SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.25A INDEPENDÊNCIA PERDIDA: REFLEXÕES SOBRE EDUCAÇÃO E MOVIMENTO CABANO NO GRÃO-PARÁ DA AMÉRICA PORTUGUESA (1755-1840)(DES)ARQUIVAR: ARQUIVOS PESSOAIS E EGO-DOCUMENTOS NO TEMPO PRESENTE índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Compartilhar


História da Educação

versão impressa ISSN 1414-3518versão On-line ISSN 2236-3459

Hist. Educ. vol.25  Santa Maria  2021  Epub 31-Ago-2021

https://doi.org/10.1590/2236-3459/106499 

Dossiê: Independência e instrução no Brasil, Chile e nos Estados Unidos da América

RAÇA, MEMÓRIA E EDUCAÇÃO NA FORMAÇÃO NACIONAL DOS ESTADOS UNIDOS (XIX-XXI)

RAZA, MEMORIA Y EDUCACIÓN EN LA FORMACIÓN NACIONAL DE LOS ESTADOS UNIDOS (XIX-XXI)

RACE, MEMORY AND EDUCATION IN THE NATIONAL FORMATION OF THE UNITED STATES (XIX-XXI)

RACE, MÉMOIRE ET L'ÉDUCATION DANS LA FORMATION NATIONALE DES ÉTATS-UNIS (XIX-XXI)

* Universidade de Illinois (UIUC), Urbana-Champaign, Estados Unidos.


RESUMO

Situado no contexto do movimento Black Lives Matter, o texto analisa momentos na história dos direitos civis durante o período da escravidão e no tempo pós-abolição, analisando o papel do judiciário e seus vínculos com questões de acesso e igualdade na educação. Ao colocar de lado a metanarrativa positivista sobre a expansão progressiva dos direitos na história norteamericana, analisamos momentos em que a ação do judiciário reforçou a escravidão e a segregação racial não apenas como marcos dessa história de políticas raciais, mas também como tentativas frustradas por parte de indivíduos e de movimentos sociais para expandir o acesso aos direitos humanos. Refletimos, ainda, sobre as maneiras com que a noção positivista de um avanço contínuo dos direitos tem coincidido com projetos de comemoração, memorialização, e romantização do passado escravagista, bem como de figuras ligadas à defesa da escravidão e da segregação racial.

Palavras-chave: História; Estados Unidos; Racismo

resumen

Situado en el contexto del movimiento Black Lives Matter, este texto analiza momentos de la historia de los derechos civiles durante el período de la esclavitud y la abolición, analizando el papel del sistema de justicia y sus conexiones com el desafío de acceso e de la igualdad en la educación. Al colocar de lado la meta-narrativa positivista sobre la expansión constante de los derechos en la historia de los Estados Unidos, analisamos momentos en que la acción del judiciario reforzó la esclavitud y la segregación racial, no apenas como marcos de la historia de políticas raciales, pero también como esfuerzos frustrados por parte de individuos y de movimientos sociales para expandir el acceso a los derechos humanos. Reflexionamos, todavía, las maneras en que la noción positivista de un avanzo constante de los derechos ha coincidido con proyectos de conmemoración, memorialización, y de romantización de pasado esclavista, bien como de figuras asociadas a la defensa de la esclavitud y de la segregación racial.

Palabras clave: Historia; Estados Unidos; Racismo

Abstract

Placed in the context of the Black Lives Matter movement, this article analyzes moments in the history of civil rights under slavery and the post-emancipation era, analyzing the role of the judiciary and its connection to questions of access and equality in education. By putting aside the positivist meta-narrative that the United States has experienced a progressive expansion of rights, we see moments when the action of the courts reinforced slavery and racial segegation not just as milestones in the history of racial politics, but also as frustrated efforts by individuals and social movements to expand access to human rights. We also see ways in which the positivist notion of a constant advance of rights has coincided with projects to commemorate, memorialize and romanticize the history of slavery, along with the leading figures associated with slavery and segregation.

Keywords: History; United States; Racism

Résumé

Situé dans le contexte du mouvement Black Lives Matter, cet article analyse des moments de l'histoire des droits civils pendant la période de l'esclavage et dans la période post-abolitionniste, en analysant le rôle de la justice et ses liens avec les questions d'accès et d'égalité dans l'éducation. En mettant de côté le méta-récit positiviste sur l'expansion progressive des droits dans l'histoire des États-Unis, nous voyons des moments où l'action judiciaire a renforcé l'esclavage et la ségrégation raciale, non seulement comme des jalons dans l'histoire des politiques raciales, mais aussi comme efforts frustrés des individus et des mouvements sociaux pour élargir l'accès aux droits de l'homme. On réfléchit également la manière dont la notion positiviste d'une avance constante des droits a coïncidé avec des projets de commémoration, de mémoire et de romantisme du passé de l'esclavage, ainsi que des figures liées à la défense de l'esclavage et de la ségrégation raciale.

Mots-clés: Histoire; États-Unis; Racisme

Introdução1

Este artigo foi elaborado em dois tempos: o primeiro, como apresentação em um colóquio2 e, o segundo, no quadro da pandemia decorrente da proliferação do COVID19 e da morte violenta de George Floyd, um afro-americano asfixiado por policiais na cidade de Minneapolis, nos Estados Unidos, em 25 de maio de 2020.

Situado no contexto do movimento Black Lives Matter, o texto focaliza aspectos da história dos direitos civis durante o período da escravidão e no tempo pós-abolição, analisando o papel do judiciário e seus vínculos com questões de acesso e igualdade na educação nos Estados Unidos. Ao colocar de lado a meta-narrativa positivista sobre a expansão progressiva dos direitos na história norte-americana, é possível perceber momentos em que a ação do judiciário reforçou a escravidão e a segregação racial, não apenas como marcos da história de políticas raciais, mas também como reação a tentativas por parte de indivíduos e de movimentos sociais para garantir direitos humanos e escolarização igualitária. Observamos, ainda, que a noção positivista de um avanço contínuo dos direitos tem coincidido e se confrontado com projetos de comemoração, memorialização, e romantização do passado escravagista, bem como de figuras ligadas à defesa da escravidão e da segregação racial.

As reflexões apresentadas por ocasião do referido colóquio foram revistas e ampliadas no contexto das reações à morte de Floyd. Um ponto importante se refere às pressões por mudanças sentidas em muitas áreas, efeito do ativismo da parte do movimento Black Lives Matter que ultrapassam as demandas pelo fim da violência policial para reivindicar ações contra a ampla gama de racismo estrutural e institucional. Tais demandas têm resultado na queda, de forma brusca, de parte significativa da aparelhagem do projeto de memorialização comprometida com o chamado supremacismo branco.

A partir desses acontecimentos, o artigo foi desenvolvido de modo a abordar quatro interrogações: 1) Como tem sido a história da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos acompanhada por um projeto de supremacismo branco? 2) Como podemos entender a imagem do judiciário como uma instituição que defende os direitos civis, quando essa percepção é fruto de um breve período agora terminado, dentro de uma tendência muito mais longa de restringir os diretos de pessoas Afro-Americanas e de outras minorias raciais e étnicas? 3) Como as limitações impostas pelo judiciário são traduzidas (e com que intensidade) nas políticas educacionais dos Estados Unidos? 4) Como estes elementos têm contribuído para que, atualmente, se legitimem medidas e estratégias para uma maior segregação escolar?

Uma das meta-narrativas mais poderosas nos Estados Unidos é a noção de que a trajetória nacional se constitui em uma marcha contínua para a expansão dos direitos e o aumento da liberdade. A noção do progresso histórico tem convivido com a romantização do passado escravocrata e de figuras, cujos perfis se encontram vinculados à preservação da escravidão, ao supremacismo branco e à segregação fundada em lei e imposta por violência. Por exemplo, em 1983, quando foi estabelecido o feriado em memória do Dr. Martin Luther King, Jr., o Estado de Virgínia, que liderou campanha militar e política Confederada para preservar a escravidão na Guerra Civil (1861-65), estabeleceu a data como “Lee-Jackson-King Day3,” comemorando, assim, os dois generais que comandaram a resistência armada à abolição, deslocando King Jr. e sua luta pela igualdade para um terceiro plano.

