicas, adequando-os às novas exigências decorrentes da nova base legal expressa nas Diretrizes Curriculares e Conteúdos mínimos de 1994. - Em novembro de 1999, com a realização do IX Conabea e XVI Ensea, foi discutido e reunido em Anexo ao Caderno 21, as configurações preconizadas sobre os laboratórios voltados ao curso de Arquitetura. Pela primeira vez é redigido um documento com a sinalização detalhada sobre a caracterização das instalações técnicas do Laboratório de Tecnologia da Construção - englobando o Canteiro Experimental e Maquetaria. | |
2003-2011 Luiz Inácio Lula da Silva |
Ensino: - sem identificação |
Governo: De acordo com Monteiro (2013), no primeiro governo, dentre as medidas que visavam conectar a avaliação e a regulação estava o Decreto nº 5.773/2006, sobre “o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação no sistema federal de ensino.” Este Decreto incorporava o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), parte do SINAES o processo de reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos e a possibilidade dos conselhos profissionais se manifestarem a respeito desse processo. - Segundo a mesma autora, no segundo mandato (2007 - 2010), foi criado uma série de índices na avaliação da educação superior. Em 2008, propôs‐se a instalação de outros dois indicadores no contexto da educação superior brasileira: o Conceito Preliminar de Curso (CPC) e o Índice Geral de Cursos das Instituições de Educação Superior (IGC). O CPC é formado por 3 elementos: “os insumos que lhe são atribuídos, 30% da nota final; o Enade, com atribuição de 40%; e o IDD com 30%. - De acordo com Rothen e Barreyro (2012), o SINAES perde sua face avaliadora. Quanto à avaliação de cursos: perdem‐se as visitas in loco e a peerreview, ao serem restritas aos cursos sob supervisão. Assim, a avaliação formativa é “desinduzida”, ao privilegiar os resultados do ENADE sobre os outros. Os cursos de arquitetura inseridos em instituições públicas e criados neste governo foram: UNESP-PP (2003); UFRR (2005); UFS (2007); IFF (2008); UEG (2008); IFES (2008); UFOP (2008); UTFPR (2009); UFSJ (2009); UEMT (2009); UFG (2009); UFAM (2010); UNILA (2010); UFFS (2010). | |
Entidades Associativas: Em 2008, o XXVI ENSEA/XXXII COSU, teve como principal temática: “Novos perfis e padrões de qualidade para os cursos de Arquitetura e Urbanismo: do projeto pedagógico às atribuições profissionais”. A proposta da diretoria da ABEA é que fossem criados 3 grupos de trabalho para discussão dos temas pertinentes aos Padrões de Qualidade: Grupo 1 - responsável pelos assuntos relativos aos Recursos Materiais; Grupo 2 - responsável pelos assuntos relativos ao corpo docente e Grupo 3 - responsável pelos assuntos relativos ao Projeto Pedagógico. Segundo Monteiro (2013), a partir desse momento, a diretoria da ABEA deu início a uma aproximação junto ao INEP para apresentação deste documento e, sua consequente aprovação junto ao governo federal, mas tal iniciativa não teve êxito. | |
2011-05/2016 Dilma Roussef |
Ensino: - sem identificação |
Governo: Os cursos de arquitetura inseridos em instituições públicas e criados neste governo foram: UFAP (2011) | |
Entidades Associativas: - O CAU propõe a revisão da Resolução CNE/CES no 2/2010, aprovada no XVII CONABEA/2013 e na 30ª Plenária do CAU-BR/2014. Neste processo é acrescentado no ART 5º o §2º que diz: Para atingir os objetivos e desenvolvimento pleno destas Diretrizes, os cursos de Arquitetura e Urbanismo deverão ser equipados adequadamente com laboratórios específicos, ateliês ou salas de projetos, instalações para pesquisas estudos avançados, bibliotecas com acervo adequado e suficiente e disponibilidade de tecnologias atualizadas para o intercâmbio de informações. - No ART 6º, §5ºdesta nova resolução (ainda em fase de análise pelo MEC), foram acrescentados no Item II, sobre os conteúdos: - produção em ateliê, experimentação em laboratórios e canteiros de obras, elaboração de modelos, utilização de computadores, consulta a bibliotecas e bancos de dados. |
Fonte: elaborado pelas autoras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao analisar cronologicamente as trajetórias de diferentes escolas de Arquitetura e Urbanismo pelo país, foi observado que a busca pela autonomia da formação do arquiteto em relação às antigas Escolas de Engenharia e Belas Artes não ocorreu de maneira espontânea, pois a criação dos novos cursos e escolas adaptou-se às condições de cada local e à política educacional em vigor no período de sua implantação.
