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História da Educação

versão impressa ISSN 1414-3518versão On-line ISSN 2236-3459

Hist. Educ. vol.26  Santa Maria  2022  Epub 30-Nov-2022

https://doi.org/10.1590/2236-3459/119417 

Artigo

PROFESSORAS GAÚCHAS PARTICIPANTES DA MISSÃO PEDAGÓGICA AO URUGUAI (1913-1914)

PROFESORAS RIOGRANDENSES EN MISIÓN PEDAGÓGICA EN URUGUAY (1913-1914)

SCHOOLTEACHERS FROM RIO GRANDE DO SUL IN A STUDY MISSION TO URUGUAY (1913-1914)

ENSEIGNANTES DU RIO GRANDE DO SUL (BRÉSIL) PARTICIPANTES À LA MISSION PÉDAGOGIQUE À L’URUGUAY (1913-1914)

* Universidade Federal do Rio Grande (FURG), Rio Grande/RS, Brasil.

** Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pelotas/RS, Brasil.


Resumo

O objetivo principal deste artigo é apresentar e analisar a participação de dez professoras na missão de estudos enviada pelas autoridades gaúchas ao Uruguai nos anos de 1913 e 1914. Embora tenha se tornado expressivo o número de professoras atuando no ensino público primário já no início do século XX, ainda era pouco comum que elas realizassem viagens ou cursos no exterior no referido período. Assim, considerou-se relevante apresentar os propósitos da missão pedagógica, destacando quem eram essas mulheres, suas trajetórias e algumas de suas ações profissionais, dando, assim, visibilidade à participação feminina na configuração do campo intelectual da educação gaúcha. A contribuição desse artigo, que teve como subsídio os trabalhos de Miceli (1979), Perrot (2007) e Vieira (2015), é, portanto, na perspectiva de caracterizar e reconhecer as mulheres professoras como intelectuais.

Palavras-chave: professoras; intelectuais; educação; missão pedagógica

Resumen

El principal objetivo de este artículo es presentar y analizar la participación de diez profesoras en la misión de estudios enviada por las autoridades de Rio Grande del Sur (Brasil) a Uruguay en los años 1913 y 1914. Aunque se haya convertido en gran expresión el número de maestras actuando en la enseñanza pública primaria ya en el principio del siglo XX, todavía no era común que realizaran viajes o cursos en el exterior en este periodo. Así que consideramos relevante presentar los ideales de la misión pedagógica, señalando quiénes eran esas mujeres, sus trayectorias y algunas de sus acciones profesionales, colaborando, de este modo, con la visibilidad sobre la participación femenina en la configuración del campo intelectual de la educación riograndense. De manera que la contribución de este artículo, que tuvo como amparo los trabajos de Miceli (1979), Perrot (2007) y Vieira (2015), está en la posibilidad de caracterizar y reconocer a las mujeres profesoras como intelectuales.

Palabras clave: profesoras; intelectuales; educación; misión pedagógica

Abstract

The main purpose of this paper is to present and analyze the participation of ten schoolteachers who were sent by the authorities of the state of Rio Grande do Sul in a study mission to Uruguay in the years of 1913 and 1914. Even though there was already an expressive number of schoolteachers working in primary public education in the early 1900s, it was not common for them to travel or study abroad at that time. Therefore, we deemed it relevant to discuss the purposes of the study mission, presenting who those women were, their life stories, and some of their professional histories to highlight female participation in configuring the intellectual landscape of education in Rio Grande do Sul. This paper is based on works by Miceli (1979), Perrot (2007), and Vieira (2015) and seeks to identify and recognize female schoolteachers as intellectuals.

Keywords: schoolteachers; intellectuals; education; study missions

RÉSUMÉ

Cet article a pour principal but présenter et analyser la participation de dix enseignantes à une mission d’études envoyée par les autorités de l’état du Rio Grande do Sul, Brésil, à l’Uruguay en 1913 et 1914. Bien que le nombre d’enseignantes dans les écoles primaires publiques soit devenu expressif au début du 20e siècle, aller en voyages ou suivre des cours à l’étranger n’était pas commun pour elles à cet époque. Alors, on a trouvé pertinent de présenter les objectif de cette mission pédagogique, en soulignant qui étaient ces femmes, leurs trajectoires et quelques de leurs actions professionnelles, pour donner une visibilité à la participation féminine dans la configuration du champ intellectuel de l’éducation en Rio Grande do Sul. Cet article, qui s’appuie sur les travaux de Miceli (1979), Perrot (2007) et Vieira (2015), donne une contribution à la perspective de caractériser et de reconnaître les femmes enseignantes en tant qu’intellectuelles.

Mots-clés: enseignantes; intellectuels; éducation; mission pédagogique

Introdução

O período de 1889 a 1930, descrito na historiografia brasileira como Primeira República ou República Velha, designa uma série de mudanças nas estruturas políticas, econômicas e sociais do país, que estavam articuladas a um contexto mundial de modernização. Não obstante a essa realidade mundial e nacional, o Rio Grande do Sul (RS) também foi palco de significativas mudanças, as quais foram expressas através de um projeto político modernizador articulado aos interesses de um grupo específico, o Partido Republicano Rio-Grandense (PRR)1.

Pautadas nas premissas positivistas, as ações do referido partido tinham como objetivo reorganizar a sociedade a partir da liberdade e da igualdade, propugnando que o progresso do Rio Grande do Sul dependia de uma reforma intelectual e moral. Para tanto, o investimento recaiu sobre aquele que passou a ser considerado “o melhor de todos os bens”: a educação. Seria por meio dela, portanto, que os sujeitos poderiam sair da ignorância e serem educados de forma a ter “[...] aptidão para governar-se e adquirir o gosto pelo exercício da liberdade [...]”, além de adquirir a “consciência nacional” (CORSETTI, 2008, p. 60).

Imbuídos por esse ideário, as autoridades do RS procuraram aperfeiçoar o sistema de ensino, que estava em fase de expansão e de consolidação no início do século XX. Dentre as inúmeras estratégias adotadas para sua qualificação, ressalta-se a de buscar subsídios em países tidos como referência (NÓVOA e SCHRIEWER, 2000), haja vista que as missões pedagógicas “[...] funcionavam como técnica de investigação e de conhecimento, como prática de observar, experimentar, comparar e produzir conhecimento sobre o outro [...]”, e também sobre “o eu” (GONDRA, 2010, p. 13). Logo, essas viagens, em suas distintas dimensões seja de mediação, formativa ou avaliativa, se constituíram como uma tendência investigadora no século XIX e XX.

Assim, Antônio Augusto Borges de Medeiros - Presidente do RS (1898-1928) - organizou e autorizou uma missão pedagógica para conhecer de perto a realidade educacional uruguaia, a qual foi realizada em dois momentos. No primeiro, em 1913, um grupo composto de dois professores e quatro professoras permaneceu três meses no Uruguai com o intuito de visitar as escolas de ensino primário e as instituições consideradas como modelares por atenderem a especificidades de ensino como, por exemplo, aquelas frequentadas crianças surdas e propensas à tuberculose. No segundo momento, em 1914, três professoras receberam subsídio do governo uruguaio para aperfeiçoar seus estudos no Instituto Normal de Señoritas2 e três foram financiadas pelo governo do RS para praticar, nesse estabelecimento e na escola de aplicação anexa, os métodos de ensino lá utilizados.