A verificação de tendências tão contrárias e incompatíveis como as do Lee-Jackson-King Day não se constitui em simples coincidência. Pelo contrário, são tendências que coexistem em um país que, supostamente, se torna cada vez mais igualitário, com seu passado pesando cada vez menos sobre seu presente. Mesmo em uma época que passou pela recente eleição e reeleição de um presidente de descendência africana4, o progresso nas arenas de igualdade e dos direitos humanos passa a ser percebido como algo cada vez menos alcançável. Esses limites têm sido especialmente evidentes em três áreas: na educação básica e superior; na integração socioeconômica e na violência policial e social.

A narrativa positivista sobre a expansão de direitos, em sua versão contemporânea, foi fortemente alimentada pelo papel do Supremo Tribunal Federal que com a decisão Brown v. Board of Education, de 1954, proibindo a segregação escolar, o que abriu uma jurisprudência, no campo dos direitos humanos, inédita na história do país. Nos vinte anos subsequentes, o Supremo Tribunal e o juizado federal desmantelaram o sistema de segregação racial ancorado e protegido em lei, agindo ao lado da mobilização por parte de movimentos reivindicando direitos e mudando opinião pública. Ao lado disto é possível observar ação legislativa no sentido de criar leis e políticas públicas, de modo a garantir determinados direitos, como o direito ao voto.

A ação do Supremo Tribunal, parte integrante dessa série de mudanças, aparece hoje não como um marco de progresso constante, mas como uma breve etapa, de apenas algumas décadas, na esfera de uma longa tendência conservadora da qual o tribunal tem se aproximado. O recuo deste tribunal é especialmente notável em sua jurisprudência sobre integração racial no ensino básico e ações afirmativas no ensino superior5. Trata-se, pois de uma questão que articula história geral dos Estados Unidos com a conquista de determinados direitos, inclusive os educacionais, por parte de todos os cidadãos, matéria que repousa em um longo e complexo debate que continua hoje.

Escravidão, segregação e o desafio da igualdade

“A educação pública para todos e ao custo do Estado foi, no Sul, uma ideia Negra” escreveu em W.E.B. Du Bois, um dos principais intelectuais Afro-americanos do século XX (DU BOIS, 1935, p. 638). Para James Anderson, a visão da educação no Sul pós-bélico procura reconhecer os ex-escravizados como os principais desafiadores da resistência estabelecida à educação gratuita na região. (ANDERSON, 1988, p. 113)

Du Bois (1868-1963) conviveu com o auge da segregação racial nos Estados Unidos. Nos Estados do Sul, a segregação foi uma forma de supremacismo branco fundamentado em lei e apoiado por violência. Foram os estados do Sul que se revoltaram, em 1861, para preservar a escravidão depois da eleição de um presidente abolicionista, Abraham Lincoln6. Com a derrota da “Confederação”7, em 1865, a escravidão foi abolida nos Estados Unidos por emenda constitucional. Quando os brancos do Sul, gradativamente, recuperaram o poder local, voltaram a criar leis obrigando a separação racial e restringindo os direitos de pessoas Afro-Americanas.

Nas outras regiões do país, em que a segregação não foi codificada, ela aparecia e funcionava por meio de práticas de discriminação mais semelhantes às que Hasenbalg descreve para a experiência brasileira da mesma época:

Com a abolição do escravismo, o racismo, como construção ideológica e conjunto de práticas mais ou menos articuladas, foi preservado em alguns casos até mesmo reforçado. A preservação do racismo, independentemente do conteúdo irracional do preconceito racial, serviu aos interesses (materiais ou não) daqueles que dele se beneficiaram. (HASENBALG, 1979, p. 113)

Quando Du Bois se pronunciou em 1935 sobre a influência Afro-Americana sobre a formação da educação pública, ele convivia com a distorção desse projeto educacional por parte de supremacistas brancos. Ao voltarem ao poder no Sul, impuseram a segregação não apenas para separar brancos e negros, mas também para criar diferenças de condições de ensino entre alunos brancos e negros, que serviam como espetáculo público, de modo a demonstrar a superioridade de qualquer pessoa branca sobre todas as pessoas afro-americanas. Ainda foi necessário aguardar algumas décadas até o Supremo Tribunal, no caso Brown, declarar a segregação escolar do ponto de vista racial como procedimento inconstitucional. Du Bois já teria aplicado o conceito da “dupla consciência” à experiência afro-americana, definindo a relação entre a auto-imagem de pessoas afro-americanas e a consciência do desprezo delas da parte das pessoas brancas, “esse sentido se sempre se estar olhando através dos olhos dos outros.” (DU BOIS, 1903, p. 3).

Nos anos que se seguiram à Guerra Civil (1861-1865), o governo federal conduziu, nos estados do Sul, um projeto político e social chamado “Reconstrução”. O referido projeto começou com intervenção militar e com a cassação de políticos e administradores que tinham apoiado a “Confederação”, retirando, efetivamente, toda a camada dirigente dos estados do Sul. Durante a década de “Reconstrução”, que durou até 1877, antigos escravos Afro-americanos votaram e foram eleitos para cargos estaduais e municipais no Sul. O novo protagonismo político dos negros foi apagado pelo terrorismo branco, que assumiu várias formas, incluindo a formação do Ku Klux Klan8. Grupos paramilitares aterrorizavam e mataram pessoas Afro-Americanas para prevenir sua participação política. Neste contexto de violência, as eleições presidenciais de 1876 foram influenciados pela intimidação de eleitores Afro-americanos por parte de brancos e fraude na contagem de votos em vários estados do Sul, resultando em um colégio eleitoral quase empatado e uma crise constitucional. O candidato Republicano Rutherford Hayes assumiu a presidência com base em um acordo que resultou no fim da “Reconstrução” e a retirada das tropas federais que tinham sido uma das poucas proteções dos direitos políticos de pessoas negras.

O resultado foi a separação cada vez mais intensa de pessoas afro-americanas do sistema eleitoral, dos direitos políticos e das políticas públicas. Um exemplo extremo dessa exclusão pode ser observado no estado de Mississippi, no qual pessoas afro-americanas consistiam em maioria da população até a década de 1930. Durante a “Reconstrução”, 115 deputados e senadores estaduais eram afro-americanos. Com o fim do referido projeto, a violência e a legislação terminaram por restringir o voto exclusivamente à brancos, o que passou a significar que, naquele estado, nenhuma pessoa afro-americana pode ser eleita à assembleia até 1965, quando uma das principais leis federais de direitos civis, o Voting Rights Act (a Lei de Direito ao Voto) de 1964, anulou as restrições eleitorais racistas. (OREY, 2000, p. 791-792; LOWRY II, 1971, p. 580). Cenários semelhantes se repetiram em outros estados do Sul.

Antes da guerra de secessão, a educação de pessoas escravizadas era proibida por lei em quase todos os estados do Sul. (FONER, 1988, p. 96). A “Reconstrução” criou algumas oportunidades para superar essa restrição, e pessoas libertas usaram, intensivamente, o acesso ao processo político para criar redes de educação pública nos estados em que ainda não existiam. Os projetos foram apoiados pela agência federal criada para auxiliar pessoas saindo de escravidão, o Freedmen’s Bureau, bem como da parte de iniciativas de grupos filantrópicos, religiosos e abolicionistas do Norte, que apoiaram a construção de escolas e encaminharam recursos e professores para as mesmas.

Segundo Eric Foner,

Em 1865 e 1866, negros formaram sociedades e colhiam fundos entre eles mesmos para comprar terrenos, construir escolas e pagar salários para professores. Até 1870, negros gastaram mais de 1 milhão de dólares com educação, um ponto de orgulho coletivo. (FONER, 1988, p. 100)

Os esforços se estenderam muito além do auxílio mútuo. Como relata o historiador Christopher Span, no estado de Mississippi, delegados afro-americanos na assembleia constituinte, ao criarem a nova carta do estado, em 1868, estabeleceram escolas gratuitas e “acessíveis para todos sem critério de gênero, raça, classe ou prévia condição servil.” Um dos delegados relatou que “o estado não tinha professores... até que trouxemos professores do Norte, homens e mulheres, brancos e negros.” (SPAN, 2009, p. 4) Processos semelhantes foram desenvolvidos no resto do Sul, com as redes escolares sendo incluídas nas novas constituições estaduais e, em alguns estados, a adoção do instituto da obrigatoriedade da frequência escolar.