Sobre a relação entre modelo de implantação (Modelo Belas Artes ou Politécnico) e a configuração estrutural da área técnica dos cursos visitados(ver Gráfico 01), foi observada a inexistência de relação direta entre modelo de implantação e a estruturação curricular da área da Tecnologia da Construção, diante da heterogeneidade de proposições encontradas, sendo provável que esta questão tenha sido influenciada pela história construída ao longo dos anos, diante das oportunidades surgidas e composição do quadro docente, o qual direcionaria o curso para uma determinada vertente e daria o tom das prioridades de cada escola.
Este fato relacionado ao processo histórico de implantação e desenvolvimento dos cursos vai ao encontro das colocações de Michel Young sobre o processo de formação estrutural do ‘currículo’, visto em Galian e Louzano (2014), quando afirma que a seleção de conhecimento poderia ser definida como a expressão dos interesses dos grupos que detinham maior poder para influir nessa definição, dando assim um viés político na temática do currículo, considerando neste debate as tensões existentes entre a pressão externa, exercida pelos governos e suas agências, e a pressão interna, exercida pelas associações profissionais de especialistas da comunidade educacional.
Um dos primeiros acontecimentos históricos que provocou profundas transformações na estruturação curricular ocorreu em 1931,na Escola Real das Ciências, Artes e Ofícios, quando recebe a primeira reforma com orientação modernista pelo então diretor Lúcio Costa. Neste mesmo período, é criado em Belo Horizonte o primeiro curso de arquitetura da América Latina desvinculado do modelo Politécnico e Belas Artes, assim como, começa a funcionar o ensino de Arquitetura e Urbanismo na recém-criada Escola de Belas Artes de Pernambuco. Na mesma década, o Instituto de Belas Artes de Porto Alegre inaugura seu curso de Arquitetura e, em São Paulo, a Escola Politécnica passa a fazer parte da Universidade de São Paulo, oferecendo dentre seus cursos o de engenheiro-arquiteto. Enquanto isso, o curso de arquitetura da Escola de Belas Artes da Bahia seguia suas atividades, mas ainda sem reconhecimento nacional.
Nas décadas posteriores a este período são vistos consideráveis avanços expansionistas e estruturantes sobre o ensino, principalmente, em capitais do país com um determinado grau de desenvolvimento urbano. Na intenção de caminharem de forma independente em relação aos cursos de origem, a maior parte destas escolas enfrentou longos e conturbados processos de cunho separatista ou de fusão. Já em meados da década de 1940, a Escola Nacional de Arquitetura no Rio de Janeiro passa a Faculdade Nacional de Arquitetura e se separa da Escola de Belas Artes, no mesmo ano, os cursos de arquitetura em funcionamento na Escola de Belas Artes de Pernambuco e no Instituto de Belas Artes em Porto Alegre são reconhecidos como cursos superiores e a Escola de Engenharia da Universidade de Porto Alegre volta a criar um novo curso de arquitetura, que havia funcionado antes por um breve período (1896-1908), enquanto que, ainda no Rio Grande do Sul, o Instituto de Belas Artes também passa a fazer parte da universidade, fato que ocasionou a fusão dos dois cursos. No fim desta década o curso da Escola de Belas Artes da Bahia é federalizado e o curso de engenheiro-arquiteto da Escola Politécnica de São Paulo é desvinculado passando a ter autonomia como curso de Arquitetura e Urbanismo.
Neste mesmo período, o contexto desenvolvimentista e o debate modernista já haviam se legitimado no país, havendo um descompasso entre a atividade profissional e o ensino, já que a reforma curricular proposta por Lúcio Costa na Escola Nacional de Belas Artes demorou a ser reconhecida e aplicada no contexto acadêmico, fato que ocorreu por volta de 1945 na Escola Nacional de Arquitetura, servindo posteriormente de modelo curricular para a implantação e reforma de outros cursos pelo país. Diversos autores relatam que os cursos até então criados passam a ter um alinhamento, por força de lei, ao da escola do Rio de Janeiro, como aconteceu com São Paulo e Rio Grande do Sul e antes deles, também a Escola de Arquitetura de Belo Horizonte, a qual, desde os primórdios de sua criação, já se enquadrava nos moldes definidos pelo Estado durante o governo de Getúlio Vargas, sendo esta uma estratégia para o reconhecimento nacional do curso.