Com essa ação, o Estado estava “[...] agindo dentro de uma corrente de idéas generelisadas e proclamadas por uma orientação toda de actualidade” (A FEDERAÇÃO, ed. 250, 28 de out. de 1913, p. 1) que era aprender com a experiência de países mais adiantados, uma vez que, como mencionado, a prática de enviar missões educacionais ao estrangeiro no final do século XIX, assim como nas primeiras décadas do século XX, configurou-se como uma estratégia importante para aqueles que almejavam promover mudanças em seus setores educacionais3.

Tendo em vista a relevância de tais missões para o período e o fato de a composição dos dois grupos que participaram da missão de estudos ao Uruguai ser majoritariamente feminina, considerou-se importante abordar tal questão. Chama-se atenção para o fato de que embora existam trabalhos que tratem sobre a missão de estudos ao Uruguai, nenhum deles teve como foco as professoras comissionadas4. Tampouco, encontram-se biografias ou informações mais detalhadas a respeito de suas trajetórias. Logo, entende-se primordial destacar quem foram essas mulheres e suas contribuições no campo educacional gaúcho.

Sobre a participação de mulheres em missões pedagógicas, é interessante observar que apesar de ter se tornado expressivo o número de professoras atuando no ensino público primário no século XX, ainda era pouco comum que elas realizassem viagens ou cursos no exterior no referido período, sendo perceptível a predominância masculina em viagens. Desse modo, teve-se como objetivo, neste artigo, apresentar e analisar a participação das professoras nessa missão.

Considera-se relevante destacar quem eram essas mulheres, suas trajetórias e ações profissionais, dando, assim, visibilidade à participação feminina na configuração do campo intelectual da educação gaúcha. A contribuição desse artigo é, portanto, na perspectiva de caracterizar e reconhecer as mulheres professoras como intelectuais (MICELI, 1979; VIEIRA, 2015; GOMES e HANSEN, 2016), em especial aquelas que participaram de missões no início do século XX, perspectiva ainda incomum na historiografia da educação. Segundo Perrot (2007), "as professoras primárias são, há muito tempo, mulheres engajadas", seja pela educação das meninas, pelo socialismo, pelo feminismo ou até pela revolução, seja a favor da contracepção e do aborto. Segundo a autora, "as professoras primárias são as primeiras intelectuais. Até mesmo mais do que as professoras secundárias", que eram em menor número, mais individualistas e solitárias (ibidem, p. 127).

Entende-se, no entanto, que “uma história ‘sem as mulheres’ parece impossível (ibidem, p. 13), especialmente no campo educacional, majoritariamente feminino. Contudo, as mulheres têm sido invisíveis ou invisibilizadas na história. Diz ela que “em muitas sociedades, a invisibilidade e o silêncio das mulheres fazem parte da ordem das coisas.” (ibidem, p. 17). Quando se trata do reconhecimento das mulheres professoras como intelectuais esse silenciamento é imponderável, especialmente em razão da composição de gênero da profissão. Assim, no sentido de contribuir com uma mudança na ‘ordem das coisas’ é que esse artigo foi escrito, fundamentalmente para destacar a participação nas missões pedagógicas e as trajetórias profissionais e intelectuais de dez mulheres gaúchas: Florinda Tubino Sampaio, Olga Acauan Gayer, Ondina Godoy Gomes, Carlina Carneiro Cunha, Marina Barreto Cunha, Georgina Gomes Moritz, Maria José de Souza Cunha, Branca Diva Pereira de Souza, Maria Idalina Mariante Pinto e Marieta Freitas Chaves.

Para tanto, trabalhou-se com um corpus de análise amplo que foi composto por documentos de diferentes tipologias, a saber, Relatórios da Secretaria do Interior e do Exterior, Mensagens dos Presidentes de Estado enviadas à Assembleia Legislativa, reportagens publicadas no jornal A Federação, materiais e entrevistas concedidas pelos descendentes dos/as professores/as que participaram da missão pedagógica ao Uruguai5. É válido frisar que o contato com estes familiares foi uma tarefa árdua e complexa principalmente por três motivos: (i) o trânsito das professoras e de seus descendentes por diferentes cidades e Estados; (ii) as mudanças de sobrenomes no decorrer das histórias geracionais e (iii) por algumas professoras não seguirem atuando no magistério após um período de suas vidas. Do total de dez professoras participantes da missão, foram encontrados descendentes de seis delas, a saber: Branca Diva Pereira de Souza, Georgina Gomes Moritz, Marina Barreto Cunha, Maria Idaliana Mariante Pinto, Olga Acaun Gayer e Ondina Gomes Godoy.

Ademais, como afirmou Le Goff (1990, p. 110), pelo fato de nunca ser puro e objetivo, o documento deve ser compreendido como um monumento e deve “ser desestruturado, desmontado e desmistificado”. Cabe salientar, nessa direção, a acuidade necessária no cruzamento dos dados coletados, haja vista que os documentos investigados são de ordens discursivas diferentes. Não há como tratar os decretos e os regulamentos expedidos pelas autoridades gaúchas, por exemplo, como se tivessem sido produzidos com a mesma intencionalidade de uma reportagem publicada em um jornal da época, pois esses documentos não possuíam a mesma finalidade, não foram escritos para os mesmos leitores e não tiveram a mesma circulação. Desse modo, foi fundamental observar, nos documentos que compuseram o corpus de análise deste artigo, o contexto social e político em que eles foram produzidos, com que intencionalidade, quem os escreveu, o lugar social de onde falava o sujeito que o escrevia, entre outros aspectos. Em linhas gerais, sinaliza-se que os documentos oficiais evidenciam um pensamento político e social que vigorava à época, e, por isso, contribuíram para contextualizar o período em que a missão ocorreu, as compreensões e ações das autoridades do Rio Grande do Sul, bem como a organização e os encaminhamentos relativos à missão de estudo ao Uruguai; as reportagens veiculadas nos jornais, por caracterizarem-se como arquivos do cotidiano, possibilitaram identificar os integrantes da missão pedagógica, assim como o debate acerca da ação do Estado que não havia sido registrado nos documentos oficiais consultados; e as entrevistas realizadas com os descendentes das professoras forneceram subsídios não só para a elaboração dos breves perfis profissionais de cada uma das professoras, mas também para pensar algumas questões sobre as suas participações na missão de estudos

Assim, este texto está organizado em duas seções. Na primeira, expõem-se os propósitos da missão pedagógica ao Uruguai e os possíveis critérios que constituíram o processo seletivo dos professores e professoras que participaram da missão de estudos. Na segunda, apresentam-se, por meio de um perfil geral, as mulheres que integraram as viagens, suas trajetórias e algumas de suas ações profissionais, dando, assim, visibilidade à participação feminina na configuração do campo intelectual da educação do Rio Grande do Sul.