Com o fim da “Reconstrução”, os brancos retomaram o poder com uma combinação de violência, coação e intimidação seguida pela elaboração de leis que subordinavam e marginalizavam as pessoas afro-americanas. Segundo James Anderson:

Os negros foram cruelmente privados de seus direitos; sua subordinação cívica e política foi fixada nas leis do sul e os estatutos e costumes sociais foram uma armadilha fixando-os a uma economia agrária que restava pesadamente sobre o controle e a distribuição de uma mão de obra coagida. Desde o fim da Reconstrução até a década de 1960, negros no sul existiam num sistema social que lhes privava de sua cidadania, do direito ao voto e do controle voluntário de sua mão de obra. Estavam na situação de um povo oprimido. A educação negra se desenvolveu dentro deste contexto de opressão política e econômica. (ANDERSON, 1988, p. 2)

O projeto de reconstituição do poder branco usou a lei e a violência para separar pessoas afro-americanas do direito ao voto, de participar em júris, de direitos econômicos, de trabalho e de educação. A segregação escolar ancorada na raça foi imposta no Sul. Esse projeto foi acompanhado pelo projeto simbólico de recuperar a imagem branca e de sua luta na guerra civil como um ato heroico e de sacrifício em que soldados brancos do Sul foram vítimas de agressão por parte do Norte. Essa versão apagou a história da escravidão e da luta pela emancipação. Deste modo, podemos argumentar que projeto de segregação social e escolar se constitui em parte indissociável do projeto de supremacismo branco que também incluía a construção e celebração de determinada memória e história estadounidense, romatizando, por exemplo, a luta por parte do Sul na guerra da secessão. A militância pelos direitos civis lidou contra a segregação e a violência racial por meio de mobilização social e ações na justiça. No entanto, transcorridos mais de 150 anos, o projeto de memória só passou a ser enfrentado mais direta e maciçamente no contexto do recente movimento Black Lives Matter.

Ida Wells: Educação, militância e supremacismo branco

A experiência de Ida B. Wells, professora, jornalista e militante, nos permite perceber as estreitas conexões entre escravidão e supremacismo branco, educação e os aspectos legislativos, assim como os fios dessa história que alcançam o presente. Wells nasceu escrava no estado de Mississippi, em 1862. Depois da abolição, a família Wells investiu, como muitos outros, na criação de oportunidades educacionais. Seu pai, James Wells que, possivelmente, não fora alfabetizado, virou membro do conselho do Shaw University9, uma faculdade recém-criada por missionários metodistas para a educação de antigos escravos. Ida Wells relembra “Nosso trabalho foi ir à escola e aprender tudo o que pudemos.” (McMURRY, 1998, p. 8-9). Os pais de Wells faleceram em uma epidemia de febre amarela, em 1878. Com isso, Wells passou a cuidar de si e de seus irmãos enquanto estudava para ser professora.

Wells estudou na Fisk University10, fundada em 1866 por religiosos abolicionistas para educar ex-escravizados/as. Trabalhou como professora em uma escola segregada em Memphis, (no estado de Tennessee), cidade na qual o Reverendo Martin Luther King seria morto por um segregacionista quando fazia uma visita para apoiar uma greve de garis afro-americanos em 1968. Desde o início de sua carreira, Wells militou contra a segregação, fazendo parte de uma frente ampla de pessoas afro-americanas que desafiavam a crescente formalização da segregação e negação de acesso a estabelecimentos escolares, meios de transporte e outros setores. Em 1887, depois de ser retirada à força de um vagão de trem para brancos, processou a companhia ferroviária, acontecimento que se transformou em um caso que chegou ao supremo tribunal estadual, no qual foi derrotada.

Wells começou a trabalhar como jornalista e virou editora de um jornal afro-americano, em Memphis, chamado Free Speech (“Liberdade de expressão”) que publicava matérias sobre injustiças raciais, formalização da segregação e violência racial branca. Esse jornal era impresso em papel cor-de-rosa para que pessoas não alfabetizadas o pudessem reconhecer. (SILKEY, 2015, p. 162). Em 1891, foi demitida como professora por publicar críticas às condições das escolas para alunos afro-americanos e a falta de preparação de professores que recebiam cargos nessas escolas por meio de favores políticos. Dedicada integralmente ao jornalismo, começou nas páginas do Free Speech a criticar o linchamento de pessoas afro-americanas, especialmente o linchamento de três homens em Memphis, em 1892. (McMURRY, 1998, p. 132-133)

Wells publicou Southern Horrors: Lynch Law in all its phases (1892), relatando casos de linchamento no Sul dos Estados Unidos, denunciando o descaso das autoridades e a inação mesmo por parte de brancos revoltados com a violência. Para Wells, apenas a ação coordenada por comunidades negras poderia acabar com esse tipo de violência. Wells argumentou a favor de um boicote de mão de obra Afro-Americana:

O afro-americano pode fazer por si mesmo o que nenhum outro pode fazer... a reabilitação do Sul se deve ao capital do norte e a mão de obra afro-americana. Se essa mão de obra fosse retirada, o capital não permaneceria... A aplicação sábia desse poder sobre os locais de linchamento poderia, muitas vezes, produzir uma revolução pacífica.” (WELLS, 1892, p. 31)

Ao sofrer represálias por sua militância, a professora jornalista se mudou de Memphis para Chicago, cidade industrial e comercial no norte do país cujo crescimento econômico e demográfico no final do século XIX e primeiras décadas do XX era semelhante ao que aconteceria em São Paulo entre as décadas de 1920 e 1960. Destino de imigrantes, depois da Primeira Guerra Mundial seria também o principal destino da chamada Grande Migração, em que seis milhões de pessoas afro-americanas partiram do Sul para cidades do Norte (WILKERSON, 2016). Os migrantes fugiram das condições denunciadas por Wells e da pobreza reproduzida na ausência de reforma agrária depois do desmantelamento do regime sustentado na escravidão.

Mesmo em uma cidade do Norte como Chicago, as condições vividas por Wells em Memphis continuavam presentes. Como jornalista, lutou contra projetos para segregar as escolas da cidade. Embora sem segregação codificada, restrições nos títulos imobiliários concentravam pessoas afro-americanas em bairros e escolas efetivamente segregadas racialmente. O estado de Illinois, do qual Chicago era a principal cidade, tinha abolido a escravidão quando virou estado em 1819. Foi o estado de Abraham Lincoln, o presidente que, durante a Guerra Civil, aboliu a escravidão, e de Ulysses Grant, que comandou as tropas do Norte nas principais ações militares contra a “Confederação” e que, como presidente, entre 1867 e 1877, presidiu o projeto da “Reconstrução”. Ainda assim, era um estado que registrou 56 linchamentos entre 1877 e 1950.11 O maior momento de violência racista aconteceu em Springfield, a capital do estado, em 1908, quando uma multidão branca atacou bairros e estabelecimentos afro-americanos, matando nove pessoas.12

Esse ato de terrorismo ganhou repercussão nacional por acontecer na cidade na qual Lincoln tinha exercido sua carreira de advogado e lançado sua campanha presidencial. Wells participou de uma série de encontros organizados em resposta ao ataque que, em 1909, estabeleceram a National Association for the Advancement of Colored People (NAACP)13, uma das principais organizações de direitos civis nos Estados Unidos. Entre os organizadores estava Du Bois, que convidou o filósofo de educação, John Dewey, a participar do congresso de fundação desta organização. O NAACP se empenhou em desafiar a segregação racial e restrições ao voto para pessoas afro-americanas por intermédio de ações na justiça, tendo, ainda, liderado uma campanha contra as práticas de linchamento. Essas ações criaram a experiência necessária para desenvolver estratégias para combater a segregação escolar e foi o NAACP que protagonizou o caso Brown.

Wells morou na zona sul de Chicago, a principal região residencial e comercial afro-americana, tendo sido enterrada no cemitério Oak Woods em 1931 (figura 1). Contudo, por mais que tenha sido um estado que produziu lideranças políticas e militares que atuaram na Guerra Civil, existe um enorme monumento aos soldados Confederados (figura 2). O monumento, no entanto, não pode ser considerado totalmente fora de lugar: foi erguido no lugar de enterro de soldados Confederados que faleceram como prisioneiros de guerra em uma instalação militar próxima.