Em razão da maturidade alcançada até a década de 1960 e à inexistência de processos regulatórios como a Reforma Universitária de 1969, foram realizados neste período profundos debates sobre o processo de formação profissional em diversas regiões da federação, em especial entre meados da década de 1950 e o ano histórico de 1962, os quais promoveram transformações de ordem estrutural, pedagógica e política. De acordo com Graeff (1995), o currículo mínimo desenvolvido em 1962 ao longo destes debates vinha abrir oportunidades de mudanças e experiências inovadoras, inclusive no sentido de colocar o ensino em sintonia com as realidades geográficas, sociais e culturais de cada região.
A partir da década de 1960, há um grande intercâmbio de profissionais docentes atuantes em diferentes regiões do país, destacando-se aqueles formados pelas escolas carioca, paulista, mineira e gaúcha, os quais disseminam o conhecimento adquirido nestes centros de formação com propostas de ensino mais consolidadas. Desta forma, as novas escolas criadas tem como apoio as discussões que até então já haviam sido travadas sobre o ensino e, sob bases muito particulares, estes conceitos foram sendo adaptados de acordo com cada contexto e a formação do quadro docente. Destaca-se nesse momento, a experiência da FAU UNB, podendo ser considerada a mais inovadora até então, com inspiração bauhauseana e coordenada por profissionais formados em outras regiões do país.
Embora esta proposta didática tenha sido abortada precocemente devido às ações do regime militar, tornou-se outra fonte de referência (além do modelo Politécnico e Belas Artes) para as escolas criadas posteriormente, sendo visto que as propostas para a área técnica - em que o uso laboratorial e experimental está integrado à proposta geral do ensino - nunca foram replicadas em nenhuma outra escola nacional, nem mesmo na UNB este viés foi retomado ao longo das tentativas de reestruturação. Este fato fortalece a hipótese da relação entre atividades práticas/laboratoriais e iniciativa docente, cujas propostas somente são viabilizadas de acordo com a influência e poder decisório que os atores possuem nas reestruturações do ensino de determinada escola.
Em meio às discussões travadas no fim do período de 1960, está o Currículo Mínimo de 1969, criticado por diversos autores ao defenderem que as normas para sua aplicação denotavam uma visão tecnocrática e padronizadora, indiferente às dinâmicas de mudanças de procedimentos didático-pedagógicos em andamento nas escolas de Arquitetura e Urbanismo. O tempo revelou que estas considerações padronizadoras não foram aplicadas em sua íntegra, diante da heterogeneidade de proposições vistas nos projetos político pedagógico consultado e estruturações curriculares, havendo liberdade na formulação de propostas e delineamento de prioridades nos cursos.
Após implantação do Currículo Mínimo pelo Governo, entidades como ABEA e CEAU foram criadas na década de 1970 e realizaram diversas discussões sobre o ensino a partir de avaliações sistemáticas. As informações produzidas até então, seja pelas escolas com trajetórias mais longas, assim como, por estas entidades, daria oportunidade para que novos cursos fossem criados sob bases mais sólidas de discussão sobre o ensino. Porém, este cenário que supostamente levaria a implantações com maior respaldo de informações e experiências não acarretou em propostas inovadoras, sendo visto por meio dos históricos analisados trajetórias orientadas, prioritariamente, por meio de resoluções regulamentadoras do ensino. De modo geral, a dimensão curricular foi marcada por bases normativas associadas às competências profissionais sem refletir as particularidades associadas ao momento histórico, político e social dentro de uma determinada instituição. As principais ações ao longo da construção histórica do currículo dos cursos arquitetura nas escolas brasileiras foram realizadas por profissionais essencialmente da área, assim como, as discussões e documentação deste processo, não sendo identificada ao longo da pesquisa a participação de profissionais teóricos do currículo.
Este resgate histórico das primeiras ações realizadas por Instituições de Ensino e por Entidades Governamentais e Associativas envolvidas com a questão educacional no Brasil permitiu compreendera influência do momento político educacional vivenciado no país na época decriação de diferentes cursos em Instituições públicas, possibilitando um olhar mais aprofundado sobre o respaldo e apoio que cada curso possuía no momento de sua implantação, concluindo que as variáveis que influenciaram na atual estruturação da área da Tecnologia da Construção não se resumem, necessariamente, ao plano teórico dos Projetos Pedagógicos de curso, mas aos aspectos político-educacionais, estruturais e socioeconômicos, e também questões de fundo, como as relações interpessoais e burocráticas.