A MISSÃO PEDAGÓGICA AO URUGUAI E OS CRITÉRIOS DE SELEÇÃO DAS PROFESSORAS VIAJANTES

Como mencionado, a missão ao Uruguai foi desenvolvida em dois momentos, sendo a primeira viagem realizada no ano de 1913 e a segunda em 1914. Cada uma delas teve finalidade e duração distintas, todavia, ambas foram financiadas pelo Estado do Rio Grande do Sul. A viagem de 1913 tinha como intuito observar a realidade educacional uruguaia, a organização escolar, os métodos de ensino adotados, os materiais usados, entre outros aspectos, no período de três meses. A viagem de 1914 tinha o objetivo de possibilitar a um grupo de professoras estudar e aperfeiçoar seus conhecimentos e suas práticas de ensino no Instituto Normal de Señoritas e na Escola de Aplicação anexa à mesma.

Os nomes, tanto dos professores quanto das professoras que fariam parte da missão de estudos, liderada por Alfredo Clemente Pinto6, no ano de 1913, foram apresentados na reportagem publicada no jornal A Federação que anunciava a mesma: “[...] Guerreiro Lima, e sras. dd. Georgina Godoy Gomes, Marieta Chaves, Fanny Barnewitz e Florinda Tobino.” (A FEDERAÇÃO, ed. 203, 01 de set. de 1913, p. 1)

Os anúncios seguintes publicados no impresso sobre a missão pedagógica mostram que todos os nomes propostos foram mantidos para a realização da viagem, exceto o de Fanny Barnewitz. Ao invés do referido, passou a constar na listagem o nome de Ondina Godoy Gomes. Nesse caso, não foram localizadas justificativas para tal substituição. Da mesma maneira, não foi possível identificar, nas fontes consultadas, se houve um processo seletivo ou sob quais critérios se deu a escolha desses/as professores/as.

Contudo, a análise dos dados permitiu verificar que, com exceção de Georgina Gomes Moritz, todos os outros profissionais, que viajaram em 1913, atuavam na Escola Complementar de Porto Alegre7: Alfredo Clemente Pinto trabalhava há 7 anos, Afonso Guerreiro Lima - 3 anos, Florinda Tubino Sampaio - 2 anos, Marieta Freitas Chaves - 1 ano e Ondina Godoy Gomes havia sido contratada há 5 meses. Como se observa, o fato de somente Georgina Moritz não atuar na Escola Complementar, indica que, possivelmente, esse tenha sido um critério seletivo.

Vale relembrar que a referida escola, situada na capital, era a única pública e gratuita no Estado responsável pela formação dos candidatos ao magistério, o que conferia a ela uma importância singular. Logo, por um lado, assumia uma “[...] posição de pioneirismo quanto a teorias educacionais” e, por outro lado, representava a possibilidade das moças de classes mais privilegiadas “[...] adquirirem uma preparação cultural mais ampla”, bem “[...] como era praticamente a única oportunidade de formação profissional considerada conveniente para mulheres, servindo assim também àquelas que precisavam trabalhar” (LOURO, 1986, p. 58).

Se integrar o corpo docente da referida instituição foi um dos critérios de seleção, parece interessante questionar então, por que o nome de Georgina Moritz, que não atuava na Escola Complementar, constava na lista desse grupo que foi publicada no jornal A Federação antes mesmo do nome de Ondina Godoy, que atuava na instituição? E ainda: por que selecionar somente professores e professoras que atuavam na Escola Complementar?

Os materiais consultados não trazem respostas a essas questões. No entanto, eles apresentam alguns indícios que possibilitam se não respondê-las, ao menos problematizá-las. Nesse sentido, sobre a primeira questão destaca-se que as relações e os vínculos estabelecidos fossem com as autoridades gaúchas ou com os colegas de serviço, podem ter influenciado na escolha de Georgina. É elucidativo, nessa perspectiva, a sua relação com Ondina Godoy Gomes. Logo após a partida da comissão para Montevidéu foi divulgada no jornal A Federação uma reportagem criticando a maneira ‘espalhafatosa e grosseira’ com que o periódico O Século editava suas epigrafes e anunciava os fatos. Tal censura era referente à notícia que havia sido editada em 22 de setembro de 1913 sob o título “A olygarchia positivista do Rio Grande”, a qual alertava que “Da commissão de professoras que foram observar o methodo de instrucção adoptado na Republica do Uruguay fazem parte duas parentes do dr. Borges de Medeiros”, presidente do Estado no período (A FEDERAÇÃO, ed. 231, 04 de out. de 1913, p. 3). Após apresentar a reportagem, o órgão do PRR se manifestou indicando que se tratava de um equívoco, uma vez que:

[...] as duas distinctas professoras eram sobrinhas do dr. Olavo Godoy, as quaes não têm relação alguma de parentesco com o dr. Borges de Medeiros.

O engano deve provir do facto de ter sido o dr. Olavo Godoy cunhado do finado Victorino Borges de Medeiros, irmão do dr. presidente do Estado.

Dahi, porem, não decorre nenhum parentesco entre o nosso preclaro chefe e as sobrinhas do dr. Olavo Godoy (A FEDERAÇÃO, ed. 231, 04 de out. de 1913, p. 3).

No entanto, vale ressaltar que Jacinto Godoy Gomes, irmão de Ondina e de Georgina, foi nomeado, em 1910, para o cargo de Secretário da Procuradoria-Geral do Estado e de Secretário particular de Borges de Medeiros (PICCININI, 2004), o que evidencia que, mesmo sem grau de parentesco direto, como referiu o jornal A Federação, existia relações estabelecidas entre o Presidente do Estado e a família Godoy Gomes. Além disso, o esposo de Georgina, Gustavo Moritz, que atuava como editor do Correio do Povo, viajou juntamente com a comissão ao Uruguai. Com a abreviatura G. M. foram identificadas no periódico, três reportagens noticiando as atividades que estavam sendo desenvolvidas pelo grupo de professoras.

Todas essas informações evidenciam a rede de relações políticas e de poder que, provavelmente, a família Godoy Gomes estava envolta, o que, sem dúvida, deve ter contribuído para a escolha de Ondina Godoy, assim como para a indicação de Georgina Moritz para integrar a comissão, mesmo sem ela atuar na Escola Complementar de Porto Alegre.

Quanto ao ato de selecionar somente professores e professoras que atuavam na Escola Complementar, vale listar os argumentos presentes nas falas das autoridades gaúchas de que a falta de um corpo docente qualificado impedia o desenvolvimento e a melhoria do sistema público de ensino que estava sendo consolidado no Rio Grande do Sul. Assim, teria o Estado considerado importante que os/as integrantes da missão de estudos atuassem nessa instituição que formava os/as aspirantes ao magistério público por intencionar qualificar seus processos de formação?