Fonte: foto por Jerry Dávila (2020)

Figura 1 - A lápide de Ida B. Wells no Cemitério Oak Woods em Chicago, fotografado no 23 de setembro de 2020, dia em que um júri, no estado vizinho de Kentucky, absolveu policiais por matar Breonna Taylor, técnica de sala de emergência e afro-americana, quando dormia em casa.  

Fonte: foto por Jerry Dávila (2020)

Figura 2 - O monumento Confederado no Cemitério Oak Woods, cercado de canhões. 

Trata-se de um monumento grandioso, com um pilar de 12 metros de altura, composto de granito e bronze e cercado por canhões e uma pirâmide de balas de canhão. No cume do pilar aparece um soldado Confederado em bronze, baseado no quadro “Appomatox” do pintor John Elder, cujas obras romantizavam a campanha militar do Sul e que foram adaptadas para a criação dos monumentos Confederados.14 Na base do monumento, relevos em bronze retratam a “chamada à luta” e a “volta à casa”, que completa o imaginário comum aos monumentos Confederados, de modo a exaltar a lealdade e nobreza em uma tragédia chamada de “causa perdida.”

A versão nostálgica da luta Confederada como sacrifício, ao colocar o soldado derrotado no centro, desconsidera e marginaliza as lutas afro-americanas por sua liberdade, o que faz parte de uma estratégia para reintegrar brancos do Norte e do Sul. Ao comparar a experiência dos Estados Unidos depois da Guerra Civil com a construção do apartheid na África do Sul depois da sangrenta Guerra Boer, Anthony Marx assinala:

Para reduzir esses conflitos, as elites atuaram vigorosamente para estabelecer acordos, traindo os negros e reforçando antigas ideologias e distinções raciais à fim de unir os brancos... ‘Para sanar as feridas nacionais’ entre os brancos, os negros foram subordinados, e a ferida racial foi deixada a supurar. (MARX, 1999, p. 2)

O Presidente Grover Cleveland assistiu à inauguração do monumento em 1895. Uma placa interpretativa no monumento inclui uma declaração do Presidente William McKinley (1897-1901) que reflete o projeto descrito por Marx:

A União é mais uma vez o altar de nosso amor e nossa lealdade, nossa devoção e nosso sacrifício... Todo túmulo de soldado criado na desafortunada Guerra Civil é um tributo à valentia Americana... no espírito de fraternidade devemos compartir com vocês o cuidado dos túmulos dos soldados Confederados.15

Trata-se, portanto, de uma declaração de irmandade e igualdade entre os soldados do Norte e do Sul na qual as pessoas afro-americanas, cuja escravização foi o motivo da luta Confederada, estão ausentes. Essa memorialização que desarticulava a guerra da questão da escravidão, coincide com o reforço do sistema da segregação e marginalização de pessoas afro-americanas na vida pública. No mesmo momento em que o monumento foi construído, Wells embarcava em uma campanha contra a exclusão e discriminação de pessoas afro-americanas na Exposição Mundial de 1893 em Chicago, publicando The Reason Why the Colored Person is Not Allowed in the World’s Columbian Exposition. (WELLS, 1893). O protesto criticava a forma em que o supremacismo branco foi refletido na organização e as opções temáticas do evento, que se fundamentava nas lógicas do colonialismo europeu, o darwinianismo social e o racismo científico. Eram tendências evidentes também nas representações de civilização, raça e cultura em países Europeus e em países das Américas, incluindo-se o Brasil.16 Os organizadores da exposição responderam aprovando um “Dia de Gente de Cor”, o que foi rejeitado por Wells como uma concessão simbólica. A exposição estava profundamente imersa no racismo colonialista de sua época - uma “fantasmagoria racista” na frase de Claudia Roth Pierpont - organizada ao redor de hierarquias do darwinismo social dentro de um conjunto arquitetônico chamado de “Cidade Branca.” (BLIGHT, 2018, p. 734; PIERPONT, 2004, p. 51).

Fonte: Biblioteca Digital Mundial (1893)

Figura 3 - Visão geral da Exposição Mundial de Chicago, conhecida como “A Cidade Branca.”17  

O antropólogo Franz Boas, que teria um papel fundamental no Brasil e nos Estados Unidos na rejeição da noção da superioridade racial, foi indicado para coordenar o pavilhão de antropologia física na exposição que, em tais exposições, funcionava como um “zoológico humano”, reunindo pessoas “primitivas” para personificar as pressuposições do racismo científico. (BLANCHARD, 2009; HINSLEY, 2016, p. xvi). Em palestra depois da exposição, Boas declarou: “o velho sentimento sobre a inferioridade da raça de cor é tão poderoso que sempre se apresenta como uma barreira formidável a seu avanço.” (PIERPONT, 2004, p. 51).

Justiça e direitos civis

Apesar de variar regionalmente entre o informal e o formal, a segregação racial, em todo o país, encontra-se enraizada no supremacismo branco e violência. Estes dois pilares vêm sendo, aos poucos, desmontado por atuação de movimentos sociais afro-americanos que desenvolveram a estratégia dupla de desafiar publicamente a segregação e, ao mesmo tempo, ingressar, repetidamente, na justiça com recursos contra leis e práticas segregacionistas. Os tribunais federais e estaduais foram, de modo geral, resistentes a esses apelos. A partir da década de 1950, contudo, o Supremo Tribunal Federal começou a acatar os argumentos relacionados aos danos causados pela segregação.

A época em que o Supremo Tribunal Federal atuou de forma consistente para garantir os direitos humanos de pessoas afro-americanas e de outros grupos minoritários, como os de origem indígena ou latino-americana, durou menos de 30 anos. Foi antecedido por quase dois séculos de decisões - algumas com implicações enormes - que justificavam a escravidão e perpetuaram o supremacismo racial. Essa época de expansão de direitos foi seguida desde os finais da década de 1970 por uma jurisprudência mais conservadora que tem desmantelado muitas das ferramentas de política pública e muito de suas próprias decisões na área de relações raciais.

O judiciário norte-americano - como qualquer outro - tem interpretado a constituição segundo as tendências ideológicas ascendentes. O exemplo mais notório durante o período da escravidão foi o caso Dred Scott v. Sandford (1857). Scott entrou na justiça para obter sua alforria depois do seu proprietário ter se mudado com ele, de um estado escravista, para vários estados que tinham abolido a escravidão. Parte de seu argumento foi que, em território livre, tinha vivido como liberto e com os direitos de um cidadão, e como prova, tinha se casado legalmente, algo proibido a pessoas escravizadas. O tribunal rejeitou o pedido de Scott, o que fez com que retornasse à condição de escravo. A natureza da decisão foi importante para o aprofundamento legal da escravidão, marginalização racista de pessoas Afro-Americanas e supressão de seus direitos. Menos notado, mas ainda muito importante, consiste na natureza da ação de Scott, isto é, a tentativa frustrada de apelar ao judiciário e à constituição na defesa dos direitos humanos.