Corrobora essa questão as investigações de Alfredo Bosi (1996) ao destacar que, talvez, a iniciativa das autoridades gaúchas de enviar uma missão de estudos ao Uruguai possa ser entendida como um “[...] sinal de zelo do governo por uma formação docente [...]” (BOSI, 1996, p. 302). Na ótica das autoridades, mais eficiente do que oportunizar a ida de docentes primários seria, então, possibilitar a atualização dos profissionais responsáveis pela formação dos aspirantes ao magistério? De profissionais que atuavam em uma instituição com representação e visibilidade na sociedade gaúcha?

Imbricado à atuação na escola de formação de professores, outro critério que parecer ter conduzido a seleção e/ou indicação do grupo foi o reconhecimento profissional, isto é, o suposto qualificado trabalho que esses professores e professoras desempenhavam no magistério público e a responsabilidade empreendida no desenvolvimento de suas funções.

Sobre isso, é interessante registrar que, assim como nos colégios elementares, a nomeação dos cargos vagos na Escola Complementar poderia ser feita por concurso ou por meio da escolha direta do governo quando esse julgasse conveniente (DECRETO nº 1.479, 1909). Desse modo, o próprio fato desses profissionais atuarem na Escola Complementar de Porto Alegre já os colocava em posição de reconhecimento social e profissional, uma vez que eles haviam sido contratados e/ou convidados diretamente pelas autoridades gaúchas por sua qualificação, prestigio, empenho e/ou destaque no magistério gaúcho.

Salienta-se, como exemplo, a figura da professora Florinda Tubino Sampaio. Ela diplomou-se pela Escola Complementar no ano de 1911 e foi convidada para trabalhar na instituição assim que recebeu seu diploma devido ao seu desempenho durante a formação que foi considerada exemplar. No ano de 1912, em uma visita realizada à Escola Complementar pela redação do jornal A Federação e pelo Secretário do Interior Dr. Protásio Alves, a professora teve a turma escolhida para mostrar os bons resultados de seu trabalho, o qual recebeu diversos elogios, como se pode ver a seguir:

Felicitamos a professora Florinda Tubino, pelo real aproveitamento da sua aula e apresentamos-lhe as nossas despedidas. A distincta jóvem apertou-nos a mão com um gesto de prazer e nobre orgulho pela prova que havia dado dos resultados do seu trabalho. E ficamos pensando quanto era justo e digno de apreço o intimo contentamento de uma moça que desempenha a cansativa missão de dar as primeiras licções a creanças (A FEDERAÇÃO, ed. 234, 05 de out. de 1912, p. 1).

Assim como o caso de Florinda Tubino Sampaio, os nomes dos demais comissionados ao serem referidos na imprensa ou nos documentos oficiais, eram precedidos por expressões como “distinctas”, “ilustrado”, “Dedicados professores rio-grandenses” (RELATÓRIO, 1914, p. XIII). Vale questionar nesse sentido: a escolha de Florinda Tubino Sampaio, assim como das demais professoras, representaria uma premiação pelos bons resultados de seus trabalhos, pela maneira responsável e disciplinada com que desempenhavam o exercício do magistério? A ressalva feita por Beiser (1997, p.64) de que os professores e as professoras rio-grandenses “foram brindados com uma inusitada possibilidade de atualização”, é interessante nessa perspectiva.

As informações expostas elucidam que, com maior ou menor tempo de exercício no magistério, as professoras comissionadas possuíam relações bem estabelecidas, fosse pelo sucesso escolar obtido no curso de formação, pelos cargos já ocupados, pelo desempenho de suas tarefas, pelos vínculos instituídos no próprio ambiente de trabalho, ou, ainda, pelas redes de relações mantidas com as autoridades gaúchas. Além disso, também evidenciam que apesar de não ter sido realizado um processo seletivo com etapas pré-estabelecidas, a seleção do grupo que viajou em 1913 esteve pautada em aspectos tais como qualificação, reconhecida competência profissional, prestígio, idoneidade e responsabilidade profissional. Entretanto, permite-se afirmar que, provavelmente, a indicação direta feita pelas autoridades gaúchas e, especialmente pelo diretor da Escola Complementar, tenha sido um critério predominante na nomeação dos profissionais.

Esses aspectos parecem ter regido também a seleção do grupo que viajou para Montevidéu no ano de 1914. Ratifica essa assertiva o seguinte registro: “Irá estudar tambem na Escola Normal de Montevidéo, uma turma de alumnos escolhidos entre os melhores da nossa escola complementar” (MENSAGEM, 1913, p. 11).

As duas únicas diferenças observadas em comparação ao grupo anterior, se assim pode-se dizer, foi que a listagem dos nomes das alunas-mestras e das professoras indicadas no ano de 1914 foi divulgada somente no dia de embarque das mesmas para o Uruguai, não sendo publicada anteriormente na imprensa nem em documentos oficiais localizados na pesquisa. E, ainda, que tais nomes foram sugeridos diretamente pelo diretor da Escola Complementar, pois um Ofício assinado por Protasio Alves8 assim foi redigido para Alfredo Clemente Pinto: “Devendo seguir para Montevidéo 6 alumnas desse estabelecimento, afim de ali se matricularem na Escola Normal, cumpre-vos fazer a necessária indicação” (LIVRO DE MINUTAS, Ofício nº 296, 28 de fev. de 1914).

Quanto às três alunas-mestras, Carlina Carneiro da Cunha, Marina Barreto da Cunha e Olga Acauan Gayer, formadas pela referida instituição no ano de 1913, foi possível identificar que as indicações para aperfeiçoarem sua formação e serem matriculadas no Instituto Normal de Señoritas no ano de 1914, com bolsas concedidas pelo governo uruguaio, ocorreu em virtude delas serem “[...] lãs alumnas que más se han distinguido em el curso de su carrera tanto por su inteligencia como por su contracción al estudio.” (EL DIA, 17 de mar. de 1914, p. 5).

Logo, é possível aferir que a indicação das alunas recém-formadas pautou-se pelo sucesso escolar (boas notas, distinção) e pelo empenho (dedicação aos estudos, responsabilidade) no decorrer do curso de formação. E, ainda, que essa oportunidade configurou-se como uma premiação pela conclusão do curso com distinção9, haja vista, por exemplo, a aprovação plena de Olga Acauan Gayer nos dois primeiros anos de curso e a premiação recebida da Mestra Olga Talaia de Moura por inteligência e aptidão; e a aprovação com distinção, no ano de 1912, de Marina Barreto Cunha.

Entretanto, se efetivamente o desempenho escolar foi um dos critérios que respaldou a escolha do diretor da Escola Complementar, chama a atenção o fato de Carlina Carneiro Cunha integrar o grupo, pois de acordo com os documentos analisados, em comparação com as outras duas colegas, ela apresentou um rendimento regular. Cotejando ainda as notas de Carlina, com os aproximadamente 23 nomes que constam na listagem publicada no jornal A Federação com os resultados dos exames ano a ano, evidencia-se que tiveram outras alunas com um desempenho geral no curso melhor do que o dela. É o caso, por exemplo, de Zulmira Godoy Gomes; Marieta Silva e Ernestina Sappo. Não há, contudo, na documentação consultada, elementos para compreender tal situação.