A decisão teve repercussão profunda. O presidente do Supremo Tribunal, Roger B. Taney determinou que nenhuma pessoa de origem africana deveria ter direito à cidadania estadunidense:

Pode um negro, cujos ancestrais foram importados a este país, e vendidos como escravos, virar membro da comunidade política formada e criada pela constituição dos Estados Unidos[?]... Achamos que não o são, e que não foram incluídos, e que não houve intenção de incluí-los, sob a palavra ‘cidadão,’ na constituição, e por isso não podem exigir nenhum dos direitos e privilégios que esse instrumento garante para os cidadãos dos Estados Unidos. (DRAKE, 1999, p. 123)

Por isso, segundo Taney, seja escravo ou liberto, Scott não tinha direito de apelar ao tribunal. Dos dois ministros que não concordaram com a decisão, um renunciou a seu mandato e, outro, criticou a opinião de Taney afirmando que era “mais uma questão de gosto do que de lei.” (SPIRES, 2019, p. 169)

A parte da decisão ainda mais impactante do caso Scott foi a determinação de que pessoas escravizadas continuavam escravas mesmo quando entravam em território livre. A decisão significou que um proprietário de escravos no Sul podia levar seus escravos para o Norte e manter seus direitos sobre o escravo, anulando, efetivamente, a abolição que tinha acontecido gradativamente no Norte. Essa parte da decisão aprofundou as tensões políticas sobre a escravidão entre estados livres e escravistas, levando-os ao caminho da Guerra Civil, que eclodiria quatro anos mais tarde. (FEHRENBACHER, 2001)

Depois da Guerra Civil, o judiciário teve um papel fundamental na criação de dispositivos que sustentaram a segregação e a preservação do supremacismo branco, tomando por base uma interpretação interessada e limitada das emendas constitucionais aprovadas para abolir a escravidão e garantir a cidadania dos antigos escravizados. O tribunal também anulou a Lei de Direitos Civis de 1875 que protegia o direito ao voto. A decisão foi seguida por uma onda de violência por parte de brancos no Sul para retomar o poder e aprovar leis que restringiam o voto Afro-Americano. No contexto dos casos frustrados contra a segregação, como no processo iniciado por Ida Wells, um grupo em New Orleans participou de um processo que conseguiu derrubar práticas segregacionistas. Trata-se do caso de Homer Plessy, um homem classificado no censo como “oitavão” - alguém que tinha um bisavô/avó classificado como negro - comprou passagem em um vagão de trem de primeira classe. Foi barrado e o grupo processou a empresa. O caso Plessy v. Ferguson (1896) foi decidido pelo Supremo Tribunal em favor da segregação racial, decisão que prevaleceu até a decisão Brown v. Board of Education of Topeka de 1954. A postura do tribunal permite perceber a ação judicial alinhada às ideologias predominantes no país, que defendiam a segregação racial. (KLARMAN, 2004, p. 450-452)

O NAACP, que desenvolveu o caso Brown, aproveitou lições apreendidas através de uma série de ações legais fracassadas. O judiciário não respondia positivamente ao argumento de que a segregação era inerentemente desigual, nem que era racista, nem que criava diferentes castas sociais baseada no supremacismo branco. Sem essas linhas mais diretas, a chave da estratégia levada à frente pelo advogado Thurgood Marshall foi a de mostrar que o sistema de segregação causava danos morais às crianças que estudavam em escolas segregadas. Usou estudos psicológicos em que crianças negras habitualmente escolhiam bonecas brancas para brincar como prova do estigma causado pela segregação. Essa argumentação parece ser próxima à justificação da constitucionalidade das cotas universitárias no Brasil pela Ministra Cármen Lúcia em 2012: “...presenteei duas sobrinhas com duas bonecas negras lindas. Uma das sobrinhas, que é negra, rejeitou a boneca... Ela não estava se reconhecendo como o padrão da sociedade.”18

Fonte: Fotos por Jerry Dávila (2021).

Figuras 4 e 5 - Paineis do mural “These Are Times” de Scott Ayo (2018) no lugar onde Homer Plessy foi reitrado do trem em New Orleans, vinculando seu ato de resistenciâ à luta para derrubar a segregação escolar. 

Nos estados do Sul houve resistência maciça à decisão de integrar as escolas. Um município em Virgínia simplesmente fechou sua rede escolar. Em outros lugares, a segregação residencial reproduzia a segregação escolar mesmo sem leis segregacionistas. Por meios de separação legais e informais, cidades se construíram de formas altamente divididas, tanto no Sul quanto nos estados do Norte. Entre essas práticas, a mais notória foi a chamada “red lining,” isto é, o uso de uma linha vermelha para designar bairros negros nos mapas desenvolvidos pelo governo federal para determinar o nível de risco para seguradoras e para empréstimos hipotecários. (ROTHSTEIN, 2017)

Nesse ambiente de segregação das casas e bairros, o fim da separação legal entre alunos negros e brancos, na prática, mudou muito pouco. Dez anos depois de Brown, nos estados do Sul, menos de 3% de alunos negros cursavam escolas com maiorias de alunos brancos. A vara federal, seguindo a jurisprudência do Supremo Tribunal, baixou uma série de decisões destinadas a superar a resistência política à integração e, por certo momento, tentar ultrapassar as barreiras estruturais da segregação residencial.

A solução desenvolvida e aplicada por juízes federais não apenas no sul, mas também em cidades do norte do país, foi de obrigar redes escolares municipais a usar ônibus escolar para distribuir alunos nas escolas da rede, a fim de criar perfis demográficos que, em cada escola, refletissem a demografia do município. O sistema, que durou entre 1971 e 2002, deu resultados: em 1988, a porcentagem de alunos negros no sul matriculadas em escolas maioritariamente brancas subiu de 2,3% a 43,5%. (CERMERINSKY, 2005, p. 29). O alcance da medida foi limitada em regiões metropolitanas cujas escolas estavam divididas entre várias redes de ensino, visto que a segregação estrutural continuou nos subúrbios, principalmente brancos, e centros urbanos, principalmente, negros e latinos, acompanhada por uma desigualdade estrutural em termos de acesso aos recursos já que a educação pública nos Estados Unidos é financiada, sobretudo, pelos impostos sobre imóveis, o que termina por gerar mais recursos para municípios cujos moradores tem residências mais caras.

A partir de 1954, o judiciário nos Estados Unidos rejeitou o racismo institucional na forma das leis e no combate às práticas de segregação. Observando que ausência dessas práticas e leis não garantiam a integração igualitária, passou-se a atuar contra o racismo estrutural com medidas como a obrigação do uso de ônibus escolar para integrar sistemas escolares. No entanto, no contexto de mudança política e ideológica desde os meados da década de 1970, o judiciário recuou na ação contra racismo estrutural. Em 2002, o Supremo Tribunal Federal proibiu o uso de ônibus para integrar escolas como parte de uma tendência de restringir o uso de políticas públicas para promover a integração racial. A decisão freou o aumento da integração, e em 2017, o número de alunos Afro-americanos cursando em escolas onde não estavam na maioria havia diminuído para 30,2% - um terço menos do que no auge do esforço de integração escolar (GARCÍA, 2020).

O retrocesso no ensino básico se repetiu no ensino superior, onde a ação conservadora do Supremo Tribunal Federal agiu energicamente para desmantelar os projetos de cotas e de ações afirmativas. A tendência de restringir medidas de integração racial começou em 1978 com o processo Bakke v. Regents of University of California, que terminou por determinar que o uso de cotas raciais e de gênero era inconstitucional. A decisão abriu espaço para o uso de “ações afirmativas” mais indiretas, o que reduziu oposição à decisão por parte de movimentos sociais e de instituições de ensino. Como lamentou um ministro do Supremo Tribunal, “tristemente... ponderamos se a maioria [do tribunal] ainda acredita que... discriminação racial contra não-brancos é um problema em nossa sociedade, ou mesmo lembra que em algum momento foi.” (HIGGINBOTHAM, 1996, p. vii)

As medidas de ação afirmativa foram cada vez mais restritas pela ação do tribunal. O recuo do Supremo Tribunal e da vara federal foi produto de uma campanha política de indicar juízes conservadores. Em sua versão mais recente, o Presidente Trump, como candidato em 2016, chegou a publicar uma lista de pessoas que indicaria como juiz para superar os receios de eleitores conservadores sobre seu comportamento pessoal. Durante sua campanha para reeleição, o Ministério de Justiça abriu em agosto de 2020 um processo contra a Universidade de Yale, acusando a universidade de discriminar alunos brancos e asiáticos ao praticar as formas leves de ação afirmativa, ainda, assim, não toleradas pelo Supremo Tribunal. (ANDERSON, 2020). Nas estratégias jurídicas e raciais usadas pelo Presidente Trump não são novas, posto que caminham em uma senda política e jurídica que tem produzido e reproduzido desigualdades persistentes, sem que se limitem ao campo educacional.19

Desigualdades Persistentes e Black Lives Matter

A desigualdade socioeconômica nos Estados Unidos tem aumentado consistentemente nos últimos 50 anos. Em 2016, a renda média entre brancos era U$48 mil por ano entre brancos, e de U$31 e U$31,4 mil entre afro-americanos e Latinos (KOCHHAR, 2018). Desigualdade que se repete em outras áreas da vida socioeconômica como nas taxas de desemprego, sendo especialmente notável na ação policial. Para citar um exemplo, entre 2003 e 2007, na cidade de Filadélfia, onde 50% da população é Afro-Americana, 80% das pessoas baleadas pela polícia é Afro-Americana (TAYLOR, 2014, p. 2). Em outras cidades e regiões do país, repetem-se ações policiais que resultam na morte de Afro-americanos desarmados. Recentemente, a reação pública a essa violência gerou o movimento Black Lives Matter.

Escrevendo em 2014, no início do movimento Black Lives Matter, e muito antes das políticas etno-nacionalistas do governo Trump, Keeanga-Yamahtta Taylor antecipa as reações que viriam mais tarde seguindo a morte de George Floyd:

O gênio do slogan ‘Black Lives Matter’ está na sua capacidade de dar voz aos aspectos deshumanizantes do racismo anti-negro nos Estados Unidos. A força do movimento ao longo prazo vai depender de sua capacidade de alcançar grandes números de pessoas, ligando a questão da violência policial às outras formas em que pessoas negras são oprimidas. (TAYLOR, 2014, p. 183)

Para Taylor, essas áreas incluem o aumento do salário-mínimo e justiça educacional, às quais podemos acrescentar justiça ambiental, a reforma do sistema penitenciário e acesso ao sistema de saúde, especialmente, no meio de uma pandemia que atinge pessoas afro-americanas, indígenas, e latinas de forma desproporcional.

As reações à morte de George Floyd indicam que o diagnóstico de Taylor tem sido presciente: o repúdio gerado pela frieza da ação que matou Floyd, e o acúmulo de casos de violência semelhantes fizeram eclodir uma onda de protestos através do país e no exterior. Os incipientes projetos de reforma do aparelho policial que surgiram em resposta às manifestações ainda não deram resultados. O movimento, contudo, expandiu exponencialmente seu alcance e passou a focalizar outras formas de opressão. Entre elas estão as mudanças no uso de símbolos relacionados à escravidão e ao supremacismo branco nos espaços públicos.

Embora mudanças simbólicas não se devem confundir com mudanças estruturais, esse arcabouço simbólico que se encontra repentinamente em jogo é parte integrante do projeto de supremacismo branco que, desde a Guerra Civil, vem sendo reforçada por meio de diversas medidas e práticas de segregacionismo, perdurando como contrapeso ao movimento de direitos civis. Os protestos, dentre outras estratégias, também se voltaram para os símbolos que consagravam a segregação e superioridade branca, desencadeando uma onda de ações contra símbolos racistas ou que romantizaram a escravidão e a luta para preservá-la.

Entre as mudanças mais bruscas e inesperadas houve a troca de nome de um dos principais clubes de futebol americano, os “Redskins” de Washington, D.C. O nome “Redskins” significa literalmente “os pele-vermelha”, referindo-se a pessoas indígenas. Sua logomarca era uma figura indígena e os cantos da torcida vulgarizavam músicas imaginariamente indígenas produzidas para filmes de faroeste e desenhos animados na década de 1950. O dono do clube tinha rejeitado insistentemente todas as pressões por parte de organizações indígenas para mudar o nome, que normalizava a objetificação e esterotipificação de pessoas indígenas. No contexto dos protestos recentes, a empresa de encomendas FedEx, patrocinadora comercial do clube, cujo contrato de U$205 milhões lhe dava o direito ao uso do seu nome no estádio, enviou uma carta pública ao dono pedindo a mudança do nome por ser “inconsistente com seu compromisso com uma sociedade mais inclusa.” (CLARKE, 2020)

Na ligas nacionais de basquete, a National Basketball Association e a Women’s National Basketball Association, jogadores vestem camisas que, em lugar de seu nome, usam o nome de pessoas mortas pela polícia, como Breonna Taylor, técnica de sala de emergência e afro-americana, morta quando dormia em casa, ou frases dos movimentos sociais que foram aprovados em negociação como:

Black Lives Matter; Say Their Names; Vote; I Can't Breathe; Justice; Peace; Equality; Freedom; Enough; Power to the People; Justice Now; Say Her Name; Sí Se Puede (Yes We Can); Liberation; See Us; Hear Us; Respect Us; Love Us; Listen; Listen to Us; Stand Up; Ally; Anti-Racist; I Am A Man; Speak Up; How Many More; Group Economics; Education Reform; and Mentor.20

A associação de corrida automobilística, NASCAR, por sua vez, muito identificada com o Sul e contando com apenas um piloto Afro-Americano em sua primeira divisão, estabeleceu uma regra inusitada, proibindo o uso da bandeira Confederada, que tinha sido comum entre seus torcedores e espectadores.

Em diversas cidades do país, manifestantes e prefeituras agiram para retirar estátuas de figuras associadas à escravidão, ao segregacionismo e ao colonialismo. Em Alexandria, Virginia, uma estátua com a mesma figura, “Appomatox” que aparece no monumento Confederado no cemitério em Chicago, foi retirada em junho de 2020. O monumento em Chicago, que está sob a jurisdição do governo federal, contudo, permanece. Uma estátua de Taney foi retirado de sua cidade natal, Annapolis, Maryland em 2017.

O exército, de sua parte, tenta retirar os nomes de generais Confederados de instalações militares. A Câmara de Deputados aprovou legislação para retirar do Congresso o busto do ministro do Supremo Tribunal Federal Roger Taney, autor da decisão Dred Scott. As medidas do Exército e da Câmara contam, contudo, com a oposição do Presidente Trump.

O principal alvo tem sido estátuas comemorativas aos soldados confederados que foram erguidos na época da segregação. Como explica a historiadora Karen Cox:

Quase nenhum dos monumentos foi instalado imediatamente depois da Guerra Civil. Alguns foram erguidos na época do movimento de direitos civis no início da década de 1960, coincidindo com o centenário da guerra, mas a imensa maioria data de entre 1895 e a Primeira Guerra Mundial. Foram parte de uma campanha para caracterizar a causa sulista na Guerra Civil como justa e, a escravidão, como uma instituição benévola. No pano de fundo de sua instalação foi a violência do sistema Jim Crow [de segregação] e a opressão Afro-Americana. Os monumentos foram erguidos como símbolos explícitos da supremacia branca. (COX, 2017)

O mais habitual é a construção e localização destes monumentos e as estátuas em frente aos tribunais de justiça e de prefeituras como uma forma de sinalização de poder. (BRUNDAGE, 2019).

Fonte: Foto por Michael Dávila (2020)

Figura 6 - Marcus-David Peters Circle, antigo Robert E. Lee Circle.  

A expressão desse poder foi especialmente forte na cidade de Richmond, Virginia, capital da Confederação. Em Richmond, a Avenida dos Monumentos é um boulevard de escala magnífica com estátuas gigantescas das principais figuras da Confederação, incluindo seu presidente, Jefferson Davis, e seus principais generais, incluindo o comandante Robert E. Lee. A pressão aumentou nos últimos anos para retirada deste tipo de estátuas, mas só começaram a ser suprimidas depois da morte de Floyd. Salvo a do general Lee (figura 3). A retirada deste monumento foi impedida por um juiz acatando um pedido por descendentes da família que tinha doado o terreno do monumento à cidade, condicionando seu uso à presença da estátua. Enquanto a cidade apela desta decisão, o monumento virou uma horta comunitária e um espaço onde performances acontecem diariamente. Pichado para descaracterizá-lo, o monumento foi redirecionado para chamar atenção quanto aos custos da violência policial, com o círculo de trânsito onde fica rebatizado Marcus-David Peters Circle, em memória de um professor Afro-Americano morto por policiais em 2018.