Para além do mérito profissional, as opções pessoais de querer ou não participar da missão também podem ser observadas. Há de se considerar para o caso das estudantes, que no ano de realização da viagem elas eram jovens, tendo entre 18 e 19 anos e que a decisão de ir ou não a Montevidéu pode ter sido influenciada pela necessidade de acompanhamento de um responsável. Veja-se que no livro de matrículas do Instituto Normal de Señoritas havia uma coluna para ser preenchida com o nome de um responsável e endereço residencial no Uruguai. Uma acompanhante ou responsável que permanecesse no país vizinho pelo período de aperfeiçoamento concedido pelo governo, também poderia representar um gasto extra para as famílias, pois ainda que as passagens das acompanhantes tenham sido pagas pelo Estado não há informações de que a estadia das mesmas tenha sido financiada pelo poder público.

Quiçá esses requisitos, questão financeira e necessidade de um responsável, tenham impossibilitado a indicação de outra aluna-mestra que não fosse Carlina, por exemplo, pois, para ela, talvez isso não tenha se configurado como um problema ou empecilho, uma vez que como sua responsável em Montevidéu constava, no livro de matrículas, o nome de sua mãe - Anacleta F. da Cunha - e o endereço de residência na rua San José, nº 950, o mesmo indicado para Marina Cunha (COLEÇÃO INSTITUTO NORMAL DE SEÑORITAS, Livro de Matrículas, 1914).

Embora o nome da responsável de Marina não tenha sido preenchido no livro de matrículas do Instituto é possível que sua mãe, Eulalia Barreto, também tenha a acompanhado na viagem, pois, segundo seu bisneto,

[...] a Vó Laia tinha muitas relações e se não me engano ela tinha uma irmã ou uma prima que morava em Montevidéu que era bastante abastada. É bem provável que a mãe dela [mãe de Marina] tenha ido para Montevidéu, até porque acredito que se a filha foi, como moravam só as duas e era a família dela, é capaz de ter ido junto. (ENTREVISTA CASTRO, 12 de dez. de 2016).

A situação de Olga também parece não ter sido distinta do caso de Marina e de Carlina, pois consta nos registros familiares a informação de que no Uruguai, ela “[...] estudou com proveito por quatro anos, estando sempre acompanhada de sua amada mãe.” (ARAÚJO, s/d, p. 38).

Nessa mesma perspectiva, Luiz Benevides, neto de Maria Idalina Mariante - professora que viajou juntamente com as três estudantes recém-formadas -, destaca ao narrar suas lembranças sobre a viagem que: “Também ninguém nunca soube dizer como uma família conservadora de Porto Alegre em 1913 deixou que a filha fizesse essa viagem, já que nunca constou que alguma irmã ou a mãe a tivesse acompanhado.” (ENTREVISTA BENEVIDES, abril, 2016). O relato do neto de Maria Idalina demonstra que não só o fato de ser jovem, mas também de ser mulher, as colocava quase que na impossibilidade de realizar uma viagem ao estrangeiro sem uma companhia naquela época. Pode-se questionar: quem teria se responsabilizado por Idalina nessa viagem? Não se trata de uma pergunta menor, uma vez que a condição de viajantes desacompanhadas de mulheres no período não pode ser minimizada.

Essas informações mostram que as indicações de Alfredo Clemente Pinto, talvez, não tenham sido pautadas somente pelo critério de bom desempenho e melhores notas. Sem dúvida, esses foram alguns critérios que subsidiaram a escolha, mas não o único; outras questões permearam a indicação como, por exemplo, situações pessoais e financeiras, ou, ainda, relações familiares e políticas.

São interessantes sobre este último, os destaques feitos pelo bisneto de Marina Barreto Cunha ao mencionar sobre as inúmeras transferências concedidas à professora pelas autoridades gaúchas, após o seu retorno de Montevidéu, o que evidencia as relações políticas e de poder as quais as estudantes e suas famílias, possivelmente, estavam envoltas. Como frisou Castro, em entrevista concedida para a pesquisa, talvez uma das questões mais relevantes que tenha contribuído na seleção destas e não de outras pessoas tenha sido o acesso irrestrito, as relações de amizade e as identificações políticas que o conjunto dos integrantes e/ou seus familiares possuíam com as autoridades gaúchas da época.

Da mesma maneira, os critérios que fizeram com que as outras três professoras, Branca Diva Pereira Souza, Maria Idalina Mariante Pinto e Maria José de Souza Cunha, fossem também indicadas para a viagem de 1914 parecem ter sido, assim como para o grupo de 1913, o bom desempenho de suas funções no magistério público e a competência profissional. Maria Idalina e Maria José foram contratadas para atuar na escola anexa à Escola Complementar logo após a conclusão do curso de formação ao magistério, o que as caracterizam nesse contexto, como já mencionado anteriormente, com elevada competência profissional.

Nessa linha, são relevantes os registros de alguns familiares dessas professoras. Dona Francelina, sobrinha de Branca Diva Pereira, salientou que sua tia recebeu o convite para ir ao Uruguai “[...] porque ela sempre se destacou nos estudos e no trabalho. Ela foi como prêmio.” (ENTREVISTA PORCELLA, maio, 2016). Luiz Benevides, neto de Maria Idalina, também informou que “o que sempre se falou na família é que foi um prêmio por sua cultura incomum na época, especial naquela capital e naquela idade” (ENTREVISTA BENEVIDES, abril, 2016).

Em linhas gerais, evidencia-se que, embora o processo de escolha dos grupos que integraram os dois momentos da missão de estudos não tenha sido explicitado nas fontes oficiais, os critérios que teriam conduzido as indicações não foram diferentes: premiação pelo bom desempenho de suas funções, idoneidade moral, responsabilidade, competência profissional, o amor ao estudo e a vocação ao magistério (A FEDERAÇÃO, ed. 18, 21 de jan. de 1916).

Possivelmente esses critérios tenham sido elencados, pois, como bem salientou Geraldino Silveira em uma reportagem:

O critério que predomina em todos os paizes de onde se pretende reorganisar serviços de administração publica, é confiar a pessoas competentes a missão de ir ao extrangeiro estudal-os, aproveitando a experiencia já adquirida por outros. Por toda parte se observa essa tendencia investigadora [...] (A FEDERAÇÃO, ed. 250, 28 de out. de 1913, p. 1).

Ao que tudo indica, a experiência do Rio Grande do Sul não parece ter sido diferente. Sobre essa tendência, são relevantes as observações do Inspetor Nacional uruguaio Abel J. Pérez, ao ressaltar que aquele que é selecionado para participar dessas viagens tem a difícil tarefa de “[...] llevar á un país cercano y amigo, La prueba tangible de sus progresos em La instrucción normal exteriorizada em alumnas de um nivel intelectual elevado y de una cultura positiva traducida en todos sus actos y acciones” (ANALES DE INSTRUCCIÓN PRIMARIA, 1904, Tomo II, p. 54).

Por certo, inúmeros aspectos e concepções podem ter sido ressignificados e colocados em circulação por meio das práticas das professoras que participaram da missão de estudos durante o período em que exerceram o magistério público ou que atuaram em cargos públicos, uma vez que se tem a compreensão, assim como Ianni (2003, p. 31), de que “há sempre uma transfiguração, de tal modo que aquele que parte não é nunca o mesmo que regressa”.

Contudo, para além das possíveis apropriações10 realizadas por elas e mesmo que os critérios de escolha e indicação do grupo tenham sido pautados por reconhecido mérito escolar e profissional, relações políticas, condições familiares, entre outros, reforça-se que as professoras que viajaram e permaneceram no Uruguai em 1913 e 1914, fizeram dessa experiência um momento importante de formação e catalisaram tal vivência como possibilidade concreta de tornarem-se intelectuais da educação, contribuindo sobremaneira com o campo educacional do Rio Grande do Sul. Salienta-se, a partir de Vieira (2015, p. 8), que “o intelectual é aquele que mobiliza o seu prestígio como especialista em favor de causas públicas [...]”.

Nesse sentido, pensar as professoras como intelectuais da educação envolve a compreensão de que elas detinham competência e legitimidade, bem como mobilizaram saberes didático-pedagógicos em prol do campo educacional e viveram suas vidas profissionais imersas em relações de poder e posicionando-se intelectualmente neste âmbito (VIEIRA, 2015), como se observará na próxima seção.

AS “DEDICADAS” PROFESSORAS RIO-GRANDENSES

Se por um lado os sujeitos que participavam de viagens pedagógicas eram considerados distintos e competentes, por outro lado, participar dessas experiências proporcionava ainda mais status profissional a eles, pois observar de perto, examinar, avaliar determinada realidade, poderia representar um marco nas suas trajetórias profissionais e pessoais. Para além das aprendizagens individuais, essas situações propiciavam certo prestígio dentre os demais no campo educacional (MIGNOT, 2010) possibilitando, no retorno das missões, maior legitimidade para propor projetos e mudanças nos diferentes níveis educativos, para participar de debates e para assumir cargos estratégicos no campo educacional. Sem dúvida, essa foi a realidade para algumas das professoras que participaram da missão de estudos ao Uruguai no início do século XX, uma vez que a mesma representou não só o aperfeiçoamento de conhecimentos e práticas como também permitiu maior visibilidade no magistério público e na sociedade rio-grandense.

Do ponto de vista da pesquisa que resultou nesse artigo, vale destacar que a maior parte dos descendentes dos comissionados entrevistados na investigação realizada não possuía informações detalhadas a respeito da mesma, tampouco materiais ou registros fotográficos. Todavia, todos afirmaram ter conhecimento da participação de seus familiares na missão de estudos, o que evidencia a importância da mesma nas trajetórias pessoais e profissionais de cada uma das professoras.

Nesse sentido, considerou-se importante apresentar um perfil geral do grupo a fim de identificar quem eram as mulheres que integraram a comissão de estudos ao Uruguai, onde atuaram, quais as principais atividades desenvolvidas em suas trajetórias profissionais antes e/ou depois da viagem pedagógica. Vale frisar que se reconhece a importância dos dois professores que integraram a missão de estudos, todavia, o foco deste artigo são as trajetórias das mulheres, por isso, foram contempladas na constituição deste perfil somente as informações das professoras.

Desse modo, destaca-se, como mencionado, que a composição dos dois grupos que integraram a missão de estudos era majoritariamente feminina. Do total dos 12 profissionais selecionados para integrar a missão, 10 eram mulheres. Todas elas se formaram pela Escola Complementar de Porto Alegre, sendo que a maior parte delas concluiu o curso entre os anos de 1911 e 1913. Não é pouco provável que a predominância feminina no grupo que viajou em 1913 deva-se justamente à presença majoritária de mulheres tanto no exercício do magistério público primário como na Escola Complementar. Da mesma maneira, o grupo que viajou em 1914 ser constituído somente de mulheres deve-se ao fato de as três bolsas concedidas pelo governo uruguaio serem destinadas às matrículas no Instituto Normal de Señoritas.

Sobre a predominância de mulheres no exercício do magistério público Tambara (1998, p. 39) salienta que o:

[...] processo de feminização do magistério de instrução primária no Rio Grande do Sul intensificou-se com a instalação da escola normal quando se iniciou o processo de profissionalização da atividade de magistério e, concomitantemente, um processo de reserva de mercado desta atividade para a mulher.

Segundo o autor, esse processo foi lento e gradual. No ano de 1887, 48,3% dos profissionais atuantes no magistério público do Rio Grande do Sul eram do sexo masculino e 51,7% do sexo feminino. No início do século XX, essa porcentagem já apresentava uma diferença maior. As mulheres representavam, no ano de 1900, 60,43% do corpo docente enquanto os homens totalizavam 39,57%.

É interessante enfatizar que embora tenha se tornado expressivo o número de professoras atuando no ensino público primário no início do século XX, era pouco comum que elas realizassem viagens ou cursos no exterior. Como salientado por Leite (2000), no século XIX, era incomum que mulheres realizassem viagens longas e perigosas. Entretanto, por volta de 1850, esse espaço foi sendo conquistado lentamente por elas, ainda que fosse perceptível a predominância masculina em viagens11. Desse modo, Louro (1986, p. 167) destaca que é “[...] inegável que uma caravana de moças recém-formadas representava - em 1914 - uma quebra de posição conservadora que não admitia a profissionalização feminina.”.

Vale destacar que a maior parte das professoras que participou da missão de estudos, posteriormente à viagem dedicou-se intensamente ao magistério público primário: Florinda Tubino Sampaio, Olga Acauan Gayer e Ondina Godoy Gomes atuaram por um longo período na Escola Complementar de Porto Alegre; Carlina Cunha, Georgina Gomes Moritz e Maria José de Souza trabalharam vários anos como professoras primárias. A atuação dessas professoras ocorreu, principalmente, na cidade de Porto Alegre, capital do estado, e, por vezes, na mesma instituição de ensino por longos períodos como, por exemplo, o caso de Carlina Cunha que trabalhou aproximadamente seis anos no Colégio Fernando Gomes (1916-1922) e de Georgina Gomes Moritz, que atuou nesta mesma instituição, por no mínimo, 11 anos (1916-1927). Entende-se que os vários anos do exercício da docência primária, assim como a proximidade e parceria de trabalho estabelecida entre essas profissionais contribuiu para que elas constituíssem uma rede de apoio e de apoiadores (GOMES e HANSEN, 2016).

Além de desempenharem a função de professoras primárias, algumas das viajantes como Branca Diva Pereira de Souza, Florinda Tubino Sampaio e Maria José de Souza foram diretoras de instituições de ensino. Branca Diva permaneceu no cargo no Colégio Elementar Souza Lobo pelo período de 18 anos. Florinda Tubino Sampaio foi pioneira no cargo de direção do Instituto de Educação, antiga Escola Normal que recebeu esta denominação em 1939, exercendo o referido cargo por 11 anos (1936-1945). Maria José de Souza, por sua vez, desempenhou a função no Colégio Elementar Fernando Gomes por pelo menos dois anos (1928-1929)12.

Olga Acauan Gayer também foi a primeira mulher a assumir a Diretoria Geral da Instrução Pública no ano de 1937, fato bastante relevante para uma historiografia das mulheres no campo educacional e das políticas públicas no estado gaúcho. Ademais, foi diretora do Departamento Geral de Educação Primária e Normal da Secretaria de Educação e Cultura do Estado do Rio Grande do Sul em 1942. De 1948 a 1955 exerceu o cargo de Diretora do Instituto de Educação Flores da Cunha, antiga Escola Normal de Porto Alegre.

Cabe enfatizar também que, ainda que a maior parte das professoras integrantes da missão de estudos tenha tido uma trajetória profissional voltada ao campo educacional, outras, no entanto, por distintos motivos, deixaram de fazê-lo em algum momento de suas vidas. É elucidativo a esse respeito a figura de Maria Idalina Mariante Pinto que em virtude da nomeação de seu esposo, em 1925, como diretor do presidio da Ilha Grande, transferiu residência para o Rio de Janeiro, e manteve lá atuação como diretora do Grupo de Escoteiros do Mar, do qual participavam os filhos dos colonos e de presidiários cujas famílias se mudavam para a região para ficarem próximas de parentes presos. Todavia, em 1930, ao perder o cargo de diretor, o casal mudou-se para o Rio de Janeiro e Maria Idalina não retornou a trabalhar (ENTREVISTA BENEVIDES, abril, 2016).

Nessa perspectiva outras situações ainda são interessantes de serem problematizadas. Os dados analisados evidenciam que Marieta Freitas Chaves exerceu a docência por um período breve, de 1911 a 1917, quando solicitou dispensa. Marina Cunha, por sua vez, ao casar-se, em 1920, encerrou sua atuação de cinco anos como professora primária. Observando as trajetórias pessoais dessas três profissionais, é possível inferir que ser esposa talvez tenha inviabilizado a continuidade do ser professora, uma vez que Marieta e Marina deixaram de exercer o magistério em período próximo ao de seu casamento, o que, no entanto, não diminui, obviamente, a importância que tiveram no campo educacional gaúcho, em especial ao serem escolhidas e participarem da missão pedagógica promovidas pelo governo do estado gaúcho em 1914.

É sabido que o casamento pode significar para algumas mulheres o fim da carreira profissional. Isso poderia ser uma dura realidade para muitas mulheres quando se trata do contexto das primeiras décadas do século XX. Além dos dois exemplos mencionados anteriormente, destaca-se, ainda, em relação à vida privada das professoras do grupo que duas delas, Branca Diva Pereira e Ondina Godoy, não casaram e não tiveram filhos. Olga Acauan e Carlina Cunha, por sua vez, casaram-se, mas não tiveram filhos. Em contrapartida, Florinda Tubino, Georgina Gomes Moritz e Maria José de Souza Cunha continuaram atuando como professoras após o matrimônio e a maternidade. Esses dados são interessantes à medida que demonstram que a maior parte das professoras, ou seja, sete delas desenvolveram concomitantemente as atividades no campo profissional e no âmbito privado.

No decorrer de suas trajetórias educacionais algumas dessas professoras também foram autoras de livros didáticos13. Florinda Tubino Sampaio produziu o livro “Lições de História da Civilização, publicado em dois volumes pela livraria do Globo, sendo o primeiro tomo editado no ano de 1935 e o segundo em 1936. Branca Diva Pereira de Souza e Olga Acauan adaptaram, conjuntamente, a cartilha ¿Quieres Ler?, do professor uruguaio José H. Figueiras, para o ensino da leitura (PERES, 1999; MICHEL, 2017; 2018). Pode-se dizer que a tradução deste livro foi um dos resultados mais perceptíveis provenientes do segundo momento da missão de estudo, uma vez que ele foi publicado pela editora Selbach e foi adotado nas salas de aulas gaúchas por muitas décadas.

Além desse trabalho coletivo, Branca Diva também foi autora de mais duas obras, a saber, “Primeiras Leituras” (s/ed.) e “Quero Ler (s/ed.).

Vale salientar, desse modo, que além de produzir conhecimentos no campo educacional, Olga Acauan e Branca Diva colocaram em circulação uma proposta para o ensino da leitura e da escrita, que reverberou nas concepções e nas práticas das professoras primárias rio-grandenses por décadas, o que implica na ressalva de que, por meio de suas produções elas fizeram circular esses conhecimentos e saberes para um amplo público; aspecto esse, elencado por Gomes e Hansen (2016), que deve ser considerado ao se identificar um intelectual mediador.

De maneira geral, os dados analisados indicam que as dez professoras selecionadas para integrar a missão ao Uruguai eram e/ou tornaram-se pessoas envolvidas com as questões educacionais de seu tempo e reconhecidas nesse campo fosse pela idoneidade, pela participação em debates, pelo desempenho no trabalho pedagógico, pela autoria de livros didáticos, ou ainda, pelo envolvimento que tiveram no campo do ensino público do Estado.

Nesse sentido, pode-se reafirmar que se trata de uma geração de mulheres intelectuais. Configura-se um argumento baseado na ideia já mencionada de Vieira (2015) de que o intelectual mobiliza seus saberes e conhecimentos como especialista em favor de causas políticas. Igualmente tal argumento é baseado na ideia de Peres e Ramil (2018) ao destacarem as atividades das professoras gaúchas, autoras de livros didáticos na segunda metade do século XX. Ou seja, trata-se de intelectuais principalmente em razão da ampla rede de sociabilidade profissional da qual participaram ativamente, do desenvolvimento de saberes específicos, de uma certa identidade profissional que construíram, das relações que estabeleceram entre o poder público e outras instituições públicas e privadas, do engajamento na causa da produção didática, do discurso da modernidade e da renovação pedagógica que contribuíram para difundir, da ocupação de espaços e de posições de prestígio social e de poder, do trabalho em prol das reformas educacionais, entre outras ações e atividades desenvolvidas.

Conclusões

A missão de estudos do governo gaúcho ao Uruguai foi realizada em dois momentos: o primeiro no ano de 1913 e o segundo em 1914 e cada uma dessas etapas teve objetivos distintos, sendo que, inicialmente, viajou para Montevidéu um grupo de profissionais da educação com a intenção de observar a realidade educacional uruguaia, a organização escolar, os métodos de ensino adotados, os materiais usados, entre outros aspectos, para, então, posteriormente, no segundo momento, um grupo de professoras estudar e aperfeiçoar seus conhecimentos e sua prática de ensino no Instituto Normal de Señoritas e na Escola de Aplicação anexa à mesma.

No que tange à seleção e/ou indicação das profissionais que integraram a missão de estudos, foi possível verificar que tais nomes foram sugeridos pelas autoridades gaúchas e, especialmente, pelo diretor da Escola Complementar de Porto Alegre - Alfredo Clemente Pinto. Contudo, apesar de não ter sido realizado um processo seletivo com etapas pré-estabelecidas, a seleção e/ou indicação dessas profissionais esteve pautada por um conjunto de critérios tais como qualificação, reconhecida competência profissional, prestígio, idoneidade, dedicação aos estudos e responsabilidade profissional. Assim, os registros analisados demonstraram que com maior ou menor tempo de exercício no magistério, as integrantes da missão de estudos eram envolvidas com as questões educacionais da época, possuíam relações bem estabelecidas, fosse pelo sucesso escolar obtido no curso de formação, pelos cargos já ocupados na administração pública, pelo desempenho de suas tarefas no exercício do magistério, pelos vínculos instituídos no próprio ambiente de trabalho, ou ainda, pelas redes de relações mantidas com as autoridades gaúchas.

Além desses elementos, observou-se que, especificamente para o grupo que viajou em 1914, questões financeiras e familiares podem ter influenciado a indicação feita pelo diretor da Escola Complementar de Porto Alegre, uma vez que se tratava de professoras jovens que necessitavam à época, para poder viajar, a companhia de um familiar, o que para umas poderia ser, ou não, um empecilho.

Mas o importante a ressaltar, por fim, como se destacou, é que seja nas salas de aula por longos períodos, na direção de instituições de ensino públicas, na produção de materiais didáticos, à frente da Diretoria da Instrução Pública, como foi o caso de Olga Acaun Gayer, ou da direção do Instituto de Educação, como Florinda Tubino Sampaio, essas dez mulheres destacadas nesse artigo configuram uma geração de intelectuais do campo educacional, reconhecidamente sujeitos inseridos em relações de poder, que buscaram os seus posicionamentos no mercado das profissões associadas ao campo intelectual (MICELI, 1979; VIEIRA, 2015) e que contribuíram significativamente com a educação gaúcha em um tempo e espaço em que a participação feminina na esfera pública - em especial a qualificação com viagens ao exterior - era, ainda, incomum e pouco aceitável. Trata-se, pois, de pioneiras da educação que precisam ser reconhecidas e retiradas do silêncio que foram submetidas por décadas.

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1Para o caso da educação nesse período ver, entre outros, Tambara (1995), Giolo (1997) e Corsetti (1998).

2Instituição estatal responsável pela formação de professores no Uruguai. Foi criada em 1882 em caráter de internato passando, a partir de 1900, a ser externato e denominada Instituto Normal.

3Sobre o fato de o Uruguai ser considerado um país mais adiantado, cabe salientar que, no período de envio da missão de estudos, estava na presidência Batllhe y Ordónez. Seu governo mostrou significativos avanços passando a ter um papel de destaque na América Latina. Dentre os principais feitos destaca-se: o projeto da Lei de Trabalho aprovado em 1905; a criação do Ministério da Instrução Pública em 1911; a regulamentação das eleições para a Convenção Nacional Constituinte que autorizava o voto secreto, universal e masculino em 1915; a instalação de bondes elétricos em 1906; a iluminação a gás desde 1886; Lei do divórcio em 1907; a supressão do ensino religioso em 1909; entre outros. Ações, avanços e progressos estes que renderam ao país, nesse período, o status de Suiça latino-americana (SOUZA, 2003).

5Os questionamentos que nortearam as entrevistas solicitavam, basicamente, dados biográficos das professoras, da trajetória profissional e, ainda, informações a respeito da missão de estudos ao Uruguai.

6Alfredo Clemente Pinto foi diretor da Escola Normal do Estado no período Imperial, Diretor da Instrução Pública no ano de 1886, e convidado para dirigir a Escola Complementar de Porto Alegre em 1906.

7Embora a Escola Normal da capital existisse desde 1869, ela foi constantemente reorganizada, e a Escola Complementar, que previa uma formação em três anos, foi criada em 1906, sendo a única instituição estatal responsável pela formação de professores no Rio Grande do Sul até 1927.

8Secretário dos Negócios do Interior e Exterior de 1906 a 1928.

9Ações como essas eram praticadas no período investigado, tanto nacional como internacionalmente, pois várias instituições tinham por prática custear os estudos dos alunos e alunas com bom desempenho ao final do curso. A Escola Nacional de Belas Artes, por exemplo, realizava essa prática e, no ano de 1911, reorganizou os critérios seletivos para as viagens de premiação à Europa aos alunos que merecessem por distinção na pintura (A FEDERAÇÃO, ed. 28, 01 de fev. de 1911, p. 1). No Rio Grande do Sul, desde 1918, alunos dos institutos anexos à Escola de Engenharia que demonstrassem propensão a determinadas especializações também tinham a possibilidade de, através de uma bolsa do governo federal, aperfeiçoar seus estudos no estrangeiro.

10O conceito de apropriação é aqui entendido a partir da perspectiva de Chartier (2003) e De Certeau (2014) que consideram que os sujeitos interpretam e fazem usos diferenciados e opostos dos bens culturais. O “consumo” é uma produção astuciosa, dispersa e “quase invisível, pois não se faz notar com produtos próprios, mas nas maneiras de empregar os produtos impostos [...]” (CERTEAU, 2014, p. 39).

11Em comissões pedagógicas, geralmente, eram enviados homens, quase sempre autoridades ligadas ao governo ou figuras de destaque no cenário educacional do Brasil. Como exemplos, cita-se os intercâmbios realizados por Abílio César Borges à Europa em 1866, 1870 e 1879 (CHAMON e FARIA FILHO, 2007), por Manoel José Pereira Frazão à Europa e aos Estados Unidos em 1890 (SCHUELER, 2006) e por Maria Guilhermina Loureiro de Andrade em 1883, aos Estados Unidos (CHAMON, 2005).

12Dados extraídos do Relatório do Estado dos anos de 1928 e 1929. Não foi possível identificar o período de permanência como diretora para além desse período.

13Foi o caso também de Affonso Guerreiro Lima. Além dele, o então diretor da Escola Complementar, Alfredo Clemente Pinto já tinha publicado o livro Seleta em Prosa e verso (1883) antes da viagem ao Uruguai, o qual segundo Tambara (2008, p. 86) “[...] no alvorecer da República e, de modo especial, no período da República Velha, vai constituir-se no livro de leitura, por excelência, da escola primária no Estado do Rio Grande do Sul.”.

Recebido: 19 de Outubro de 2021; Aceito: 10 de Janeiro de 2022

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CAROLINE BRAGA MICHEL é professora do Instituto de Educação, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) e atua no Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEdu) na mesma universidade. Doutora em Educação pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Realizou Pós-Doutorado na Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Coordena o Centro de Memória da Educação (CEMEDU) da FURG e é vice-líder do Grupo de estudo e pesquisa em Educação, Pedagogias e Sociedade (GEPEES).

ELIANE PERES é professora Titular Aposentada da UFPel. Colaboradora do Programa de Pós-graduação (Mestrado e Doutorado), PPGE, da Faculdade de Educação da UFPel. Possui Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (2000), com Estágio no Exterior (PDEE) na Universidade de Lisboa ("doutorado-sanduíche"). Realizou estágio de pós-doutorado (com bolsa CAPES) na University of Illinois at Urbana-Champaign (USA) em 2011-2012. Foi Fulbright Visiting Professor na University of Texas at San Antonio, USA, em 2018.

Editora responsável:

Dóris Bittencourt Almeida

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