Considerações finais: memória e justiça social

Dois aeroportos na região metropolitana de Washington, D.C. refletem a memorialização conturbada e conectada da luta pelos direitos civis e da resistência branca. O Thurgood Marshall Baltimore/Washignton International Airport memorializa o advogado que liderou a equipe do NAACP que levou o caso Brown à Supremo Tribunal, sendo, posteriormente o primeiro ministro Afro-Americano do Supremo Tribunal Federal. O Ronald Reagan Washington National Airport leva o nome do ex-presidente cujo projeto político incluía captar os votos de brancos no Sul desapontados pelo processo de integração racial. Reagan realizou seu primeiro comício depois de receber a indicação do Partido Republicano como candidato à presidência em 1980 no pequeno vilarejo de Filadélfia, Mississippi. Filadélfia, com uma população de menos de 7 mil, tinha a fama de ser o lugar onde, em 1964, o Ku Klux Klan linchou três militantes de direitos civis, um ato que aumentou pressão pública para aprovação das principais leis federais voltadas para o desmantelando a segregação, o Civil Rights Act de 1964 e o Voting Rights Act de 1965. O linchamento e a reação do governo federal foram retratados no filme Mississippi em chamas (1988). Nesse local, Reagan adotou e repetiu o lema usado pelos governadores sulistas que defenderam a segregação como uma prática que cabia aos estados e não à união decidir: “Eu acredito nos poderes dos estados.” E declarou: “temos distorcido o balanço de nosso governo hoje em dia, dando-lhe poderes nunca contemplados pela Constituição” (POTTER, 2020, p. 201).

São poucos os países nos quais, dois aeroportos da capital, separados por 50 quilômetros, podem comemorar legados tão contrários. Essa justaposição mostra um país em que os principais conflitos do passado não estão resolvidos, onde a noção do progresso e da expansão de direitos e oportunidades convive com a dura realidade de racismo institucional e estrutural, notável especialmente na violência policial e na desigualdade educacional. Na mesma medida em que o passado pesa tanto sobre o presente, está sempre viva a possibilidade de mudança. Em junho de 2020, em resposta à pressão insistente de movimentos sociais - e sob a ameaça da liga de futebol em que a Universidade de Mississippi joga, de excluí-lo - o estado de Mississippi retirou a imagem da bandeira Confederada de sua bandeira estadual. Foi o último estado da antiga Confederação a fazê-lo.

O desafio das forças estruturais e institucionais não existe de modo isolado e pode ser entendido e enfrentado com melhores ferramentas quando se coloca em diálogo com os desafios de um país cujo passado e presente são semelhantemente conturbados, como é o Brasil. Entre os inúmeros pontos de diálogo possíveis, o texto destaca e finaliza com um. Os Estados Unidos são um dos poucos países que não tem garantia constitucional ao acesso à educação, e o único país a não ratificar a Convenção Sobre Direitos da Criança das Nações Unidas. (WONG, 2018). Na ausência desse direito, depois da escravidão, em grande parte o país, a educação pública foi erguida pelas mãos dos escravos libertos como uma garantia de sua libertação e do exercício da cidadania. Muito diferente foi a trajetória brasileira, na qual cada constituição tem garantido o direito à educação, desde a carta de 1824, que no Art. 179 articula “a instrução primaria é gratuita a todos os Cidadãos.” Nem a constituição dos Estados Unidos ou a carta Brasileira de 1824 faz menção explícita à escravidão (a brasileira remete à escravidão quando menciona ingênuos e libertos, admitindo-os como cidadãos do Império), mesmo sendo a principal estrutura econômica e de dominação social existente nos dois países. A injustiça possibilitada por esse silêncio mostra a ambivalência do judiciário no campo dos direitos humanos, a inconsistência das instituições na garantia da igualdade de oportunidade, e a importância contínua do esforço individual e dos movimentos sociais na reivindicação delas.

Referências

ANDERSON, James D. The Education of Blacks in the South, 1860-1935. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 1988. [ Links ]

ANDERSON, Nick. “Justice Department accuses Yale of illegal bias against White, Asian American applicants in admissions,” The Washington Post, 13 de agosto de 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.washingtonpost.com/local/education/justice-department-accuses-yale-of-illegal-bias-against-white-asian-american-applicants-in-admissions/2020/08/13/d99a7376-dda5-11ea-8051-d5f887d73381_story.html . Acesso em: 13 ago. 2020. [ Links ]

BLANCHARD. Pascal, BANCEL, Nicolas, DEROO, Eric, LAMAIRE, Sandrine (orgs.). Human Zoos: Science and Spectacle in the Age of Colonial Empires. Liverpool: Liverpool University Press, 2009. [ Links ]

BLIGHT, David. Frederick Douglass: Prophet of Freedom. New York: Simon & Schuster, 2018. [ Links ]

BRUNDAGE, W. Fitzhugh, COX, Karen, GALLAGHER, Gary, PAINTER, Nell Irving, CLINTON, Catherine (org.) Confederate Statues and Memorialization. Athens: University of Georgia Press, 2019. [ Links ]

CERMERINSKY, Erwin “The Segregation and Resegregation of American Public Education.” In: BOGER John Charles; ORFIELD, Gary (orgs.). School Resegregation: Must the South Turn Back? Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2005. [ Links ]

CLARKE, Liz. “In private letter to Redskins, FedEx said it will remove signage if name isn’t changed,” The Washington Post. 10 de julho de 2020. Disponível Em: Disponível Em: https://www.washingtonpost.com/sports/2020/07/10/private-letter-redskins-fedex-said-it-will-remove-signage-if-name-isnt-changed . Acesso em: 13 ago. 2020. [ Links ]

COX, Karen, “The Whole point of Confederate monuments is to celebrate white supremacy,” The Washington Post, 16 de agosto de 2017, Disponível em: Disponível em: https://www.washingtonpost.com/news/posteverything/wp/2017/08/16/the-whole-point-of-confederate-monuments-is-to-celebrate-white-supremacy . Acesso em 13 ago. 2020. [ Links ]

DRAKE, Frederick; NELSON, Lynn. (org). States’ Rights and American Federalism: A documentary history. Westport: Greenwood, 1999. [ Links ]

DU BOIS, W.E.B. Black Reconstruction in America, 1860-1880. [1935]. New York: Free Press, 1998. [ Links ]

DU BOIS, W.E.B. The Souls of Black Folk. Chicago: McClurg, 1903. [ Links ]

EISENBERG, Peter. Guerra Civil Americana. São Paulo: Brasiliense, 1983. [ Links ]

FEHRENBACHER, Don. The Dred Scott Case: It’s Significance in American Law and Politics. New York: Oxford University Press, 2001. [ Links ]

FONER, Eric. Reconstruction: America’s Unfinished Revolution, 1863-1877. New York: Harper & Row, 1988. [ Links ]

GARCÍA, Emma. “Schools are still segregated and black children are paying a price,” Economic Policy Institute, February 12, 2020. Disponível em: Disponível em: https://www.epi.org/publication/schools-are-still-segregated-and-black-children-are-paying-a-price . Acesso em: 13 ago. 2020. [ Links ]

GOODWIN, Doris Kearns. Lincoln. Rio de Janeiro: Record, 2013. [ Links ]

HASENBALG, Carlos. Discriminação e desigualdades raciais no Brasil. Rio de Janeiro: Graal, 1979. [ Links ]

HIGGINBOTHAM, JR., A. Leon. Shades of Freedom: Racial Politics and Presumptions of the American Legal Process. New York: Oxford University Press, 1996. [ Links ]

HINSLEY, Curtis e WILCOX, David. “The Chicago Fair and American Anthropology, 1893,” In: HINSLEY, Curtis e WILCOX, David Coming of Age in Chicago: The 1893 World’s Fair and the Coalescence of American Anthropology. Lincoln: University of Nebraska Press, 2016. [ Links ]

KARNAL, Leandro. História dos Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. [ Links ]

KLARMAN, Michael. From Jim Crow to Civil Rights: The Supreme Court and the Struggle for Racial Equality. New York: Oxford University Press, 2004. [ Links ]

KOCHHAR, Rakesh; CILLUFFO, ANTHONY. “Income Inequality in the U.S. Is Rising Most Rapidly Among Asian,” Pew Research Center, July 12, 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.pewsocialtrends.org/2018/07/12/income-inequality-in-the-u-s-is-rising-most-rapidly-among-asians . Acesso em: 13 ago. 2020. [ Links ]

LOWRY II, Mark. Population and Race in Mississippi, 1940-1960, In: Annals of the Association of American Geographers. 61:3, 1971, p. 576-588. [ Links ]

MARX, Anthony. Making Race and Nation: A Comparison of the United States, South Africa and Brazil. New York: Cambridge University Press, 1999. [ Links ]

McMURRY, Linda. To Keep the Waters Troubled: The Life of Ida B. Wells. New York: Oxford, 1998. [ Links ]

OREY, Byron D’Andra. “Black Legislative Politics in Mississippi,” Journal of Black Studies, 30:6 (2000), pp. 791-814. [ Links ]

PIERPONT, Claudia Roth, “The Measure of America: How a rebel anthropologist waged a war on racism,” The New Yorker, 8 de março de 2004, 51. [ Links ]

POTTER, Jennifer Potter, “Lynching,” In: Violence in American Society: An Encyclopedia of Trends, Problems, and Perspectives. Vol. 1. RICHARDSON, Chris (org). Santa Barbara: ABC-CLIO, 2020. [ Links ]

ROTHSTEIN, Richard. The Color of Law: A Forgotten History of How our Government Segregated America. New York: Liverlight, 2017. [ Links ]

SILKEY, Sarah L. Black Woman Reformer: Ida B. Wells: Lynching & Transatlantic Activism. Athens: University of Georgia Press, 2015. [ Links ]

SPAN, Christopher. From Cotton Field to to Schoolhouse: African American Education in Mississippi, 1862-1875. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2009. [ Links ]

SPIRES, Derrick. The Practice of Citizenship and Print Culture in the Early United States. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2019. [ Links ]

TAYLOR, Keeanga-Yamahtta. From #Blacklivesmatter to Black Liberation. Chicago: Haymarket Books, 2014. [ Links ]

WELLS, Ida B. Southern Horrors: Lynch Law in All Its Phases. [1892]. Amherst: Humanity Books, 2002. [ Links ]

WELLS, Ida B., Douglass, Frederick., Penn, Irvine Garland. e Barnett, Lee. The Reason Why the Colored Person is Not Allowed in the World’s Columbian Exposition [1893] Urbana: University of Illinois Press, 1999. [ Links ]

WILKERSON, Isabel. “The Long-Lasting Legacy of the Great Migration,” Smithsonian Magazine, setembro de 2016, Disponível Em: Disponível Em: https://www.smithsonianmag.com/history/long-lasting-legacy-great-migration-180960118 Acesso em: 13 ago. 2020. [ Links ]

WONG, Alia. “The Students Suing for a Constitutional Right to Education,” The Atlantic, 28 de novembro de 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.theatlantic.com/education/archive/2018/11/lawsuit-constitutional-right-education/576901 . Acesso em: 13 ago. 2020. [ Links ]

1Agradeço a revisão geral e final deste artigo que contou com a colaboração do Professor José G. Gondra.

2Trata-se do colóquio “Independência e Instrução na América e África - História, Memória e Formação” último evento público ocorrido na Universidade do Estado do Rio de Janeiro antes da eclosão da pandemia em março de 2020. Detalhes do evento podem ser conferidos em https://uerjbicentenario.wixsite.com/evento (acesso em 31 out. 2020) e no canal do NEPHE/UERJ no Youtube https://www.youtube.com/channel/UC1eM0YNgoqnaLjSE90OxGuw

3A lei que instituiu o “Lee-Jackson-King Day” permaneceu em vigência até 2002.

4Trata-se de Barack Obama, (nascido em Honolulu, 4 de agosto de 1961), um advogado e político norte-americano que serviu como o 44º presidente dos Estados Unidos de 2009 a 2017, sendo o primeiro afro-americano a ocupar o cargo.

5Em 1971, por exemplo, na decisão Swann v. Charlotte-Mecklenburg Board of Education, o Supremo Tribunal Federal apoiou a decisão de um juiz federal, obrigando o uso de sistemas de ônibus escolar para distribuir alunos de forma demograficamente proporcional nas redes escolares. Em 2002, o Supremo Tribunal Federal anulou sua posição anterior e proibiu o uso de medidas desenvolvidas com a intenção de garantir a igualdade de distribuição de alunos por grupo racial ou étnico.

6Sobre a presidência de Abraham Lincoln, a eclosão da Guerra Civil e a abolição da escravidão, ver Doris Kearns Goodwin Lincoln (2013) e Peter Eisenberg (1983).

7Os sulistas, ainda no ano das eleições (1860), já falavam em secessão, isto é, em separação entre as duas regiões e na criação de outro país, os Estados Confederados da América, em oposição ao Norte. Em dezembro de 1860, os sulistas conceberam uma nova Constituição e oficializaram os Estados Confederados, elegendo como presidente Jefferson Davis, do Mississippi, e, como capital, a cidade de Montgomery, no Alabama. Em 1864, as forças do Sul já não conseguiam mais se manter coesas. A situação era desfavorável para os sulistas, e o seu presidente, Jefferson Davis, foi preso pelos soldados da União quando tentava fugir. O general Lee, por sua vez, rendeu-se em 19 de abril de 1865 ao general Ulysses Grant, pondo fim à guerra. Cf. Karnal (2007).

8Também conhecida como “KKK” ou simplesmente de “Klan”, surgiu nos Estados Unidos, mais precisamente no estado do Tennessee, após o fim da Guerra de Secessão, com o objetivo de promover o terror no sul dos Estados Unidos. Perseguia, espancava e assassinava pessoas negras libertas e pessoas que defendiam os direitos civis para os afro-americanos. O KKK teve uma ressurgência na década de 1920 com protestos xenófobos contra a imigração e continua ativa e praticando manifestações supremacistas como o um protesto violento em 2018 em Charlottesville, Virginia, depois da qual o Presidente Trump elogiou os supremacistas como “gente muito fina.” https://www.washingtonpost.com/politics/2020/05/08/very-fine-people-charlottesville-who-were-they-2/ Acesso em 6 nov. 2020.

9Atualmente chamado Rust College, https://www.rustcollege.edu Acesso em 5 nov. 2020.

10A respeito da história desta instituição, cf. https://www.fisk.edu/about/history/ Acesso em 3 nov. 2020.

11Ver o projeto “Lynching in America,” Equal Justice Initiative, Disponível Em: https://lynchinginamerica.eji.org/explore. Acesso em: 13 ago. 2020.

12“1908 Springfield race riot led to the creation of the NAACP,” State Journal-Register, 14 de agosto de 2018. Disponível em: https://www.sj-r.com/news/20180814/1908-springfield-race-riot-led-to-creation-of-naacp Acesso em: 13 ago. 2020.

13A respeito da história do NAACP, cf. https://naacp.org/nations-premier-civil-rights-organization/ Acesso em 3 nov. de 2020.

14“Confederate Mound,” U.S. Department of Veterans Affairs National Cemetery Administration, “Confederate Mound,” Disponível em: https://www.cem.va.gov/cems/lots/confederate_mound.asp Acesso em: 13 ago. 2020.

15Citado no trecho “Caminho à reconciliação” na placa interpretativa frente ao monumento, de autoria do Departamento de Assuntos de Veteranos do governo dos Estados Unidos.

17Disponível em https://www.wdl.org/pt/item/11369/ Acesso em 4 nov. 2020.

18“Ministra Cármen Lúcia afirma em seu voto que cota é uma etapa para a igualdade,” Notícias STF, 26 de abril de 2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=206008 Acesso em: 13 ago. 2020.

19Em 2013, por exemplo, o Supremo Tribunal anulou, como inconstitucionais, as cláusulas de execução do Voting Right Act que fiscalizavam a conduta eleitoral de estados que tinham praticado segregação e restrição do voto.

20“Season Restart: Team-by-team social justice messages on jerseys,” National Basketball Association, 24 de julho de 2020. Disponível em: https://www.nba.com/2020-restart-nba-social-justice-jersey-messages. Acesso em: 13 ago. 2020.

Recebido: 14 de Agosto de 2020; Aceito: 21 de Dezembro de 2020

E-mail: Jdavila@illinois.edu

JERRY DÁVILA ocupa a cátedra Jorge Paulo Lemann de História do Brasil na Universidade de Illinois em Urbana-Champaign. Atua como o diretor executivo do Illinois Global Institute, que reúne os centros de estudos internacionais da universidade. Tem leccionado na Universidade de São Paulo e a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro como bolsista Fulbright.

Editora responsável:

Tatiane de Freitas Ermel

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons